Continuando os artigos que tratam sobre a mentira,
desta vez estou escrevendo sobre o Pinóquio, por ser ele um personagem que está
relacionado à questão da mentira.
Foi escrito por Carlo Collodi em 1882 um livro
chamado “As Aventuras de Pinóquio”, no qual é contada a história de um velho
Mestre Carpinteiro que construiu um boneco de madeira. Há na história
considerações de ordem moral e do crescimento individual, em que Pinóquio vai
aprendendo e superando defeitos para se tornar um verdadeiro ser humano. A obra
escrita não é um conto de fadas e sim um romance que tem uma mensagem do autor
de base espiritual e esotérico, tendo sido ele um membro da Maçonaria. O
próprio Walt Disney, que reproduziu a história em um filme de animação fez
parte da Rosacruz.
O autor quis enfatizar um aspecto educacional e do
trabalho, criticando a ociosidade. Gepeto é um carpinteiro (ressaltando o
trabalho), o grilo falante é a consciência moral (representando a Educação e o
autoconhecimento) e a Fada Azul que deu vida ao boneco é uma entidade maior
(lado espiritual). Pinóquio no seu início está dominado pelo egoísmo, assim
como pela ignorância, alienação e indisciplina. E vai aprendendo e se
desenvolvendo até se tornar um menino de verdade. Pinóquio está preso então a
vícios e suas mentiras fazem crescer o nariz e seu ócio o leva a ter orelhas de
burro. Um aspecto que contribuiu para seu crescimento é o seu próprio
sofrimento. A história de Pinóquio objetiva fazer uma comparação com o
desenvolvimento das pessoas.
A autora Alessandra Garrido Sotero, mestre em
Língua e Literatura Italiana escreveu um artigo interessante sob o ponto de
vista psicanalítico sobre Pinóquio, intitulado "PINÓQUIO: DO PRINCÍPIO DO
PRAZER AO PRINCÍPIO DA REALIDADE". Vou transcrever aqui alguns trechos de
sua obra:
"No espaço contemporâneo, no qual o homem tem
grande preocupação. Trata-se de uma análise que focaliza a necessidade de o
homem se libertar do estigma de “marionete”, saindo do seu egocentrismo e
mirando àquilo que está a seu redor, tornando-se pessoa."
"...Durante as suas aventuras, Pinóquio não
tem uma preocupação com o certo ou com o errado, ele sempre age de acordo com
aquilo que lhe dá vontade, preocupando-se com a sua satisfação imediata. Ele é
exatamente a falta do dever e da moral, a falta de compromisso com qualquer
princípio ou regra, a procura do prazer absoluto sem preocupar-se com qualquer
coisa
que seja"(...)
que seja"(...)
"...Um exemplo claro da sua conduta observamos no quarto capítulo, quando ele responde ao Grilo Falante qual é a sua profissão: “- A de comer, beber, dormir, me divertir e vagabundear de manhã até de noite" (p. 22). Verdadeiramente, isso é tudo o que queremos quando somos crianças, dominados por aquilo que Freud chama de princípio do prazer, que vem a ser uma tendência inata do organismo de evitar a dor e buscar o prazer (...)"
"...Embora Pinóquio tenha vida, ele não é uma
pessoa (entendendo por pessoa, aquele ser capaz de viver em sociedade) e
somente no fim da história, quando ele se ajusta ao princípio da realidade,
então merece ser transformado em uma pessoa. Sempre que Pinóquio está sendo
sugerido pelo princípio do prazer, se afasta da condição humana, e isto é
representado pela sua “animalização”. Em diversas partes da história, Pinóquio
se transforma em um animal, e, isto acontece sempre quando ele é sugerido pelo
princípio do prazer (...)"
"...Podemos concluir que quando Pinóquio dá
toda a sua economia é a representação da saída do egocentrismo, é o início de
um princípio da realidade. O princípio da realidade traz uma grande mudança na
vida de Pinóquio: Gepeto volta a trabalhar e a rir. Algo muito importante no
fim da história é a admiração com a qual Pinóquio observa a marionete que era,
que lhe parece até divertida. Este comportamento é comum quando se cresce
e se observa como um bobo, uma criança. Pinóquio, finalmente conquistou a sua maturidade.
É relevante dizer que não é o fim do princípio do prazer, pois este continua
durante toda a nossa vida em nós, mas é a representação de uma maturidade
através do aprimoramento do princípio da realidade. Este aprimoramento é
contínuo, é um processo lento que ocorre no decorrer da vida, assim como propõe
As aventuras de Pinóquio."
Assim, pode-se fazer uma relação de que o vício de
mentir de Pinóquio está ligado a uma fase de sua vida, que ele precisa superar
defeitos individuais, o seu egocentrismo, a sua egoísta busca de prazer para
então, a partir de um processo de desenvolvimento conseguir uma maturidade, na
qual ele está mais ligado à realidade. As suas mentiras faziam parte de um
conjunto de atitudes e comportamentos dessa primeira fase de vida, na qual
predominava uma tendência à irresponsabilidade.
Não quer dizer que ele não mentirá mais, porém já
não é mais o mesmo irresponsável de antes, tendo uma maior consciência de si e
do mundo que o cerca. Na sua segunda fase ele já está mais seguro de si, mais
maduro.
Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História e
Psicólogo
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