No dia 7 de novembro de 1901, na cidade
do Rio de Janeiro, nasceu a jornalista, poeta, pintora, escritora e professora
Cecília Benevides de Carvalho Meireles. Seu pai era o funcionário do Banco do
Brasil Carlos Alberto de Carvalho Meireles e sua mãe Mathilde Benevides
Meireles, professora da rede pública de ensino fundamental (na época era
chamado ensino primário). Ambos eram portugueses dos Açores. Considerada por
muitos como a melhor poeta do Brasil e um dos grandes nomes da poesia na língua
portuguesa.
Seu estilo como poeta foi em grande
parte neossimbolista. Houve forte influência da psicanálise em obras suas de
caráter intimista e com foco em aspectos sociais. Suas poesias estavam muito
voltadas para o tempo efêmero e vida contemplativa. Ela é conhecida pelo
vanguardismo nacionalista, na segunda fase do modernismo brasileiro, entre os
poetas consolidadores da “Poesia de 30”. Como jornalista escreveu muito sobre a
educação e também sobre viagens que fez ao exterior. Era uma defensora de
reformas educacionais e da construção de bibliotecas infantis.
Seu pai morreu três meses antes do
nascimento de Cecília e quando tinha três anos de idade, ela perdeu sua mãe,
passando a morar com sua avó materna, Jacinta Benevides, natural dos Açores,
arquipélago de Portugal, e que era viúva. Ao concluir o ensino fundamental em
1910 Cecília recebeu do poeta Olavo Bilac uma medalha de ouro pelo
seu excelente desempenho nos estudos. Ela naquela época já demonstrava
gostar muito de ler e tinha começado a escrever seus primeiros versos, como
também começava a estudar canto, violão e violino no Conservatório Nacional de
Música. Mas depois preferiu se dedicar exclusivamente à
literatura. Como sua avó não a deixava brincar fora de casa com
outras crianças, ela habituou-se a dois pontos, que, segundo ela dizia, a
influenciaram como escritora: "a solidão e o silêncio".
Formou-se em 1917, aos dezesseis anos
de idade na Escola Normal do Distrito Federal (Rio de Janeiro). Um de seus
professores foi o poeta Osório Duque Estrada. Foi a oradora de seu grupo de
formatura. Depois de sua formatura começou a lecionar em 1918. Em outubro de
1922 casou-se com o pintor, ilustrador e desenhista português
Fernando Correia Dias e com ele teve três filhas. Por meio do marido pôde ter
contato com o movimento poético português do início do século XX. As
dificuldades financeiras afetavam muito o casal. Nesse tempo Cecília passou a
escrever sobre educação no jornal Diário de Notícias. Também ela
colaborava com a revista luso-brasileira Atlântico. Ela se mostrou
interessada com a qualidade de ensino e preocupada com a falta de livros
didáticos e então escreveu livros para escolas primárias, tendo publicado em
1924 o livro infantil Criança, Meu Amor, voltado para o ensino fundamental. O
livro foi adotado na cidade do Rio de Janeiro, em Minas Gerais e Pernambuco.
Seu primeiro livro de poemas Espectros,
foi publicado em 1919, quando tinha 18 anos, com temas históricos,
lendários, mitológicos e religiosos.
Em fevereiro e março de
1923 publicou Nunca mais... E Poema dos Poemas,
com vinte e um poemas e seis sonetos, que tinha caráter simbolista e
com ilustrações de seu marido. Em 1925 publicou poemas que tinha escrito em
1922 no livro Baladas para El-Rei, também com ilustrações de seu
marido.
Em 1930 defendeu a tese "O
Espírito Vitorioso” na primeira etapa de um concurso promovido pela Escola
Normal para a vaga de professor catedrático. Na tese defendia “a escola
moderna”, com destaque para os seguintes pontos: liberdade, inteligência,
estímulo à observação e à experimentação. Foi aprovada para a segunda fase, mas
na prova prática perdeu a vaga para um concorrente. No início dos anos 30
Cecília publica várias obras e traduções, faz pesquisas históricas e visita
países como Argentina, Bélgica, Holanda, Estados Unidos, Israel, Índia e tem
obras suas traduzidas para idiomas como o alemão, espanhol, inglês, italiano
etc. Em 1934, ela funda a primeira Biblioteca Infantil do Brasil, no
bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro. Lecionou Literatura Luso-Brasileira
e Técnica e Crítica Literária de 1935 a 1938 na Universidade do
Distrito Federal. Nos Estados Unidos, em 1940, deu curso de literatura e
cultura brasileira na Universidade do Texas, em Austin. Nos anos 40 viajou pela
México, Chile, Uruguai e Argentina. Em 1951 esteve na França, Bélgica, Holanda
e nos Açores. No mesmo ano se aposenta do cargo de diretora da Prefeitura do
Distrito Federal. Em 1953, à convite do governo da Índia, participa de um
congresso sobre Gandhi em Goa e na capital indiana recebeu o título de Doctor
honoris causa por suas traduções do poeta, romancista, músico e
dramaturgo Tagore. Esteve novamente na Europa em 1954 e em 1958 visitou Israel.
Cecília teve problemas com a política
da época. Ela fazia críticas a Getúlio Vargas, a quem chamava de “O Ditador”.
Em 1937 autoridades mandaram fechar a biblioteca que ela tinha fundado por motivo
de denúncias de que existiriam lá obras suspeitas. A razão principal foi a
presença da obra As Aventuras de Tom Sawyer, do escritor Mark
Twain, dos Estados Unidos.
Seu marido Fernando Correia Dias sofria
de depressão e suicidou-se em 1935. Cinco anos depois da morte do primeiro
marido, casou-se com o engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da
Silveira Grilo .
Cecília foi uma estudiosa, tendo
aprendido várias línguas como inglês, francês, italiano, russo, hebraico e
dialetos do grupo indo-iraniano. Traduziu para o português obras de Tagore,
Charles Dickens, François Perroux, Alexandre Pushkin, Rainer Maria Rilke,
Virginia Woolf, Garcia Lorca a antologias de poesia hebraica e chinesa.
A partir de 1962 começa a sofrer
de um câncer no estômago e vem a falecer em 9 de novembro de 1964, aos 63 anos,
na cidade do Rio de Janeiro.
Estas são algumas das obras de Cecília
Meireles que foram publicadas
- Espectros,
1919
- Criança,
meu amor, 1923
- Nunca
mais,
1923
- Poema
dos Poemas,
1923
- Baladas
para El-Rei,
1925
- O
Espírito Vitorioso, 1929
- Saudação
à menina de Portugal, 1930
- Batuque,
samba e Macumba,
1933
- A
Festa das Letras,
1937
- Viagem, 1939
- Olhinhos
de Gato,1940
- Vaga
Música,
1942
- Poetas
Novos de Portugal, 1944
- Mar
Absoluto,
1945
- Rute
e Alberto,
1945
- Rui
— Pequena História de uma Grande Vida, 1948
- Retrato
Natural,
1949
- Problemas
de Literatura Infantil, 1950
- Amor
em Leonoreta,
1952
- Doze
Noturnos de Holanda e o Aeronauta, 1952
- Romanceiro
da Inconfidência, 1953
- Poemas
Escritos na Índia, 1953
- Batuque, 1953
- Pequeno
Oratório de Santa Clara, 1955
- Pistoia,
Cemitério Militar Brasileiro, 1955
- Panorama
Folclórico de Açores, 1955
- Canções, 1956
- Giroflê,
Giroflá,
1956
- Romance
de Santa Cecília,
1957
- A
Bíblia na Literatura Brasileira, 1957
- A
Rosa,
1957
- Obra
Poética,1958
- Metal
Rosicler,
1960
- Poemas
de Israel,
1963
- Antologia
Poética,
1963
- Solombra, 1963
- Ou
Isto ou Aquilo , 1964
- Escolha
o Seu Sonho,
1964
Há uma obra de Cecília Meireles menos
conhecida que é um livro infanto-juvenil chamado Olhinhos de Gato (acima
na lista). Essa obra tomou como base a vida da autora, contando sua infância
depois que perdeu a mãe e como foi criada pela avó.
O compositor Raimundo Fagner gravou
músicas tendo poemas de Cecília Meireles como base.
A escritora recebeu diversas homenagens
como o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras em 1938 por sua
obra Viagem; o Prêmio de Tradução de Obras Teatrais (1962); o
Prêmio Jabuti de Tradução de Obra Literária pelo livro Poesia de Israel (1963);
o Prêmio Jabuti de Poesia em 1964, pelo livro Solombra etc.
A escola básica da freguesia de Fajã de
Cima, nos Açores, tem o nome de Cecília Meireles. Na província de Valparaíso,
no Chile, foi fundada em 1964 a “Biblioteca Cecília Meireles”.
No tempo dos cruzados novos a efígie de
Cecília Meireles estava na nota de cem cruzados novos, que foi lançada em 1989.
Abaixo algumas poesias de Cecília
Meireles:
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
— Em que espelho ficou perdida
a minha face?
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.
Nadador
O que me encanta é a linha alada
das tuas espáduas, e a curva
que descreves, pássaro da água!
É a tua fina, ágil cintura,
e esse adeus da tua garganta
para cemitérios de espuma!
É a despedida, que me encanta,
quando te desprendes ao vento,
fiel à queda, rápida e branda
E apenas por estar prevendo,
longe, na eternidade da água,
sobreviver teu movimento…
Pergunto-te onde se acha a minha vida
Pergunto-te onde se acha a minha vida.
Em que dia fui eu. Que hora existiu formada
de uma verdade minha bem possuída
Vão-se as minhas perguntas aos depósitos do nada.
E a quem é que pergunto? Em quem penso, iludida
por esperanças hereditárias? E de cada
pergunta minha vai nascendo a sombra imensa
que envolve a posição dos olhos de quem pensa.
Já não sei mais a diferença
de ti, de mim, da coisa perguntada,
do silêncio da coisa irrespondida.
Tumulto
Tempestade... O desgrenhamento
das ramagens... O choro vão
da água triste, do longo vento,
vem morrer-me no coração.
A água triste cai como um sonho,
sonho velho que se esqueceu...
( Quando virás, ó meu tristonho
Poeta, ó doce troveiro meu!...)
E minha alma, sem luz nem tenda,
passa errante, na noite má,
à procura de quem me entenda
e de quem me consolará...
Algumas frases de Cecília Meireles:
"Aprendi com
as primaveras a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira".
"Entre mim e
mim, há vastidões bastantes para a navegação de meus desejos afligidos"
"Há pessoas
que nos falam e nem as escutamos, há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes
deixam, mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossas vidas e nos marcam
para sempre".
"Liberdade é
uma palavra que o sonho humano alimenta, não há ninguém que explique e ninguém
que não entenda".
"Tenho fases,
como a Lua; fases de ser sozinha, fases de ser só sua".
________________________________________________
Márcio José Matos Rodrigues
Figura: https://www.google.com/search?sxsrf=ALeKk00b17Xu-srlwNPfKSWUueFmrZTGLw:1604808679435&source=univ&tbm=isch&q=imagem+de+cecilia+meireles&sa
Belo artigo. Maravilhosas poesias.
ResponderExcluir