Neste mês de outubro
de 2023, quando o mundo está passando por guerras e outros conflitos terríveis
que afetam tanta gente e considerando também o “Dia do Professor” comemorado no
Brasil em 15 de outubro, resolvi escrever sobre Gabriela Mistral, uma poetisa
(ou poeta), educadora, diplomata e feminista chilena, que em 1945 (ano do fim
da Segunda Guerra Mundial) recebeu o Prêmio Nobel de Literatura.
O nome original de
Gabriela Mistral era Lucila de Maria del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga. Ela
nasceu em Vicuna, Chile, em 7 de abril de 1889. O amor, o amor de mãe, memórias
pessoais dolorosas, mágoa e recuperação foram temas centrais em poemas escritos
pela autora.
Seu pai era o
professor e poeta Juan Jerónimo Godoy Villanueva, e sua mãe era Petronila
Alcayaga Rojas, descendentes de espanhóis. Gabriela passou anos de sua infância
em localidades do vale de Elqui, na atual Região de Coquimbo. Aos dez anos foi
com seus pais para La Union(hoje em dia é Pisco Elqui). Mas o local
que Gabriela considerava como sua cidade natal foi Montegrande, onde ela viveu
entre três e nove anos. Ela chamava este lugar de “amado povoado”.
Aos três anos
o pai de Gabriela deixou a família, mas ela o defendeu e mencionou
que foram poemas de seu pai que incentivaram nela o gosto pela poesia. A sua
mãe morreu em 1929. Para ela foi dedicado a primeira parte do livro Tala: Muerte
de mi Madre
Gabriela passou a
trabalhar como professora primária em 1903, tendo feito a prova nacional
para professores na Escola Normal N º 1 de meninas de Santiago e obteve o
título de “Maestra”. Trabalhou como professora em cidades chilenas, conheceu o
poeta Pablo Neruda e em 1918 se tornou diretora do "Liceo de niñas de
PuntaArenas". Foi convidada em 1922 pelo Ministério da Educação do
México para trabalhar nos planos da reforma educacional que estava sendo
conduzida pelo filósofo e ministro de educação José Vasconcelos.
Em 1914, ao vencer
os JuegosFlorales de Santiago, com seus Sonetos de La
Muerte, a então Lucila Godoy passou a utilizar o pseudônimo de Gabriela
Mistral, em referência a seus poetas preferidos: o italiano Gabriele D’Annunzio
e o provençal Fréderic Mistral.
Em 1945, quando
fazia parte do corpo diplomático chileno, Gabriela residiu na cidade de
Petrópolis, no Rio de Janeiro e nessa época recebeu a notícia de que tinha sido
escolhida para receber o Prêmio Nobel de Literatura, passando a ser a a
primeira escritora latino-americana a receber tal prêmio. Ela passou a ter um
destaque internacional e começou a viajar para diversos lugares do mundo e também
passou a representar o Chile em comissões culturais das Nações Unidas. Ela
deixou as atividades de ensino para se dedicar a cargos diplomáticos na Europa.
Era muito respeitada por sua honestidade moral e intelectual, imbuída de um
profundo sentimento religioso. Teve sua poesia influenciada pelo trágico
suicídio de seu noivo em 1907. Essa marca levou a sua poesia a ter
características de um forte carinho maternal, como em seus poemas relacionados
às crianças. Na sua poesia encontram-se elementos como o amor pelos humildes e
um interesse pela Humanidade.
Gabriela veio a
falecer em 10 de janeiro de 1957 em Hempstead, Estado de Nova Iorque, nos
Estados Unidos.
Entre as obras mais
significativas de Gabriela Mistral podem ser citadas:
Sonetos de laMuerte, 1914; Desolación,
1922; Lecturas para Mujeres, 1923; Ternura, 1924; Nubes Blancas
y Breve Descripción de Chile, 1934; Tala, 1938; Antología,
1941; Lagar, 1954; Recados Contando a Chile, 1957
Segundo a
professora Dilva Frazão:
“(...) Gabriela Mistral, pseudônimo literário de Lucila de Maria del
Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga, nasceu em Vicuña, no Norte do Chile,
no dia 7 de abril de 1889. Era filha de um professor, descendente de espanhóis
e índios. Desde cedo, demonstrou um interesse duplo: tanto pela escrita como
pela docência.
Com 16 anos decidiu se dedicar à carreira de professora. Quando estava
com 18 anos, seu namorado se suicidou, fato que marcou sua obra e sua vida.
Em 1914, quando tinha 25 anos, ganhou um concurso de poesia nos Juegos
Florais de Santiago, com “Sonetos de La Muerte” – começava a nascer “Gabriela
Mistral”, nome criado em homenagem aos poetas que admirava o italiano Gabriele
D’Annunzio e o francês Frédéric Mistral.
Em 1922, publicou seu primeiro livro de poesias, “Desolación”, onde
incluiu o poema “Dolor”, no qual fala do suicídio de seu namorado.
Gabriela Mistral trabalhou como professora de escola secundária e como
diretora. Ainda em 1922, foi convidada para trabalhar no Ministério da Educação
do México.
Logo, Gabriela se tornaria uma referência na pedagogia – elaborou as
bases do sistema educacional do México, fundou escolas e organizou várias
bibliotecas públicas.
A notoriedade a obrigou a abandonar o ensino e a desempenhar diversos
cargos diplomáticos na Europa, Estados Unidos e América Latina. Em 1926 foi
nomeada secretária do Instituto de Coperación Intelectual de la Sociedade de
Naciones.
Paralelamente foi redatora da revista de Bogotá “El Tiempo”. Representou
o Chile em um Congresso universitário em Madri e pronunciou uma série de
conferências sobre o desenvolvimento cultural norte-americano, nos Estados
Unidos.
Gabriela Mistral foi nomeada Consulesa do Chile e representou seu país
em Nápoles, Madri, Lisboa e no Rio de Janeiro. Nos anos 30 e 40, ela era
considerada um ícone da literatura latino-americana (...)”
Também a mesma autora sobre Gabriela:
“(...) Logo que chegou ao Brasil, fez amizade com Cecília Meireles –
lançaram um livro de poemas juntas. Fez amizades literárias com Manuel
Bandeira, Jorge de Lima, Assis Chateaubriand e seu predileto, Vinícius de
Moraes. Conheceu Mário de Andrade através de Cecília. Nessa época, escreveu
para o Jornal do Brasil.
A poesia de Gabriela Mistral é única, mística e repleta de imagens
singulares e de lirismo. Seus temas centrais são o amor pelos humildes,
memórias pessoais dolorosas, as mágoas e um interesse mais amplo por toda a
humanidade (...)”
Alguns poemas de Gabriela Mistral:
Eu Não Sinto a Solidão.
É noite desampara
Das montanhas ao oceano
Porém eu, a que te embala,
Eu não sinto a solidão.
É todo o céu desamparo,
mergulha a lua nas ondas,
Porém eu, a que te embala,
eu não sinto a solidão
É o mundo desamparo,
Triste a carne em abandono,
Porém eu, a que te embala,
Eu não sinto a solidão.
A oração da mestra
Senhor! Tu que ensinaste, perdoa que eu ensine; que leve o
nome de mestra, que Tu levaste pela Terra.
Dá-me o amor único de minha escola; que nem a queimadura da
beleza seja capaz de roubar-lhe minha ternura de todos os instantes.
Mestre, faz-me perdurável o fervor e passageiro o desencanto.
Arranca de mim este impuro desejo de justiça que ainda me perturba, a
mesquinha insinuação de protesto que sobe de mim quando me ferem.
Não me doa a incompreensão nem me entristeça o esquecimento das que ensine.
Dá-me o ser mais mãe que as mães, para poder amar e defender
como elas o que não é carne de minha carne. Dá-me que alcance
a fazer de uma de minhas crianças meu verso perfeito e a deixar-lhe
cravada minha mais penetrante melodia, para quando meus lábios não cantem mais.
Mostra-me possível teu Evangelho em meu tempo, para que não
renuncie à batalha de cada dia e de cada hora por ele.
Põe em minha escola democrática o resplendor que se discernia sobre
tua roda de meninos descalços.
Faz-me forte, ainda em meu desvalimento de mulher, e de mulher pobre;
faz-me desprezadora de todo poder que não seja puro, de toda pressão
que não seja a de tua vontade ardente sobre minha vida.
Ausência
Se
vai de ti meu corpo gota a gota.
Se vai minha cara no óleo surdo;
Se vão minhas mãos em mercúrio solto;
Se vão meus pés em dois tempos de pó.
Se vai minha voz, que te fazia sino
fechada a quanto não somos nós.
Se vão meus gestos, que se enovelam,
em lanças, diante de teus olhos.
E se te vai o olhar que entrega,
quando te olha, o zimbro e o olmo.
Vou-me de ti com teus mesmos alentos:
como umidade de teu corpo evaporo.
Vou-me de ti com vigília e com sono,
e em tua recordação mais fiel já me borro.
e em tua memória volto como esses
que não nasceram nem em planos nem em bosques
Sangue seria e me fosse nas palmas
de teu trabalho e em tua boca de sumo.
Tua entranha fosse e seria queimada
em marchas tuas que nunca mais ouço,
e em tua paixão que retumba na noite,
como demência de mares sós.
Se nos vai tudo, se nos vai tudo!
Desolação
A bruma espessa, eterna, para que esqueça de onde
Há-me jogado ao mar em sua onda de salmoura.
A terra a que vim não tem primavera:
tem sua noite longa a qual mãe me esconde.
O vento faz à minha casa sua ronda de soluços
e de alarido, e quebra, como um cristal, meu grito.
E na planície branca, de horizonte infinito,
vejo morrer intensos poentes dolorosos.
A quem poderá chamar a que até aqui há vindo
se mais longe que ela só foram os mortos?
Tão sós eles contemplam um mar calado e rígido
crescer entre seus braços e os braços queridos!
Os barcos cujas velas branqueiam no porto
vem de terras onde não estão os que são meus;
e trazem frutos pálidos, sem à luz de meus hortos,
seus homens de olhos claros não conhecem meus rios.
E a interrogação que sobe a minha garganta
ao olhar-los passar, me descendem, vencida:
falam estranhas línguas e não a comovida
língua que em terras de ouro minha velha mãe canta.
Vejo cair a neve como o pó na sepultura,
Vejo crescer a névoa como o agonizante,
e por não enlouquecer não encontro os instantes,
porque a "noite longa" agora tão só começa.
Vejo o plano extasiado e recolho seu luto,
que vim para ver as paisagens mortais.
A neve é o semblante que aparece a meus cristais;
sempre será sua altura abaixando dos céus!
Sempre ela, silenciosa, como a grande olhada
de Deus sobre mim; sempre sua flor de laranjeira sobre minha casa;
sempre, como o destino que nem mingua nem passa,
descenderá a cubrir-me, terrível e extasiada.
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de
História
Figura
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