sábado, 7 de novembro de 2020

Aniversariante de Novembro: A escritora Cecília Meireles

 





No dia 7 de novembro de 1901, na cidade do Rio de Janeiro, nasceu a jornalista, poeta, pintora, escritora e professora Cecília Benevides de Carvalho Meireles. Seu pai era o funcionário do Banco do Brasil Carlos Alberto de Carvalho Meireles e sua mãe Mathilde Benevides Meireles, professora da rede pública de ensino fundamental (na época era chamado ensino primário). Ambos eram portugueses dos Açores. Considerada por muitos como a melhor poeta do Brasil e um dos grandes nomes da poesia na língua portuguesa.

Seu estilo como poeta foi em grande parte neossimbolista. Houve forte influência da psicanálise em obras suas de caráter intimista e com foco em aspectos sociais. Suas poesias estavam muito voltadas para o tempo efêmero e vida contemplativa. Ela é conhecida pelo vanguardismo nacionalista, na segunda fase do modernismo brasileiro, entre os poetas consolidadores da “Poesia de 30”. Como jornalista escreveu muito sobre a educação e também sobre viagens que fez ao exterior. Era uma defensora de reformas educacionais e da construção de bibliotecas infantis.

Seu pai morreu três meses antes do nascimento de Cecília e quando tinha três anos de idade, ela perdeu sua mãe, passando a morar com sua avó materna, Jacinta Benevides, natural dos Açores, arquipélago de Portugal, e que era viúva. Ao concluir o ensino fundamental em 1910  Cecília recebeu do poeta Olavo Bilac uma medalha de ouro pelo seu excelente desempenho nos estudos. Ela naquela época  já demonstrava gostar muito de ler e tinha começado a escrever seus primeiros versos, como também começava a estudar canto, violão e violino no Conservatório Nacional de Música. Mas depois preferiu se dedicar exclusivamente à literatura.  Como sua avó não a deixava brincar fora de casa com outras crianças, ela habituou-se a dois pontos, que, segundo ela dizia, a influenciaram como escritora: "a solidão e o silêncio".

Formou-se em 1917, aos dezesseis anos de idade na Escola Normal do Distrito Federal (Rio de Janeiro). Um de seus professores foi o poeta Osório Duque Estrada. Foi a oradora de seu grupo de formatura. Depois de sua formatura começou a lecionar em 1918. Em outubro de 1922 casou-se com o pintor,  ilustrador e desenhista português Fernando Correia Dias e com ele teve três filhas. Por meio do marido pôde ter contato com o movimento poético português do início do século XX. As dificuldades financeiras afetavam muito o casal. Nesse tempo Cecília passou a escrever sobre educação no jornal Diário de Notícias. Também ela colaborava com a revista luso-brasileira Atlântico. Ela se mostrou interessada com a qualidade de ensino e preocupada com a falta de livros didáticos e então escreveu livros para escolas primárias, tendo publicado em 1924 o livro infantil Criança, Meu Amor, voltado para o ensino fundamental. O livro foi adotado na cidade do Rio de Janeiro, em Minas Gerais e Pernambuco.

Seu primeiro livro de poemas Espectros, foi publicado em 1919, quando tinha 18 anos, com temas históricos, lendários, mitológicos e religiosos.

Em fevereiro e março de 1923  publicou  Nunca mais... E Poema dos Poemas, com vinte e um poemas e seis sonetos, que tinha  caráter simbolista e com ilustrações de seu marido. Em 1925 publicou poemas que tinha escrito em 1922 no livro Baladas para El-Rei, também com ilustrações de seu marido.

Em 1930 defendeu a tese "O Espírito Vitorioso” na primeira etapa de um concurso promovido pela Escola Normal para a vaga de professor catedrático. Na tese defendia “a escola moderna”, com destaque para os seguintes pontos: liberdade, inteligência, estímulo à observação e à experimentação. Foi aprovada para a segunda fase, mas na prova prática perdeu a vaga para um concorrente. No início dos anos 30 Cecília publica várias obras e traduções, faz pesquisas históricas e visita países como Argentina, Bélgica, Holanda, Estados Unidos, Israel, Índia e tem obras suas traduzidas para idiomas como o alemão, espanhol, inglês, italiano etc.  Em 1934, ela funda a primeira Biblioteca Infantil do Brasil, no bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro. Lecionou Literatura Luso-Brasileira e  Técnica e Crítica Literária de 1935 a 1938 na Universidade do Distrito Federal. Nos Estados Unidos, em 1940, deu curso de literatura e cultura brasileira na Universidade do Texas, em Austin. Nos anos 40 viajou pela México, Chile, Uruguai e Argentina. Em 1951 esteve na França, Bélgica, Holanda e nos Açores. No mesmo ano se aposenta do cargo de diretora da Prefeitura do Distrito Federal. Em 1953, à convite do governo da Índia, participa de um congresso sobre Gandhi em Goa e na capital indiana recebeu o título de Doctor honoris causa por suas traduções do poeta, romancista, músico e dramaturgo Tagore. Esteve novamente na Europa em 1954 e em 1958 visitou Israel.

Cecília teve problemas com a política da época. Ela fazia críticas a Getúlio Vargas, a quem chamava de “O Ditador”. Em 1937 autoridades mandaram fechar a biblioteca que ela tinha fundado por motivo de denúncias de que existiriam lá obras suspeitas. A razão principal foi a presença da obra As Aventuras de Tom Sawyer, do escritor Mark Twain, dos Estados Unidos.

Seu marido Fernando Correia Dias sofria de depressão e suicidou-se em 1935. Cinco anos depois da morte do primeiro marido, casou-se  com o engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira Grilo .

Cecília foi uma estudiosa, tendo aprendido várias línguas como inglês, francês, italiano, russo, hebraico e dialetos do grupo indo-iraniano. Traduziu para o português obras de Tagore, Charles Dickens, François Perroux, Alexandre Pushkin, Rainer Maria Rilke, Virginia Woolf, Garcia Lorca a antologias de poesia hebraica e chinesa.

 A partir de 1962 começa a sofrer de um câncer no estômago e vem a falecer em 9 de novembro de 1964, aos 63 anos, na cidade do Rio de Janeiro.

Estas são algumas das obras de Cecília Meireles que foram publicadas

  • Espectros, 1919
  • Criança, meu amor, 1923
  • Nunca mais, 1923
  • Poema dos Poemas, 1923
  • Baladas para El-Rei, 1925
  • O Espírito Vitorioso, 1929
  • Saudação à menina de Portugal, 1930
  • Batuque, samba e Macumba, 1933
  • A Festa das Letras, 1937
  • Viagem, 1939
  • Olhinhos de Gato,1940
  • Vaga Música, 1942
  • Poetas Novos de Portugal, 1944
  • Mar Absoluto, 1945
  • Rute e Alberto, 1945
  • Rui — Pequena História de uma Grande Vida, 1948
  • Retrato Natural, 1949
  • Problemas de Literatura Infantil, 1950
  • Amor em Leonoreta, 1952
  • Doze Noturnos de Holanda e o Aeronauta, 1952
  • Romanceiro da Inconfidência, 1953
  • Poemas Escritos na Índia, 1953
  • Batuque, 1953
  • Pequeno Oratório de Santa Clara, 1955
  • Pistoia, Cemitério Militar Brasileiro, 1955
  • Panorama Folclórico de Açores, 1955
  • Canções, 1956
  • Giroflê, Giroflá, 1956
  • Romance de Santa Cecília, 1957
  • A Bíblia na Literatura Brasileira, 1957
  • A Rosa, 1957
  • Obra Poética,1958
  • Metal Rosicler, 1960
  • Poemas de Israel, 1963
  • Antologia Poética, 1963
  • Solombra, 1963
  • Ou Isto ou Aquilo , 1964
  • Escolha o Seu Sonho, 1964

Há uma obra de Cecília Meireles menos conhecida que é um livro infanto-juvenil chamado Olhinhos de Gato (acima na lista). Essa obra tomou como base a vida da autora, contando sua infância depois que perdeu a mãe e como foi criada pela avó.

O compositor Raimundo Fagner gravou músicas tendo poemas de Cecília Meireles como base.

A escritora recebeu diversas homenagens como o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras em 1938 por sua obra Viagem; o Prêmio de Tradução de Obras Teatrais (1962); o Prêmio Jabuti de Tradução de Obra Literária pelo livro Poesia de Israel (1963); o Prêmio Jabuti de Poesia em 1964, pelo livro Solombra etc.

A escola básica da freguesia de Fajã de Cima, nos Açores, tem o nome de Cecília Meireles. Na província de Valparaíso, no Chile, foi fundada em 1964 a “Biblioteca Cecília Meireles”.

No tempo dos cruzados novos a efígie de Cecília Meireles estava na nota de cem cruzados novos, que foi lançada em 1989.

 

Abaixo algumas poesias de Cecília Meireles:

 

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
— Em que espelho ficou perdida
a minha face?

Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

Nadador

O que me encanta é a linha alada
das tuas espáduas, e a curva
que descreves, pássaro da água!

É a tua fina, ágil cintura,
e esse adeus da tua garganta
para cemitérios de espuma!

É a despedida, que me encanta,
quando te desprendes ao vento,
fiel à queda, rápida e branda

E apenas por estar prevendo,
longe, na eternidade da água,
sobreviver teu movimento…

 

Pergunto-te onde se acha a minha vida


Pergunto-te onde se acha a minha vida.
Em que dia fui eu. Que hora existiu formada
de uma verdade minha bem possuída

Vão-se as minhas perguntas aos depósitos do nada.

E a quem é que pergunto? Em quem penso, iludida
por esperanças hereditárias? E de cada
pergunta minha vai nascendo a sombra imensa
que envolve a posição dos olhos de quem pensa.

Já não sei mais a diferença
de ti, de mim, da coisa perguntada,
do silêncio da coisa irrespondida.

 

Tumulto

Tempestade... O desgrenhamento
das ramagens... O choro vão 
da água triste, do longo vento, 
vem morrer-me no coração.

A água triste cai como um sonho,
sonho velho que se esqueceu...
( Quando virás, ó meu tristonho
Poeta, ó doce troveiro meu!...)

E minha alma, sem luz nem tenda,
passa errante, na noite má,
à procura de quem me entenda
e de quem me consolará...

 

Algumas frases de Cecília Meireles:

 

"Aprendi com as primaveras a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira".

"Entre mim e mim, há vastidões bastantes para a navegação de meus desejos afligidos"

"Há pessoas que nos falam e nem as escutamos, há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam, mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossas vidas e nos marcam para sempre".

"Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém que não entenda".

"Tenho fases, como a Lua; fases de ser sozinha, fases de ser só sua".

 

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Márcio José Matos Rodrigues

  Figura:  https://www.google.com/search?sxsrf=ALeKk00b17Xu-srlwNPfKSWUueFmrZTGLw:1604808679435&source=univ&tbm=isch&q=imagem+de+cecilia+meireles&sa



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