No dia
14 de outubro houve um grande
atentado terrorista em Mogadíscio, com mais de 300 mortos e cerca de 400
feridos. Foi um ataque com carros-bomba no centro da cidade. Os
suspeitos principais são os terroristas do grupo Al Shabab, um braço da rede
Al-Qaeda. A Somália é um dos países com maior número de ataques terroristas no
mundo.
A situação
piorou com a falta de atendimento às vítimas em um país que por vários anos tem
tido sua história ligada à guerra, ao terrorismo e à seca e que no seu passado
colonial esteve dominado por duas potências europeias: Itália e
Inglaterra.
A realidade é tão brutal na Somália, que 739.000
pessoas ultimamente precisaram deixar obrigatoriamente seus lares para
conseguir alimentos e tiveram de viver em campos de refugiados, em moradias
precárias.
Vou falar das características deste país e também
sobre a sua história.
A Somália localiza-se no Leste da África, conhecido
como chifre da África, sendo uma
nação litoral. Nos seus limites continentais há a Etiópia e Djibouti no norte e
no oeste e, o Quênia em seu sudoeste. No seu extremo oriente há o Golfo de
Áden. A sua extensão territorial é de
637.657 km². Sua capital é
Mogadíscio. O clima é Árido
tropical. Há um chamado governo de transição formado em 2004. É dividida
administrativamente em 18 regiões. Os idiomas oficiais são o árabe e o somali,
mas também são falados o inglês e o italiano. A maior religião é o Islamismo com 98,5% da população. Sua
população é de aproximadamente 9 milhões de habitantes. A composição da
população é de 98,3% somalis, 1,2% árabes e 0,5% outros.
A Somália sentiu o peso do imperialismo europeu na
segunda metade do século XIX, com rivalidades coloniais entre a Itália, o Reino
Unido e a França. No início da década de 1880 a França e a Inglaterra procuraram
se estabelecer na costa da Somália, visando em especial sua importância
estratégica e comercial. Quando a Itália entrou em cena, as três potências
iniciaram um processo de expansão pelo interior.
Em 1897, a partilha do país estava encerrada, sem se
importar com os interesses das populações nativas, tirando-lhes a
independência. Os chefes de clãs e sultões somalis não se acomodaram à invasão
que interferia em seu poder político. Tanto que iniciaram vários levantes
contra forças europeias e também da Etiópia durante essa fase de
partilha.
Os chefes somalis, sabedores das rivalidades que existiam entre as
potências europeias, procuraram jogar umas contra as outras, assinando diversos
tratados com as potências, na esperança de que pela diplomacia pudessem
assegurar a independência. A entrada estrangeira no país não enfrentou uma
nação única e sim um conjunto de clãs isolados que não raramente eram inimigos.
E para piorar a situação dos somalis, eles não tinham armas modernas. Ainda
assim houve resistência, o que conservou vivo o espírito nacionalista.
A França criou sua colônia no Djibuti, cujo primeiro nome foi Somália
francesa. Esse território só se tornou independente em 1977. A Inglaterra ficou
com a parte do território somali que ficou conhecido dos europeus como Somália
Inglesa, ao norte e a Itália com a Somália Italiana, mais ao sul.
Em relação à Somália Inglesa, também chamada de Somalilândia Britânica, foi um
protetorado britânico situado no norte do chifre da África. Quando a Somália se
tornou independente fez parte desse país e atualmente se declara um país
chamado República da Somalilândia, não reconhecido oficialmente. Durante os
anos 1870 o Egito dominou a área, mas abandonou a área e assim o Império
Britânico formou seu protetorado.
Sobre a Somália Italiana, a Itália em 1889 celebra
acordos com os sultões de Obbia e Aluula, estabelecendo um protetorado nos
outros 2/3 do futuro país. O governo italiano impôs a administração direta em
1908, estabelecendo sua colônia. Em 1936 a Itália fascista invade a Etiópia,
formando a África Oriental Italiana (AOI), junto a Somália e Eritreia. Com a a
declaração de guerra da Itália ao Reino Unido em junho de 1940, na Segunda
Guerra Mundial, forças italianas invadem a Somalilândia britânica,
reconquistada um ano depois.
Pós-Segunda GuerraMundial
Quando acaba a guerra, a Itália renuncia aos
direitos à Somália, que fica de 1941 a 1950, sob administração militar
britânica.A Assembléia Geral da ONU, em 21 de novembro de 1949, adota uma
resolução recomendando que a antiga Somália italiana seja colocada sob tutela
por 10 anos, com a Itália como administradora, com o objetivo de preparar a
independência. A Somália britânica foi declarada independente a 26 de junho de
1960 e 5 dias depois, a 01 de julho, a parte italiana é declarada independente,
as duas ao se unirem no mesmo dia formaram a República da Somália.
Governo Parlamentar e Golpe
Militar
Foi aprovada em referendo, em junho de 1961, uma
Constituição que dizia que deveria haver um governo parlamentar com base no
modelo europeu e o governo da Somália desistia de reivindicar as áreas somalis
na Etiópia, Quênia e Djibuti, estabelecendo boas relações com os vizinhos. Mas
a aproximação com a Etiópia, considerada por nacionalistas como uma rival, foi
o estopim para o golpe de outubro de 1969, liderado pelo general Mohamed Siad
Barre.
Barre aproximou-se da União Soviética (URSS) e
formou um serviço de segurança nacional para controlar a população, iniciando
uma série de projetos de inspiração socialista, porém restringindo muito a
liberdade política e utilizando o terror para intimidar e se manter no
poder.
O imperador da Etiópia foi derrubado em 1974 e em
1977 o governo militar da Somália decide invadir aquele país para conquistar a
região de Ogaden, com maioria de habitantes de origem somali. Porém, o novo governo aliou-se à União Soviética,
que forneceu entre 10.000 a 15.000 soldados cubanos e conselheiros militares
soviéticos, além de muitas armas, provocando a derrota da Somália. A ajuda
soviética irritou o ditador, general Barre, que em novembro de 1977, expulsou
todos os conselheiros soviéticos e revogou o acordo de amizade da Somália com a
URSS.
Entre as consequências da Guerra de Ogaden podem
ser citadas milhares de mortes, com grandes custos para a Somália e o a
ocorrência de mais 650.000 refugiados do
território etíope. Esta derrota militar teve efeitos terríveis para o regime de
Siad Barre, que viu seu prestígio se reduzir perante o Exército e a população
somali. Com o final da a guerra, a Somália abandona sua ideologia socialista e
procura apoio no ocidente.
Assim, de 1982 a 1988, houve novo parceiro no contexto da Guerra Fria: os
Estados Unidos. Mas a crise econômica, corrupção e custo
das atividades anti-insurgência causam grandes privações à população
e ao final da década de 1980, grupos armados de oposição na região norte se
voltam contra o governo e se espalham para as regiões central e sul. Há uma
desintegração do exército somali e o controle efetivo do regime é reduzido às
áreas nas imediações de Mogadíscio. Após o fim da Guerra Fria, a Somália perdeu
sua importância como um aliado dos Estados Unidos, que se distanciaram de
Barre. A queda do regime ocorre em 1991 e várias facções começaram a tentar
controlar o território lutando entre si.
O General Aidid
O general Mohamed Farrah Hassan Aidid foi um
líder controverso e sanguinário da Somália, considerado muitas vezes como um senhor da guerra. Teve uma
educação em Roma e Moscou, tendo servido no governo de Barre em diferentes
posições até se tornar o chefe do serviço de inteligência somali. Em 1985,
Barre descobriu seus planos golpistas o
prendeu por seis anos. Em 1991, foi libertado da prisão por movimentos
contrários ao governo militar.Com a queda do governo Barre, tornou-se poderoso
e liderou a resistência contra as tropas
das Nações Unidas e dos Estados Unidos. O General Aidid foi um dos principais
alvos da Operação Restore Hope, onde as Nações Unidas e os Estados Unidos
forneceram ajuda humanitária à população e também tentavam romper um cerco
militar do general no país. Foi o presidente da Somália por um curto período de
tempo, no entanto foi obrigado a deixar o país em 1995 pela pressão das forças
da ONU. Na sua época no poder, uma violenta guerra civil provocou uma situação
de extrema fome no país. E Aidid confiscava os alimentos enviados como ajuda
humanitária, atacando comboios, usando a fome como arma. Por causa dessa
política cerca de 300.000 pessoas morreram. Uma operação dos Estados Unidos
contra o Aidid em 3 de outubro de 1993, apesar de tecnicamente bem sucedida,
teve como consequência a morte de centenas de somalis e de 18 soldados dos
Estados Unidos. Tal operação foi descrita no filme "Falcão Negro em
Perigo". Em 1996, o general morria em agosto, como resultado de um
tiroteio com gangues rivais (jornais dos Estados Unidos lançaram a hipótese de
ter sido um plano da CIA).
As Cortes Islâmicas
Nos anos 90, Baseadas na Charia (lei islâmica), as
cortes islâmicas tornaram-se o principal sistema judicial. sustentado pelos tributos pagos pelos
litigantes. Em pouco tempo, as cortes passaram a oferecer outros serviços, como
educação e assistência médica, atuando também como força policial com
contribuições de comerciantes para
reduzir o crime. Em 1999 o grupo começou a firmar sua autoridade. Os
partidários e integrantes das cortes islâmicas e outras instituições uniram-se
para formar a União dos Tribunais Islâmicos (UTI), uma milícia armada passando
a controlar partes da capital. As cortes formaram uma união das cortes
islâmicas em 2000, consolidando recursos e poder, mas entrando em confronto com
senhores da guerra somalis tradicionais.
Para enfrentar a UTI, um grupo de senhores da guerra
de Mogadíscio formou a Aliança Para Restauração da Paz e a Luta Contra o
Terrorismo (APRPLCT). Esta era uma mudança principal, pois esses senhores da
guerra lutaram entre si por muitos anos. No começo de 2006, os dois grupos
entraram em choque repetidamente e em maio de 2006 houve fortes combates em
Mogadíscio, onde morreram mais de 300 pessoas.
O governo dos Estados Unidos passou a financiar a
APRPLCT, devido ao possível envolvimento da UTI com a rede terrorista A-Qaeda,
que em 9 de agosto de 1998 provocou ataques às embaixadas norte-americanas no
Quênia e na Tanzânia.
Segundo várias fontes, o governo eritreu começou
armar e financiar a UTI, assim como ajudando rebeldes etíopes, como a FLO
(Frente de Libertação Omoro).
As regiões de Puntlândia e Somalilândia (onde era a
Somália Britânica) afirmaram sua autonomia.
Em 2004, o governo de transição somali é formado no
Quênia, reconhecido pela comunidade internacional. Esse governo durou até 20 de
agosto de 2012 quando seu mandato terminou oficialmente e iniciou-se o Governo
Federal da Somália. Nesses governos não tem existido eleições diretas.
Al-Shabab
Al-Shabab significa"A Juventude" em árabe
e surgiu em 2006, como uma ala radical da
extinta União das Cortes Islâmica da Somália enquanto combatia forças
etíopes que invadiram o país para apoiar o fraco governo interino. Nas áreas
sobre seu controle, impôs uma versão rígida da Sharia. O Al-Shabab defende a
versão wahabista do islã, inspirada pela Arábia Saudita, enquanto a maioria dos
somalis segue a linha do sufismo. Esse grupo foi expulso da capital do país,
Mogadíscio, em agosto de 2011. Mas mesmo tendo
perdido o controle das principais cidades e povoados, o grupo ainda tem
influência sobre áreas rurais da Somália. O grupo está sob pressão de várias
frentes, tanto na Somália quanto no Quênia e na Etiópia e usando táticas de
guerrilhas para enfrentar as forças da União Africana (tropas mandadas por
países africanos).
Os Clãs
Há uma importância grande dos clãs na Somália.
A população da Somália vem se dividindo quase por
completo entre as duas principais famílias de clãs: Somale e Sab. Estes,
por sua vez, são subdivididos em seis clãs principais: Hawie, Dir,
Isaq, Darod, Digil e Rahawayn.
Os clãs Hawie, Dir, Isaq e
Darod pertencem à família Somale. Concentram a maior parcela da
população do país, mais de 70%, e têm como característica o fato de serem
pastores nômades criadores de cabras, camelos e ovelhas.
Os clãs Digil
e Rahawayn pertencem à família Sab. Eles são agricultores da
região sul do país, constituindo quase 20% de sua população total.
Pirataria
A existência de pirataria na costa da Somália tem sido uma ameaça à marinha
mercante internacional desde o início da guerra civil, nos anos de 1990. A
atividade dos piratas contribuiu para um
aumento nos custos do transporte marítimo, e impediram a entrega de remessas
assistenciais de alimentos. Noventa por cento das remessas do Programa
Alimentar Mundial são enviados pelo mar, e os navios passaram a precisar de
escolta militar. Os atos de pirataria
foram interrompidos temporariamente quando a União das Cortes Islâmicas
ascendeu ao poder. Com o colapso do governo central, barcos e navios
pescando ilegalmente nas águas da Somália passaram a ser comuns. Os piratas
estavam interessados, inicialmente, em assumir o controle das águas do país
antes que empresários ou milicianos se envolvessem. Certos piratas são antigos
pescadores, que argumentam que os navios estrangeiros estão ameaçando seu
sustento pescando nas águas somalis. Na maioria dos sequestros realizados as
vítimas não são machucadas, para que o pagamento dos resgates seja realizado.
Pelo contrário, os seqüestradores tratam bem seus reféns, na esperança de
receberem os resgates. A pirataria somali tem sido objeto de preocupação de diversos países que tem deslocado navios de guerra para o oceano Índico para proteger navios mercantes.
Comentários finais
A Somália, vive à beira do caos. Além da luta
contra o extremismo islâmico, majoritariamente localizada no Al Shabaab, o país
parece não conseguir se livrar de crises humanitárias que deixam boa parte de
sua população na extrema pobreza. E atualmente, sofre, ainda, com uma das secas
mais severas já vistas. Segundo números recentes da ONU, mais de um milhão de
pessoas foram afetadas por esse fenômeno. Muitas comunidades rurais da Somália
se transformaram em cidades fantasmas após as colheitas falidas e a morte do
gado, que deixou a população sem reserva de alimentos. Politicamente a Somália
continua fragmentada, com um governo central sem muita força política e militar
para integrar todas as regiões do país e com a existência da guerrilha fanática
islâmica que almeja tomar o poder. É nesse contexto de miséria, divisão
territorial, pouco desenvolvimento econômico e com a existência de terrorismo que está a Somália atual.
Sugestão de Filmes e vídeos
1- Filmes
Falcão Negro em Perigo
https://www.youtube.com/watch?v=8nYUtotY2to
https://pt.wikipedia.org/wiki/Black_Hawk_Down
Capitão Philips
www.adorocinema.com/filmes/filme-191696/
https://www.youtube.com/watch?v=noLJBSIM-lY
2-Vídeos sobre a Somália
https://www.youtube.com/watch?v=C08emqE70E4
https://www.youtube.com/watch?v=V9F-ZE434v8
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História
Figura: Google
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