sábado, 20 de março de 2021

O poeta brasileiro Castro Alves

 







Em 14 de março de 1847, nascia o poeta brasileiro Antônio Frederico de Castro Alves, na Fazenda Cabaceiras, na vila de Curralinho, Cachoeira, na Bahia. Teve o apelido de Cecéu, dado em família. A “mucama” Leopoldina lhe contava historias e lendas do sertão. Ele foi representante da Terceira Geração Romântica no Brasil. É o patrono da cadeira nº 7 da Academia Brasileira de Letras. Considerado por críticos como o maior poeta romântico brasileiro. Demonstrou sua indignação por meio de suas poesias em relação aos graves problemas sociais da época. Escreveu poemas como Os Escravos, A Cachoeira de Paulo Afonso e Gonzaga. Poemas assim fizeram com que ele fosse chamado de "poeta dos escravos" e "poeta republicano” por Machado de Assis. Ou como o descreveu Joaquim Nabuco: “nacionalista, poeta social, humano e humanitário”. Afrânio Peixoto disse sobre Castro Alves: "o maior poeta brasileiro, lírico e épico”. Manuel Bandeira por sua vez afirmou sobre ele: "o único e autêntico condor nesses Andes bombásticos da poesia brasileira foi Castro Alves, criança verdadeiramente sublime, cuja glória se revigora nos dias de hoje pela intenção social que pôs na sua obra”.

Castro Alves teve suas primeiras aulas com o professor e curandeiro chamado José Peixoto da Silva. Cursou o primário em São Félix.  O poeta e seu irmão estudaram na cidade de Cachoeira, na classe do mestre-escola Antônio Frederico Loup. Dos tempos sertanejos havia as lembranças do primeiro amor infantil, Leonídia Fraga. Conforme Archimimo Ornelas, as memórias dessa época levaram o poeta a escrever: "Quando a infância corria alegre, à toa (…) Em minha infância refletia-se a tua / Beijei-te as mãos suaves, pequeninas. / Tinhas um palpitar de asas divinas… / Eras — o Anjo da Fé!…";

O pai de Castro Alves era o professor e médico Antônio José Alves e sua mãe era Clélia Brasília da Silva Castro. Tendo sido convidado para lecionar na Faculdade de Medicina em Salvador, em 1854, seu pai vai com a família para essa cidade. Lá o poeta entrou no Ginásio Baiano, onde também estudava Rui Barbosa. Logo cedo Castro Alves seguiu o caminho da poesia. Sua mãe morreu em 1859 e em 9 de setembro de 1860, em uma festa na escola, quando tinha 13 anos, recitou sua primeira poesia em público. Publicou em 1861, ainda estudante no mesmo colégio, versos para homenagear o “mestre do coração” Dom Antônio de Macedo Costa que tinha falecido.

Seu pai casou-se novamente, em 24 de janeiro de 1862 e no dia seguinte Castro Alves e seu irmão José Antônio, embarcam no navio a vapor Oiapoque para a cidade do Recife, pois o poeta iria fazer os preparatórios visando o ingresso na Faculdade de Direito. Nesses tempos Recife estava sendo sacudida pelos ideais abolicionistas e republicanos. O amigo de Castro Alves que acompanhava o poeta nessa época disse sobre ele: "A alma desse menino era de uma pureza inexcedível; a inteligência tinha lampejos que ofuscavam como relâmpago — Hugo em pequeno devia ser assim".

Aos dezesseis anos Castro Alves começou sua maior produção e iniciou seus versos de Os Escravos aos dezessete anos, em 1865. José de Alencar disse a respeito dele: "palpita em sua obra o poderoso sentimento de nacionalidade, essa alma que faz os grandes poetas, como os grandes cidadãos”. Castro Alves se envolveu com destaque na campanha abolicionista assim como Luís Gama, Ruy Barbosa, Joaquim Nabuco e José do Patrocínio. Teve como influências em suas obras escritores como Victor Hugo, Lord Byron, Lamartine e Henrich Heine.

Após cinco meses na cidade do Recife Castro Alves publicou o poema “A Destruição de Jerusalém”. Por duas vezes foi reprovado ao tentar entrar para a Faculdade de Direito. Durante uma apresentação da peça Dalila no Teatro Santa Isabel, Castro Alves fica fascinado pela atriz portuguesa Eugênia Câmara. Sua primeira poesia sobre a escravidão é publicada no jornal “A Primavera”:

“Lá na última senzala, 
Sentado na estreita sala, 
Junto ao braseiro, no chão, 
Entoa o escravo seu canto 
E ao cantar correm-lhe em pranto 
Saudades do seu torrão.”

Ainda muito jovem começa a sentir os primeiro sintomas de tuberculose, enquanto escrevia uma poesia para Eugênia.  Ficou muito triste com a morte de seu irmão José Antônio que cometeu suicídio em 9 de fevereiro de 1864 e nesse ano foi aprovado para fazer o curso de Direito. No jornal “O Futuro” publica poesias, sendo que no número 4 ele publicou uma sátira à academia, assim como aos estudos jurídicos. Nesse mesmo ano ao sentir uma dor no peito e muita tosse, lembra-se da morte da mãe e de outros poetas que tinham morrido de tuberculose. E então escreve “Mocidade e Morte”. Tendo voltado para a Bahia, prejudicou seus estudos e perde assim o ano  na faculdade. Só volta ao Recife em março de 1865, indo viver com uma amante de nome Idalina (que sabia tocar piano e cantava) e continuando o curso de Direito. Depois de uma visita ao amigo Maciel Pinheiro, em prisão escolar por críticas à academia, Castro Alves escreve o poema “Pedro Ivo”, homenageando o líder republicano que fez parte da Revolução Praieira.

Duelou de forma literária com o colega sergipano Tobias Barreto, um escritor que sido amigo de Castro Alves. O tipo de personalidade de Tobias era de uma pessoa nervosa e Castro Alves era do tipo simpático, meigo. Tobias era admirador da atriz Adelaide Amaral e Castro Alves estava enamorado da atriz Eugênia Câmara. Tobias defendia Adelaide e criticava Eugênia. Dois grupos se formaram, um do lado de Adelaide e outro do lado de Eugênia. Castro Alves se inseriu no grupo pró-Eugênia. Castro Alves venceu a disputa com Tobias, atraindo mais a atenção do público e de Eugênia.

Em 11 de agosto de 1865, em uma reunião de abertura das aulas no salão nobre da faculdade, quando houve falas de autoridades, professores e alunos, Castro Alves diz: “Quebre-se o cetro do Papa,/ Faça-se dele uma cruz!/ A púrpura sirva ao povo/ Para cobrir os ombros nus. (...)”. Foi para a Bahia em 16 de dezembro com o poeta Fagundes Varela e rompe com Idalina. Escreveu sobre esse envolvimento com ela o poema “Aves de Arribação”.

Junto com Augusto Guimarães, Rui Barbosa, Plínio de Lima, Regueira Costa e outros no início de 1866 fundaram uma sociedade abolicionista. Não via com simpatias a Guerra do Paraguai, mas mesmo assim tentou se alistar, sendo recusado por suas condições de saúde.

A morte do pai de Castro Alves deixa cinco filhos com menos de 14 anos. O poeta com apenas 19 anos procura ajudar a sua madrasta na criação dos irmãos. Ele estava envolvido na época em um caso de amor com a atriz Eugênia Câmara, dez anos mais velha. O casal foi para a Bahia em 1867,  porque ela iria representar "O Gonzaga ou a Revolução de Minas", drama em prosa escrito por Castro Alves. A obra foi muito bem recebida pelo público. Depois o poeta foi para o Rio do Janeiro. Lá conhece Machado de Assis que o apoiou para entrar no círculo literário. Vai então para São Paulo e nessa cidade concluiu o Curso de Direito. Em 1868 terminou o romance  com Eugênia. Ele teve brigas com ela por causa de ciúmes. Em São Paulo para onde foram ela lhe foi infiel.

Fere em 1869 gravemente o pé esquerdo em uma caçada durante suas férias, o que resulta na perda do pé. Passou a usar uma prótese de madeira. Teve ainda algumas paixões passageiras como com Cândida e Laura, sobre as quais escreveu o poema "Os Anjos da Meia-Noite". Ainda se lembrava de Eugênia e escreveu para ela em 17 de novembro: "Adeus! P'ra sempre adeus! A voz dos ventos / Chama por mim batendo contra as fragas, / Eu vou partir... em breve o oceano / Vai lançar entre nós milhões de vagas...". Ela  respondeu: "Adeus, irmão desta alma, digo-te Adeus! / Mas deixa que eu evite esse jamais! — / Que o céu se compadeça aos rogos meus / E um dia cessarão teus e meus ais!" e "Sim que Deus iluminou a tua fronte / Com um raio divinal de Gênio! e Glória!.. / Vive, sonha, canta, este horizonte!... / O Brasil quer teu nome em sua história" e conclui "Adeus! Se um dia o Destino / Nos fizer ainda encontrar / Como irmã ou como amante / Sempre! Sempre! me hás de achar"

Em Salvador em 1870 escreveu o seu único livro editado em vida: Espumas Flutuantes. Nesse livro há uma poesia lírica, com destaque para o amor sensual e a natureza O poeta na abertura do livro fez uma dedicatória aos familiares mortos. Seu último amor foi a italiana Agnese Trinci Murri, cantora lírica, cuja beleza atraiu o poeta já bem doente. Ele escreve para ela e tenta beijá-la, mas ela não o aceita

Em 6 de julho de 1871 Castro Alves morre em Salvador, devido à tuberculose. Tinha só 24 anos de idade.

A vida de Castro Alves foi mostrada no cinema no filme luso-brasileiro de 1949 Vendaval Maravilhoso. A cantora Amália Rodrigues representou a atriz Eugênia Câmara. O filme não era uma biografia do poeta, apenas inspirou-se na vida dele. Em 1999 o ator Bruno Garcia interpretou Castro Alves no filme Castro Alves-Retrato Falado do Poeta, com destaque para suas lutas pela República e pela Abolição.

Principais obras: Espumas flutuantes ; A cachoeira de Paulo AfonsoOs escravos. Teatro: Gonzaga ou a Revolução de Minas.

Segundo a Professora licenciada em Letras Daniela Diana:

 

“Castro Alves (1847-1871) foi um dos últimos grandes poetas do Romantismo no Brasil. Sua obra representa, na evolução da poesia romântica brasileira, um momento de maturidade e de transição.

Maturidade, em relação a algumas atitudes ingênuas das gerações anteriores, como a idealização amorosa e o nacionalismo ufanista, às quais o poeta dava um tratamento mais crítico e realista.

Transição, porque sua visão mais objetiva diante da realidade aponta para o movimento literário seguinte, o Realismo, que já predominava na Europa.”

 

Segundo Diva Frazão:

“Castro Alves é a maior figura do Romantismo. Desenvolveu uma poesia sensível aos problemas sociais de seu tempo e defendeu as grandes causas da liberdade e da justiça.

Denunciou a crueldade da escravidão e clamou pela liberdade, dando ao romantismo um sentido social e revolucionário que o aproximava do Realismo. Sua poesia era como um grito explosivo a favor dos negros, sendo por isso denominado “O Poeta dos Escravos”.

Sua poesia é classificada como “Poesia Social”, que aborda o tema do inconformismo e da abolição da escravatura, através da inspiração épica e da linguagem ousada e dramática como nos poemas: Vozes d’África e Navios Negreiros, da obra Os Escravos (1883), que ficou inacabada.”



Poemas de Castro Alves:



Tragédia no mar- Trecho do poema “O navio negreiro



Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri! [...]

 

Mocidade e morte

Oh! Eu quero viver, beber perfumes
Na flor silvestre, que embalsama os ares;
Ver minh’alma adejar pelo infinito,
Qual branca vela n’amplidão dos mares.
No seio da mulher há tanto aroma...
Nos seus beijos de fogo há tanta vida...
— Árabe errante, vou dormir à tarde
À sombra fresca da palmeira erguida.

Mas uma voz responde-me sombria:
Terás o sono sob a lájea fria.

Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma um cisne de douradas plumas:
Não! o seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas.
Vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas.
Minh’alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas...

E a mesma voz repete-me terrível,
Com gargalhar sarcástico: — impossível!

Eu sinto em mim o borbulhar do gênio.
Vejo além um futuro radiante:
Avante! — brada-me o talento n’alma
E o eco ao longe me repete — avante! —
O futuro... o futuro... no seu seio...
Entre louros e bênçãos dorme a glória!
Após — um nome do universo n’alma,
Um nome escrito no Panteon da história.

E a mesma voz repete funerária: —
Teu Panteon — a pedra mortuária!

Morrer — é ver extinto dentre as névoas
O fanal, que nos guia na tormenta:
Condenado — escutar dobres de sino,
— Voz da morte, que a morte lhe lamenta —
Ai! morrer — é trocar astros por círios,
Leito macio por esquife imundo,
Trocar os beijos da mulher — no visco
Da larva errante no sepulcro fundo.

Ver tudo findo... só na lousa um nome,
Que o viandante a perpassar consome.

E eu sei que vou morrer... dentro em meu peito
Um mal terrível me devora a vida:
Triste Ahasverus, que no fim da estrada,
Só tem por braços uma cruz erguida.
Sou o cipreste, qu’inda mesmo flórido,
Sombra de morte no ramal encerra!
Vivo — que vaga sobre o chão da morte,
Morto — entre os vivos a vagar na terra.

Do sepulcro escutando triste grito
Sempre, sempre bradando-me: maldito! —

E eu morro, ó Deus! na aurora da existência,
Quando a sede e o desejo em nós palpita...
Levei aos lábios o dourado pomo,
Mordi no fruto podre do Asfaltita.
No triclínio da vida — novo Tântalo —
O vinho do viver ante mim passa...
Sou dos convivas da legenda Hebraica,
O ‘stilete de Deus quebra-me a taça.

É que até minha sombra é inexorável,
Morrer! morrer! soluça-me implacável.

Adeus, pálida amante dos meus sonhos!
Adeus, vida! Adeus, glória! amor! anelos!
Escuta, minha irmã, cuidosa enxuga
Os prantos de meu pai nos teus cabelos.
Fora louco esperar! fria rajada
Sinto que do viver me extingue a lampa...
Resta-me agora por futuro — a terra,
Por glória — nada, por amor — a campa.

Adeus! arrasta-me uma voz sombria
Já me foge a razão na noite fria!...

 

Dedicatória

A pomba d’aliança o voo espraia

Na superfície azul do mar imenso,

Rente... rente da espuma já desmaia

Medindo a curva do horizonte extenso...

Mas um disco se avista ao longe... A praia

Rasga nitente o nevoeiro denso!...

O pouso! ó monte! ó ramo de oliveira!

Ninho amigo da pomba forasteira!...

 Assim, meu pobre livro as asas larga

Neste oceano sem fim, sombrio, eterno...

O mar atira-lhe a saliva amarga,

O céu lhe atira o temporal de inverno...

O triste verga à tão pesada carga!

Quem abre ao triste um coração paterno?...

É tão bom ter por árvore — uns carinhos!

É tão bom de uns afetos — fazer ninhos!

 

 

Pobre órfão! Vagando nos espaços

Embalde às solidões mandas um grito!

Que importa? De uma cruz ao longe os braços

Vejo abrirem-se ao mísero precito...

Os túmulos dos teus dão-te regaços!

Ama-te a sombra do salgueiro aflito...

Vai, pois, meu livro! e como louro agreste

Traz-me no bico um ramo de... cipreste!

 

 

O laço de fita

Não sabes, criança? 'Stou louco de amores...
Prendi meus afetos, formosa Pepita.
Mas onde? No templo, no espaço, nas névoas?!
Não rias, prendi-me
Num laço de fita.

Na selva sombria de tuas madeixas,
Nos negros cabelos da moça bonita,
Fingindo a serpente qu'enlaça a folhagem,
Formoso enroscava-se
O laço de fita.

Meu ser, que voava nas luzes da festa,
Qual pássaro bravo, que os ares agita,
Eu vi de repente cativo, submisso
Rolar prisioneiro
Num laço de fita.

E agora enleada na tênue cadeia
Debalde minh'alma se embate, se irrita...
O braço, que rompe cadeias de ferro,
Não quebra teus elos,
Ó laço de fita!

Meu Deusl As falenas têm asas de opala,
Os astros se libram na plaga infinita.
Os anjos repousam nas penas brilhantes...
Mas tu... tens por asas
Um laço de fita.

Há pouco voavas na célere valsa,
Na valsa que anseia, que estua e palpita.
Por que é que tremeste? Não eram meus lábios...
Beijava-te apenas...
Teu laço de fita.

Mas ai! findo o baile, despindo os adornos
N'alcova onde a vela ciosa... crepita,
Talvez da cadeia libertes as tranças
Mas eu... fico preso
No laço de fita.

Pois bem! Quando um dia na sombra do vale
Abrirem-me a cova... formosa Pepital
Ao menos arranca meus louros da fronte,
E dá-me por c'roa...
Teu laço de fita.

 

 

Os Três Amores


Minh’alma é como a fronte sonhadora
Do louco bardo, que Ferrara chora...
Sou Tasso!... a primavera de teus risos
De minha vida as solidões enflora...
Longe de ti eu bebo os teus perfumes,
Sigo na terra de teu passo os lumes...
— Tu és Eleonora...

II

Meu coração desmaia pensativo,
Cismando em tua rosa predileta.
Sou teu pálido amante vaporoso,
Sou teu Romeu... teu lânguido poeta!...
Sonho-te às vezes virgem... seminua...
Roubo-te um casto beijo à luz da lua...
— E tu és Julieta...

III

Na volúpia das noites andaluzas
O sangue ardente em minhas veias rola...
Sou D. Juan!... Donzelas amorosas,
Vós conheceis-me os trenos na viola!
Sobre o leito do amor teu seio brilha...
Eu morro, se desfaço-te a mantilha...
Tu és — Júlia, a Espanhola!...

Amar e Ser Amado

Amar e ser amado! Com que anelo
Com quanto ardor este adorado sonho
Acalentei em meu delírio ardente
Por essas doces noites de desvelo!
Ser amado por ti, o teu alento
A bafejar-me a abrasadora frente!
Em teus olhos mirar meu pensamento,
Sentir em mim tu’alma, ter só vida
P’ra tão puro e celeste sentimento
Ver nossas vidas quais dois mansos rios,
Juntos, juntos perderem-se no oceano,
Beijar teus labios em delírio insano
Nossas almas unidas, nosso alento,
Confundido também, amante, amado
Como um anjo feliz... que pensamento!?

"Coração de Filigrana de Oiro"

Ai! Pobre coração! Assim vazio
E frio
Sem guardar a lembrança de um amor!
Nada em teu seio os dias hão deixado!…
É fado?
Nem relíquias de um sonho encantador? Não, frio coração! É que na terra
Ninguém te abriu…Nada teu seio encerra!
O vácuo apenas queres tu conter!
Não te faltam suspiros delirantes,
Nem lágrimas de afeto verdadeiro…
- É que nem mesmo o oceano inteiro
Poderia te encher!

 


As Duas Flores

São duas flores unidas
São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo,no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.
Unidas, bem como as penas
das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.
Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.
Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

                         

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

  

 Figura:



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