Tenho acompanhado com certa preocupação
a questão que o governo da Venezuela tem levantado sobre a região de Essequibo,
reivindicando a anexação da área incorporando-a ao território venezuelano. A
região mencionada corresponde a cerca de 70% do território da Guiana e é rica
em petróleo. A reivindicação do governo Maduro acontece no contexto da
descoberta de petróleo por parte da empresa Exxon Mobil dos Estados
Unidos, no oceano Atlântico, em águas guianenses. A Guiana ainda importa
da Venezuela o petróleo que precisa.
A origem do nome do rio Essequibo vem
do sobrenome do oficial espanhol Juan de Esquivel que era subordinado a
Diego Colón, no século XVI. A grafia do termo foi mudando por causa de mudanças
fonéticas derivadas da pronúncia indígena e europeia.
Segundo o diplomata Celso
Amorim, ex-chanceler do Brasil e conselheiro do presidente da República,
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para assuntos internacionais, este desejo da
Venezuela de anexar a região de Essequibo representa um risco de conflito
militar.
Houve recentemente um referendo sobre a
questão de Essequibo e, segundo o governo venezuelano, grande parte da
população venezuelana demonstrou apoio à anexação da área. Para Amorim, ainda
que não exista a possibilidade imediata de intervenção militar venezuelana, ele
não duvida totalmente de que possa haver. Ele disse: “Essas coisas às
vezes saem do controle”. Um grande receio de Amorim é de que um
conflito armado na região possa levar à entrada de tropas estrangeiras no norte
da América do Sul. Para ele, até a oposição venezuelana poderá também utilizar
a questão de Essequibo em seus discurso político: “A oposição apoia e pode
tornar essa reivindicação irreversível. Isso é uma reivindicação histórica da
Venezuela. Não vou entrar no mérito, mas está lá dormente. Até no período do
Chávez ficou dormente. O Chávez fez até a Petrocaribe. A Guiana participava da
Petrocaribe. Por que isso está sendo ressuscitado dessa forma agora é uma
matéria de interpretação, mas eu acho perigoso — observa.”
A parte da população venezuelana que
participou da consulta popular apoiou as propostas do governo de
Nicolás Maduro, entre elas a criação do Estado de Guiana Essequiba, que seria
então uma nova unidade territorial venezuelana e seus habitantes receberiam a
cidadania venezuelana. Do lado da Guiana, o seu governo considera ilegal
o plano venezuelano de anexação de Essequibo.
Características da
Guiana Essequiba ou Território Essequibo (também com o nome de Zona em Disputa
na Venezuela):
É um território do
Planalto das Guianas, entre o rio Cuvani e o rio Essequibo, com extensão
territorial de 159.500 km², fazendo parte integrante da República Cooperativa
da Guiana, porém havendo pela Venezuela a contestação por meio do Acordo de
Genebra de 17 de fevereiro de 1966.
A região de Essequibo
possui, além do petróleo, recursos como ouro, bauxita, urânio e também um
significativo potencial hidrelétrico.
História da
disputa:
No século XIX os
ingleses compraram a região de Essequibo, que estava sob controle holandês.
Esse território, junto às colônias britânicas de Berbice e Demarara, formou a
Guiana Inglesa. O naturalista Robert Schomburgk realizou expedições para o
Reino Unido nesse século para estabelecer fronteiras. Surgiu então a Linha
Schomburgk. Essa linha fronteiriça foi contestada por Brasil e Venezuela. Com o
Brasil, houve a Questão do Pirara. O negociador diplomático
brasileiro foi Joaquim Nabuco. Da área em disputa, após arbitragem
internacional, a maioria territorial (59%)l ficou com a Coroa Inglesa e o
Brasil com 41%. Nabuco ficou muito desapontado com a decisão.
Enquanto os ingleses
diziam que a região era mesma sua, a Venezuela este país considerava Essequibo
como região sua, por ter sido uma área de atuação de missões espanholas no
tempo que a Venezuela fazia parte do Império Colonial da Espanha. Quando ouro foi
descoberto na região, colonos britânicos começaram a explorar e uma companhia
mineradora foi criada. A Venezuela protestou e pediu uma arbitragem
internacional para resolver a questão, porém a Inglaterra só aceitou essa
proposta quando os Estados Unidos passaram a apoiar a reivindicação da
Venezuela, que em 1897 tinha rompido relações com a Inglaterra.
Os Estados Unidos
convocaram um tribunal internacional para decidir a questão, apoiados na
Doutrina Monroe (“América para os americanos”), concordando com a posição
venezuelana, considerando que a Inglaterra estava se intrometendo numa questão
americana . Assim, por dois anos e meio um tribunal se reuniu em Paris para
fazer uma análise . Eram cinco juristas (um dos Estados Unidos, um da
Venezuela, dois ingleses e um russo). Dessas reuniões surgiu o Laudo de
Paris. Foi definido em 1899 que a maior parte do território disputado seria
inglês ( a área entre os rios Essequibo e Cuyuni) e uma parte menor (a oeste do
rio Cuyuni) seria venezuelano. Os dois lados concordaram com o acordo em 1905.
Em 1962 o governo
venezuelano contestou o que foi decidido pelo Laudo de Paris. Nesse
ano os governantes venezuelanos lançaram dúvida sobre a posição que tinha sido
adotada nas reuniões de Paris pelo diplomata russo, pois ele tinha estudado em
uma universidade inglesa. Também questionou-se o número de representantes
ingleses nas reuniões. Eram dois. Enquanto a Venezuela tinha um. O outro
americano era dos Estados Unidos.
Na ocasião da contestação venezuelana
em 1962, é de ressaltar o apoio da Inglaterra e dos Estados Unidos ao governo
venezuelano, considerando-se aí o contexto ideológico, pois a Guiana Inglesa
estava próxima de se separar da Inglaterra e as principais lideranças da Guiana
eram adeptas do socialismo leninista. Era a época da Guerra Fria e os Estados
Unidos receavam a existência de mais países socialistas na América,
principalmente após a revolução cubana, vitoriosa em 1959, que depois seguiu os
rumos do socialismo e aproximou-se da União Soviética. Então, nesse contexto,
houve a assinatura do Acordo de Genebra, surgindo uma Comissão Mista para se
voltar às negociações. O Governo venezuelano passou a dizer que a região do
Essequibo era parte da Venezuela.
O Brasil nos anos 70 era governado por
militares de direita. O governo brasileiro militarizou sua fronteira com a
República da Guiana, que tinha um governo de esquerda. O governo da
Guiana, percebendo a situação, procurou uma aproximação com o governo
venezuelano. Mesmo quando a Guiana passou a ter um governo de direita, a
Venezuela não deixou de contestar e se opôs à construção de uma hidrelétrica
pela Guiana na região do Essequibo. Os dois países passaram a considerar a
Questão de Essequibo como questão de segurança nacional.
A ONU na década de 80 passou a interferir
na disputa e relações amistosas entre Venezuela e Guiana foram estabelecidas,
havendo colaboração entre os países, como a integração elétrica e a aliança
militar contra o tráfico de drogas. O governo Hugo Chavez aumentou essa
aproximação, perdoando a dívida da Guiana com a Venezuela.
Mudança de posição da
Venezuela
O governo Maduro vem tendo outro
posicionamento e passou a reclamar Essequibo como parte da Venezuela. Há de se
considerar a descoberta de petróleo pela empresa multinacional Exxon Mobil no ano
de 2015 em águas guianenses no oceano Atlântico. Esta descoberta pode
levar ao fim da dependência da Guiana em relação ao petróleo venezuelano e pode
também transformar a Guiana em concorrente exportador de petróleo na América do
Sul, o que não seria desejável pelo governo atual da Venezuela.. Além disso,
Maduro pode não estar vendo com bons olhos a influência dos Estados Unidos na
Guiana. Por fim, é preciso considerar a própria política interna da Venezuela,
com eleições marcadas para o ano que vem e Maduro pode estar usando a questão
de Essequibo como um artifício político a seu favor , apelando para o
nacionalismo venezuelano para conseguir mais apoio do povo.
Um conflito militar no norte da América
do Sul seria algo péssimo. Além de mortes e destruição que acontecem em
guerras, milhares de refugiados poderiam procurar ajuda nos países próximos à
Guiana, causando uma situação social muito grave. Também existe a possibilidade
de envolvimento internacional, pois a Guiana tem apoio dos Estados Unidos e a Venezuela
tem se aproximado muito da Rússia, que inclusive já forneceu em anos anteriores
equipamento militar às forças armadas venezuelanas. Espera-se que a diplomacia
evite uma guerra, talvez com a Guiana oferecendo alguma compensação à
Venezuela, sem no entanto ceder Essequibo. O governo brasileiro já se ofereceu
como mediador e defende uma solução pacífica para a questão.
Segundo a Folha de São Paulo em 07 de dezembro de 2023:
“(...) Na terça (5), Maduro apresentou o que considera o novo mapa de seu país, amputando 70% do território do país vizinho, anunciou concessões petrolíferas em terras que não tem e nomeou um general para assumir um posto fronteiriço como "única autoridade" da região.
No processo, todo ele ao arrepio da lei internacional, esqueceu de falar
sobre os moradores de Essequibo, cerca de 120 mil pessoas, e reservou os apupos
de praxe contra os Estados Unidos, apontados como potência colonial porque a
americana Exxon Mobil explora desde 2019 os campos de petróleo da região
disputada desde o século 19.
Com tudo isso, Maduro tenta mascarar
o fato de que apenas 50,7% dos 20,7 milhões aptos a votar no plebiscito do
domingo (3) apareceram, isso segundo o governo. A oposição aponta que o número
pode ser bem menor (...)”
_______________________________________
Márcio José Matos Rodrigues-Professor
de História
Figura:
https://www.google.com/search?q=imagem+de+regi%C3%A3o+de+essequibo&client=firefox-b-d&sca_esv=
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