segunda-feira, 29 de novembro de 2021

História do milho

 




O meu último artigo de novembro de 2021 é sobre o milho. O milho é um cereal que é cultivado em muitos lugares do mundo e pode ser usado como alimento para os seres humanos ou como ração para animais. Pertence ao grupo dos angiospermas (que produz as sementes no fruto). Antes se pensava que o milho tinha como antecessor o teosinto. Mas os cientistas Magelsdort e Reeves fizeram estudos e apresentaram provas de que o teosinto é resultado de uma hibridação do milho.

Sobre a origem do milho, surgiu provavelmente no México, pois a domesticação do milho começou há milhares de anos, entre 7500 a 12.000 anos atrás na parte central do México. A origem da palavra milho vem do latim vulgar milium, originando-se o termo no numeral mil, por causa da considerável quantidade de grãos em uma espiga. Na língua castelhana é chamado mijo e na língua portuguesa foi chamado de milhete ou painço.  Também para o milho há o termo maís que se originou na língua dos Tainos da ilha de Hispaniola, o que levou ao termo em língua portuguesa maisena, que vem do milho. No século XVIII o milho tinha as denominações milho zaburromilho grandemilho graúdomilho maísmilhãomilho grosso e milho de maçaroca. No Brasil os indígenas de língua tupi chamavam o milho como avatiauatiabati etc.

O milho em estado puro ou como ingrediente de outros produtos destaca-se como fonte energética, sua casca é rica em fibras e o grão possui carboidratos, proteínas e vitaminas do complexo B. Possui também quantidades consideráveis de açúcares e gorduras. Hoje em dia há muita mecanização no cultivo do milho. Ele tem um alto potencial produtivo, tendo tido uma produção mundial de 817 milhões de toneladas em 2009. Os Estados Unidos são atualmente o maior produtor do mundo, com quase 50% da produção mundial. Também se destacam como grandes produtores: A China, a Índia, o Brasil, a França, a Indonésia e a África do Sul.

A estudiosa Mary Poll, em uma publicação na revista Proceedings of the National Academy of Scienes, disse que datam de há 7300 anos os primeiros registros do cultivo do milho, encontrados em ilhas pequenas no litoral do México. Na caverna Guila Naquitz, no Vale de Oaxaca, foram encontrados vestígios arqueológicos de milho, por volta de 6250 anos atrás. O nome de origem indígena caribenha queria dizer “sustento da vida”. Civilizações importantes da América como Olmecas, Maias, Astecas e Incas utilizaram o milho como alimento básico. Tais povos faziam homenagem ao milho em suas artes e religiões.  Para Astecas, Toltecas e Maias foi o deus Quetzalcóatl que originou os homens e o milho para alimentá-los. Determinadas variedades selvagens de milho foram transformadas progressivamente em plantas cultivadas devido a processos de mutação e seleção natural em conjunto com os indígenas americanos.

Segundo Scheryem Plantas úteis para o homem: “(...) As autoridades não estão de acordo quanto ao lugar de origem do milho, no entanto a maioria coincidem em que se estende desde o centro dos Andes, no noroeste da América do Sul, e por acaso (mais tarde), desde o outro centro, ao norte da América Central e México. Há outra teoria sobre a possibilidade de que o milho possa ter cruzado o Pacífico tropical, desde a área de Burma, com os navegadores, para começar a sua carreira espetacular desde a costa Peruana. É possível que nunca saibamos como foram os verdadeiros começos desta importante gramínea, mas desde os tempos históricos que a vemos progredir rapidamente até aos nossos dias, em que o mundo depende de muitos milhões de toneladas de um cereal que não pode existir sem ser cultivado.»

Os indígenas americanos plantavam milho em montes por meio de um sistema complexo. De início havia uma variação de espécies de milho, mas depois passou a ser plantada uma única espécie. A partir da chegada dos europeus no final do século XV, omilho passou a ser plantado em outros locais fora da América. Na América do Sul ainda há muito plantio no sistema tradicional chamado no Brasil de roça. No Brasil o consumo do milho é significativo, porém é menor que o que existe no México e em países caribenhos.

Povos indígenas da América criaram lendas sobre como o milho passou a fazer ser um alimento para eles. Para povos mexicanos antigos antes da época atual houve quatro épocas anteriores. Segundo essas crenças, o fim da cada uma dessas quatro era marcado por cataclismas. Quando começava uma nova época havia uma evolução dos seres vivos, comparando-se a época anterior. O deus Quetzalcóatl, ajudado por larvas e abelhas, conseguiu roubar os ossos de gerações passadas que estavam na Terra dos Mortos, que era vigiada por Mictlantecuhtli, o Senhor dos Mortos. Quetzalcóatl então teria sido ajudado pela deusa da fertilidade chamada Quilaztli, moendo os ossos, colocando-os numa taça e cobrindo-os com o sangramento de partes de seu corpo. Surgem assim Oxomoco e Cipactónal, que seriam o Adão e a Eva para esses povos americanos. Era preciso haver um bom alimento para eles. E foi assim que a formiga negra, conhecedora da existência do milho, ajudou Quetzalcóatl a encontra-lo.

Povos antigos do México consumiam o Atolli (espécie de mingau) que era feito principalmente de milho. Havia o xocoatolli, um mingau de milho que era alimento do povo Quaquata, do México.  Era feito com milho vermelho da região. Quando os europeus chegaram na América, o milho era cultivado em uma extensão da América do Norte até a América do Sul. Os nativos da América do Norte e os dos Andes utilizavam o milho como cereal. Os indígenas que viviam em áreas de florestas usavam o milho para consumo imediato. Era o milho verde que era cozido ou assado. Havia também em áreas da América do Sul e Antilhas a farinha de milho e a bebida fermentada chicha . Milho era para muitos povos americanos associado à vida. Além de ser comido por diversos desses povos cozido e assado, também era moído, fazendo-se bolos e pães, assim como o milho foi usado para fazer pipoca.

Entre os usos do milho por indígenas brasileiros, pode-se citar os Caiabi, na região do atual Mato Grosso. Eles preparavam um mingau de milho, no qual os grãos tinham sido pilados, peneirados e se cozia a farinha com mandioca-doce, com acréscimo de amendoim torrado e moído. Também esse povo fazia um mingau com farinha de milho seco, cozida por bastante tempo na água e ao esfriar se colocava batata-doce. Faziam também mingaus de milho verde e farinhas de milho verde e do seco. A de milho seco tinha o acréscimo de amendoim torrado e pilado, como também farinha de mandioca, sendo uma farinha consumida com peixe ou carne de caça.

Os indígenas do litoral paranaense usavam a quirera (milho moído), a pamonha e a pipoca, todos derivados do milho. No Pará os Arawé consumiam muito o milho, especialmente como farinha de milho, paçoca, cauim, mingau de milho verde e mingau doce. Para esse povo a roça de milho era mais importante que a de mandioca. Também no Pará, os Paranakã comiam milho assado e os Xicrim consumiam um mingau de milho parecido com a pamonha, como também milho torrado com banana, peixe ou carne. Os Guarani que viviam em São Paulo comiam milho assado ou cozido e também como bolo.

Indígenas venezuelanos utilizavam o milho na alimentação e também como isca para pegar macacos . Os macacos iam roubar as espigas de milho, alguns eram atingidos por flechas e serviam de comida para os indígenas.

Índios norte-americanos usavam como uma parte de sua alimentação o milho, o feijão e a abóbora. Havia tribos do Canadá que cultivavam mais de quinze espécies de milho e com esse eram preparadosbolinhos, pães, sopas. Ao milho também eram adicionados feijões, carne, farelo de girassol, nozes. Havia também o pão de milho, feito com milho moido , feijão e nozes secas. Outra comida desse povo era um cozido feito com milho e feijão.

Existiam festas dos indígenas norte-americanos no início da colheita do milho. Tais festas duravam vários dias. Os Creek consideravam o início do amadurecimento do milho como o início do Ano Novo. Os Hurons faziam um tipo de canjica e tribos do sudoeste do Canadá faziam uma farinha grossa de grãos de milhos torrados e moídos, que muitas vezes era misturada com ervas e temperos. Essa farinha era o pinole. Havia tribos dos Iroqueses que cozinhavam o milho com carne, feijão e vegetais. Os Pueblos faziam um tipo de tortilha de farinha de milho, cinza de madeira e água. Uma tribo do nordeste dos atuais Estados Unidos, os Wampanoag, cultivavam tipos diferentes de milho: o negro, o branco, o amarelo, o azul, o bege, o esverdeado etc. Esse povo também aproveitava, além do grão para alimento, a palha, que era usada para fazer cestos, esteiras, bonecas e o sabugo era usado como dardo de jogos, chocalho e combustível. Diversas outras tribos da América do Norte utilizavam o milho de diferentes formas.

Na Europa, o milho do tipo que os indígenas americanos conheciam, não existia antes das grandes navegações que começaram no final do século XV. Mas na Antiguidade havia, segundo alguns autores antigos como Plínio, o Velho, um milho miúdo (milium) e o milhete (panicum) que eram consumidos entre os etruscos. Na Idade Média também havia menções ao milhete e ao milho miúdo. Foi a partir de Colombo, quando participantes da expedição dele em Cuba conheceram o milho, que este chegou à Europa. Historiadores de renome chamaram as Américas de Civilização do Milho. Na Europa o milho rapidamente começou a se espalhar. Os portugueses o levaram para ser cultivado na África. Posteriormente os europeus o introduziram na Ásia.

Na Idade Moderna o milho foi de início consumido entre as pessoas mais humildes. Os nobres e a burguesia tinham discriminação em relação ao milho, encarando-o como ração para animais. Somente décadas após o milho já estar sendo consumido pelos mais pobres é que a elite europeia também passou a usar o milho para consumo próprio. Os pobres usavam o milho em especial como farinha para sopas, papas e guisados. Mas na Itália o milho superou o uso dos antigos milhete e milho miúdo e foi introduzido na culinária italiana, surgindo a polenta. Já os franceses aderiram ao consumo do milho vindo da América a partir do século XVII e criaram uma iguaria chamada de milhade ou millase. O uso cada vez maior do milho e da batata nos séculos XVIII e XIX contribuiu para um aumento da produção de alimentos para centros urbanos da Europa que ficavam cada vez mais povoados, principalmente após as revoluções burguesas.

No Brasil o milho antes da chegada dos portugueses já era muito usado como alimento por povos nativos, embora o principal uso da maioria dessas populações fosse a mandioca. Não demorou muito para que os portugueses começassem a usar o milho na alimentação para animais e depois também para consumo humano. Segundo Câmara Cascudo, já no século XVII: “o milho dava bolos, havendo ovos, leite, açúcar e a mão da mulher portuguesa para a invenção”.  O milho no Brasil passou a ser usado em sobremesas e com a influência italiana, surgem as polentas. Atualmente há muitos usos para o milho no Brasil e em outros países, sendo usado em diversos pratos e também há o óleo de milho, a farinha de milho, o xarope de milho, bebidas destiladas etc.

Uma discussão do mundo de hoje diz respeito ao milho transgênico. A variedade RR GA21, que é tolerante ao herbicida glifosato, é a variedade de milho geneticamente modificado mais conhecida. É muito usada nos Estados Unidos. Outras empresas que usam milho transgênico são a Syngenta, a BASF, a Bayer e a Dupont. Em 1999 o governo brasileiro autorizou a empresa Novartis a realizar testes no país com a variedade de milho transgênico BT, resistente a insetos. Tem havido em certas partes do mundo um aumento considerável na produção do milho transgênico. Nos Estados Unidos mais de 70% do milho semeado é transgênico. Há críticos que se opõem ao milho transgênico. Um dos argumentos de quem defende o milho transgênico é o aumento médio de produtividade e também dizem que o milho que existe atualmente  tem sido modificado no decorrer dos últimos séculos, pois o milho original dos indígenas tinha espigas pequenas, com grãos faltando e muito suscetível a doenças e pragas. Os críticos não consideram seguro para o consumo de seres humanos e para o meio ambiente o milho que passou por modificação genética, pois o milho geneticamente modificado recebeu DNAs de um ou mais seres que naturalmente não se cruzariam e segundo esses críticos, pode haver sim danos à saúde (como alergias, riscos de câncer etc) e interferências nocivas à natureza, pois pode haver contaminação, por exemplo, de variedades tradicionais por elementos transgênicos.

Atualmente também outro uso do milho tem sido a produção de etanol, principalmente nos Estados Unidos. Segundo estudiosos, em comparação com a cana de açúcar, o milho produz mais etanol, porém é preciso uma área maior para o plantio.

 “A Lenda Do Milho

Há muito tempo, muito antes do homem branco tocar os pés no novo mundo, em uma selva da América do Sul, havia uma tribo indígena que estava passando por muitas dificuldades.

Não havia alimentos, e na mata começaram a sumir os animais. Nos rios e nas lagoas, dificilmente se via a o movimento de um peixe.

Na mata não haviam mais frutas, nem por lá apareciam caças de grande porte: onças, capivaras, antas, veados ou tamanduás.

No ar do entardecer, já não se ouvia o chamado dos macucos e dos jacus, pois as fruteiras já tinham secado.

Os índios, que ainda não cultivavam nada, estavam atravessando um tempo de sofrimento.

Nas tabas tinha desaparecido a alegria, fruto da fartura de outros tempos e em suas ocas, os índios não eram menos tristes.

Os velhos, desconsolados, passavam o dia dormindo nas esteiras e redes, à espera de que o Grande Espírito  lhes mandasse um pouco de mel.

As mulheres da tribo formavam roda no terreiro e lamentavam a pobreza em que viviam.

Os curumins cochilavam por aqui e ali, tristinhos, de barriga vazia.

E os varões da tribo, não sabendo mais o que fazer, batiam pernas pelas matas, onde já não armavam mais os laços, mundéus e outras armadilhas. E eles se perguntavam:

— Armá-las para quê?

Os rastros de caça, o tempo havia desmanchado todos, pois estes datavam de outras luas, de outros tempos mais felizes.

Tabajara era um velho índio muito bondoso e querido pelo seu povo, era o Cacique da tribo, e estava preocupado e sofrendo com tudo que estava acontecendo.

O velho Cacique, orou ao grande espirito e pediu uma iluminação e que sua vida fosse seu sacrifício para livrar seu povo de tanto sofrimento, e em um sonho o grande espirito lhe mostrou como deveria fazer para que a tribo fosse libertada do mau que à assolava.

Tabajara ao despertar de seu sono reuniu os homens de sua tribo e disse que sua morte estava próxima, e completou dizendo aos presentes:

— Não chorem minha morte, alegrem-se, enterrem meu corpo numa cova bem rasa. Cubram-me com palha seca e pouca terra. Esperem vir o sol e a chuva, e três dias depois, surgirá de minha cova uma planta bem viçosa, que após algum tempo produzirá muitas sementes. Quando virem a planta crescer e as lindas espigas aparecerem, não as comam, guardem-nas e plantem as suas sementes. Será o alimento para toda tribo sempre.

A saúde do Chefe índio estava fragilizada pela idade e pela escassez vivida por todos, não tardou o que ele previu, e pós a morte de Tabajara, seu povo fez conforme ele havia determinado.

Sobre a cova do velho guerreiro, surgiu uma linda planta com belas espigas cheias de grãos dourados e suas folhas compridas lembravam a lança do Cacique Tabajara

Sua flor vistosa parecia o cocar do chefe índio e a tribo descobriu que sua espiga era um delicioso alimento.

Os índios ficaram contentes e agradecidos ao grande espirito, então a tribo passou a cultivar o milho com muito carinho e prosperaram, a caça, a pesca e as frutas voltaram a ser abundante nas matas. E assim surgiu o milho, diz a lenda.”

https://www.espacoeducar.net/2014/08/folclore-atividade-lenda-do-milho-com.html

Adaptação: André Souza

 

 

A Festa do milho

O sertanejo festeja
A grande festa do milho
Alegre igual á mamãe
Que ver voltar o seu filho
Em março queima o roçado
A dezenove ele planta

A terra já está molhada
Ligeiro o milho levanta
Dá uma limpa em abril
Em maio solta o pendão
Já todo embonecado
Prontinho para São João

No dia de Santo Antônio
Já tem fogueira queimando
O milho já está maduro
Na palha vai se assando
No São João e São Pedro

A festa de maior brilho
Porque pamonha e canjica
Completam a festa do milho

Luiz Gonzaga

https://www.letras.mus.br/luiz-gonzaga/1560731/

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura:https://www.google.com/search?q=imagem+de+milho&sxsrf=AOaemvLujZMok3vjeAv6npdn-XaQI6HUoA:1638243018172&tbm=isch&source


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