No dia 07 de setembro se comemora a independência do Brasil. Em homenagem à data, resolvi escrever um artigo específico sobre o tema.
O processo que causou a
independência do Brasil em relação à Portugal começou com a vinda da família real
portuguesa para o Brasil, que chegou neste país em 1808. Vou iniciar este
artigo falando sobre como estava o Brasil no início do século XIX e depois
falarei sobre o contexto europeu na época, a vinda da família real e sobre os
fatos que levaram à independência.
Segundo Gislaine Azevedo e
Ricardo Seriacopi em sua obra "História", volume único: "Na
passagem do século XVIII para o século XIX, a colônia portuguesa na América
encontrava-se em situação bem diversa que os portugueses haviam encontrado
trezentos anos antes. Em boa parte de nosso litoral já havia vilas e cidades, e
até no interior podiam-se encontrar núcleos urbanos decorrentes da ação de
bandeirantes, mineradores, vaqueiros, tropeiros e do trabalho de escravos
indígenas e africanos.
Em várias regiões da
colônia, as atividades econômicas haviam passado por um processo de expansão e
diversificação, contribuindo para integrar grande parte do território e
delimitar cada vez mais nossas fronteiras. O mercado interno crescera tanto que
a comercialização de gêneros alimentícios e formação de rotas de comércio
escapavam ao controle da metrópole.
Enquanto o Sul se destacava
pelo grande fornecimento de gado e exportação de artigos de couro, a região de
São Paulo tornara-se fonte de abastecimento agrícola e ponto de passagem das
mercadorias trazidas pelos tropeiros sulistas para o mercado de outras regiões.
O Rio de Janeiro, por sua vez, elevado a capital de colônia em 1763, tinha em seu
porto um intenso movimento comercial.
Minas Gerais, apesar de não
produzir ouro como no início do século XVIII, transformara-se em pólo
agropecuário, enquanto na Zona da Mata do Nordeste continuava a produção de
açúcar, principal produto de exportação da colônia. No Norte, e em algumas
regiões nordestinas, investia-se em outras culturas, como algodão, arroz, fumo,
cacau e anil.
As pessoas e as mercadorias
circulavam com maior facilidade, e a expansão do mercado interno levava, pouco
a pouco, a economia colonial a se monetarizar. Ou seja, os pagamentos deixavam
de ser feitos à base de produtos ou de ouro e passavam a se realizar por meio
de moedas.
Nesse processo, a economia
colonial crescera e ficara maior que a do reino. A atividade manufatureira,
entretanto, continuava inibida pela política de Portugal..."
E sobre a economia
portuguesa dizem os autores: "Apesar de boa parte da riqueza aqui
produzida ter como destino a metrópole, os portugueses não conseguiram garantir
sua independência econômica em relação à Inglaterra. Em vez de investir no
desenvolvimento industrial, a Coroa Portuguesa preferia empregar os lucros
advindos de seus negócios no Brasil na construção de palácios, igrejas e conventos..."
(...) "O dinheiro era utilizado também para financiar o luxo da Corte e do
alto clero, ou era gasto em presentes para os fidalgos do reino e monarcas
vizinhos. Além disso, boa parte dos lucros seguia para a Inglaterra como
pagamento pela importação de produtos industriais ingleses".
No plano político europeu,
Portugal no ano de 1806, diante da imposição do imperador Napoleão Bonaparte em
querer que países europeus aderissem ao seu bloqueio continental contra a
Inglaterra (que por sua vez estava bloqueando pela mar os portos sob controle
da França), procurou manter-se neutro. O reino português não queria indispor-se
com a Inglaterra, antiga aliada e parceira comercial e nem com a França, que
poderia tomar medidas militares contra os portugueses.
A França napoleônica enfrentava
na Europa o poderio naval inglês. A Inglaterra era a maior potência industrial
do mundo e via com preocupação a expansão francesa na Europa. Mas assim como a
Inglaterra não tinha um exército poderoso para derrotar os franceses no
continente, a França também não tinha uma marinha forte o bastante para
derrotar a frota inglesa. O bloqueio naval inglês incomodava Napoleão que pretendia
afetar a Inglaterra com um bloqueio aos produtos ingleses na Europa, mas a
continuação desse bloqueio à Inglaterra seria quebrado mais tarde pelos russos,
o que instigou Napoleão em 1812 a invadir a Rússia, o que causou sua maior
derrota e, consequentemente, o início do fim de seu império.
Pressionado por Napoleão, o
príncipe regente Dom João, que governava Portugal, sabia que se desagradasse os
franceses esses poderiam invadir o território português e que se aderisse ao
bloqueio poderia causar efeitos também terríveis, como o ataque da Inglaterra
pelo mar, com o risco até de perda de seu império colonial. Diante da demora da
decisão portuguesa, Napoleão deu a ordem para a invasão. Finalmente Dom João
decidiu então, pressionado pelos ingleses, a fugir com a corte para o Brasil. E
assim, milhares de portugueses, entre funcionários, soldados, nobres e membros
da família real embarcaram para o Brasil em navios protegidos pela esquadra
inglesa.
Já no Brasil, a principal
medida que Dom João tomou foi a "Abertura dos Portos às Nações
Amigas", o que representava a quebra do pacto colonial, isto é, o fim da
obrigação do Brasil de só fazer comércio com Portugal. Um ato que beneficiava
as elites agrárias e mercantis do Brasil e em especial a Inglaterra, ansiosa
para compensar as perdas comerciais devido ao Bloqueio Continental. Também em
1810 foram assinados tratados entre Portugal e Inglaterra, com grandes
benefícios para essa última. Outro ato de grande importância foi a elevação do
Brasil à categoria de Reino Unido a Portugal. O Brasil assim não seria
considerado mais uma mera colônia. Foi uma jogada portuguesa diante do
Congresso de Viena, para justificar a presença da família real portuguesa no
Brasil e fortalecendo a posição de Portugal no citado congresso. Outras medidas
também foram tomadas por Dom João em relação ao processo urbanizador no Rio de
Janeiro, mas houve por outro lado aumento de impostos e insatisfação de
províncias, como em Pernambuco, com a eclosão da Insurreição Pernambucana de
1817.
Em 1820, houve a Revolução
Liberal do Porto. Os revoltosos conseguiram afastar os governantes ingleses
presentes em Portugal desde as guerras napoleônicas (Napoleão tinha sido
definitivamente derrotado em 1815) e passaram a exigir a volta da família real.
Houve a organização das chamadas Cortes portuguesas, com grande influência da
burguesia comercial, que já estava influenciada por ideias liberais e, que
portanto, desejava o fim do absolutismo real e a implantação da monarquia
parlamentar.
Pressionado pelas Cortes,
Dom João finalmente volta a Portugal, deixando seu filho, Dom Pedro. Mas as
Cortes não se deram por satisfeitas e passaram a exigir o retorno do pacto
colonial e a pressionar que Dom Pedro voltasse para Portugal. Com o aumento
dessas exigências, Dom Pedro, aconselhado por sua esposa e pelo seu ministro
José Bonifácio, resolve então proclamar a independência do Brasil em 07 de
setembro de 1822. O Brasil continuaria sendo um país agrícola, com grandes
latifúndios, com a permanência da escravidão, com a produção econômica baseada
na monocultura de exportação e com grandes dívidas com a Inglaterra, numa
dependência econômica que duraria ainda dezenas de anos.
A continuidade da escravidão
até o penúltimo ano do império brasileiro (já no reinado de Dom Pedro II) e a
manutenção da estrutura agrária com grande poder dos latifundiários revelaram-se fatores que mantiveram no século XIX uma mentalidade aristocrática de uma elite
de poderosos fazendeiros, com uma significativa parcela da sociedade submetida
ao escravismo e mesmo os ex-escravos ou os descendentes deles em grande parte
sofrendo os reflexos da escravidão. No século XX os efeitos da longa escravidão,dos
latifúndios e das fortes desigualdades regionais se fizeram sentir, tendo esses
efeitos grande influência em questões sociais, como a Guerra do
Contestado, a Revolta da Chibata, o Cangaço etc. Até mesmo em pleno século
XXI, há heranças culturais presentes em formas de injustiças sociais, desigualdades
diversas e mesmo na mentalidade de poderosos, com a ocorrência, por exemplo, de casos de exploração de trabalhadores rurais
que lembram em grande parte a escravidão dos tempos coloniais e imperiais.
A seguir algumas citações de
autores :
1-Mary Del Priore, em Histórias da Gente Brasileira, Império:
"A Revolução Liberal do
Porto, movimento voltado para a convocação de uma assembleia constituinte,
exigia o retorno imediato de Dom João à metrópole. Não tendo sido extinta a
dualidade de poder, o rei voltou ao Reino e aqui deixou como regente seu filho,
D. Pedro" .
E ainda : "E das ondas
passamos aos redemoinhos e marés. Eis que a pressão metropolitana voltou-se
para o regente: em 21 de setembro de 1821, um decreto determinava seu retorno
imediato. D. Pedro resistiu e, em 09 de janeiro de 1822, tornou pública sua
determinação de permanecer no Brasil. Não com a frase publicada nos jornais:
-Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto! Digam ao
povo que fico!"-mas com palavras mais imprecisas: "Convencido de que
a presença de minha pessoa no Brasil interessa ao bem de toda a nação
portuguesa, e convencido de que a vontade de algumas províncias assim o requer,
demorarei a minha saída até que as Cortes de meu augusto pai deliberarem a este
respeito, com perfeito conhecimento das circunstâncias que têm ocorrido."
E sobre o 7 de setembro:
"...Dom Pedro rompeu com a pátria-mãe, sagrando-se imperador em 12 de
outubro do mesmo ano. Controvérsias sobre a data e o famoso "grito"
não faltam. Nenhum jornal de época fez qualquer menção ao 7 de setembro. Em
carta aos paulistas, datada do dia 8, o príncipe apenas fala da necessidade de
voltar ao Rio de Janeiro em função de notícias recebidas de Portugal, sem
qualquer menção à Proclamação da Independência..." (...) O grito só começa
a ganhar força a partir de 1826, com a
publicação do padre Belchior Pinheiro Ferreira incluindo a data de 7 de
setembro no calendário das festividades da independência."
2-Laurentino Gomes em sua obra 1822:
"Até as vésperas do Grito do Ipiranga, eram raras as vozes entre os
brasileiros que apoiavam a separação completa entre os dois países. A maioria
defendia ainda a manutenção do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve, na
forma criada por Dom João em 1815. Foram o radicalismo e a falta de sensibilidade
política das cortes constituintes portuguesas, pomposamente intituladas de
"Congresso Soberano", que precipitaram a ruptura. Portanto, os
brasileiros apenas se aproveitaram das fissuras abertas na antiga metrópole
para executar um projeto que, a rigor, ainda não estava maduro".
E ainda: "...Os riscos do processo de
ruptura com Portugal eram tantos que a pequena elite brasileira, constituída
por traficantes de escravos, fazendeiros, senhores de engenho, pecuaristas,
charqueadores, comerciantes, padres e advogados se congregou em torno do imperador Pedro I
como forma de evitar o caos de uma guerra civil e étnica que, em alguns
momentos, parecia inevitável..." (...) Como resultado, o país foi
edificado de cima para baixo. Coube à pequena elite imperial, bem preparada em
Coimbra e em outros centros europeus de formação, conduzir o processo de
construção nacional, de modo a evitar que a ampliação da participação para o
restante da sociedade resultasse em caos e rupturas traumáticas..."
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Márcio José Matos
Rodrigues-Professor de História.
Belo artigo acerca da Independência ou "independência" do Brasil, digno de um profissional com o gabarito de Márcio Rodrigues.
ResponderExcluirvaleu pela força! obrigado.
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