Em 4 de abril de
1914, nascia na colônia francesa da Conchinchina (hoje parte do Vietnã) na
localidade de Gia Định, atualmente o distrito de Binh Than, na ex-Saigon e atual
Cidade de Ho Chi Minh, a romancista, poetisa, novelista, roteirista dramaturga
e diretora de cinema Marguerite Duras. Foi casada duas vezes. A primeira
com Dionys Mascolo e a segunda com Robert Antelme. Teve um filho: Jean
Mascolo.
Os pais dela eram
funcionários do governo colonial francês. Tendo o pai morrido, a mãe, uma
professora primária, investiu suas economias na compra de um terreno para
cultivar arroz, mas foi enganada, pois não lhe disseram que havia um período do
ano em que as terras eram invadidas pelo mar, causando a perda da colheita.
Então a mãe viu-se sem dinheiro e impossibilitada de educar seus três
filhos. A mãe voltou com seus filhos para a França quando Marguerite
tinha 17 anos. Em Paris Marguerite, aos 18 anos, foi estudar Direito,
tornando-se depois escritora. Seu sobrenome de família era Donnadieu e depois
passou a ser Duras, o nome de uma vila onde ficava a casa de seu pai. Os anos
que passou na Indochina a influenciaram na criação de obras. Sobre sua vida em
uma colônia francesa a autora disse: “Digo que eu não podia ser igual
aos franceses da França depois dessa infância”. A luta mal sucedida de sua
mãe contra o sistema colonial foi o tema do romance de 1950: "Uma Barragem
contra o Pacífico”.
Como autora de
peças de teatro, novelas e filmes teve seu trabalho associado com os
movimentos existencialista e do novo romance.
Algumas de suas obras de destaque foram O Amante, A Dor, O Amante da
China do Norte e O Deslumbramento. Foi roteirista do filme “Hiroshima,
meu amor”. Para a jornalista e redatora brasileira Beatriz Prieto: “ O
filme é aberto com imagens da destruição da cidade japonesa e um delicado
monólogo que repete algumas vezes as frases “você está me matando, você me faz
bem”. Junto ao trecho de O Amante, esse fragmento enriquece a
leitura de Emily L., porque eles parecem exprimir feridas que a
francesa insiste em tangenciar e o movimento de tentar transformá-las em
palavras, como se a escrita autorizasse uma ligeira agência diante desse prazer
que também pode matar.”
Ela também foi
diretora de filmes dela mesma, como India Song (1976). Teve
obras literárias suas adaptadas por outros diretores de cinema, por
exemplo, O Amante, em 1992. Este seu livro “O Amante”, de
1984, foi vencedor do prêmio francês Goncourt. Essa obra conta o
relacionamento da própria autora quando adolescente, com um chinês rico. Outras
obras que tiveram relação com a própria vida da escritora foram A Dor e Uma
Barragem contra o Pacífico. Como autora destacou-se como uma voz
importante entre as mulheres européias.
Beatriz Prieto diz sobre a escritora: “Ainda que a escritora
não tenha se declarado feminista, seu texto escancara uma verdade que vai além
da literatura: “as personagens de Duras personificam, mais do que vivem, o
silêncio e a falta”, de acordo com o artigo “A crítica literária
feminista e a crítica literária feminina: O caso de Marguerite Duras”, de
Stephanie Carolina Andreossi. Trazendo a mulher para o seu lugar de ser
faltante, a escritora consegue perpetuar uma crítica ao silenciamento da voz
feminina que, segundo ela mesma, tem o mesmo direito de fala e de
posicionamento que teria o homem. Duras também se inspirou na psicanálise
lacaniana para guiar seu texto, como é possível notar no livro Écrire,
que narra seu processo de escrita e a costura que tentava fazer entre a
personalidade de suas personagens e a teoria psicanalítica.
Em livro de Marguerite Duras, a
experiência amorosa se afasta da representação idílica para ser fonte de
angústia contínua
A despeito da conotação prevalentemente
positiva, amar pode ser uma estranha espécie de exumação: escavação com mãos
nuas nos próprios subterrâneos que traz à tona dores, aversões e desesperos. A
escrita de Marguerite Duras soa entoada por essa sensação: o encontro com o
vazio que invariavelmente arrasta o corpo. No romance Emily L., o
amor é subtraído do campo do idílio para ser construído como algo que deixa os
personagens à deriva. Não é uma deriva total, no entanto.
Na cena inicial, a paisagem é descrita
com uma “amurada que impede a aproximação, frágil e branca”, imagem que
extrapola o delineamento do cenário. Nos diálogos, existe uma amurada ainda
mais concreta, aquela entre duas pessoas que estabelecem uma conversa sem
qualquer margem para compreensão. A amurada invisível indica uma aproximação
impossível: a menor distância entre duas pessoas ainda é enorme (...)”.
Segundo Leyla Perrone-Moisés, ensaísta
e crítica literária:
“A vida de Marguerite Duras se confunde
com sua obra: boa parte desta é autobiográfica e boa parte daquela foi dedicada
à escrita. Podemos dividir sua obra literária em cinco fases ou maneiras: a
"realista", a do "novo romance", a "romanesca", a
"escritural" e a "transparente".
A primeira fase, tributária do romance
norte-americano, é predominantemente narrativa. No romance "Uma Barragem
contra o Pacífico", em "O Marinheiro de Gibraltar" (1952) e
"Os Cavalinhos de Tarquínia" (1953), encontramos uma narradora hábil,
capaz de criar tramas interessantes e personagens verossímeis, representativas
de certo mal-estar social e psicológico da primeira metade do século.
Os livros da segunda fase têm
afinidades com o então triunfante "noveau roman", mais pela temática
da ausência, da solidão e da errança do que pelo experimentalismo técnico, que
não atraía a autora. Desta safra podemos citar "Le Square" (1955),
"Moderato Cantabile" (1958) e "A Tarde do Senhor Andesmas"
(1962).
A terceira fase corresponde ao encontro
de um estilo próprio e de um universo romanesco inconfundível. A essa fase
pertencem "O Êxtase de Lol V. Stein" (1962), obras cujas intrigas e
personagens se entrelaçam, e acabam por desembocar nos filmes "Nathalie
Granger, A Mulher do Ganges" (1973) e "India Song" (1975) (...)”
Também diz a referida ensaísta e
crítica literária: "Seus filmes explorarão a duração psicológica e a
ausência de acontecimentos _"Vera Baxter" (1976), "O
Caminhão" (1977)_, o mesmo ocorrendo em seus livros _"Navire Night"
(1979), "Outside" (1981), "A Doença da Morte" (1982). Pela
indefinição de gênero e pelo tratamento poético do texto, essas obras
correspondem ao que, nos anos 70, se teorizou como "escritura". Uma
escritura de primeira grandeza, que tem afinidades com a de Clarice Lispector.
Quando todos pensavam que Marguerite não mudaria mais e continuaria sendo
aquela autora obsessiva e hermética, sublime e irritante, ela surpreendeu a
todos publicando "O Amante" (1984), narrativa de leitura amena e, ao
mesmo tempo, um texto de grande qualidade estética. Neste livro, Duras contava
a face oculta da história de "Uma Barragem contra o Pacífico": o
escandaloso romance da adolescente francesa de 15 anos com um chinês, relação
iniciática e inesquecível. Como surpresa seguinte, Duras publicou "A Dor"
(1985), narrativa igualmente autobiográfica em que ela relembra os anos da
ocupação nazista. Segundo testemunho da autora, foi um livro que escreveu
chorando. Narra a volta de seu marido, que pertencia à Resistência, do campo de
concentração em que estivera preso; estava paralítico e o amor entre ambos
também já havia mudado, o que tornava a magia duplamente irreparável. Nessas
duas obras, o estilo de Duras apresenta-se transparente e "fácil",
por outras palavras, clássico.”
O filósofo Michel Foucault e a ensaísta
Hélène Cixous, entrevistaram a escritora em 1975 e e o psicanalista Jacques
Lacan, escreveu um um artigo-homenagem sobre o romance O arrebatamento
de Lol V. Stein.
Em outubro de 1988
Duras permaneceu em um hospital por vários meses por problemas decorrentes do
álcool. Teve um amante de 30 anos, muito mais novo que ela, que além de amante
era também enfermeiro e personagem. Criticou os crimes do nazismo, mas também aspectos
do Partido Comunista, embora tenha permanecido com posições de esquerda. Passa
a ser uma severa crítica da extrema direita que surgia. Em 1993 teve de pagar 2
mil dólares ao partido Frente Nacional, pois disse que os integrantes
desse partido eram: "os assassinos, os porcos, o rebotalho dos tempos
modernos".
Morreu em Paris,
em 3 de março de 1996, de câncer, com 81 anos de idade.
Frases
de Marguerite Duras:
“Posso dizer o que quiser, nunca
saberei o motivo pelo qual se escreve, nem como não se escreve.”
“Caminhais em direção da solidão. Eu,
não, eu tenho os livros.”
“Sou mais escritora do que vivente, que
uma pessoa que vive.
Naquilo que vivi, sou mais escritora do que alguém que vive.
É assim que eu me vejo.”
“Muito cedo foi tarde demais em minha vida.”
“No amor não há férias nem nada
parecido. O amor deve viver-se plenamente, com o seu aborrecimento e tudo.”
“Há ilusões que se parecem com a
luz do dia; quando acabam, tudo com elas desapareceu.”
“Um escritor é um país desconhecido.”
“A solidão não se encontra. Nós é que a
fazemos.”
“Os homens gostam das mulheres que
escrevem. Mesmo que não o admitam. “
“Nunca escrevi julgando fazê-lo, nunca
amei julgando amar, nunca fiz nada senão esperar diante da porta fechada.”
Trechos de obra:
A Dúvida, a Solidão, logo... a Escrita
"Na vida, chega um momento - e
penso que ele é fatal - ao qual não é possível escapar, em que tudo é posto em
causa: o casamento, os amigos, sobretudo os amigos do casal. Tudo menos a
criança. A criança nunca é posta em dúvida. E essa dúvida cresce à sua volta.
Essa dúvida, está só, é a da solidão. Nasce dela, da solidão. Podemos já nomear
a palavra. Creio que há muita gente que não poderia suportar o que aqui digo,
que fugiria. Talvez seja por essa razão que nem todos os homens são escritores.
Sim. Essa é a diferença. Essa é a verdade. Mais nada. A dúvida é escrever. É,
portanto, também, o escritor. E com o escritor todo o mundo escreve. É algo que
sempre se soube.
Creio também que sem esta dúvida primeira do gesto em direção à escrita não
existe solidão. Nunca ninguém escreveu a duas vozes. Foi possível cantar a duas
vozes, ou fazer música também, e jogar tênis, mas escrever, não. Nunca."
Marguerite Duras, in "Escrever"
Um Escritor é Uma Contradição
"Um escritor é uma coisa curiosa.
É uma contradição e, também, um contra-senso. Escrever também é não falar. É
calar. É gritar sem ruído. Um escritor é, muitas vezes, repousante: ouve muito.
Não fala muito porque é impossível falar a alguém de um livro que se escreveu
e, sobretudo, de um livro que se está a escrever.
É impossível. É o oposto do cinema, o oposto do teatro e de outros espetáculos.
É o oposto de todas as leituras. É o mais difícil de tudo. É o pior. Porque um
livro é o desconhecido, é a noite, é fechado, é assim. É o livro que avança,
que cresce, que avança em direções que julgávamos ter explorado, que avança em
direção ao seu próprio destino e ao do seu autor, então aniquilado pela sua
publicação: a sua separação dele, do livro sonhado, como da criança
recém-nascida, sempre a mais amada."
Marguerite Duras, in "Escrever"
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Márcio José Matos
Rodrigues-Professor de História.
Figura:
https://www.google.com/search?q=images+marguerite+duras&sxsrf=ALeKk01zSNU1mVpFsG2weRWHGNjItdZ6ag:1617579392727&tbm=isch&source=iu
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