A escritora e poeta (ou poetisa) brasileira Olga Savary nasceu em 21 de maio de 1933, em Belém do Pará. Era a filha única de Bruno Savary, engenheiro russo que tinha antepassados alemães, suecos e franceses e da paraense Célia Nobre de Almeida. Olga tinha uma bisavó materna indígena. Na sua infância, Olga recebeu influências culturais do Pará por meio de parentes pelo lado de mãe. Seus avós maternos eram da cidade paraense de Monte Alegre.
Olga, devido ao trabalho de seu pai,
vai morar em Fortaleza, capital do Ceará, em 1936. Em 1942, por causa da
separação de seus pais, Olga passa a morar na cidade do Rio de Janeiro com um
tio materno. É nessa cidade que ela, aos onze anos, passa a redigir um pequeno
jornal, com incentivo de um vizinho, ganhando uma remuneração. A mãe não
concordava com essa atividade, porque desejava que a filha se interessasse por
música, porém Olga não queria tal caminho. Para evitar que a mãe destruísse
seus escritos, Olga dava seu caderninho para um bibliotecário guardar. A
convivência com a mãe era complicada e aos 18 anos ela voltou a Belém e foi
estudar no Colégio Moderno. Mas sua carreira de escritora só vai em frente
quando volta a morar no Rio de Janeiro.
Ela, além de escrever poesias, também
foi contista, romancista, crítica, tradutora e ensaísta. Ela traduziu obras de
escritores hispano-americanos como Borges, Cortázar, Carlos Fuentes, Lorca,
Neruda, Octávio Paz, Mário Vargas Llosa e também traduziu obras dos escritores
japoneses Buson e Issa.
A escritora conheceu o poeta Carlos
Drumond de Andrade, que teria se apaixonado por ela. Mas não foi correspondido.
Segundo ela:
“Drummond era meu primo, ele que
descobriu isso e me escreveu para contar. Ele era apaixonado por mim, eu
não. Se bem que uma vez encontrei com ele na rua, e tive que encostar na
parede, para não cair. Fiquei com as pernas bambas, não de paixão, mas de
ternura”.
Olga foi correspondente de periódicos
no Brasil e em outros países, tendo organizado antologias de poesias. Em 1968
Olga participou do filme “Edu, Coração de Ouro”. A Antologia de Poesia
da América Latina, editada em 1994, nos Países Baixos, com obras de 18
poetas, entre eles Pablo Neruda e Octávio Paz (dois ganhadores do Nobel de
Literatura) conta também com poesias de Olga. Ela participou da associação
mundial de escritores, com ligação à UNESCO, chamada PEN Club. Presidiu entre
1997 e 1998 o Sindicato de Escritores do Estado do Rio de Janeiro. Foi a
primeira mulher brasileira que lançou um livro todo dedicado a poemas eróticos.
Teve alguns poemas musicados pelo compositor Madan, Pedro Luiz das Neves (1961
- 2014). Foi colaboradora de jornais e revistas do Brasil e de fora do país.
Ganhou o Prêmio Jabuti, de
Autor Revelação, pelo livro Espelho Provisório, o Prêmio
de Poesia, pelo livro Sumidouro e o Prêmio Artur de Sales
de Poesia, pelo livro Berço Esplêndido, em 1987.
Olga teve dois filhos no seu casamento com o cartunista
Jaguar: Pedro e Flávia Savary. Pedro faleceu em 1999.
Ela disse certa vez:
“No Brasil, poeta morre de fome.
Mas sou apaixonada por este malandro chamado literatura
e não viveria sem ele.”
Olga Savary (1933 – 2020)
Olga publicou os seguintes livros:
Livros publicados: 1970 - Espelho
Provisório (poemas); 1977 - Sumidouro (poemas); 1979
- Altaonda (poemas); 1982 - Magma (o 1º livro
editado por uma mulher só com poemas eróticos; 1982 - Natureza Viva (poemas);1986
- Hai-Kais (poemas); 1987 - Linha d'água (poemas);
1987 - Berço Esplendido (poemas); 1989 - Retratos (poemas);
1996 - Morte de Moema (poemas); 1997 - O Olhar Dourado
do Abismo (contos). 1998 - Repertório
Selvagem (poesia reunida).
Olga morreu de parada cardíaca em 15 de maio de 2020,
por causa da COVID- 19.
Segundo Antônio Houaiss: “Olga Savary é senhora de uma gleba fecunda
no território da poesia brasileira viva que ninguém aí se nutre deve
desconhecer.”
Segundo Felipe Fortuna:
“Acostumada à concisão, sua
poesia exercita, com formas breves, com metros curtos, a permanência — qualidade,
aliás, que lhe permitiu dominar a estrutura do haicai, talvez avessa às
peculiaridades do idioma. Ao estrear numa década violenta da história política
do País, Olga Savary atravessou-a com a delicadeza da linha-d´água no papel,
sem se permitir a poesia engajada: ela é, de fato, poeta dos elementos, das
formas naturais, das pequenas elegias.”
O poeta Antonio Carlos Secchin disse:
“— Além da poesia delicada, temos também a posição dela como incentivadora de novos poetas. Ela organizou a primeira antologia de poesia erótica do país, e se dedicou inteiramente à literatura em todas as manifestações, apesar de não ter tido o reconhecimento à altura. E ela se ressentia um pouco disso, com razão. Nos resta homenageá-la...”
O poeta Edimilson de Almeida Pereira
destacou em sua página numa rede social : "No início do meu percurso como
poeta, Olga (que conheci através de José Afrânio Moreira Duarte, outro amigo
imensurável, flor da mais humana generosidade) foi uma incentivadora constante,
uma voz reconhecida que se dedicou a ler e a comentar os textos de um
iniciante" E ainda : “— Ela foi uma artista de muitas faces. Harmonizou
densidade e coerência com a força criativa da poeta, o rigor crítico da
pensadora, a competência da gestora pública de bens clulturais, tudo isso
permeado por uma generosidade muito grande e um senso de humor refinado. A Olga
Savary que conheci me legou a vontade de trabalhar apesar dos obstáculos, sem
perder no trabalho o apreço pela beleza.”
Aguns poemas de Olga Savary:
Pássaro
A noite não é tua
mas nos dias
— curtos demais para o voo —
amadureces como um fruto.
Tuas asas seguem as estações.
É tua a curvatura da terra.
Pássaro, metáfora de poeta.
Nua e crua
Não tendo pra onde voltar é que me largo pra rua,
Eu que seria leito de rio, leito de mar, maré,
Sem porto ou barco, peixe fora d´água, pássaro no voo
Mas quede a asa?
Signo
Há tanto tempo que me entendo tua,
exilada do meu elemento de origem: ar,
não mais terra, o meu de escolha,
mas água, teu elemento, aquele
que é do amor e do amar.
Se a outro pertencia, pertenço agora a este
signo: da liquidez, do aguaceiro. E a ele
me entrego, desaguada, sem medir margens,
unindo a toda esta água do teu signo
minha água primitiva e desatada
Luz, Câmara, Ação
O poeta cria o sonho
compensando o que lhe falta
com o muito que lhe sobra.
Acomodação do desejo III
Deito-me com quem é livre à beira dos abismos
e estou perto do meu desejo.
Depois do silêncio úmido dos lugares de pedra,
dos lugares de água, dos regatos perdidos,
lá onde morremos de um vago êxtase,
de uma requintada barbárie estávamos morrendo,
lá onde meus pés estavam na água
e meu coração sob meus pés,
se seguisses minhas pegadas e ao êxtase me seguisses
até morrermos, uma tal morte seria digna de ser morrida.
Então morramos dessa breve morte lenta,
cadenciada, rude, dessa morte lúdica.
Mapa de Esperança
Vinha pisando sobre toda a praia,
o sangue quieto — ou quase quieto —,
os pensamentos leves como espumas
e os cabelos soltos como nuvens.
Trágica como princesa de elegia,
meu estandarte é o desespero,
minha bandeira, indecisão.
Ainda assim, alegria, te festejo.
Menina sublunar, afogada,
que voz de prata te embala
toda desfolhada?
Tendo como um só adorno
o anel de seus vestidos
ela própria é quem se encanta
numa canção de acalanto
presa ainda na garganta.
Auto despedida
Há algo nas manhãs que não entendo agora
e a um grito de minhas pernas não atendo.
Ainda depois da noite, noite me espia
e sonho dúvidas enormes e imóveis
como a imobilidade das aranhas.
Tão pouco tempo – e tenho de deixar-me
e queria nunca ter de repartir-me.
Começa a raiva da saudade
que inventei vou ter de mim
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Márcio José Matos Rodrigues
Figura:
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