A pedido de um leitor de meus artigos neste blog
decidi escrever sobre a reunião realizada por representantes da Igreja Católica
chamada de “conclave”.
Mas o que é o conclave? A palavra “conclave” vem
sendo usada desde 1274. Foi o papa Gregório X que a usou pela primeira vez
nesse ano, criando-se assim as bases para os conclaves que foram realizados até
a atualidade. Trata-se de um processo desenvolvido pela Igreja Católica de
escolha de um novo papa (o chefe da Igreja Católica), por meio de uma reunião
do Colégio de Cardeais. No decorrer de todo esse tempo desde a sua criação,
esse processo passou por mudanças conforme os contextos em que ocorreram.
Foi durante o Segundo Concílio de Lyon, em 1274,
que o papa Gregório X , preocupado com a possibilidade de demora na escolha e
com possíveis interferências políticas externas, assinou um decreto que
determinava que os cardeais eleitores deveriam ficar trancados em seclusão
(isolamento) cum clave ( “com chave”). Eles não poderiam sair
até que o processo da eleição tivesse terminado, com um novo papa eleito.
No início da história da Igreja Católica o bispo de
Roma (que posteriormente passou a ser considerado o papa) era escolhido pelo
consenso do clero e dos leigos da diocese. Mas a regra mudou em 1059 quando o
Colégio de Cardeais foi designado como o único corpo de eleitores. O Papa Paulo
VI em 1970 fez outra mudança: os eleitores seriam cardeais com menos de 80 anos.
Houve outras alterações feitas depois pelos papas João Paulo II e Bento
XVI. Atualmente é preciso um voto de maioria qualificada de dois
terços para eleger o novo papa.
O mais longo tempo para escolha de
um papa aconteceu com a morte do Papa Clemente IV. Em Viterbo, na Itália, no
dia 29 de novembro de 1268, teve início a mais longa eleição papal da História
da Igreja que só teve fim em 1º de setembro de 1271. Dos 19 cardeais eleitores
que iniciaram a reunião, dois morreram nesse período. A população da cidade
perdeu a paciência e trancou os cardeais eleitores no Palácio Papal de Viterbo.
A entrega de alimentos era controlada rigorosamente e a cobertura do local onde
os cardeais estavam foi removida em parte deixando-os expostos à temperatura
ambiente. Finalmente foi escolhido Teobaldo Visconti, que nem cardeal era e não
estava na reunião. Ele encontrava-se na Terra Santa e demorou 4 meses para ele
chegar em Viterbo e em 27 de março, em Roma, tornou-se o papa Gregório X.
A expressão “conclave” aparece pela
primeira vez na Constituição Apostólica Ubi Periculum , em
relação ao local em que se reúnem os cardeais para a eleição do novo Papa, e à
assembleia constituída com esta finalidade.
Na atualidade, quando há a morte de um papa, durante nove dias os cardeais celebram exéquias de sufrágio por sua alma
, conforme o que está escrito no documento Ordo Exsequiaram Romani
Pontifici.
Quando um papa morre ou renuncia
a Sé Apostólica é considerada vacante até a data de eleição de um novo
pontífice. Durante este tempo o Cardeal Decano ou Camerlengo fica responsável
pelos assuntos da Igreja. Ele é que tem que comprovar oficialmente a morte do
Papa, fazendo-o na presença do Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias,
dos Prelados Clérigos e dos Secretário e Chanceler da Câmara
Apostólica. Também é o Decano que redige a ata em relação ao falecimento do
Papa. É convocado o Sagrado Colégio dos Cardeais para que seja reunido o
Conclave. O Camerlengo também tem a função de recolher o selo e o anel
pontifícios, fechando os aposentos e dependências onde o papa que morreu viveu
e trabalhou.
A eleição é feita no Vaticano
pelos cardeais reunidos que não tenham completado 80 anos até o anúncio da Sé
Apostólica vacante. O último papa que não era cardeal foi Urbano VI, em 1378. A
eleição é realizada no Estado do Vaticano ( na Capela Sistina), com os cardeais
isolados do mundo exterior, sem poderem se comunicar para fora de onde estão.
O Papa Paulo VI por meio do
documento do Motu Proprio Ingravescentem Aetatem, de 21 de
novembro de 1970, refez regras de eleição e foi publicada a Constituição
Apostólica Romano Pontífice Eligendo em 1975 que reafirma o documento
de 1970. Foram decretadas por esse papa três modalidades para a eleição: 'por
aclamação' (um cardeal propõe um nome e os outros cardeais aceitam-no
imediatamente); 'por compromisso', isto é, por aceitação do nome decidido por
um grupo de Cardeais, e 'por votação'. Neste último caso, o nome do Cardeal
mais votado tinha que somar dois terços dos votos. Mas João Paulo II na Constituição
Apostólica Universi Dominci Gregis, de Constituição Apostólica modificou
as regras de escolha: a eleição de um papa seria só por votação, com três
passos. O primeiro é a contagem dos votos, o segundo a sua verificação e
o terceiro a sua destruição pelo fogo.
O sigilo durante o processo
eleitoral no Conclave é para os cardeais e todas as pessoas chamadas a prestar
apoio técnico ou logístico às sessões do Conclave. Geralmente os conclaves
duram de 2 a 5 dias. O processo mais rápido na atualidade foi em 1939 quando
foi escolhido Pio XII em dois dias, em três votações e o mais longo foi em 1922
na escolha Pio XI. Em outras épocas da História houve o processo de escolha do
Papa Celestino V que começou em 1292 e terminou em 1294 (no total 27 meses) e
como destaque de rapidez o de escolha do Papa Júlio II em 1503 que levou
algumas horas.
Ao começa o Conclave o Camerlengo lê o juramento solene que obriga todos os cardeais eleitores a aceitar as condições do processo , a rejeitar todas as influências externas e a manter secretas as suas deliberações. Após isso, ele procede à chamada dos eleitores. Ao ouvir o seu nome, cada cardeal levanta-se e dirige-se para a mesa onde estão os três vasos de vidro e a bandeja de prata, perante a qual, em voz alta, declara o juramento com a mão direita sobre a Bíblia. O Camerlengo destaca a importância das decisões dos eleitores e diz: "Que o Senhor vos abençoe a todos!" Começa então um sorteio para escolha de três cardeais escrutinadores que tem a responsabilidade de verificar e contar os votos. Esses cardeais recebem a designação de 1.º, 2.º e 3.º escrutinador. São sorteados também os três cardeais infirmarii que devem recolher os votos dos cardeais que adoeceram, eventualmente, durante o Conclave. São sorteados, por fim, os três Cardeais revisores, encarregados de fiscalizar os trabalhos dos cardeais escrutinadores.
As votações para escolha do novo
papa são realizadas em sessões de manhã e à tarde, duas em cada sessão, com
exceção do primeiro dia onde se realiza apenas uma votação. Na hora da votação
cada Cardeal pega num boletim, de papel branco e forma retangular, que tem
escrito na parte superior ''Eligo in summum pontificem" (Elejo
como Sumo Pontífice), ali há o espaço que o cardeal eleitor deve escrever
em letras maiúscula o nome do escolhido por ele. O voto precisa ser dobrado ao
meio. Primeiro votam os cardeais mais idosos. Os eleitores colocam o voto na
bandeja de prata e vão até a boca do primeiro vaso de vidro, inclinam a bandeja
e o voto cai no vaso. Quando a votação termina, o primeiro Cardeal escrutinador
pega o vaso de vidro e leva-o para a mesa de escrutínio e aí agita-o para
misturar bem os votos e depois coloca os votos no segundo vaso de vidro,
conta-os um por um e diz em voz alta para que todos ouçam claramente. Se os
votos contados não estiverem correspondendo ao total de cardeais eleitores,
serão queimados e será feita a segunda votação.
Quando cada voto é tirado pelo
primeiro escrutinador, ele é desdobrado e é anotado numa folha de papel o nome
votado. O voto depois de ter passado pelo primeiro escrutinador é entregue ao
segundo escrutinador, que procede de igual modo, entregando o voto ao terceiro
escrutinador. Este lê cada nome votado em voz alta e de modo que todos
entendam. E assim se procede até que todos os votos sejam contados e
anunciados. No fim deste processo, o terceiro escrutinador fura e cose
cada boletim de voto com agulha e linha. Depois os votos são colocados no
terceiro vaso de vidro. Cada um dos três escrutinadores deve somar os votos
constantes do papel em que os foi anotando. Após esse trabalho, os cardeais
revisores vão até a mesa de escrutínio e, cada um por seu lado, contam os votos
e conferem o número total de votos com o registro feito por cada escrutinador.
Se houver três dias sem
resultados suspendem-se os escrutínios durante o máximo de um dia, com o fim de
criar uma pausa para oração e livre diálogo entre os cardeais eleitores.
O anúncio dizendo que o processo
eleitoral terminou ou não é por meio de "fumatas". A fumaça
que sai de uma chaminé instalada numa estufa do tipo salamandra na Capela
Sistina, é, pela sua cor, o sinal dado ao exterior. Se não houver ainda
conclusão, isto é, se o nome de um candidato não somar dois terços dos votos,
volta tudo à primeira forma. Os eleitores devem dar ao Camerlengo as notas
pessoais que porventura tomaram durante a eleição. As notas, juntamente com
todos os votos, são metidas numa caixa onde já se encontram as tiras de papel
relativas ao sorteio dos cardeais escrutinadores, infirmarii e
revisores. A caixa é conduzida para o fogão contíguo à Capela Sistina, onde
tudo é queimado.
A partir do conclave de 2005 há
um novo sistema para a fumata que permite distinguir bem a
fumaça branca, que indica a eleição do pontífice, da fumaça preta, que indica
que o processo ainda não convergiu num nome. Para obter cor preta usa-se uma
mistura de perclorato de potássio, antraceno e enxofre e
para fumaça branca é usada uma mistura de clorato de
potássio, lactose e colofónia.
Escolhido o novo papa são
chamados pelo último dos Cardeais Diáconos dois cardeais: o cardeal que é
Secretário do Colégio dos Cardeais e o cardeal que é Mestre das Celebrações
Litúrgicas Pontifícias. O Cardeal Diácono pede então o consentimento do cardeal
que foi eleito Papa dizendo:
Pergunta 1-Acceptasne
electionem de te canonice factam in Suumum Pontificem? Aceitas a tua eleição
canónica como Sumo Pontífice?
Resposta- Aceito em nome do
Senhor (o Cardeal pode rejeitar e volta-se a fazer uma nova votação).
Pergunta 2- Quo nomine
vis vocare? Com qual nome queres ser chamado?
O novo Papa releva o nome que
deseja ter. A seguir, recebe o 'ato de obediência' por parte de todos os
Cardeais. Um a um, vão até ele de pé. Então, a caixa que contém os votos, os
apontamentos dos Cardeais e as tiras do sorteio dos escrutinadores é levada a
queimar dentro do fogão da Capela Sistina. Sai neste caso a fumaça branca,
anunciando a escolha do novo Papa. O Cardeal Protodiácono vai até a varanda da
basílica anunciar o resultado.
Annuntio vobis gaudium magnum: |
"Anuncio-vos com grande
alegria: |
Em um momento posterior o Papa
aparece na varanda central da Basílica de São Pedro e deve então dar a a
bênção Urbi et Orbi .Desde a eleição do Papa João Paulo II o
papa que foi eleito fala ao povo com um discurso precedente à benção.
__________________________________
Márcio
José Matos Rodrigues-Professor de História
Figura:
https://www.gettyimages.com.br/search/2/image?phrase=conclave
Nenhum comentário:
Postar um comentário