quarta-feira, 3 de março de 2021

O compositor Heitor Villa-Lobos

 




Em 5 de março de 1887, na cidade do Rio de Janeiro (na época era o chamado Município Neutro, onde ficava a sede do governo imperial) nasceu o famoso e talentoso compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos. Além de compositor foi maestro, pianista, violoncelista e violonista. Ficou conhecido como "a figura criativa mais significativa do Século XX na música clássica brasileira". Tornou-se o mais conhecido compositor sul-americano. Na sua criação estão obras as mais diversas, como orquestrais, de câmara, instrumentais e vocais, sendo mais de duas mil obras até sua morte. Foi um importante descobridor de uma linguagem peculiarmente brasileira em música. Destacou-se como modernista na música e criou obras com características regionais brasileiras, indo na fonte de músicas populares e indígenas, tendo influências do folclore brasileiro e de elementos estilísticos da música da Europa. Um exemplo disso foi a criação de Bachianas Brasileiras. O dia de nascimento de Villa-Lobos é celebrado como “Dia Nacional da Música Clássica”.

 O pai do compositor, Raul Villa-Lobos, era funcionário da Biblioteca do Senado Nacional e músico amador. A mãe era Noêmia Monteiro Villa-Lobos. Ela queria vê-lo formar-se em medicina e o pai deu a ele instrução musical. Com seis anos de idade Heitor foi incentivado por seu pai a reconhecer características do gênero, caráter, origem, estilo e ruído musicais. Uma tia sua o influenciou a ouvir composições de Johann Sebastian Bach, compositor que foi importante em futuras criações de Heitor Villa-Lobos.

O pai morreu quando Heitor tinha 13 anos. Passou a se aperfeiçoar no violão. Foi várias vezes a localidades do interior brasileiro, começando asim a ser influenciado pelo universo musical do Brasil. Esteve no Nordeste em 1905, ficando fascinado com o folclore. Escreveu em 1907 “Os Cantos Sertanejos”, para pequena orquestra. Um fato importante dessa época foi a inauguração do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1909, que teve em seu início a referência o modelo parisiense. Lá eram encenadas as óperas dos italianos Gaetano Donizetti (1797-1848), Vincenzo Bellini (1801-1835), Giacomo Puccini (1858-1924) e Giuseppe Verdi (1813-1901). As óperas eram de origem italiana e a música de salão tocada era de compositores franceses. Nesse contexto cultural onde estava o jovem Heitor também existia outro aspecto, de característica popular que era o choro, tocado nas ruas, em lugares públicos, nos bares. Ele passou a participar do grupo do violonista Quincas Laranjeiras (1873-1935). Matriculou-se no curso de Harmonia de Frederico Nascimento, no Instituto Nacional de Música, mas teve dificuldades de adaptação à disciplina dos estudos. Tocava violoncelo, piano, violão e saxofone nos teatros e cinemas cariocas como meio de sustento. Começou uma produção de obras musicais compondo Suíte Floral Para Piano” (1914), “Danças Africanas” (1914), “Uirapuru” (1917) e “Canto do Cisne Negro Para Piano e Violoncelo” (1917), “Amazonas” (1917) etc. Casou-se com a pianista Lucília Guimarães em 1913, indo morar na cidade do Rio de Janeiro.

Nos anos de 1920 Villa-Lobos foi audaciosamente criativo, tendo produzido serestas, choros, os Estudos para violão e as Cirandas para piano. A sua estreia oficial na Semana de Arte Moderna, em São Paulo, em 1922 foi o começo para ele se projetar internacionalmente como um criador original, embora tenham existido vaias durante a apresentação de sua música moderna. Ainda não havia uma compreensão da crítica sobre a sua música. Com 36 anos, em 1923, obtendo financiamento do governo, foi a Paris onde mostrou seu talento. Em Paris pôde conhecer as músicas do russo Igor Stravinsky (1882-1971) e do húngaro Béla Bartók (1881-1945), que o inspiraram e ele fez uma ligação desse tipo de música com a sua experiência com a música urbana carioca

Em 1927 o milionário carioca Carlos Guinle financiou uma segunda viagem de Villa- Lobos para a Europa , que voltou ao Brasil somente em 1930. Logo após a sua volta ao Brasil, Heitor fez uma turnê pelo país, apresentando-se em 66 cidades. Nos anos 30 seu primeiro casamento acabou. Heitor operou-se de um câncer em 1948. Passou a viver com Arminda Neves d'Almeida, a Mindinha, que tinha sido sua aluna. Eles não chegaram a se casar. Foi Arminda que divulgou ainda mais as obras de Villa-Lobos depois que ele faleceu e se tornou diretora do Museu de Villa-Lobos em 1960. Ela teve bastante influência no trabalho dele, que dedicou várias composições à Arminda . Mas Lucília, segundo estudiosos, teve também sua influência no trabalho de Villa-Lobos, embora tenha sido uma influência sutil. Segundo o pesquisador Luís Gustavo Torres, a troca de experiências entre Lucília e Villa-Lobos possibilitou a composição Ondulando, de 1914, pois possui uma forte influência do romantismo europeu. Lucília, ao contrário do marido, era uma pianista estudiosa dos compositores românticos Schumann e Chopin. O pesquisador disse: “A obra parece ter sido feita por alguém que conhecia bem esse tipo de linguagem pianística.” Houve decerto algum tipo de parceria musical entre eles enquanto estiveram casados, mesmo que Villa-Lobos não tenha reconhecido isso publicamente.

As obras de Villa-Lobos tiveram impacto muito grande no exterior, como na França e nos Estados Unidos. O The New York Times, dedicou a Heitor Villa-Lobos um editorial no dia seguinte à morte do compositor. Os estilos europeus da virada do século XIX para o século XX, influenciaram Villa-Lobos em suas primeiras composições. Os compositores Wagner, Puccini, o modernismo da Escola de Frankfurt e os impressionistas exerceram influências sobre Villa-Lobos. Mas em 1914 já existia uma crítica dele aos moldes europeus e ele começou a descobrir uma linguagem própria. Exemplo disso foi a série de peças para piano Danças características africanas.

Na era Vargas as publicações de Villa-Lobos tinham propaganda pela nacionalidade brasileira e também estavam relacionadas à teoria musical. No filme “O Descobrimento do Brasil", de 1936 há música de Villa-Lobos, que foi adaptada para suíte orquestral. Na sua publicação A Música Nacionalista no Governo Getúlio Vargas (1941), Villa-Lobos considerava a nação como entidade sagrada. Ele fez parte de um comitê visando estabelecer uma versão definitiva para o hino nacional. Na ditadura do Estado Novo Villa-Lobos continuou produzindo obras patrióticas. Para a celebração do dia 7 de setembro (“Dia da Independência”), em 1943, Villa-Lobos compôs o ballet Dança da terra, que não foi bem considerado pelas autoridades, o que obrigou a uma revisão. Também em 1943 houve o hino de Villa-Lobos Invocação em defesa da pátria, numa época de guerra, na qual o Brasil iria entrar contra a Alemanha nazista. Nessa época, quando vigorava o Estado Novo, ele foi Secretário de Educação Musical e dava orientações a professores para que soubessem como ensinar música aos seus alunos.

Em sua vida musical, houve discípulos e colaboradores de Villa-Lobos, como os compositores, regentes e instrumentistas que trabalhavam com ele de várias formas para que funcionasse o projeto de Canto Orfeônico nas escolas públicas brasileiras, assim como em grandiosos espetáculos e também na  revisão, cópia e organização de suas partituras. Dois grandes parceiros de Villa-Lobos foram os maestros e pianistas José Vieira Brandão e Alceo Bocchino.

Villa-Lobos não dizia que fazia parte de algum movimento específico dentro da área musical. O grande público por um tempo considerável não o conheceu e houve severas críticas de alguns especialistas em música. Nos últimos de sua vida ele estava sendo criticado por sua postura política. Entre seus críticos estavam os seguidores de novas tendências europeias, como o serialismo. Alguns compositores brasileiros queriam que houvesse uma volta de certos modelos europeus, considerados como um tipo de música mais universal. O compositor faleceu no dia 17 de novembro de 1959, aos 72 anos, na cidade do Rio de Janeiro, vítima de câncer. Não teve filhos. 

Mesmo tendo recebido críticas, houve um notável reconhecimento nacional e internacional a respeito de Villa-Lobos. Ele recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Nova Iorque e foi o fundador e primeiro presidente da Academia Brasileira de Música. Era membro a Academia de Belas Artes de Nova Iorque. Apareceu pessoalmente no filme da Disney “Alô Amigos” , em 1940, ao lado de Walt Disney. Villa-Lobos foi retratado nos filmes Bachianas Brasileiras: Meu Nome é Villa-Lobos, de 1979; O Mandarim, de 1995 e Villa-Lobos, Uma Vida de Paixão, do ano 2000. A esfígie do compositor foi impressa em notas de quinhentos cruzados em 1986. Há ruas, parques, praças com nome de Villa-Lobos em cidades brasileiras, como o Parque Villa-Lobos, em São Paulo.

Dilva Frazão cita as seguintes curiosidades sobre Villa-Lobos:

“Heitor Villa-Lobos contrariou sua mãe quando entrou para a escola de música, pois o desejo dela era que ele entrasse para a faculdade de medicina.

Na Semana de Arte Moderna, em São Paulo, Heitor Villa-Lobos se apresentou de casaca e chinelo, pois estava sofrendo com sintomas da “gota”.

Um episódio turbulento da vida pessoal do maestro ocorreu em 1936, em uma viagem a Berlim, quando ele mandou uma carta desmanchando o casamento de 23 anos com a pianista Lucília Guimarães. Ele viajou em companhia de Arminda Neves d’Almeida, professora de música, então com 24 anos (quando ele tinha 46). A união com Arminda durou até sua morte.”.

Conforme disse Daniela Diana (licenciada em Letras pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) em 2008 e Bacharelada em Produção Cultural pela Universidade Federal Fluminense) a respeito de Villa Lobos:  “Villa Lobos foi um importante compositor brasileiro, além de instrumentista, regente e professor de música. Durante sua vida, criou cerca de mil obras. Cirandas, choros, sinfonias, música de câmara, óperas e outros gêneros musicais — em tudo o que compôs, imprimiu uma marca de brasilidade.” Ainda segundo Daniela: Entre as cerca de mil composições do maestro Heitor Villa-Lobos é possível destacar: Cantilena; O Trenzinho Caipira; Uirapuru; Choros nº 1 e Choros nº 5”.

 Frases de Heitor Villa-Lobos

"Quando procurei formar a minha cultura, guiado pelo meu próprio instinto e tirocínio, verifiquei que só poderia chegar a uma conclusão de saber consciente, pesquisando, estudando obras que, à primeira vista, nada tinham de musicais. Assim, o meu primeiro livro foi o mapa do Brasil. O Brasil que eu palmilhei, cidade por cidade, estado por estado, floresta por floresta, perscrutando a alma de uma terra."

Certa vez Villa-Lobos proferiu as seguintes frases em uma turnê pela Europa: "Eu não uso o folclore, eu sou o folclore." (I don't use folklore, I am the folklore.) e também "eu não estou aqui pra aprender, mas sim para mostrar o que eu até então construí" (Ich bin nichtgekommen, um zulernen, sondern um zuzeigen, wasichbishergemachthabe).

“A minha música é o reflexo da sinceridade.”

“Eu somente sou útil, de alguma forma, através da música.”

“Muitos compositores de nossa época pretendem ser modernos, sem possuir o dom da originalidade. E não compreendem que todo artista original é moderno por força.”

“Considero minhas obras como cartas que escrevi à posteridade, sem esperar resposta.”

“Quando o criador é original por natureza, pouco importam os meios de que se vale para fixar seu pensamento.”

“A música folclórica é a expansão, o desenvolvimento livre do próprio povo expresso pelo som.”

“É preciso fazer o mundo inteiro cantar. A música é tão útil quanto o pão e a água.”

“O Brasil reconhece a minha glória, me incensa, me acha formidável, mas ignora o principal de minha obra. Gostaria de saber o motivo, mas não posso perder tempo em descobri-lo.”

“Sim sou brasileiro e bem brasileiro. Na minha música deixo cantar os rios e os mares deste grande Brasil. Eu não ponho mordaça na exuberância tropical de nossas florestas e dos nossos céus, que transporto instintivamente para tudo que escrevo.”

Melodia Sentimental

Acorda, vem ver a lua
Que dorme na noite escura
Que surge tão bela e branca
Derramando doçura
Clara chama silente
Ardendo meu sonhar

As asas da noite que surgem
E correm no espaço profundo
Oh, doce amada, desperta
Vem dar teu calor ao luar

Quisera saber-te minha
Na hora serena e calma
A sombra confia ao vento
O limite da espera
Quando dentro da noite
Reclama o teu amor

Acorda, vem olhar a lua
Que brilha na noite escura
Querida, és linda e meiga
Sentir meu amor e sonhar

Composição: Dora/ Heitor Villa-Lobos

 https://www.youtube.com/watch?v=F-HZYe5kqSQ

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura: https://www.google.com/search?q=imagem+de+heitor+villa+lobos&sxsrf=ALeKk0309YNDv_DyAr8HsEoyB0kpJgIhoQ:1614798460052&tbm=isch&source=


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