terça-feira, 15 de março de 2022

O compositor erudito Haydn

 




 

No dia 31 de março de 1732, nascia na vila de Rohrau, perto da Hungria, no Sacro Império Romano-Germânico, o compositor clássico, maestro, músico e musicólogo Franz Joseph Haydn. Era filho de Matthias Haydn e Maria Koller.Foi um importante autor de música erudita ocidental. Fez parte da chamada Trindade Clássica Vienense, ao lado de outros dois grandes compositores, Wolfgang Amadeus Mozart e Ludwig van Beethoven. A carreira de Haydn foi desde o fim do Barroco até o início do Romantismo. Foi o compositor mais importante de quartetos de cordas no Classicismo. Ele estabeleceu o formato formal deste gênero para as gerações futuras. Definiu um novo equilíbrio de forças entre os quatro instrumentos que constituem o quarteto de cordas: dois violinos, viola de arco e violoncelo. Sua participação nesse período foi fundamental para o desenvolvimento musical dessa época na Europa. Michael Haydn, irmão de Franz, era compositor e foi colega de Mozart em Salzburgo.O outro irmão era o tenor Johann Evangelist Haydn.

Franz Haydn viveu principalmente na Aústria e a sua carreira foi quase toda como músico de corte para a poderosa família Eszterházy. Haydn disse que ele foi “forçado a ser original”. Sua genialidade foi reconhecida em vida. Teve origem em uma família de poucas posses. Não havia uma forte tradição musical na sua família, embora seu pai fosse um incentivador da música tradicional e sabia tocar harpa de ouvido. Mas houve uma atmosfera musical na infância de Haydn, acontecendo serões de canto com os vizinhos, conforme pôde ser constatado por anotações do compositor. Os pais dele tiveram a percepção de que o filho deles tinha talento para a música e, devido a isso, para que Haydn tivesse melhores oportunidades, aos seis anos ele foi morar em Hainburg com seu parente, Johann Matthias Franck, mestre de capela. Com ele teve sulas de música. Apesar de seu período com Franck ter sido difícil, tendo passado fome e humilhações, Haydn aprendeu a tocar cravo e violino. Ele era uma criança com uma bonita voz e passou a cantar como soprano no coro da igreja local. O diretor de música da catedral de Santo Estevão, Georg von Reutter,  teve ótima impressão sobre o talento musical de Haydn. Ele enviou Haydn para Viena e lá ele foi cantor por nove anos. Nesse tempo, nos últimos quatro anos o irmão dele, Michael, lhe fez companhia.

Com 18 anos, em 1749, Haydn não tinha mais uma bela voz para cantar e ficou desempregado, passando necessidade. Foi parar na boemia de Viena, sendo um músico ambulante por dez anos. Mas Haydn nesse tempo entrou em um meio intelectual. Assim, tornou-se a partir de 1753 secretário de Nicola Porpora, um destacado compositor italiano. Foi ele que ensinou a Haydn os fundamentos da composição. Mas Haydn teve o mérito de ter conseguido uma formação musical por seus esforços, estudando por sua conta o tratado de contraponto Gradus ad Parnassum, de autoria de Fux, um compositor da corte. Também o segundo filho de Johann Sebastian Bach, de nome Carl Philipp Emanuel Bach, influenciou significativamente Haydn. A partir de 1750 Haydn passa a escrever missas e a sua primeira ópera: Der Krumme Teufel. Pouco depois Haydn compôs os primeiros divertimentos e outras peças para cordas, deixando-o com uma boa imagem como compositor e sendo bem sucedido em um novo tipo de formação musical: o quarteto de cordas.

Entre 157-1759, Haydn passou a ser mestre de capela do conde Karl von Morzin. O compositor dirige nessa época a orquestra de câmara do conde e compõe suas primeiras sinfonias para esse tipo de formação que tinha 16 músicos. Também nesse tempo começou a lecionar música e se apaixona por Theresa Keller, tendo lhe pedido em casamento. Mas como ela iria para o convento, Haydn se casa em 1760 com Maria Anna Keller, a irmã mais velha dela, não tendo filhos. Foi um casamento infeliz. Ele teve vários casos amorosos  e ela também pode ter tido um caso com um pintor.

Após dificuldades financeiras do conde Morzin, sua orquestra foi desfeita e Haydn foi ser mestre de capela assistente para a rica família húngara dos príncipes de Eszterházi. Por meio de contrato, as condições para um músico dessa corte não eram muito dignas, com uniforme de criado e não possuindo exclusividade sobre sua criação. Mas Haydn foi respeitado. O príncipe Paul II Ezsterházy valorizou o gênio de Haydn. Com a morte desse príncipe, Haydn recebeu maior apoio de Nikolaus I Ezsterházy, irmão de Paul e grande mecenas de artistas. Em 1766 Haydn substitui o anterior mestre de capela que tinha falecido. Foi um período de mais de 30 anos que Haydn trabalhou para essa poderosa família. Ele tinha várias responsabilidades, como a composição, a regência da orquestra, a execução da música de câmara, o desenvolvimento de produções de ópera italiana, dramas heroicos ou dramas cômicos. Haydn compôs e interpretou mais de 100 sinfonias. Tornou-se assim um dos compositores mais reconhecidos da Europa. Também obteve autorização para viajar e em 1770 rege obras suas em Viena, depois vai a Paris a convite da rainha Maria Antonieta. São dessa época as bem sucedidas Sinfonias de Paris e a versão para orquestra das Sete Últimas Palavras de Cristo.

Haydn e Mozart, a partir de aproximadamente 1781, se tornaram bons amigos. Haydn tinha 24 anos a mais. Eles se influenciaram. Haydn considerava Mozart um gênio. Disse Haydn para o pai do amigo: "digo-o perante Deus e como um homem honesto, que vosso filho é o maior compositor que eu conheço em pessoa ou em nome, porque tem o gosto e a maior das ciências da composição". Mozart considerava que Haydn era um mestre e um modelo, tendo dedicado seis quartetos para ele.  Chamava Haydn de: “Papá”, “Guia” e “melhor amigo”. Mozart levou Haydn para participar da maçonaria em 1785. Quando se despediram antes da viagem de Haydn a Londres em 1790, que tinha aceitado uma ótima oferta de emprego, seria a última vez que se veriam. Mozart morreu em 1791. Devido o sucesso de sua música, Haydn regressou e ficou em Londres nos anos de 1794/1795. Nesses anos ele compôs as suas últimas doze sinfonias (nº 93-104), as chamadas “Sinfonias Londrinas”. Foi muito elogiado e recebeu convite para permanecer em Londres. Mas ele decidiu voltar para a Áustria.

Em Viena, após seu retorno da Inglaterra, Haydn dedicou-se à compor grandes obras religiosas para coro e orquestra como os últimos nove quartetos, os oratórios A CriaçãoAs Estações, o Te deum e mais seis missas que dedicou à família Eszterházy. Foi o ápice da obra de Haydn. O príncipe Nikolaus II dessa família era um entusiasta das artes e deu atribuições a Haydn. Um trabalho que foi dado a ele foi a composição anual de uma missa para celebrar o aniversário onomástico da esposa do príncipe, a princesa Maria Hermenegild,

Em 1802 ele já dava sinais de fraqueza física, sem poder compor, o que lhe deixou triste, pois ainda tinha ideias no campo da música. Ele nessa época foi muito visitado e recebeu homenagens. Porém o abalava a sua situação de inatividade.

A morte de Haydn foi em Viena, aos 77 anos, em 31 de maio de 1809. Na ocasião estava havendo um forte bombardeio da artilharia de Napoleão, antes da tomada de Viena. O imperador francês mandou um guarda ficar à porta da casa do compositor durante o tempo que ele estava próximo de morrer, para que tivesse sossego em seus últimos momentos de vida.

Houve casos interessantes da vida de Haydn, conhecido por ser tranquilo e geralmente otimista, com um refinado senso de humor. Em sua sinfonia A Despedida, ele reforçou a questão do respeito que se devia dar aos músicos, o que foi percebido pelo príncipe, que passou a dar mais valor a eles. Também houve casos que a obra tinha uma nota forte súbita, que era para os espectadores não dormissem enquanto a obra era executada. Era muito respeitado pelos músicos que ele supervisionava e era muito católico. Quando terminava uma composição escrevia: “Laudate Deo” (“Glória a Deus”) ou uma expressão nesse sentido. Ele é considerado o pai da sinfonia clássica e do quarteto de cordas. Criou a forma sonata, a forma de variação dupla, sendo o pioneiro em integrar a fuga e outros modelos de contraponto à forma clássica. São quatorze as óperas de Haydn que chegaram aos dias de hoje. Na época que foram criadas, a mais popular foi “drammaeroicomico” Orlando Paladino, inspirado no Orlando Furioso de Ariosto.

Haydn foi o compositor clássico que mais compôs no estilo trio para piano, violino e violoncelo. Ele criou 45, Mozart seis e Beethoven sete. Haydn foi autor de 14 missas, as principais foram as seis que estrearam entre 1796 e 1802 para homenagear Maria Hermenegild. O jovem Beethoven teve algumas aulas com Haydn, que percebeu o talento do rapaz, mas não pôde lhe dar muita atenção porque se encontrava muito ocupado. Foram 104 as sinfonias de Haydn, 83 quartetos de cordas, 45 trios para piano e cordas, 62 sonatas para piano e outros trabalhos.

Segundo José Carlos Fernandes:

“Joseph Haydn (1732-1809) chegou à maioridade no ano em que Bach faleceu, foi amigo de Mozart, professor de Beethoven e morreu no ano em que Mendelssohn nasceu. É conhecido do grande público sobretudo pelas sinfonias, mas consagrou-se a todos os géneros correntes no seu tempo – tendo nalguns deles uma produção copiosa – e ainda arranjou tempo para compor peças para instrumentos pouco comuns, como o “baryton”, uma espécie de viola da gamba baixo com cordas metálicas adicionais, que era o instrumento predileto do seu “patrão” Nikolaus Esterházy e para o qual escreveu 120 trios.

Haydn nasceu numa modesta família em Rohrau, na Áustria, foi menino de coro na Catedral de St.º Estêvão, em Viena, agarrou-se, na juventude, a várias tarefas humildes para ganhar a vida – a mais profícua foi a de assistente/criado do compositor italiano Nicola Porpora, com quem disse muito ter aprendido – e foi subindo na “cadeia alimentar” até, que, em 1761, com 31 anos, assumiu o posto de vice-mestre de capela da poderosa família Esterházy, ao serviço da qual iria passar três décadas, parte delas em condições de semi-isolamento, no magnífico palácio que o príncipe Nikolaus I Esterházy fez construir em Esterháza. Nikolaus mudou-se para lá com a sua corte em 1766 e aí permaneceu até à morte em 1790. Embora Haydn, promovido a mestre de capela em 1766, não tivesse mãos a medir para assegurar a intensíssima vida musical da corte, a partir de 1780 a sua fama foi difundindo-se pela Europa e as encomendas de obras iam chegando-lhe um pouco de todo o lado.”

Segundo o maestro Roberto Minczuk:  “Alegre, tranquilo e, ao mesmo tempo sério, Haydn era respeitado por todos. Era um mestre não somente em sua arte, mas também em suas atitudes para com colegas. Tinha tanto respeito que se atrevia a correr alguns riscos. Para mostrar ao príncipe Nicolaus Esterházy a importância dos músicos, compôs a Sinfonia Nº 45, Do Adeus, em que os instrumentistas vão se retirando do palco um depois do outro, até restar somente dois deles para encerrar a peça. Importante dizer que, depois dessa apresentação, o príncipe passou a tratar melhor os músicos que trabalhavam para ele (...)” (Grandes Compositores da Musica Clássica. Haydn. Abril Coleções. 2009.)

“Mozart e Haydn, dois expoentes do Classicismo, eram profundamente diferentes. O primeiro, emocionalmente instável; o outro, quase sempre tranquilo e bem humorado. Mozart tinha pouco senso de ordem e não dava importância ao dinheiro; Haydn construiu aos poucos, excelente patrimônio. Além disso, os separava uma grande diferença de idade. No entanto, ligaram-se por sólida amizade e influenciaram-se reciprocamente”. (Mestres da Música. Haydn. Abril Cultural. 1982)

Frases de Haydn:

 “Jovens podem aprender com o meu exemplo que algo pode vir de nada. O que me tornei é o resultado dos meus esforços difíceis”.

“Nunca fui tão devoto como quando compus a Criação. Eu ajoelhei-me a cada dia para orar a Deus para me dar força para o meu trabalho ... Quando eu estava trabalhando na Criação  me senti tão impregnado com a certeza divina, que antes de sentar-se ao piano, eu iria de forma calma e confiantemente orar a Deus para me conceder o talento que era necessário para elogiá-lo dignamente.”

“É a melodia que é o charme da música e é o que é mais difícil de produzir. A invenção de uma fina melodia é uma obra de gênio”.

“Se você quiser saber se você tem escrito qualquer coisa que valha a pena preservar, cante para si mesmo sem qualquer acompanhamento”.

“Mozart é a encarnação da música”.

“Eu te digo diante de Deus e como honesto Homem, seu filho (WA Mozart) é o maior compositor conhecido por mim . Ele é o que tem maior habilidade na composição”.

“Muitas vezes_lutando contra obstáculos de toda ordem, ou sentindo minhas forças falharem e achando difícil perseverar no caminho escolhido_um secreto sentimento murmurava dentro de mim: existem poucas pessoas contentes e felizes aqui na Terra: talvez teu trabalho possa, um dia, ser a fonte onde os fracos, abatidos e sobrecarregados, encontrem alguns momentos de repouso e bem estar".

Sugestão para assistir

 

 

Joseph Haydn Sinfonia Nº 104 em Ré maior Londres - 3º

 https://www.youtube.com/watch?v=S8gDYXU6540

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

 

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sábado, 12 de março de 2022

A escritora, desenhista e poetisa Pagu

 






Considerando o Dia Internacional da Mulher, meu segundo artigo deste mês de março é sobre Patrícia Rehder Galvão, chamada de Pagu. Ela foi poetisa, escritora, diretora,desenhista, tradutora,cartunista, jornalista e militante comunista. Nasceu em São João da Boa Vista (SP) em 9 e junho de 1910.  Participou do movimento modernista que iniciou em 1922, ainda que não tenha participado da Semana de Arte Moderna. Era de uma família abastada e conservadora do interior paulista, a terceira de quatro irmãos. Seu pai era Thiers Galvão de França, advogado e jornalista descendente de portugueses. Sua mãe era Adélia Rehder, que tinha ancestrais alemães e portugueses. O apelido de infância era Zazá (Pagu foi um apelidado dado em época posterior pelo poeta Raul Bopp).

Em 1925, Patrícia mudou-se para a cidade de São Paulo com sua família. Nessa cidade ela foi redatora, criticando o governo e as injustiças sociais, com o pseudônimo de Patsy, no Brás Jornal. Ela foi uma mulher progressista. Diferente de muitas outras mulheres, ela bebia e fumava em público, vestia-se com roupas colantes e transparentes,usava cabelos curtos e teve vários relacionamentos amorosos. Era um comportamento ousado que se diferenciava da grande maioria das pessoas de sua classe social de origem. Foi uma musa para os modernistas. Aos 18 anos, tendo sido influenciada pelas ideias de Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral, Patrícia integrou-se ao movimento antropofágico. O apelido Pagu veio do poema escrito em 1928 por Raul Bopp chamado “Coco de Pagu”:

Pagu tem uns olhos moles
uns olhos de fazer doer.
Bate-coco quando passa.
Coração pega a bater.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer
(...)

O poema para Pagu foi publicado em jornais e interpretado por ela no Teatro Municipal de São Paulo, em 1929. Em 1929, Laura Suarez compôs e cantou uma canção, com o mesmo título do poema, que foi lançada no início de 1930 em disco.

Pagu esteve nos Estados Unidos, Japão e Manchúria. Lá ela fez a cobertura da coroação do imperador Pu-Yi, um governante fantoche do Japão e que tinha sido o último imperador da China. Ela ainda entrevistou o psicanalista Sigmund Freud quando estavam em um navio. Pagu ainda conseguiu na Manchúria 19 saquinhos de soja que deu para o poeta Bopp. Ela teria sido uma das colaboradoras para o plantio de soja no Brasil.

Pagu, após já ter se relacionado com homens famosos e anônimos, passou a namorar secretamente em 1928 o escritor Oswald de Andrade, que na época estava casado com a pintora Tarsila do Amaral. Oswald se separou de Tarsila e ficou com Pagu. Ela e Oswald fizeram um cerimônia de “casamento”, que foi mais um ato simbólico, realizado no Cemitério da Consolação, em São Paulo. Mas depois eles se casaram oficialmente, estando ela grávida de seis meses, o que foi um escândalo para a sociedade conservadora da época que já a tinha criticado por seu relacionamento com Oswald. O filho do casal, Rudá de Andrade, nasceu em 25 de setembro de 1930.

Oswald e Pagu passaram a militar no Partido Comunista Brasileiro e fundaram o jornal O Homem do Povo, que existiu até o ano de 1945. Nesse ano Oswald desligou-se do partido. Oswald não era fiel e devido a essas traições, o casal se separou em 1934. Pagu foi morar sozinha e levou seu filho, sendo de novo criticada pela sociedade conservadora. Ela tinha sido presa em 1931 por ter participado de uma greve de estivadores em Santos. Durante sua vida, pagu foi presa 23 vezes. Deixou o Brasil em 1933 para viajar pelo mundo e publicou, com o pseudônimo de Mara Lobo, o romance Parque Industrial. Foi presa sob acusação de ser comunista, em Paris, em 1935. Mandada de volta por autoridades francesas ao Brasil, com identidade falsa, ela foi presa e torturada pela polícia do governo Vargas e ficou cinco anos presa. Tal fato ativou mais sua criatividade e sua arte. O filho dela nesse tempo estava com o pai, Oswald de Andrade.

Em 1940, Pagu estava livre da prisão e mudou sua postura política, saindo do Partido Comunista e seguindo uma abordagem socialista trotskista, fazendo parte do jornal Vanguarda Socialista, no qual também trabalhavam, entre outros, o crítico de arte Mário Pedrosa e o então marido de Pagu, Geraldo Ferraz. Com Geraldo, Pagu teve seu segundo filho, Geraldo Galvão Ferraz, nascido em junho de 1941. Nessa época Pagu passou a morar com o marido e seus dois filhos em São Paulo. Fez uma viagem para a China e lá lançou obras suas. Um novo livro foi publicado por ela em 1945, A Famosa Revista, em parceria com seu marido. Pagu tentou ser eleita deputada estadual em 1950, sem ser bem sucedida. Frequentou a Escola de Arte Dramática de São Paulo, em 1952. Foi para Santos, onde atuou em espetáculos no teatro. Estava inserida no teatro de vanguarda.

Pagu fez traduções das obras A Cantora Careca, de Eugène Lonesco e Fando e Liz, de Fernando Arrabal. Traduziu poemas de Guiiaume Apollinaire. Trabalhou como animadora cultural em Santos, passando a residir nessa cidade em 1953, onde incentivava jovens talentos e grupos amadores de teatro. Além dos livros Parque Industrial e A Famosa Revista, Pagu escreveu contos policiais, com o pseudônimo King Shelter, publicados na revista Detective, que estava sob direção de Nelson Rodrigues. Em 1998 a  Livraria José Olympio Editora reuniu esses contos na obra Safra Macabra. Pagu traduziu e revelou para o Brasil autores como James Joyce, Octávio Paz etc. O último jornal onde ela trabalhou foi A Tribuna.

Pagu também destacou-se como desenhista e ilustradora, tendo participado da Revista de Antropofagia (1928-1929). Houve a publicação em 2004 de 22 desenhos de Pagu no chamado Caderno de croquis de Pagu e outros momentos felizes que foram devorados reunidos. Fez parte da equipe que organizou os desenhos da autora, o filho dela Rudá de Andrade.

Em 1960, quando estava trabalhando como crítica de arte, descobriu que tinha câncer de pulmão. Foi a Paris para uma cirurgia, que não adiantou. Ficou morando em Paris e fazendo quimioterapia. Ficou desesperada por não poder trabalhar com arte e ter de ficar deitada na cama. Deprimida, tentou o suicídio, mas foi salva pelo marido. Ela escreveu sobre o acontecido: ": "Uma bala ficou para trás, entre gazes e lembranças estraçalhadas". Mesmo com o tratamento, ela não se curou, voltou ao Brasil e morreu em Santos em 12 de dezembro de 1962.

Em São Paulo, no ano de 2005 foi feita uma comemoração pelos 95 anos de Pagu, com ampla programação, com exposição de fotos, desenhos e textos da autora, com lançamento de livros e um espetáculo foi apresentada sobre a vida dela. No dia do nascimento de Pagu, os convidados compareceram a uma festa com roupas de época, realizada no Museu da Imagem e do Som de São Paulo. Houve um filme sobre a vida de Pagu feito em 1987: Eternamente Pagu. Rita Lee e Zélia Duncan fizeram a canção Pagu:

“Nem toda feiticeira é corcunda
Nem toda brasileira é bunda
Meu peito não é de silicone
Sou mais macho que muito homem
Sou rainha do meu tanque
Sou Pagu indignada no palanque... “

Também houve documentários e peças sobre ela e foi enredo da Escola de Samba X-9, em Santos. A pesquisadora Márcia Costa escreveu o livro: De Pagu a Patrícia - o Último Ato

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

 

Figura: https://www.google.com/search?q=imagem+de+Pagu&sxsrf=APq-WBv7bJBJHIQ_oTN1FO1Q9Guo4t_6vg:1647145866772&tbm=isch&source=iu&ictx=1&vet=1&fir=

 


domingo, 6 de março de 2022

A pintora brasileira Anita Malfatti

 






 


Em homenagem ao Dia Internacional da Mulher resolvi homenagear duas grandes artistas brasileiras Anita Malfatti e Patrícia Rehder Galvão (Pagu). Começarei por Anita.

A pintora, desenhista, gravadora, ilustradora e professora Anita Malfatti nasceu em São Paulo (SP), em 2 de dezembro de 1889. Seu pai era Samuel Malfatti, engenheiro italiano e sua mãe era Bety Malfatti, que lhe ensinou a pintar. Ela iniciou seus estudos no colégio São José, depois foi para a Escola Americana e para o Colégio Mackenzie, em 1897. Tentou o suicídio aos 13 anos deitando na linha do trem. Ela assim descreveu a experiência: “Foi uma coisa horrível, indescritível. O barulho ensurdecedor, a deslocação do ar, a temperatura asfixiante deram-me uma impressão de delírio e de loucura. Eu via cores, cores e cores riscando o espaço, cores que eu desejaria ficar para sempre na retina assombrada. Foi a revelação: voltei decidida a me dedicar à pintura”. Com 19 anos ela se formou como professora.

Anita pintava com a mão esquerda, porque possuía uma atrofia no braço direito e na mão direita.  Suas primeiras pinturas são de 1909. Em 1910 ela foi para a Alemanha onde estudou no Museu Real Artes e Ofícios. Ficou na Alemanha até 1914. Em 1915 e 1916 ela estudou na Arts Students League of New York e na Independent Scholl of Art.

No início dos trabalhos de Anita havia um trabalho experimental com a luz, sem a técnica tradicional claro-escuro. Não havia da parte dela uma preocupação com a representação naturalista da realidade. Podem ser vistas imagens com contornos grossos e ondulantes. Na obra Tropical de 1917 pode ser observada a temática nacionalista

A primeira exposição individual de Anita ocorreu em 1914, em São Paulo. Mas ela só ficou conhecida em 1917, pois recebeu uma forte crítica de Monteiro Lobato, que não gostou de suas obras. Ele escreveu no jornal O Estado de São Paulo a sua crítica chamada “Paranoia ou mistificação?"

Anita foi a precursora da pintura modernista, que passou a se destacar na Semana de Arte Moderna de 1922. Passou a participar do chamado Grupo dos Cinco, formado por ela, por Tarsila do Amaral, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti del Picchia. O nacionalismo esteve muito presente no modernismo brasileiro, que de início estava muito voltado ao contexto urbano. Entre os anos 1922 e 1930 a “arte nova” ou arte moderna teve seu auge, na chamada “fase de destruição”. O Cubismo, o Futurismo, o Dadaísmo, o Surrealismo e o Expressionismo presentes na Europa influenciaram o modernismo brasileiro. Anita de início foi influenciada pelo Expressionismo. Na década de 1920 Anita começou a se interessar pelo Fauvismo, utilizando cores mais intensas, indo em direção à temática regionalista.

Anita apresentou 20 obras suas durante a Semana de Arte Moderna em 1922. Além dela também outros artistas tiveram obras em exposição como Di Cavalcanti, Ferrignac, John Graz, Yan de Almeida Prado, Vicente do Rego Monteiro etc. Ela morou em Paris no período de 1923 a 1928. Nessa época ela realizou exposições em Berlim, Paris e Nova York. De 1928 a 1933 em São Paulo, ela lecionou desenho na Universidade Mackenzie. E em 1942 se tornou presidente do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo. Faleceu em São Paulo em 6 de novembro de 1964, aos 74 anos.

Obras de Anita Malfatti: O Burrinho Correndo (1909);O Barco (1915);A Estudante Russa (1915); O Farol (1915);Uma Estudante (1916);O Japonês (1916);O Homem de Sete Cores (1916); A Mulher de Cabelo Verde (1916);A Boba (1916);O Homem Amarelo (1916);Tropical (1917);A Onda (1917);A Chinesa (1922);Mario de Andrade I (1922);As Margaridas de Mário (1922);Paisagem dos Pirineus (1924);As Duas Igrejas (Itanhaém, 1940);Samba (1945).


Para ver obras de Anita: 

https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa8938/anita-malfatti/obras?p=1

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História.


Figura:

https://www.google.com/search?sxsrf=APq-WBvzn3sZzvXUvUhI-NWyxLXW798uhQ:1646583308062&source=univ&tbm=isch&q=imagem+de+anita+malfatti&fi

terça-feira, 1 de março de 2022

Poemas do poeta ucraniano Taras Shevchenko

 









A seguir alguns  poemas do poeta, escritor, pintor, ilustrador, folclorista e etnógrafo ucraniano do século XIX  Taras Hryhorovych Shevchenko, nascido em 9 de março de 1814 e que morreu em 10 de março de 1861. Foi um autor muito importante para a literatura ucraniana moderna e para a própria língua ucraniana moderna, tendo sido membro da Academia Imperial de Artes.  Foi condenado por defender a independência da Ucrânia, que fazia parte do Império Russo. 

 

Testamento

 

Quando eu estiver morto, enterre-me

 

Na minha amada Ucrânia,


Minha tumba sobre um túmulo alto


Em meio à vasta planície,


Para que os campos, as estepes sem limites,


A costa do rio Dnieper


Meus olhos pudessem ver, meus ouvidos pudessem ouvir


O poderoso rio rugir .


Quando da Ucrânia o rio Dnieper levar para o
mar azul profundo


O sangue dos inimigos... então eu deixarei


Estas colinas e campos férteis –


Eu os deixarei todos e voarei


Para a morada de Deus,


E então eu orarei. ... Mas até aquele dia


não sei nada de Deus.


Oh me enterre, então levante-se


E quebre suas pesadas correntes

 

E regue com o sangue dos tiranos


A liberdade que você conquistou.


E na grande nova família,


A família dos livres,


Com palavras suaves e amáveis


​​Lembre-se também de mim.







Traduzido por John Weir-


Toronto, 1961

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Rugem as Cascatas

Rugem as cascatas, nasce a lua,

Como sempre nasceu...

Sitch desapareceu

E o líder também!

Não há mais Sitch?

Os juncos perguntam ao Dnipró:

“Onde estão nossos filhos,

Onde eles andam?”

 

Não voltarão os cossacos

Não se levantarão os hetmans

Não cobrirão a Ucrânia

Os jupany vermelhos.

 

Somente o inimigo está rindo...

Ria, cruel inimigo!

Mas não muito, tudo está desaparecendo,

Porém a glória não sumirá:

Não sumirá, mas contará ,

O que acontecia no mundo,

De quem é verdade, de quem é a injúria

E de quem nós somos filhos.

 

Nossa balada, nossa canção

Não morrerá, não perecerá...

Glória ao nosso povo,

Glória à Ucrânia!

 

Para ouvir:  https://www.youtube.com/watch?v=3QqYakvmp3k

 

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O sol se põe

 

O sol se pões, colinas negrejam

A avezinha se cala, o campo se aquieta,

Homens contentes fruem repouso,

Mas eu só miro... e vôo com alma

Ao pomar escuro na minha Ucrânia.

Voo com meus pensamentos,

E assim a alma se acalma,

Negrejam campos, matas e montes,

No céu profundo, nasce uma estrela.

Oh estrela, estrelinha!_e lágrimas rolam.

Tu já surgiste na minha Ucrânia?

Será que olhos amados

No céu te buscam? Ou já esqueceram?

Se já esqueceram, durmam tranqüilos,

E com o meu destino não se perturbem.

 

 

  Para ouvir:   

https://www.youtube.com/watch?v=_quJiFGpWts&t=20s

 

Brama e Ruge

 

Brama e ruge vasto Dniper

Uiva um vento furioso,

Dobra e curva os salgueiros,

Ergue ondas colossais.

 

A lua fraca nesta noite

Entre as nuvens surge e desce,

Como barco no mar negro,

Se afunda, e aparece.

 

Ainda os galos não cantaram

Não há murmúrio ao redor,

No bosque os mochos gorjeavam,

E os freixos crepitavam.

 

Para ouvir: https://www.youtube.com/watch?v=6--ZM_GhXgs&t=5s

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura:

https://www.google.com/search?sxsrf=APq-WBsOwCpqvDzd4df3m7UHraR3xLEzSw:1646195668729&source=univ&tbm=isch&q=imagens+do+poeta+russo+taras+shevchenko&fi