Neste segundo artigo
sobre a industrialização no Brasil, vou abordar
uma parte do terceiro período
da História (República) envolvendo a República Velha e a Era Vargas.
1-República Velha
No início da República
continuou a haver a relação entre cafeicultura e industrialização. Mas não
foram só os cafeicultores que investiram em indústrias nessa época (anos finais
do Império e começo da República). Houve também outros grupos como donos de
bancos ou empresas estrangeiras, além de muitos imigrantes, que chegavam de sua
terra de origem com um certo volume de capitais. Na qualidade de diretores de
bancos ou outras empresas estrangeiras, tais imigrantes eram diferenciados dos imigrantes
que tinham vindo trabalhar na lavoura. Tornaram-se famosos como grandes
investidores, imigrantes como Francisco Matarazzo, Alexandre Siciliano, Klabin
e Nicolau Scarpa.
Além dos já citados
investidores em São Paulo, houve outros investidores da indústria em outros
estados como Domingos Bebiano (no Rio de Janeiro); Herman Lundgren (em
Pernambuco) e Hering (Santa Catarina).
Começava a surgir uma
burguesia industrial no Brasil, composta por proprietários do capital aplicado
nas indústrias e que viviam dos rendimentos gerados por ele. Havia uma
determinada afinidade entre os interesses agrários e os industriais (havia
cafeicultores que se tornaram industriais) e foi essa afinidade que impediu o
surgimento de conflitos abertos entre as partes, em especial quando havia a
discussão sobre protecionismo à indústria ou sobre taxa cambial.
O desenvolvimento
industrial que houve no Sudeste não se viu na mesma proporção em outras
regiões. Isso se deu porque na referida região houve um alto grau de concentração
urbana, de capitais, de mão de obra de indústrias. Um fator a se destacar foi
que o Rio de Janeiro na República Velha ,até a década de 20, foi o local da
concentração das grandes indústrias, com ênfase nos ramos de bebidas, alimentos
e principalmente produtos têxteis.
No Império, enquanto
ainda existia a escravidão, houve casos de indústrias com operários livres e
escravos. Só com a abolição isso deixou de ocorrer.
Os primeiros operários vinham das camadas mais pobres da população urbana, inclusive existiram muitos menores de idade, constituindo um contingente de trabalhadores não especializados. Os aprendizes tinham condições precárias de trabalho, que não eram melhores que a de muitos escravos. Tanto os adultos como as crianças chegavam a trabalhar até 16 horas por dia, sem folga semanal ou outro direito.
Os primeiros operários vinham das camadas mais pobres da população urbana, inclusive existiram muitos menores de idade, constituindo um contingente de trabalhadores não especializados. Os aprendizes tinham condições precárias de trabalho, que não eram melhores que a de muitos escravos. Tanto os adultos como as crianças chegavam a trabalhar até 16 horas por dia, sem folga semanal ou outro direito.
Muitas vezes os operários
qualificados, necessários ao desenvolvimento industrial, eram contratados na
Inglaterra. Eles sentiam dificuldades em relação ao clima e saíam caros para os
industriais, pois tinham salários maiores. A situação do operariado quanto à
sua origem estava relacionada com a imigração e grande parte se constituía de
italianos, portugueses e espanhois nos maiores centros industriais do país. A
enorme exploração do trabalho envolvia mulheres e crianças (que recebiam
salários bem menores).
Quanto mais imigrantes
chegavam nos centros industriais, mais o salário baixava pelo aumento da oferta
de trabalhadores procurando emprego. Também as demissões eram frequentes e nos
períodos de crise econômica como nos anos de 1897 a 1900 e durante a I Guerra
Mundial a situação piorava com aumento do desemprego. Mas em relação ao total
da população brasileira no início da República, o número proporcional de
trabalhadores ainda era baixo (o país ainda era muito rural). Em 1900, da
população ocupada brasileira de 9.503.000 indivíduos, somente havia 321.000
trabalhando nas indústrias. E só no Rio de Janeiro e São Paulo era que havia grandes
concentrações operárias. Era muito difícil haver uma mobilização nacional em
torno de causas comuns.
O operariado na República
Velha passava por muitas privações e exploração. Para aumentar a produtividade
fabril, eram utilizados até mesmo castigos corporais ou cobranças de multas. A
jornada de trabalho era, em algumas situações, de até 15 horas por dia. Em
muitas fábricas havia péssimas condições de higiene, não possuindo nem mesmo
água potável ou janelas para ventilação.
Havia muitos casos de alcoolismo e de doenças como tuberculose e sífilis
entre os trabalhadores. O Estado não intervinha em favor dos operários. Não
existiam dispositivos previdenciários,
indenizações ou aposentadorias e era muito alto o número de acidentes de
trabalho. Havia uma política repressiva e, em alguns casos, um estilo
paternalista dos empresários. O operário era muitas vezes considerado um ser
ignorante e marginal que tinha de estar sob vigilância.
Houve bairros operários e
a construção de vilas operárias por vários empresários. Nessas vilas era
estabelecido uma rígida disciplina, por exemplo, o controle de entrada e saída
das pessoas, a fixação de horários para ir e vir, o policiamento dos costumes,
a vigilância dos namoros de portão etc. E até o lazer era vigiado.
Outras formas de
habitação dos operários eram os cortiços (mais comuns em São Paulo) e as
favelas (no Rio de Janeiro). A pobreza era grande. Em ambos os casos as
condições de higiene eram péssimas. As doenças se espalhavam como tuberculose, peste bubônica, febre
amarela.
Os primeiros sindicatos
tiveram como antecedentes associações como o mutualismo voltado para o auxílio
mútuo entre os trabalhadores (entre 1850 e 1880) e as ligas operárias (mais politizadas
e que criadas a partir de 1870). Essas ligas cobravam direitos e deram origem
aos primeiros sindicatos no século XX.
Na fase dos sindicatos na
República Velha, esses procuraram se caracterizar como desvinculados do Estado.
Nessa época 3 correntes disputavam entre si a liderança dos trabalhadores: a
socialista, a trabalhista e a anarcossindicalista.
Na luta por melhores
condições de trabalho, houve na República Velha, entre 1917 e 1920 mais de 200
greves, apenas no eixo Rio-São Paulo, envolvendo a participação de cerca de
300.000 trabalhadores. Mas após 1920 houve um declínio do movimento operário
devido à forte repressão policial e empresarial. Em 1922 surgiu o Partido
Comunista Brasileiro que passou a disputar com o anarquismo a liderança dos
movimentos operários.
Nos anos 20 o
empresariado industrial forma organizações como o Centro dos Industriais de
Fiação e Tecelagem de São Paulo, o Centro dos Industriais de Fiação e Tecelagem
de Algodão do Rio de Janeiro, o Centro Industrial do Brasil e o Centro das
Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), futura Fiesp.
No fim dos anos 20 foram
elaboradas leis na Câmara dos Deputados. Foram elaborados projetos de lei
regulamentando o trabalho fabril. O objetivo de tais leis era tentar evitar novos
confrontos abertos. Apareceram então as primeiras leis trabalhistas do Brasil
como a Lei de Acidentes de Trabalho (1919), a Lei de Férias (1926) e o Código
do Menor (1929). Mas os empresários muitas vezes ignoravam as leis e as
autoridades não fiscalizavam como deveriam fazer. Os empresários não admitiam
uma legislação que interferisse no ritmo do trabalho fabril, diminuindo o grau
de controle sobre tal trabalho.
No tempo da República
Velha os industriais lutaram pelo
protecionismo alfandegário, pois consideravam muito baixas as tarifas cobradas
sobre os manufaturados importados, que os deixava mais baratos que os produtos
similares produzidos no Brasil. Os industriais se dirigiram ao Estado várias
propostas de revisão tarifária, sem muito sucesso, pois fazendeiros e
importadores se beneficiavam das taxas que estavam em vigor. Assim, quanto à
relação com o operariado, os industriais
recusavam a intervenção do Estado, mas para conseguir uma alteração das
tarifas queriam que houvesse uma intervenção.
2- Era Vargas
Era Vargas e desenvolvimento industrial
Com a quebra da bolsa de
Nova York, nos Estados Unidos, a crise alastrou-se por outros países. A
economia brasileira foi afetada não só por causa do café que foi desvalorizado internacionalmente,
como também pelo fato de que os capitais norte-americanos, que antes eram
obtidos sem dificuldade pelo Brasil, terem se fechado. Para piorar havia a
superprodução de café brasileiro que
ficava ainda mais difícil de escoar e que contribuía para diminuir mais o preço
do produto. Nessa época, em 1930, aconteceu a chamada "Revolução de
1930", que colocou Getúlio Vargas no poder e acabou com a República Velha.
Para tentar amenizar a crise na economia brasileira, Vargas mandou queimar
estoques excedentes de café. Também foi criado o Departamento Nacional do Café,
depois chamado de Instituto Brasileiro do Café, que controlava safras e a
exportação do café. Foi também suspenso o pagamento da dívida externa
brasileira e o Banco do Brasil passou a controlar a taxa cambial.
Com os preços do café em
baixa e existindo dificuldades em importar bens manufaturados, porém com o
poder de consumo preservado, começou um período bem favorável à expansão da
indústria brasileira. Assim, os preços dos produtos industriais aqui fabricados
tiveram mais vantagens em relação aos importados. A indústria assumiria o papel
de personagem principal na recuperação e expansão da economia brasileira. A
capacidade das indústrias existentes foi mais aproveitada, aumentando a
produção; foram adquiridos equipamentos de segunda mão mais baratos e que
podiam ser bem utilizados; e os industriais já mais organizados passaram a
exercer um considerável poder de pressão. Havia uma nova tendência que era
diversificar os ramos industriais. Houve investimentos na estrutura industrial
com o crescimento de setores voltados para a metalurgia, mecânica, cimento,
material elétrico e transportes, como também indústrias químicas e
farmacêuticas. Muitos bens industriais que antes eram só importados passariam a
ser produzidos internamente, na chamada Substituição de Importações. O ritmo da
expansão industrial cresceu, superando o da agricultura.
Por meio de
leis direcionadas para a regulamentação do mercado de trabalho, medidas
protecionistas e investimentos em infraestrutura, a indústria nacional cresceu
significativamente nas décadas de 1930-40. No entanto, tal desenvolvimento
continuou restrito aos grandes centros urbanos da região sudeste, provocando
uma grande disparidade regional. A indústria brasileira também se
beneficiou com o final da Segunda Guerra Mundial (1939-45), pois, os países
europeus, estavam com suas indústrias arrasadas, necessitando importar produtos
industrializados de outros países, entre eles o Brasil.
Na Era Vargas houve a construção da Usina de Volta
Redonda no Rio de Janeiro como também a construção da Companhia Vale do
Rio Doce, destinada à exploração do minério de ferro em Minas Gerais. Foi
adotada a
substituição de mão de obra imigrante pela nacional. Essa mão de obra era
formada no Rio de Janeiro e São Paulo em função do êxodo rural (decadência
cafeeira) e movimentos migratórios de nordestinos.
Houve investimentos
forte na criação da infraestrutura industrial: indústria de base e
energia. Destacando-se a criação do Conselho Nacional do Petróleo (1938);
Companhia Siderúrgica Nacional (1941); Companhia Vale do Rio Doce (1943);
Companhia Hidrelétrica do São Francisco (1945). O grande êxodo rural com o
aumento da população urbana constituindo um mercador consumidor e com maior
fornecimento de mão-de-obra e o aumento de exportações devido à Segunda Guerra
foram fatores que contribuíram para o desenvolvimento industrial, que ocorreu
especialmente em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul,
definindo a grande concentração espacial da indústria, que permanece até hoje.
No início da 2ª Guerra Mundial o crescimento
diminuiu porque o Brasil não conseguia importar os equipamentos e máquinas que
precisava. Apesar disso as exportações brasileiras continuaram a se manter
acarretando um acúmulo de divisas. Ao final da guerra já existiam indústrias
com capital e tecnologia nacionais, como a indústria de autopeças. O governo
criou a Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil,
mas que apenas a partir de 1941 possibilitaria financiamentos importantes .
O elemento-chave da industrialização brasileira no
período foi o Estado, que foi o principal agente dessa transformação. Houve a
preocupação de se implantar um setor industrial que produzisse bens de
produção, ou seja, um setor de indústrias pesadas ou de base. O Estado
brasileiro transformou-se em investidor industrial e investidor em indústrias
pesadas. Além de diversificar e ampliar o parque industrial brasileiro as
empresas produtivas estatais inauguradas tinham o papel de produzir bens e
serviços a baixos preços para fornecê-los aos empresários privados, para
fortalecer a burguesia industrial e o próprio capitalismo no Brasil.
Mesmo com todos esses esforços, o Estado não tinha
capitais tão amplos para investir em todos as frentes da indústria de base,
pois sua principal fonte de recursos era constituída de impostos. Foi assim uma
industrialização restringida. O Estado também concedeu empréstimos aos
industriais com juros menores que os que eram utilizados com os empresários
agrícolas e a criação de novos tributos ao setor agrário, o que desestimulou a
superprodução de café. E, por fim, houve o controle estatal da classe operária,
havendo a regulamentação das relações de trabalho entre operários e
industriais, com uma legislação trabalhista. Foram também criados o salário mínimo e o imposto
sindical.
Havia o temor de agitações proletárias,
principalmente com o aumento do número de trabalhadores. Dessa forma foi criado
o Ministério do Trabalho e os sindicatos passaram a ser regulados pelo Estado
por intermédio de uma nova legislação sindical. Por um lado o Estado concedia
as leis de proteção social ao operariado e por outro subordinava os sindicatos,
buscava-se despolitizar os trabalhadores e torná-los menos
questionadores.
Muito ainda poderia ser dito sobre o que abordei,
pois a questão da industrialização é vasta, mas espero ao menos ter
proporcionado um bom entendimento. No último artigo sobre a industrialização no
Brasil vou falar sobre o período de 1946 até a atualidade.
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História
Figura: Google.
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