domingo, 4 de outubro de 2020

Os conflitos atuais entre Armênia e Azerbaijão por Nagorno-Karabakh

 

 

 


 

Tem sido divulgada nos noticiários internacionais a existência de combates entre forças armênias e as do Azerbaijão devido a conflitos no território de Nagorno-Karabakk com população em sua maioria armênia, mas que territorialmente faz parte do Azerbaijão. Os habitantes armênios de Nagorno-Karabakh querem a independência em relação ao Azerbaijão. Os armênios cristãos ortodoxos e os azeris islâmicos (etnia dominante do Azerbaijão) há muitos anos disputam territórios. Tanto a Armênia como o Azerbaijão são ex-repúblicas soviéticas e estão na região geográfica do Cáucaso. 

 

 Histórico:

 

No Cáucaso há séculos tem havido turbulências, com guerras e confronto de interesses diversos. No século XVI com a expansão do Império Turco, grande parte daquela área foi dominada pelo referido império. Porém, o império russo também estava em expansão e atingiu partes do Cáucaso, principalmente a partir do reinado do czar Ivan, chamado de “O Terrível” e com algumas investidas também por parte da Pérsia. 

 

Depois de guerras contra os turcos, a Rússia, no século XVIII e especialmente no século XIX, foi conquistando toda a região do Cáucaso. No final desse século, Armênios e azeris passaram a constituir-se em povos dentro do Império Russo. E no século XX houve fatos foram marcantes que interferiram: A Revolução Bolchevique de 1917, que depôs o governo imperial da Rússia, deixando temporariamente a Armênia e o Azerbaijão como países livres; lutas de tropas armênias contra forças turcas otomanas em 1918, quando já estava caminhando para o fim a I Guerra Mundial e o fim do Império Turco. Mas os  bolcheviques não tinham desistido de planos expansionistas, pois eles desejavam anexar toda a região do Cáucaso. Os armênios de Karabakh lutavam por sua independência e tentavam contato com a Armênia, sem sucesso. E durante a luta da Armênia com o Azerbaijão, houve interesses não só do novo governo russo, como também da Inglaterra, que chegou a ocupar a chamada Transcaucásia em 1919. Só que ainda nesse ano, o 11º Exército da União Soviética invadiu o Cáucaso e foi formada a República Socialista Transcaucasiana. Foi constituído o Gabinete do Cáucaso, que tinha como supervisor Josef Stalin, que era Comissário do Povo para as Nacionalidades.

 

 

De início o comitê soviético decidiu juntar Karabakh à Armênia, que veio a se tornar uma república, porém houve protestos dos azeris contra essa decisão e também na época revoltas ocorreram contra os soviéticos na capital da Armênia que desgostaram o novo governo russo.O comitê  mudou sua decisão e Karabakh (que depois passou a se chamar Oblast Autônomo de Nagorno-Karabakh) ficou com a recém- criada República Socialista do Azerbaijão no início dos anos 20. E ainda existia o caso da região do  Naquichevão, que tinha sido parte da Armênia, mas com grande parte da população constituída por azeris. Nessa região foi proclamada uma república independente após a retirada dos turcos, mas os armênios com ajuda britânica em 1919 ocuparam  esse território, que foi local de combates entre Armênia e Azerbaijão em 1920. A Turquia ajudava os azeris e a Inglaterra ajudava os armênios. Os azeris conseguiram vencer e tomaram a região. Assim como Nagorno-Karabakh, o Naquichevão foi entregue ao Azerbaijão. A maior parte da população armênia do Naquichevão foi expulsa.

 

Segundo analistas políticos armênios e azeris, os soviéticos poderiam estar adotando uma política de “ dividir para conquistar", pois passaram a existir dois enclaves, um do Azerbaijão separado pela Armênia e outro de população armênia dentro do Azerbaijão. Também alguns analistas consideram que as perdas da Armênia em prol do Azerbaijão foram uma forma dos soviéticos agradarem o novo governo turco. As duas hipóteses não se excluem. Em 1936, sob o governo de Stalin, houve a demarcação das áreas pelo governo de Stalin, mantendo a posição do Azerbaijão sobre os territórios mencionados. A Armênia, mesmo como uma república soviética, fazia protestos contra as perdas territoriais para o Azerbaijão.

 

No fim dos anos 80, em uma União Soviética passando por reformas políticas e econômicas, forças azeris e armênias voltaram a se enfrentar pela questão de de Nagorno-Karabakh e no início dos anos 90, após a queda da União Soviética em 1991, houve uma guerra entre Armênia e Azerbaijão. Nessa guerra houve aproximadamente 30 mil mortos. Um acordo de paz foi assinado em 1994. Em 2016 houve novos atritos, com centenas de mortos.

 

Conflitos Atuais: 

 

Em julho de 2020, começaram novos combates entre os armênios do enclave (que fundaram uma república chamada de Artsaque)  e o Azerbaijão. E em setembro a situação se agravou. Os armênios de Nagorno-Karabakh possuem suas próprias forças armadas e são apoiados pela Armênia. A Turquia colocou-se ao lado do Azerbaijão, tendo afinidades históricas com esta nação. Inclusive há suspeitas de que combatentes oposicionistas sírios que lutam na guerra da Síria estejam sendo chamados pelo governo turco para lutarem contra os armênios. A Rússia, governada autoritariamente pelo presidente Putin, tem uma aliança militar com a Armênia, mas também tem boas relações com o Azerbaijão. Putin, pelo que tem demonstrado, não quer que a Rússia se envolva na guerra e prefere um acordo de paz. Não parece ser interessante para o governo russo uma guerra na região.

 

O Azerbaijão tem comprado muitos armamentos recentemente. Também é um país ligado à questão petrolífera. Tem aspirações de exportar gás para países europeus por meios de um duto, que saí do seu território nacional passando pela Turquia. É provável que o governo do Azerbaijão queira garantir um domínio em Nagorno-Karabakh, procurando manter uma posição mais segura para as exportações através de oleodutos e gasodutos. Há a possibilidade desta situação ser o principal fator para a eclosão do conflito atual.

 

E quanto à Turquia? Além de um relacionamento tradicional com o Azerbaijão, ela tem seus interesses econômicos na região, pois quer que gasodutos azerbaijanos e russos passem pelo seu território para a exportação de gás para a Europa. Também é possível que a própria Turquia queira se converter em um país com grandes exportações de gás para a Europa, em uma questão em que está se envolvendo em disputas com a Grécia. Conforme diz um artigo do jornal O Estado de Minas em sua seção internacional, de 1 de setembro de 2020: 

 

“A Turquia ampliou até meados de setembro sua polêmica missão de exploração em busca de gás natural em uma área do Mediterrâneo reivindicada pela Grécia.

 

No dia 10 de agosto o governo de Ancara enviou o navio de pesquisa "Oruc Reis", assim como vários navios de guerra, à região, o que aumentou a tensão com a Grécia e o restante da União Europeia (UE).   A Turquia afirmou que a missão, prevista para terminar nesta terça-feira, prosseguirá até 12 de setembro, de acordo com uma mensagem para a NAVTEX, um sistema internacional de comunicação de navegação.

 

O presidente turco Recep Tayyip Erdogan afirmou em um discurso que o "Oruc Reis" continua "suas atividades com determinação".

 

"Se Deus quiser, também esperamos ter boas notícias do Mediterrâneo em pouco tempo, como as que tivemos no Mar Negro", disse Erdogan.

 

O presidente turco se referia à descoberta anunciada pelas autoridades de 320 bilhões de metros cúbicos de gás natural no Mar Negro, a maior da história da Turquia.”

 

Analisando estas notícias, vemos os planos de expansão econômica do governo turco. Mas e a Rússia?  Terá Putin algo contra esta expansão? Como a própria Rússia é uma exportadora de gás para a Europa, se a Turquia se converter em uma grande competidora então isto poderá prejudicar os interesses econômicos russos. A Grécia, antiga rival da Turquia (embora ambas façam parte da OTAN), também pode estar muito desconfiada e poderá querer se opor à expansão turca, numa área de disputas entre as duas nações no Mediterrâneo.

 

Como se vê, há muitos interesses e portanto, provavelmente não se trata de só uma questão de conflitos territoriais localizados na região de Nagorno-Karabakh. Esta questão localizada pode estar relacionada a uma ampla questão envolvendo países da União Europeia, a Rússia e o governo turco. É toda uma realidade que envolve aspectos étnicos de uma região como também podem estar envolvidos a geopolítica e os interesses econômicos mais abrangentes. Com certeza é triste a situação de civis armênios e azeris, duramente afetados pelos combates. E se por um lado há uma população armênia do enclave desejosa de independência assim também há uma oposição de muitos azeris que não desejam perder parte do território do país.

 

Vídeos sugeridos:  

 

http://estacaoarmenia.com.br/53110/brasileiros-na-armenia-pedem-apoio-a-artsakh/

 

https://www.youtube.com/watch?v=wq6Y8FpCOYI

 

https://www.youtube.com/watch?v=FFR1iVRQMhQ





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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

 

 

 

Figura:

https://premierleaguebrasil.com.br/armenia-x-azerbaijao-mkhitaryan-europa-league/nagorno-karabakh-map-bbc/

 

 

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