Em 1859, o comerciante suíço Henri Dunant (um dos dois ganhadores do
Primeiro Nobel da Paz em 1901), testemunhou em sua passagem pelo norte da
Itália as condições terríveis da Batalha de Solferino, entre franceses e
piemonteses de um lado e austríacos de outro, que fez parte de uma série de
combates existentes no século XIX na campanha dos italianos no processo para
unir a Itália. Horrorizado com as atrocidades que viu, Dunant tomou a
iniciativa de organizar junto com outras pessoas (Gustav Moynier, Henri Dufour,
Louis Appia e Theodore Maunoir) uma convenção que não era oficial com o
objetivo de "estudar os meios de combater a insuficiência do serviço
sanitário nos exércitos em campanha". Foi nessa reunião, realizada em
1863,que surgiu o Comitê
Internacional de Socorro aos Feridos(a Cruz Vermelha).
Em 1864, houve a chamada Primeira Convenção de Genebra, uma
convenção diplomática, realizada em Genebra (Suíça), na qual houve a orientação
de que os militares feridos ou doentes deveriam ser respeitados e cuidados sem
discriminação. As ambulâncias e os hospitais passariam a ser protegidos de
ataques, sendo reconhecidos por meio do símbolo da cruz vermelha com fundo
branco. Foi emitido nessa Convenção o documento Convenção de Genebra
para a Melhoria das Condições dos Feridos das Forças Armadas em Campo.Foi
durante a Primeira Guerra Mundial que houve a verdadeira aplicação desse
tratado. Durante a guerra a Cruz Vermelha criou a Agência de Prisioneiros
de Guerra Internacional. Entre seus feitos, a Agência conseguiu que cerca de
200 mil prisioneiros de guerra fossem trocados entre os países participantes da
mesma e os prisioneiros conseguiram voltar aos seus países. Ao fim da guerra a
instituição conseguiu que aproximadamente 420 mil prisioneiros de guerra
voltassem para casa.
Em 1906 houve uma Convenção de Genebra que estendia as obrigações
decididas na Convenção de 1864 às forças navais.
Em 1899 e 1907 houve também as Convenções de Haia, na Holanda, que foram
Conferências de Paz, que trataram a respeito de conduta e os meios da guerra e
sobre resolução pacífica de disputas. Rui Barbosa foi o representante
brasileiro na segunda Convenção, tendo se destacado na defesa do princípio da
igualdade entre Estados. Foi chamado de “Águia de Haia”.
Em 1925 foi adotado um protocolo adicional para a Convenção de Genebra,
proibindo o uso na guerra de gases sufocantes ou venenosos, assim como armas
biológicas.
Em 1929, em uma outra Convenção, em Genebra, houve
novas decisões. O objetivo central era definir como os prisioneiros de guerra
deveriam ser tratados. Foi nessa Convenção que foi reconhecido como prisioneiro
de guerra o combatente que fosse capturado, fosse ele soldado de um exército,
um membro de milícia ou um civil, no estilo, por exemplo, dos resistentes em
uma guerra. Também essa Convenção afirmou que o Comitê internacional da Cruz
Vermelha (CICR) deveria visitar todos os campos de prisioneiros de guerra sem
nenhuma restrição. O referido comitê poderia dialogar, sem testemunhas, com os
prisioneiros. Outra questão nessa Convenção foi a fixação de limites no
tratamento geral de prisioneiros. Dessa forma, passa a haver: a obrigação de um
tratamento humano aos prisioneiros, sendo proibidos atos de tortura, pressão
física ou psicológica; as obrigações sanitárias (na higiene e na alimentação);
a obrigação de se respeitar a religião dos prisioneiros.
Na Segunda Guerra Mundial as regras da Convenção de 1929 não foram todas
as vezes seguidas. Por exemplo, a União Soviética e o Japão não eram
signatários da Convenção e não se sentiam obrigados a obedecer o regulamento
dela. As forças armadas japonesas na época seguiam um código de honra que não
considerava honrosa a rendição. Assim, muitas vezes não houve respeito no
sentido de condições humanitárias aos prisioneiros de guerra. A União Soviética,
no tratamento aos prisioneiros alemães os trataram de forma muitas vezes
desumana, por um lado por não ter o governo soviético assinado o tratado de
1929 e por outro lado por um sentimento de vingança devido ao tratamento dado
pelas forças armadas nazistas aos soldados e à população da União Soviética.
A Alemanha nazista, em certas situações obedeceu ao que dizia a
Convenção de 1929, no tocante a determinados prisioneiros, como os
norte-americanos e britânicos. Porém, em relação aos prisioneiros soviéticos o
tratamento foi extremamente cruel, considerando não ser a União Soviética uma
signatária da Convenção de 1929 e também porque os nazistas possuíam profundo
preconceito em relação aos povos da União Soviética, considerando-os como
racialmente inferiores. As crueldades contra civis na guerra motivou que fosse
feita uma alteração no que tinha sido decidido na Convenção de 1929.
Em 1949, diante dos grandes horrores que aconteceram na Segunda Guerra
Mundial, foram realizadas novas reuniões em Genebra. Foram revisadas as
Convenções anteriores e houve destaque à proteção aos civis em tempo de
guerra. Por essa Convenção ficou decidido que: os civis não podem
ser sequestrados de modo a servir de “escudos humanos”; não deve haver
represálias contra os civis ou seus bens; não deve haver punições coletivas
contra os civis.
Em momentos posteriores foram acrescentados protocolos adicionais:
Em 8 de junho de 1977 foi adotado o Protocolo I pela Conferência
diplomática sobre a reafirmação e desenvolvimento do Direito Internacional
Humanitário aplicável a conflitos armados. O citado protocolo passou a
vigorar em 7 de dezembro de 1979. Segundo esse protocolo, deve haver proteção
às vítimas de conflitos armados internacionais (como os conflitos armados
contra a dominação colonial, ocupação estrangeira ou contra regimes racistas).
Houve países que não quiseram assinar o protocolo. O Segundo Protocolo foi
outro protocolo adotado em 8 de junho de 1977 para vigorar em 1979. Segundo o
mesmo, deve haver proteção das vítimas nos conflitos armados não internacionais
(antes simplesmente chamados de guerras civis). Também houve países que não
assinaram o protocolo.
Embora nem todos os países que fazem parte da ONU não tenham assinado os
protocolos, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, em 1997, fez um apelo de
que determinados artigos dos dois protocolos são reconhecidos como regras do
Direito consuetudinário e, sendo assim, devem ser seguidas por todos os
Estados.
Em 8 de dezembro de 2005, foi adotado o Terceiro Protocolo pela Conferência
Diplomática de 2005. Por esse Protocolo passa a haver um novo emblema
distintivo das Convenções de Genebra: o cristal vermelho (o "emblema do
terceiro protocolo"). Esse emblema é adicional à cruz vermelha e ao
crescente vermelho, símbolos universais de assistência a vítimas de conflitos
armados. O Terceiro Protocolo passou a vigorar em 14 de janeiro de 2007.
Em uma visão atualizada, a partir das Convenções de Genebra e seus
complementos fica determinado que: é proibido o uso de armas químicas por
países em guerra; também não será permitido o uso de balas explosivas ou de
material que cause sofrimento desnecessário nas vítimas; é proibido o
bombardeio de balões com projéteis; em relação aos prisioneiros de guerra, eles
devem ser tratados com humanidade e protegidos da violência, não podendo ser
espancados ou utilizados com interesses propagandistas; o prisioneiro de guerra
deve informar quando capturado o seu nome legítimo e patente; deve haver a
identificação de mortos e feridos pelas nações em guerra e informar os
familiares dessas pessoas; deve ser preservada a vida de quem se rendeu; devem
existir zonas demarcadas nas áreas de batalha para que doentes e feridos possam
ser transferidos e tratados; os hospitais civis com emblema da cruz vermelha não
devem ser atacados; deve haver passagem livre de medicamentos; no caso de
afundamento de navios em guerra os tripulantes tem que ser resgatados
e levados para terra firme em segurança; se um exército ocupar um país é sua
obrigação providenciar alimentos para os habitantes locais; não deve haver
ataques a cidades desprotegidas; no caso de navios comerciais ou de
passageiros, antes do afundamento dos mesmos por submarinos, as pessoas nestes
navios devem ser retiradas; em uma guerra pode haver a visita de um
representante do país de quem estiver preso e os dois têm direito a conversar
reservadamente.
Ficou determinado que se houver violação no caso de nações que
ratificaram as Convenções de Genebra poderá haver um processo por meio da Corte
Internacional de Justiça ou da Corte Penal Internacional.
Segundo o autor Bruno Izaias da Silva:
“Convenção de Genebra é nome dado a um conjunto de Tratados
celebrados em Genebra, na Suíça, que versam sobre Direito Humanitário
Internacional. Seu idealizador foi o filantropo suíço Henri Dunant, como
resposta à necessidade de regulação dos Direitos Humanos em tempos de guerra,
situação presenciada por Dunant durante a Batalha de Solferino, na Itália.”
Para Fábio Konder Comparato sobre a Convenção de Genebra de 1864:
“Ela inaugura o que se convencionou chamar direito
humanitário, em matéria internacional; isto é, o conjunto das leis e
costumes da guerra, visando minorar o sofrimento de soldados doentes e feridos,
bem como de populações civis atingidas por um conflito bélico. É a primeira
introdução dos direitos humanos na esfera internacional. O direito da guerra e
da paz, cuja sistematização foi feita originalmente por Hugo Grócio em sua obra
seminal no início do século XVII (Ius Belli acPacis), passou, desde
então, a bipartir-se em direito preventivo da guerra (ius ad bellum) e direito
da situação ou estado de guerra (ius in bello), destinado a regular as
ações das potências combatentes.
A evolução posterior, no entanto, levou ao reconhecimento da
injuricidade objetiva da guerra como solução de conflitos internacional,
quaisquer que sejam as razões de seu desencadear. O direito contemporâneo, a
partir da Carta de São Francisco, instituidora das Nações Unidas, restringiu
sobremaneira o conceito de guerra justa, elaborado pelos doutores da Igreja na
Idade Média.
Com base nisto, tem-se insistido ultimamente na tese de que o direito do
estado de guerra (ius in bello) já não poderia existir, por ser uma
contradição nos termos: se a guerra constitui em si mesma um ilícito e, mais do
que isso, um crime internacional, não faz sentido regular juridicamente as
operações bélicas – o Direito não pode organizar a prática de um crime.
Tal argumento, impressionante à primeira vista pelo seu aparente rigor
lógico, não é contudo aceitável. Se a guerra, no estado presente do direito
internacional, constitui em si mesma um crime, nada impede que se reconheça a
prática, por qualquer das partes beligerantes, de outros ilícitos durante o
desenrolar do conflito. A violação dos princípios e normas do direito
humanitário, durante uma conflagração armada, pode por conseguintes
representar, ela também, em crime de guerra. No julgamento de 27 de junho de
1986 no caso Nicarágua v. Estados Unidos, de resto, a Corte Internacional de
Justiça reconheceu plena vigência dos “princípios gerais de base do direito
humanitário”.
A Convenção assinada em Genebra em 22 de agosto de 1864, unicamente por
potências europeias, e destinada a “melhorar a sorte dos militares nos
exércitos em campanha”, originou-se dos esforços de uma comissão reunida em
torno do suíço Henry Dunant. Em livro publicado em 1862 e que teve ampla
repercussão (Un Souvenir de Solférino), ele relatou como organizara,
durante a batalha de Solferino de junho de 1859 entre os exércitos austríacos e
franco-piemonteses, os serviços de pronto-socorro para os soldados feridos de
ambos os lados.
A comissão genebrina, que teve na origem da convenção de 1864 foi
revista, a fim de se estenderem seus princípios aos conflitos marítimos
(Convenção de Haia de 1907) e aos prisioneiros de guerra (Convenção de Genebra
de 1929). Em 1925, outra Convenção, igualmente assinada em Genebra, proibiu a
utilização , durante a guerra, de gases asfixiantes ou tóxicos, bem como de
armas bacteriológicas. As convenções sobre soldados feridos e prisioneiros de
guerra foram revistas e consolidadas em três convenções celebradas em Genebra
em 1949, sob os auspícios da Comissão Internacional da Cruz Vermelha. Na mesma
ocasião, foi celebrada uma Quarta convenção, tendo por objetivo a proteção da
população civil em caso de guerra.”
As Convenções de Genebra não resolveram todos os problemas em relação às guerras que acontecem pelo mundo, porém, sem dúvida, representam um avanço no sentido de procurarem estabelecer limites na direção de redução de sofrimentos, de humanizar o tratamento de feridos e a relação com as pessoas capturadas nos conflitos bélicos, tendo sido criada a Cruz Vermelha, hoje em dia com uma atuação mais ampliada e com a elaboração de regras para reduzir os impactos sobre a população civil. O que mais se espera é que as determinações das Convenções sejam mais seguidas por cada vez mais países e grupos em situações de conflitos armados, o que às vezes tem sido difícil em questões complexas, como as que envolvem diversos atores em confronto, havendo várias vezes nestes casos não só a participação de forças armadas regulares (do próprio país e até mesmo de outras nações naquele país) como também milícias, guerrilheiros e até mesmo civis organizados em gangs.
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de
História
Figura:
https://www.google.com/search?q=imagens+de+conven%C3%A7%C3%A3o+de+genebra.&tbm=isch&ved=2ahUKEwjYzKjx14n0AhXpB7kGHWq9DAEQ2-cCegQIABAA&oq=imagens+de+conven%C3%A7%C3%A3o+de+genebra.
Em pensar que um suíço filantropo deu início à cruz vermelha. Kkk sempre que eu ver a cruz vermelha vou lembrar de Henry Dunant.
ResponderExcluirEm tempos de guerra a ideia e a prática da Convenção de Genebra era muito humanitária e admirável. Era como ter um vislumbre de respeito e humanismo.Por que a guerra por si só é um crime .
Apesar de atualmente os protocolos da Cruz Vermelha serem vigorados a partir de uma necessidade gerada no crime que é a guerra, é um tanto cômico, intrigante. Mas,Salve Henry Dunant