Em 3 de junho de 1875 falecia
em Bouagival, França, o compositor francês Georges Bizet. Sua especialidade
eram as óperas. Como teve uma carreira curta, não teve muitos sucessos antes de
Carmen, sua obra principal, que é uma das óperas mais populares e bastante
tocada até os dias de hoje.
O nascimento de Georges Bizet
foi em Paris, em 25 de outubro de 1838, tendo sido registrado como
Alexandre César Léopold e depois batizado como “Georges” em 16 de março de
1840. O pai de Georges era Adolphe Bizet, que foi cabeleireiro e barbeiro antes
de ser um professor de canto. Também foi autor de algumas composições musicais.
A mãe de Georges era Aimée Delsarte. Os pais dela não queriam que ela se
casasse com Adolphe por não verem futuro em um casamento dela com ele. A
família de Aimée era ligada à cultura e à música. Ela foi pianista e o irmão
François foi um destacado cantor e professor que se apresentava em espetáculos
para a nobreza francesa. A mãe dela também foi cantora e professora de canto.
Georges Bizet tinha facilidade
para aprender música e sua mãe lhe deu as primeiras lições de piano. Ele quando
criança escutava por trás da porta as aulas de música de sua mãe e como tinha
boa memória aprendia técnicas importantes sobre canto. A habilidade dele
animaram seus pais que o matricularam no Conservatório em Paris antes da idade
mínima geralmente exigida que era de dez anos. O professor que o entrevistou
para ver se tinha capacidade ficou tão surpreso com as habilidades de Georges
que resolveu autorizar a entrada do menino ainda que não tivesse completado dez
anos.
Enquanto estava estudando
Bizet conheceu o compositor Charles Gounod, que o influenciou. Graças às aulas
do professor de piano Antoine François Marmontel o jovem Bizet foi melhorando
como pianista, tendo vencido o segundo prêmio para piano do Conservatório em
1851 e em 1852 venceu o primeiro prêmio.
Bizet compôs suas primeiras
obras em 1850. Em 1853, tendo aulas de composição de Jacques com Fromental
Halévy, produziu mais obras e foi melhorando a qualidade delas. Duas canções
publicadas em 1854 foram: "Petite Marguerite" e "La Rose et
l'abeille”. Em 1855 Bizet escreveu uma abertura para uma
grande orquestra e criou peças de piano para dois trabalhos de Gounod: a
ópera La nonne sanglante e a Sinfônica em Ré. E
quando tinha dezessete anos escreveu uma sinfonia. Participou de uma
competição de óperas para jovens compositores que que Jacques
Offenbach organizou. Bizet dividiu o prêmio com Charles Lecocq. Já conhecido,
passou a ser convidado por Offenbach para suas festas às sextas-feiras. Foi
numa dessas ocasiões que Bizet conheceu Rossini.
No concurso Prix de Rome em
1857 Bizet foi premiado com seu desempenho na cantata Clovis et
Clotilde de Amédée Burion, passando a receber um financiamento por
cinco anos. Os primeiros dois anos ele passou em Roma, o terceiro deveria ter
sido na Alemanha (mas ele pediu para ficar na Itália e não ir para a Alemanha)
e os dois últimos em Paris. Quando esteve em Roma um trabaho seu que foi
elogiado foi uma ópera buffa: Dom Procopio (1858/1859).
Um Te Deum que ele havia composto durante seus primeiros seis
meses para concorrer no Prêmio Rodrigues em Roma não teve
sucesso. Após Don Procopio, nesse período romano, Bizet
terminou seu poema sinfônico Vasco da Gama.
Depois de ter ficado no
exterior por alguns anos Bizet percebeu em sua volta a Paris que muitos teatros
de ópera dessa cidade tinham como preferência o repertório clássico. Ele não
conseguia levar adiante suas composições para orquestras e para piano, o que
fez com que sua carreira ficasse parada. Ele tinha de pagar seus custos por
meio de organização e transcrição da música de outros autores. Ele começava
projetos teatrais nos anos de 1860, porém abandonava. Mas duas óperas suas
foram bem sucedidas nos palcos: Les pêcheurs de perles e La
jolie fille de Perth.
Bizet teve a oportunidade de
mostrar seu talento como pianista em maio de 1861 em um jantar em que estava o
famoso pianista Franz Liszt. Bizet tocou muito bem uma obra de Liszt e esse
disse: "Pensei que havia apenas dois homens capazes de superar as
dificuldades da obra, mas há três e o mais novo é talvez o mais ousado e mais
brilhante".
Em 1862 nasceu um filho de
Bizet com uma empregada da família. Mas ele não o assumiu como sendo seu filho
e somente muitos anos depois da morte do compositor é que a mãe desse filho de
Bizet revelou o verdadeiro nome do pai para o filho. De 1870 a 1871, Bizet
esteve na Guarda Nacional durante a Guerra Franco-Prussiana. Após isso ele
conseguir ter pequenos sucessos com a ópera Djamileh, de um ato. Também a suíte
orquestral L’Arlésienne tornou-se logo popular.
Bizet se casou com Geneviève
Halévy (apesar de certa resistência inicial de familiares dela que não o
achavam adequado para casar com Geneviève ) em junho de 1869 e
tiveram um filho. As obras de Bizet após sua morte foram ignoradas por muitos
anos com exceção de Carmen. Ele não tinha deixado discípulo ou
sucessor. No século XX trabalhos de Bizet começaram a ser mais interpretados e
seu talento foi destacado como compositor.
Por necessidade financeira, Bizet
começou a dar aulas de piano e de composição. Também tinha o trabalho de
acompanhar ensaios de audições para óperas. Na época ele fez transcrições para
piano de centenas de óperas e outras peças, preparou partituras e fez arranjos
orquestrais, como também foi brevemente um crítico musical em 1867.
Bizet terminou uma
ópera, Ivan IV, baseada na vida do czar Ivan, O Terrível.
Entretanto não conseguiu que fosse encenada. A mesma só foi apresentada em
1946, muitos anos após o compositor ter morrido. Ele e outros três compositores
criaram em 1867 a ópera Marlborough s'en va-t-en guerre em
quatro atos. Cada compositor foi responsável por um ato. A ópera fez
sucesso. Mas nessa mesma época Bizet passou por frustrações, pois
duas óperas foram abandonadas sem serem concluídas e também não teve sucesso em
competições musicais. Foi só em 28 de fevereiro de 1869 que o compositor pôde
apresentar sua Sinfonia Roma. As obras Clarissa Harlowe e Grisélidis em
que Bizet estava trabalhando ficaram incompletas e não puderam ser apresentadas.
Ele conseguiu terminar em 1871 seu dueto para piano intitulado Jeux
d'enfants e uma ópera em um ato, Djamileh, que teve sua
estreia em maio de 1872 no Opéra-Comique em Paris.
Em 1873 Bizet começou seus
trabalho de criação da ópera Carmen, com base na novela do mesmo nome de
Prosper de Mérimée. Por um tempo esse trabalho ficou suspenso. Havia temor
de que temas de traição e assassinato pudessem não ser bem aceitos pelo público.Em
outubro de 1874 começaram os ensaios. De início músicos e membros do coro
tiveram resistências à partes da ópera. Também havia críticas moralistas de
pessoas da companhia de teatro. A estreia finalmente foi em março de 1875, com
a presença de grandes nomes da música: Jules Massenet, Camille
Saint-Saëns e Charles Gounod. Mas essa primeira apresentação
desanimou Bizet, que achou que tinha fracassado, havendo na ocasião críticas
moralistas da imprensa em relação ao comportamento liberal da principal
personagem. O público de início não se entusiasmou.
Bizet por anos
sofreu devido a problemas na garganta, o que pode ter se agravado por causa de
dias que trabalhava muitas horas e pelo fumo. Em 1875, após ter considerado que
a ópera Carmen não tinha sido bem sucedida, piorou em maio, teve
febre alta e dores e em 3 de junho teve um ataque cardíaco fulminante e morreu.
No dia do funeral, em 5 de junho, a imprensa que antes o havia criticado enfim
o elogiou como um grande compositor. Ele faleceu três meses depois da estreia
de Carmen e não soube que essa ópera viria a ser depois um
sucesso.
Comentários
de especialistas sobre a principal obra de Bizet, a ópera Carmen:
Segundo
Frederico Toscano:
“Ao morrer em junho
de 1875, aos 36 anos, o compositor francês Georges Bizet (1838-1875) não tinha
sobrevivido o bastante para saber que sua ópera Carmen tornar-se-ia
uma das mais queridas obras musicais jamais escritas e a mais amada de todo o
repertório francês. Hoje, Carmen está sempre no segundo ou
terceiro lugar – quando não no primeiro – nas listas das preferidas das
plateias e dos críticos. Era a ópera favorita da rainha Vitória do Reino Unido,
de Otto von Bismarck e de James Joyce; foi incluída em romances por Thomas Mann
e até pelo desafinado – e totalmente destituído de ouvido musical – Vladimir
Nobokov; sua história foi recontada um sem-número de vezes em filmes. Friedrich
Nietzsche, um apaixonado discípulo de Wagner que se voltou contra seu ídolo
depois da década de 1870, terminou sua vida louvando Carmen:
“Ontem ouvi – você não vai acreditar –
a obra-prima de Bizet, pela vigésima vez […]. Essa música me parece ser
perfeita. Ela se aproxima com leveza, maleável e polidamente. É agradável,
não transpira. ‘O que é bom é leve, tudo que é divino move-se com
pés gentis’: o princípio número um de minha estética. A música é funesta,
sutilmente fatalista: ao mesmo tempo ela continua popular – sua sutileza
pertence à raça, não ao indivíduo. É rica. É precisa. Ela constrói, organiza,
termina: assim, ela se constitui no oposto ao pólipo na música, a ‘melodia
infinita’. Alguma vez ouviram num palco acentos mais dolorosos, mais trágicos?
E como se os consegue? Sem trejeitos. Sem contrafação. Sem a mentira do grande
estilo!”
Bizet tinha a certeza
de estar fazendo algo de inteiramente novo: “Os críticos afirmam que sou
obscuro, complicado e tedioso, mais preocupado com a habilidade técnica do que
iluminado pela inspiração. Pois bem, desta vez escrevi uma obra que é toda
feita de clareza e vivacidade, que está cheia de cor e melodia”, afirmou ele.
Essa confiança em sua criação, porém, não impediu Carmen de
ser um fracasso ao estrear, em 3 de março de 1875, no Théâtre de l’Opéra
Comique, em Paris, o que o abateu fortemente. O que teria causado tal fiasco?
Carmen é uma personagem absolutamente
inédita, em termos de universo operístico, e vai influenciar muito todo o
teatro lírico realista do futuro. Nada tem em comum com a heroína tradicional,
pura, sofredora, um joguete nas mãos dos homens e do destino. É amoral,
complexa, combina em si traços tanto de heroína quanto de vilã, mas de uma
forma que a coloca acima dos julgamentos da moral corrente. Junto com Don
Giovanni, Violetta Valéry, Manon Lescaut, Salomé, Lulu, faz parte daquela
galeria de personagens que não se sentem culpadas por terem um comportamento
que os padrões morais vigentes consideram “irregular”. Sim, isso era demais
para o público de 1875…”
Segundo Osvaldo Colarrusso :
“A ópera Carmen de
Bizet é uma das obras mais populares do repertório lírico, admirada até mesmo
por homens sisudos como Friedrich Nietsche e Johannes Brahms. Eu mesmo, que
tive a oportunidade de reger a obra diversas vezes, julgo a Carmen uma ópera
excepcionalmente feliz em sua extrema musicalidade associada a um belo trabalho
criativo. No entanto existe um trecho da partitura que foi surrupiado de forma,
vamos dizer, desleal. A Habanera, que marca a entrada do personagem título da
obra, foi desavergonhadamente copiada de uma partitura composta duas décadas
antes da conclusão da ópera. O verdadeiro autor da Habanera da ópera Carmen foi
Sebastián Iradier, compositor espanhol que viveu de 1809 até 1865. Faleceu dez
anos antes da catastrófica estreia da ópera.
Iradier e as Habaneras
Iradier esteve em Cuba e no México em 1840, e acabou trazendo para a
França, onde sua obra foi editada, um enorme apreço por Habaneras. Iradier foi
um especialista neste ritmo, e é justo lembrar que a febre que existiu sobre o
ritmo da américa central está presente em obras de seus contemporâneos como
Louis Moreau Gottschalck e Emanuel Chabrier, e compositores posteriores como
Debussy, Ravel, e Alban Berg. Iradier é autor de uma Habanera muito popular até
hoje, que é chamada La Paloma, que já foi interpretada por grandes
cantoras como Victoria de Los Angeles e Montserrat Caballé. A obra de Iradier
que Bizet copiou foi El Arreglito, de 1855. Quem a escuta fica
impressionado que Bizet não apenas copiou a melodia, mas a própria alternância
entre uma parte inicial em modo menor e uma sequência em modo maior. Bizet
aperfeiçoa muitos detalhes mas existe mesmo o plágio (...)”
Sugestões de vídeos:
Trecho da ópera Carmen - Abertura
https://www.youtube.com/watch?v=E_EL6upyvak
Trecho da ópera
Carmen - Habanera “L’Amour est um oiseau rebelle”
https://www.youtube.com/watch?v=oGqRADwPDHA
Trecho da ópera Carmen - Canção do Toreador
https://www.youtube.com/watch?v=JoiHbdaO9g0
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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História
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