No dia primeiro de novembro de 2021,
aos 77 anos, faleceu na cidade do Rio de janeiro o pianista Nelson José Pinto
Freire. Críticos de música consideraram Freire como um dos principais
pianistas de sua geração. Era conhecido por sua "execução decorosa de
piano" e "profundidade interpretativa”. Tinha grande técnica e
uma fantástica sensibilidade para tocar os temas dos maiores compositores
do mundo na área da música erudita, aliando o virtuosismo a uma emoção
concentrada, precisa. Apresentou-se em mais de 70 países. O último
disco dele foi lançado em 2019 pela Decca com o nome de: Encores. Além
da Decca, outras gravadoras que gravaram discos de Freire foram: Sony
Classical, Teldec e Philips. Ganhou prêmios como o Gramophone
Award e o Diapason d’Or. Foi três vezes indicado ao
Grammy. Foi solista em grandes orquestras como a Orquestra Filarmônica de
Berlim, a Orquestra Filarmônica de São Petersburgo, a Royal Concertgebouw Orchestra,
a Orquestra Sinfônica de Londres, a Orquestra de Paris, a Orquestra Nacional de
França, a Filarmônica de Nova York, a Orquestra de Cleveland e a Orquestra
Sinfônica de Montreal.
Ele nasceu em Boa Esperança, Minas
Gerais em 18 de outubro de 1944. Começou a tocar piano aos três anos,
vendo sua irmã estudar o referido instrumento. Aos cinco anos já se apresentava
em seu primeiro recital no Teatro Municipal de São João Del Rei. Nesse
recital Nelson tocou a Sonata para piano em Lá maior, K331, de Mozart.
Para que ele pudesse se aperfeiçoar
como pianista, a família mudou-se para o Rio de Janeiro, tendo ele sido
finalista, aos 12 anos, do Primeiro Concurso Internacional de Piano do Rio
de Janeiro. Ganhou do Presidente Juscelino Kubitschek uma bolsa de
estudos e se mudou para Viena em 1959, sendo aluno do pianista Bruno
Seidlhofer. Com 15 anos, ele já se destacava em concertos. Ele
foi classificado pela revista Time, após uma apresentação em Nova York, quando
tinha 19 anos, como: “um dos maiores pianistas desta ou de qualquer outra
geração”.Conquistou em 1964 o primeiro lugar no Concurso Internacional de
Piano Vianna da Motta em Lisboa e recebeu em Londres as medalhas de ouro
DinuLipatti e Harriet Cohen. Mesmo tendo se tornado famoso, ele permaneceu
humilde e muito dedicado. Era perfeccionista e chamado por outros músicos
talentosos de “Reverendo Nelson”.
Entre seus discos gravados, Freire
gravou músicas de Chopin (aos 12 anos), Schumann, Brahms, Liszt, Grieg,
Tchaikovsky e Villa-Lobos. Gravou obras de Rachmaninoff, Lutoslawski e Ravel
junto com a pianista argentina Martha Argerich. Com a orquestra Sinfônica
Brasileira, sob a regência do maestro Isaac Karabtchevsky Nelson gravou
as Bachianas Brasileiras número 3. Ele se tornou um
grande intérprete de Beethoven e de Chopin. Também fez interpretações da
obra do compositor brasileiro Villa-Lobos e tocava também obras de Mozart. Foi
muito elogiado por sua interpretação do Concerto para Piano e Orquestra
N.º 2 de Chopin, na ocasião dos 150 anos de aniversário da morte do compositor.
Antes de 2001 (quando começou a lançar
grandes discos, como o dedicado à obra de Debussy), ele passou vários anos sem
querer fazer gravações, pois dizia que a música só acontecia ao vivo, com o
público. Em dezembro de 2001, foi presidente do júri do Concurso de Piano
Marguerite Long em Paris.
Foi o único pianista brasileiro, de acordo com informação do Instituto Piano Brasileiro, a ser incluído no projeto Great Pianists of the XXth Century, com uma coleção de 200 CDs que foram lançados pela Phillips. Também lançou álbuns, nos anos 2000, com gravações dos Estudos e Noturnos de Chopin, como tambémseleções de obras de Liszt, Schumann, Beethoven, Bach e Debussy; e dois Concertos de Brahms, gravados com a Orquestra Gewandhaus, de Leipzig, sob regência de Ricardo Chailly, tendo recebido na época por esse álbum o prêmio de melhor disco do ano, pela revista Gramophone, de Londres.
Nelson Freire em 2012 lançou o
álbum Brasileiro, com obras de Villa-Lobos, Camargo Guarnieri,
Lorenzo Fernandez, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Barrozo Netto, Claudio
Santoro e Francisco Mignone. Ganhou nesse ano o prêmio Grammy Latino.
O cineasta João Moreira Salles, em
2003, registrou a trajetória artística de Freire no documentário Nelson Freire,
que mostra a rotina e as turnês mundiais do maior pianista brasileiro na
atualidade. É mostrada a infância, os primeiros acordes e os sacrifícios feitos
pela família. O documentário venceu o Grande Prêmio de
Cinema Brasil 2004 na categoria. João Moreira Salles esteve com Nelson
por dois anos e registrou 70 horas de material gravado.
Foi realizado em 2015 pela Orquestra
Filarmônica de Minas Gerais em Boa Esperança, um concerto ao ar livre
para Nelson Freire, sendo ele o solista. Freire ficou muito emocionado e
resumiu suas emoções em uma palavra: “Indescritível”.
Sobre ser mineiro Freire disse:
“A raiz mineira não te solta. Nem que
queira. Mas a gente não quer. A alma mineira, como dizia Carlos Drummond de Andrade,
é algo para toda vida”
Sobre a morte do pianista, o site da
rádio France Musique, que é especializada em música clássica e
faz parte da rede pública Rádio França, houve o seguinte comentário:
“É um monumento, um monstro sagrado do
piano que nos deixa. Com ele, uma extravagância incomum no teclado se extingue,
misturada com uma rara sensibilidade e expressividade”.
Também o famoso site “SplippedDisc",
sobre música erudita, enalteceu o pianista brasileiro: "luto por um
gigante do piano, aos 77 anos".
O conceituado projeto "Silk
Road Symphony" lamentou no twitter a morte do pianista: "Notícias
muito tristes. Acabamos de saber da morte de Nelson Freire, que fez parte do
nosso conselho musical por mais de 5 anos. Obrigado, Nelson, por todo o apoio
humano e pela maestria artística e musical".
A comunidade da música erudita do
Brasil e de outros países lamentou a morte de Freire. O pianista tinha sofrido
uma queda em 2019 em Copacabana, ficando por um tempo em casa isolado,
recuperando-se. Os seus planos de voltar aos palcos em 2020 foram frustrados
por causa da pandemia.
O maestro e pianista João Carlos
Martins comentou: “Eu considerava o Nelson, talvez hoje, o maior pianista da
atualidade. E, sendo brasileiro, uma honra para o nosso país. O Nelson
dignificou o nome do Brasil em todos os continentes e, ultimamente, eu o
considerava o maior pianista da atualidade”.
A produtora de arte clássica Myrian
Dauelberg fez o seguinte comentário: Passei a tarde toda de ontem com ele, ele
chegou a tocar piano e ainda brincou comigo: 'você sabe muito bem que eu não
vou voltar a tocar piano como tocava antes'. Ele era muito
perfeccionista".
E o pianista Arthur Moreira Lima disse
sobre a morte de Freire: "Uma noticia muito triste. conheço Nelson, que
sempre chamei de nelsinho, porque nos conhecemos crianças ainda com
menos de 10 anos. É muito triste para mim e uma grande perda para todos nós que
gostávamos tanto dele e sobretudo para a musica brasileira , para a cultura
brasileira."
O maestro Isaac Karabtchevsky elogiou
Freire: "Como definir um gênio? Um gênio é exatamente isso. Ele descobria
efeitos, descobria cores, descobria uma qualidade sonora que emanava do texto
musical. Esse era o poder do Nelson".
Ana Flavia Cabral, vice-presidente
executiva da Orquestra Sinfônica Brasileira disse:
"O Nelson Freire começou sua carreira com a Orquestra Sinfônica
Brasileira, venceu o concurso pra solistas em 1956, depois venceu novamente em
1957 deixando uma plateia não só carioca, mas uma plateia mundial, boquiaberta
com o seu talento".
O maestro João Carlos Martins, amigo de
Freire, comentou: "Quando eu perdi minha mão direita, uma madrugada, ele
mandou um whatsapp depois de ouvir um CD meu e, me incentivando, falou
"João Carlos, continue porque sua música é pra poucos.E eu respondi pra
ele: Nelson, a sua diferença entre nós dois é que a sua música é pra
muitos".
Entre os discos gravados por Freire há
álbuns considerados antológicos. Por exemplo: The Nocturnes (2010). E
seis discos anteriores, foram agrupados em 2014 na caixa The Complete
Columbia Album Collection, editada pela Sony Music.
Freire tinha sido convidado para ser
jurado no importante Concurso Chopin de Varsóvia, que se realizou em outubro de
2021, mas ele cancelou antes sua participação. Em 2019 ele se acidentou em uma
caminhada, tendo quebrado um dos ossos do braço direito. Para o
jornal O Globo, em 2001, Freire disse:
“Não ouço nem durante, nem depois meus
discos. Já tem uns cinco anos isso, foi acontecendo aos poucos. Porque se ouço,
fico querendo mudar”, disse o pianista ao jornal O Globo, em
2001.
O velório dele foi realizado no Theatro
Municipal do Rio, que fez um post em homenagem ao músico destacando a
honra de ter tido o pianista no palco. Ele foi enterrado no dia 3 de novembro
de 2021 em Boa Esperança, Minas Gerais, no mesmo túmulo onde seus pais
encontram-se enterrados, no cemitério municipal da cidade.
Sugestão de vídeos para assistir:
Pianista
Nelson Freire realiza concerto nas comemorações dos 90 anos da UFMG
https://www.youtube.com/watch?v=wVoJO7VLTsI
NELSON FREIRE CHOPIN CONCERTO NO 2 PROMS 'LIVE' 2010
https://www.youtube.com/watch?v=ktertRR5iZs
Nelson Freire plays Beethoven Moonlight Sonata (Complete)
https://www.youtube.com/watch?v=eFIe8xoS1jI
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor
de História
Músicas eruditas são fenomenais, conseguem tocar a alma e despertar a essência, a beleza ❣🥂🥂
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