quinta-feira, 7 de julho de 2022

O compositor norte-americano George Gershwin

 




Em 11 de julho de 1937 morria em Hollywood, California, Jacob Gershowitz, que ficou conhecido como George Gershwin. Ele foi foi o segundo de quatro filhos, um pianista e compositor, que compunha para a Broadway  e também para concertos clássicos e que nasceu no Brooklyn, Nova York, em 26 de setembro de 1898, filho de pais judeus russos. Morris (Moishe) Gershowitz, o pai de George, em um processo de adaptação à América, trocou o sobrenome da família para Gershvin. E George, já adulto, mudou para Gershwin.

O grande parceiro em trabalhos vocais e teatrais de George foi o seu irmão mais velho, Ira Gershwin, que fazia letras. George criou músicas populares que fizeram sucesso, inclusive algumas de sua canções já foram usadas na televisão e em filmes. Em seu álbum de 1959, Ella Fitzgerald Sings the George and Ira Gershwin Songbook, a cantora Ella Fitzgerald gravou várias canções dos irmãos Gershwin. Cantores famosos e músicos gravaram músicas de Gershwin, como Louis Armstrong, Charlie Parker, Miles Davis, Frak Sinatras, Doris Day, João Gilberto, Fred Astaire, Bing Crosby, John Coltrane e outros.

Quando George tinha dez anos, ele assistiu um recital de violino de seu amigo Max Rosen. George ficou impressionado. George e Ira (o irmão mais velho, que antes se chamava Israel) tinham personalidades bem diferentes. Ira era quando criança mais estudioso, tinha admiração por arte e quis um piano de presente e George gostava de andar pelas ruas, se metia em confusão e gostava de jogar beisebol. Mas foi George que se interessou em tocar piano e com 12 anos tocou de ouvido uma canção ao piano. Seus pais se impressionaram e contrataram um professor particular para dar aulas do instrumento para ele e para o irmão. Ele teve contato com diversos professores desse instrumento por dois anos até que foi apresentado a Charles Hambitzer, que ensinou a George técnica para tocar piano e o introduziu no mundo da música erudita europeia e que até sua morte em 1918 foi um mentor para George, que veio a estudar depois com o compositor Rubin Goldmark e também com o compositor e teorista Henry Cowell.

O primeiro emprego de George Gershwin foi aos 15 anos, como músico na Tim Pan Alley, em Nova York. Passou a trabalhar para a Aeolian Company and Standard Music Rolls, em Nova York, gravando e arranjando rolos de piano, produzindo muitos rolos, utilizando pseudônimos. Em 1917 ele lançou "Rialto Ripples", que foi um sucesso comercial e em 1919 ele conseguiu ter mais sucesso com sua obra "Swanee”. George trabalhou por um breve tempo no vaudeville, tocando piano. Ele e seu irmão Ira tiveram uma participação no musical de comédia chamado Lady Be Good, incluindo músicas como "Fascinating Rhythm" e "Lady Be Good”. Depois vieram as músicas :"Oh, Kay!" (1926), "Funny Face" em 1927, “Strike Up the Band" (1927 e 1930), "Show Girl" (1929), "Girl Crazy" (1930), que introduziu o standard "I Got Rhythm", e "Of Thee I Sing" (1931),  que foi o primeiro musical de comédia  que ganhou  um Prêmio Pulitzer de Música

A primeira grande obra de George Gershwin foi Rhapsody in Blue, composta em 1924, para orquestra e piano, que foi orquestrada por Ferde Grofé. Quem tocou em estreia na cidade de Nova York foi a banda de Paul Whiteman. Essa é até hoje a obra mais popular de George. Ele ficou em Paris por pouco tempo, estudando composição com Nádia Boulanger, que , assim como outros professores, como Ravel, não quiseram ficar dando aulas a George, temendo que esses estudos influenciassem o estilo dele, que tinha influências do jazz. Foi nessa época que George Gershwin escreveu An American in Paris. Embora essa criação tenha recebido avaliações negativas em sua primeira apresentação, em 13 de dezembro de 1928, depois ficou sendo na Europa e nos Estados Unidos o que é chamado de standard do jazz. 

A sua composição Porgy and Bess, baseada no romance Porgy (de autoria de Du Bose Heyward), em 1935, que Gershwin considerava como uma “ópera folk”, foi a mais ambiciosa composição dele. Segundo análise de especialistas, é a mais importante ópera americana do século XX. Todos os cantores e atores são negros e a música combina elementos da música popular, influenciada pela música negra e tem técnicas de ópera.

Há estudiosos da música de George, que dizem que a herança cultural judaica dele influenciou na sua criação, em especial as melodias litúrgicas que ele ouvia em sua infância. Citam como exemplo, o solo de clarinete que abre a "Rhapsody in Blue", que traz a influência da Chazanut, um canto litúrgico judaico.

Nas obras sinfônicas de Gershwin a orquestração tem semelhança com a de Ravel e o concerto para dois pianos de Ravel tem influência de Gershwin. Já em relação ao Concerto in F de Gershwin, houve críticas de que seria muito influenciado por obras de Debussy. Quanto às outras possíveis influências, podem ser citadas as obras de Alban Berg, Dimitri Shostakovich, Igor Stravinsky, Darius Milhaud e Arnold Schoenberg.

Em relação à sua vida pessoal, George Gershwin teve um relacionamento amoroso com a compositora Kay Swift. Ele conversava com ela sobre suas músicas. E a obra Oh, Kay teve esse nome como forma de homenagear a compositora. Ele também teve um caso com a atriz Paulette Goddard, que em sua vida foi casada com homens famosos como Charles Chaplin, Erich Maria Remarque e Burgess Meredith.

Sobre as obras de George Gershwin disse Ravel: "Pessoalmente eu acho o jazz mais interessante: os ritmos, o jeito que as melodias são tocadas, as próprias melodias. Eu escutei as obras de George Gershwin e as achei intrigantes.” Joseph Schillinger , um professor de composição, que deu aulas à Gershwin, com sua influência russa, foi muito importante para dar a ele um método de composição. Gershwin era bastante talentoso em conseguir manipular as formas de música em uma só, como quando ele combinou ritmos e tonalidades do jazz que descobriu em Tin Pan Alley com as canções populares da época.

George Gershwin, no início de 1937, passa a ter fortes dores de cabeça e com sensações estranhas no olfato. Era um tumor no cérebro. No mesmo ano, em junho, ele participou de um concerto com a Orquestra Sinfônica de São Francisco. E em julho, aos 38 anos, em Hollywood, ele veio a falecer. Estava trabalhando nesse tempo na partitura de The Goldwyn Follies.

 

Frases de George Gershwin

"A vida é muito parecida com o jazz. É melhor quando você improvisa."

"A originalidade é a única coisa que conta. Mas o originador usa material e ideias que ocorrem em volta dele e passam por ele. E fora de sua experiência vem a criação original."

"Eu gosto de pensar em música como uma ciência emocional."

"Jazz é uma das melhores coisas que você pode encontrar em sua vida , sempre pode ser seu amigo."

"Quando estou no meu humor normal, a música pinga dos meus dedos."

"A verdadeira música deve repetir o pensamento e inspirações das pessoas e a hora."

 

Sugestão para escutar:

Rhapsody In Blue: Gershwin

https://www.youtube.com/watch?v=ynEOo28lsbc

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Márcio José Matos Rodrigues- Professor de História.

Figura:

https://www.google.com/search?q=imagens+de+george+gershwin&sxsrf=ALiCzsbQG3nHo2I5rMYFKGIJ2EggzHdBMg:1657239739234&tbm

 


terça-feira, 5 de julho de 2022

O compositor italiano Albinoni

 




Em 8 de junho de 1671 nasceu na cidade italiana de Veneza (na época República de Veneza), o compositor barroco Tomaso Giovanni Albinoni, que se destacou na sua época como compositor de óperas e que atualmente se ouve mais falar por sua música instrumental. Foi um estudioso sobre violino e canto. Ele em seu tempo foi tão popular quanto Arcangelo Corelli e Antonio Vivaldi, devido ao estilo pessoal e talento melódico. Mesmo sendo herdeiro de um fabricante de papel bem sucedido não quis gerir a herança do pai (Antonio Albinoni) e tornou-se um compositor para violino, tendo sido um dos primeiro compositores a compor para violino solo.

Johan Sebastian Bach, escreveu fugas sobre temas de Albinoni, como a Fuga sobre um tema de Albinoni em lá, BWV 950 Fuga sobre um tema de Albinoni em si menor, BWV951.

Albinoni compôs seu Opus I em 1694 e dedicou ao também veneziano Pietro Ottoboni, que era sobrinho-neto do papa Alexandre VIII, um mecenas de compositores como Arcangelo Corelli. Há a possibilidade de Albinoni ter sido sido contratado como violinista pelo duque de Mântua, Fernando Carlo, em 1700. Compôs em 1701 as populares suítes Opus 3, dedicando-as ao grão-duque Fernando III da Toscana. Albinoni foi convidado por Maximiliano II da Baviera, em 1722, para dirigir duas de suas óperas em Munique.

Infelizmente, com a destruição da Biblioteca Estadual da Saxônia, durante a Segunda Guerra Mundial, uma considerável parte do trabalho de Albinoni foi perdida, na ocasião do bombardeio de Dresden, em fevereiro de 1945. O famoso "Adágio de Albinoni" (Adágio em sol menor para violino, cordas e órgão) foi uma composição de um outro compositor que se baseou em fragmentos da obra de Albinoni. Não há muitos conhecimentos sobre a vida dele.

Entre as obras de Albinoni existiam aproximadamente oitenta óperas, porém o bombardeio de Dresden destruiu a maior parte. Vinte e oito dessas óperas foram produzidas no período entre 1723 e 1740 em Veneza. Por volta desse ano, foi publicada na França uma coleção de sonatas para violino desse autor. As óperas de Albinoni foram várias vezes apresentadas fora da Itália.

Das trinta cantatas do compositor, só uma foi publicada. A obra dele que mais chegou até os dias atuais foi a obra instrumental, que tinha sido impressa. O que se destacou nessas obras foram os seus concertos para oboé. Aproximadamente vinte outras composições , sem número de opus, existem, na sua maioria na forma de manuscritos. Há obras instrumentais dele que são regravadas com certa regularidade. Albinoni morreu em 17 de janeiro de 1751, em Veneza.

Sugestão para ouvir:

Tomaso Albinoni - Adagio (best live version) https://www.youtube.com/watch?v=_eLU5W1vc8Y

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

 

Figura:

https://www.google.com/search?sxsrf=ALiCzsaYMsYbCSGemJLW6RUGbNaCRtFLGA:1657076504688&source=univ&tbm=isch&q=imagem+de+albinoni&fir


quarta-feira, 29 de junho de 2022

O Dia Mundial dos Oceanos




Em 8 de junho é comemorado o Dia Mundial dos Oceanos. Quero destacar esta data, pois são de imensa importância os oceanos, ressaltando-se a vida marítima.  Os oceanos são fundamentais para o equilíbrio da vida no planeta.

É bom lembrar que os oceanos tem muita importância na biodiversidade, clima, alimentação, economia e eles são responsáveis pela maior parte do oxigênio na atmosfera. Eles cobrem mais de 70% da superfície da Terra e contêm 97% da água de todo o planeta. Também é importante considerar que as águas salgadas abrigam uma biodiversidade com quase 200 mil espécies identificadas e absorvem aproximadamente 30% do dióxido de carbono produzido pelos seres humanos. Até mesmo para a arqueologia os oceanos tem sua importância, porque há o estudo de navios naufragados.

Uma área de quase 362 milhões de quilômetros quadrados é ocupada aos oceanos, com uma profundidade média de 3690 metros e um volume de mais de 1,3 bilhão de quilômetros cúbicos. A forma e a dimensão de cada oceano modifica-se de forma lenta e permanente, havendo a relação com a movimentação das placas tectônicas. Os oceanos atuais não tem mais de 200 milhões de anos o que significa cerca de 1/20 da história da Terra

Os oceanos estão relacionados ao aquecimento global, erradicação da pobreza e segurança alimentar. Alguns países já comemoravam a data, mesmo antes de ser oficializada pela ONU. O primeiro país que propôs uma data sobre a importância de se preservar os mares foi o Canadá, em conferência a que houve na cidade do Rio de Janeiro em 1992. O governo canadense na época apoiou o evento “Oceans Day At Global Forum – The Blue Planet”, organizado pelo Instituto dos Oceanos do Canadá. A Comissão Intergovernamental Oceanográfica da Unesco em 1998 apoiou a criação de uma data internacional.

Com a criação da data de 8 de junho para o Dia Mundial dos Oceanos, cerca de 200 entidades de diversos países fazem várias atividades e realizam discussões  sobre a situação dos oceanos.

Em 5 de dezembro de 2017, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) anunciou  a  “Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável”. O período compreende os anos de 2021 a 2030. Esta proposta pretende formar uma estrutura de apoio às ações de gerenciamento sustentável dos Oceanos efetuadas por vários países. E assim destacou-se a seleção de uma série inicial de ações para incentivar uma “revolução do conhecimento do oceano”.

Segundo a diretora-geral da UNESCO, Audrey Azoulay:

“Da restauração da Grande Barreira de Corais ao mapeamento de 100% do fundo do oceano em alta resolução, esses programas e contribuições inovadores constituem o primeiro conjunto de Ações da Década da Ciência Oceânica que contribuirão para ajudar a entregar o oceano que desejamos até 2030”.

Entre estas ações estão incluídas iniciativas para expandir a pesquisa em alto mar e a exploração da “zona crepuscular” do oceano. Também estão previstas ações baseadas no desenvolvimento de conhecimentos e soluções para reduzir as múltiplas pressões sobre os ecossistemas marinhos, como as alterações climáticas, perda de biodiversidade e poluição e também ações para melhorar a gestão sustentável dos estoques pesqueiros.

Informações adicionais sobre os oceanos:

Mitologia Grega

Para os gregos antigos, Oceano era o mais velho dos titãs, primogênito de Urano (o Céu) e Gaia (Terra). Ele era o deus das águas correntes, do fluxo e do refluxo e a origem de todas as massas líquidas e fontes de água doce do mundo, regulamentava também o nascer e o ocaso de corpos celestes, porque a crença era de que esses corpos surgiam e desciam no reino aquático nas extremidades da Terra. Oceano era um gigantesco rio cósmico do início dos tempos, que circundava o mundo, que o mantinha apertado em uma rede circular de suas águas. Já numa época posterior, a helenística, com mais conhecimentos sobre geografia, Oceano tornou-se o deus que representava os oceanos e Poseidon reinava sobre o mar Mediterrâneo. Na obra grega Ilíada, Oceano era chamado de "o pai de todos os seres". Da união de Oceano com sua irmã Tétis, deusa das fontes de água pura surgiram rios, poços, nascentes e nuvens de chuva.

Como foram definidos os oceanos:

Conforme a proximidade dos continentes e várias características oceanográficas são definidos pela Organização Hidrográfica Internacional (IHO) cinco grandes oceanos: Oceano Atlântico, Oceano Ártico, Oceano Índico, Oceano Pacífico e Oceano Antártico. Este foi definido recentemente, pois houve há pouco tempo a identificação de suas águas como um ecossistema distinto e de grande impacto no clima global. A formação da atmosfera, o resfriamento do planeta e formação da litosfera tem uma ligação forte com a origem dos oceanos. Graças à atmosfera é que veio pelo menos 50% da água que está nas bacias oceânicas. A outra parte da água pode estar relacionada à meteoros. Os primeiros oceanos provavelmente tinham uma composição muito diferente da atual. Foi há cerca de 2,2 bilhões de anos que houve um aumento da quantidade de oxigênio no planeta. A forma como os oceanos e os continentes foram se arranjando foi um fator muito importante para haver mudanças climáticas e para a evolução de espécies.

Atlântico: O nome está relacionado à Atlas, que na mitologia grega é um dos Titãs. Por isso que também há uma outra denominação para o Atlântico: Mar de Atlas. Este oceano foi mencionado pelo historiador grego antigo Heródoto. Na Idade Média, se chamou de “mar Ocidental” ou “mar do Norte”. Foi o geógrafo Mercator que voltou a chama-lo de “Atlântico” em seu mapa do mundo de 1569.

Pacífico: Foi antes chamado de Oceano do Sul, pelo navegador espanhol Vasco Nuñez de Balboa. Foi o navegador português Fernão de Magalhães que em 1520 o chamou Pacífico, impressionado com a tranquilidade das águas deste oceano. É o maior dos oceanos.

Índico: Foi chamado assim devido às características geográficas, porque banha áreas como Índia e Indonésia. O almirante chinês Zheng He o chamava no século XV de “oceano Ocidental”, nome como os chineses conheciam este oceano. É o terceiro maior oceano, ficando trás do Atlântico e do Pacífico em extensão. Banha áreas da Ásia, da África e da Oceania.

Ártico: O nome está relacionado à geografia, vem da palavra grega “arctos” (urso, animal que habita regiões banhadas pelo Ártico) e situa-se no polo norte sob a constelação de Ursa Maior.

Antártico: O nome vem em oposição ao Ártico, o do norte é Ártico e o do sul é Antártico e circula a Antártica, o continente congelado.

Limite dos Oceanos:

Há algum tempo eram definidos 4 oceanos delimitados por terra (continentes e algumas ilhas). Hoje em dia se considera o oceano Antártico, cujas águas possuem um impacto nos outros oceanos. Atualmente a Organização Hidrográfica Internacional (IHO) é quem define os limites entre as águas oceânicas. São 77 os países que fazem parte desta Organização. Os técnicos da IHO para definir limites analisam os oceanos levando em conta relevos marinhos destes oceanos, tipos de correntes marítimas, temperaturas dessas águas e ecossistemas estabelecidos nestes ambientes.

Foi no ano 2000 que os limites do Oceano Antártico foram propostos pela IHO. Houve países membros da IHO que discordaram dos parâmetros. Em 2021 a National Geographic Society fez um reconhecimento oficial daquelas águas como sendo o quinto oceano.

Problemas:

Associação Nacional de Conservação da Natureza (Quercus), uma Organização Não Governamental de Ambiente, de Portugal, aponta dez problemas:

 "1) Sobreexploração da pesca

Estudos indicam que há uma considerável redução nas populações de algumas espécies de peixes. Como exemplo, a sobrepesca do bacalhau nas águas do Canadá quase levou à extinção deste peixe e a pesca da sardinha em Portugal que tem recomendações de organismo científico internacional para que termine totalmente já este ano. Para além da sobrepesca, também existe uma grave falta de gestão da atividade ou incumprimento de regras. Falta de definição das dimensões dos animais ou da época de captura o que permita a captura de juvenis ou fêmeas com ovos são alguns dos problemas recorrentes.

 2) Captura excessiva de espécies com ciclos de vida longos, tais como alguns tubarões e atuns

Algumas destas espécies são utilizadas para culinária de luxo ou com fins de terapias alternativas para tratamentos de saúde (exemplo, a barbatana de alguns tubarões é muito apreciada na Ásia). As espécies no topo das cadeias alimentares têm, normalmente um ciclo de vida mais longo, com reprodução mais espaçada, logo menos resistente à recuperação das espécies.

 3) Aquicultura não sustentável

A aquicultura intensiva no mar promove a proliferação de agentes poluentes nas águas marinhas. A produção de peixes e bivalves implica a utilização de antibióticos e outros produtos químicos, alguns deles tóxicos para o ecossistema. Esta situação é facilmente visível nas águas da Ásia devido à produção intensiva de amêijoa vietnamita.

 4) Lixo

A quantidade de lixos deixados nas praias ou atirados para as linhas de águas terrestres, tais como rios e ribeiras, têm como destino final o oceano. A situação é mais grave quando se tratam de resíduos não biodegradáveis, tais como os plásticos, que se vão fragmentando em partículas mais pequenas, os microplásticos, e que são confundidos com alimento por muitas espécies marinhas. Os microplásticos presentes em produtos de higiene e de limpezas domésticas e industriais também terão os mesmos destinos. As ilhas de lixo de plástico são já uma realidade em algumas zonas dos oceanos.

 5) Aquecimento das águas

O aumento da temperatura dos mares causa imensas alterações nos ecossistemas marinhos, com consequências gravosas e letais para muitas espécies. É também responsável por alteração de rotas migratórias provocando desequilíbrios nas cadeias alimentares. Para se ter uma noção, o aquecimento de 0,5ºC nas águas dos recifes de coral, provoca a sua morte. Os recifes de coral saudáveis funcionam como “maternidades” e zonas de abrigo para variadíssimas espécies usadas na alimentação humana e das quais dependem algumas comunidades de povos pescadores.

 6) Poluição

Muitos fertilizantes e pesticidas utilizados sistematicamente na agricultura acabam por ir parar ao oceano. Alguns desses produtos provocam alterações irreversíveis e fatais para as espécies (por exemplo, afetam no processo de reprodução). Além disso, se ingeridos pelo ser humano podem trazer problemas de saúde ao mesmo.

7) Concentrações elevadas de mercúrio

O mercúrio em excesso causa doenças graves nos seres vivos e no Homem. É um poluente que se acumula na cadeia alimentar (bioacumulação) e chega ao Homem através da ingestão de peixes, e que em excesso pode causar graves doenças. Daí o consumo de determinados peixes dever ser regrado, como o peixe-espada preto, o atum, entre outros.

 8) Destruição de habitats

Existem habitats muito importantes como local de abrigo para a reprodução, por exemplo as pradarias marinhas e as florestas marinhas, que estão a ser destruídas por várias causas, entre as quais a utilização de artes de pescas agressivas como a pesca de arrasto.

 9) Obras de engenharia e extração de petróleo

Todas as alterações do meio marinho provocadas por construções, perfurações em profundidade, e tantas outras (incluindo a poluição sonora) causam, alterações no habitat, provocam perturbações várias e produzem poluentes. Estes fatores contribuem para a destruição do habitat e comprometem a sobrevivência das espécies marinhas.

 10) Acidificação dos Oceanos e corais

Algumas das mudanças verificadas com as alterações climáticas ao nível dos oceanos implicam alterações do Ph, devido ao aumento da concentração de CO2 na atmosfera. Esta situação é bem notória nas zonas tropicais, onde os ecossistemas marinhos são extremamente sensíveis e ricos em biodiversidade, e cujos habitats estão a sofrer alterações que se podem revelar irreversíveis, nomeadamente do caso dos recifes de corais.”

 A referida associação fez esta observação:

“Por todos estes motivos a Quercus pediu aos responsáveis políticos que acelerem e tornem mais ambiciosos os planos para a criação de Áreas Protegidas Marinhas e que invistam fortemente na redução das fontes de poluentes marinhos.”

A seguir algumas colocações de especialistas:

Para a autora Jennifer Ann Thomas: “O lixo coloca em risco não apenas o ecossistema marinho, mas também a sobrevivência humana”

Para o oceanógrafo Alexander Turra, responsável pela Cátedra Unesco para Sustentabilidade dos Oceanos, “a poluição prejudica a biodiversidade e os processos da natureza, o que também gera impacto nos benefícios que os oceanos garantem para a humanidade”

Segundo avaliação de Marcos César de Oliveira Santos, coordenador do Laboratório de Biologia da Conservação de Mamíferos Aquáticos e professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP):

“Até então, eram raros os institutos de pesquisa oceanográfica que se dedicavam à investigação dos oceanos. A partir dos anos 1960 e 1970 novos centros de oceanografia surgiram pelo mundo e tornaram a ciência oceanográfica uma realidade, e uma necessidade, para compreendermos nosso planeta e como manejá-lo da melhor forma(...)”

(...) “Em paralelo, movimentos conservacionistas se fizeram presentes globalmente com a preocupação intrínseca sobre os efeitos de nossas ações sobre a natureza e as consequências para nossa saúde e bem-estar...”

Para Ricardo Aguilar, biólogo e pesquisador sênior da Oceana, uma das ONGs mais ativas na defesa dos oceanos no mundo:

“Infelizmente, e apesar dos oceanos estarem na agenda, não houve muitos avanços, fora o reconhecimento do papel do ecossistema marinho – nada foi aprovado até agora para protegê-los de verdade (...). Temos que aumentar a superfície da área marinha protegida em todo o globo para chegar pelo menos aos 30% recomendados por cientistas, ONGs e a União Internacional para a Conservação da Natureza.”

A questão dos oceanos é algo que tem que ser tratado com muita seriedade e as recomendações dos especialistas precisam ser consideradas, com ações imediatas e amplas para se combater os problemas citados. É urgente. A negligência e a ganância que existem em muitas situações devem ser superadas para o bem da Humanidade.

Sugestão de vídeos: 

Mares e oceanos estão em perigo

https://www.youtube.com/watch?v=duzOPcSkBPE


Poluição dos Oceanos

 

https://www.youtube.com/watch?v=z3nkfhkmZls

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História 

Figura:

https://www.google.com/search?q=imagem+de+oceanos&sxsrf=ALiCzsZvGetrxQPOfjQ-UaS-3BwrVsQYKw:1656556056230&tbm=isch&sourc

quarta-feira, 22 de junho de 2022

O Holodomor: A Fome mortal na Ucrânia dos anos 30 no século XX

 








No início da década de 30 do século XX houve na Ucrânia o Holodomor. Traduzindo para o português, quer dizer “deixar morrer de fome” ou “assassinato por fome” (“holod”, significa fome, e “mor”,significa praga ou morte). Para certos estudiosos foi uma calamidade, mas para outros tratou-se de uma política deliberada do ditador soviético Stalin entre 1931 e 1933 contra a população ucraniana por motivos políticos, uma forma de extermínio, ou seja, um tipo de genocídio. Uma corrente de pesquisadores afirma que houve intenção do governo de Stalin de destruir a "identidade nacional ucraniana".Nesse período, entre 3 a 8 milhões de ucranianos morreram devido à fome causada pela política stalinista da época.  Alguns analistas consideram que, se forem considerados os efeitos prolongados de todas as ações duríssimas do Estado sob o comando de Stalin, o número de ucranianos mortos pode ter chegado aos 14 milhões.

Os antecedentes do Holodomor estão relacionados ao tipo de políticas econômicas de Stalin desde 1928. Stalin pretendia controlar a produção de cereais na União Soviética, fazendo uma “requisição compulsória”, forçando os camponeses a entregar a preços baixos para o Estado grande parte do excedente agrícola que tinham produzido. Também houve a coletivização forçada das propriedades agrícolas, com administração racionalizada pelo Estado soviético. Nesse contexto, a Ucrânia mostrou forte resistência e alimentava um sentimento nacional que não estava de acordo com a vontade do governo soviético que tinha considerável influência da maior república, que era a Rússia. Tal atitude ucraniana de não aceitar suas políticas para o campo instigou Stalin a tomar medidas mais rígidas em relação à Ucrânia.

Houve por parte do governo liderado por Stalin uma campanha para vencer a resistência ucraniana às políticas do Estado soviético. Intelectuais ucranianos foram perseguidos e humilhados. Focos considerados de rebeldia contra o governo soviético foram atacados. E o próprio campesinato foi atingido pelas medidas duras de Stalin.

Começou em 1929 uma intensa programação de metas de produção de cereais para serem encaminhados ao poder central. As exigências eram muito severas e os camponeses só conseguiriam atende-las se deixassem de consumir o que era necessário para não passarem fome.  Houve prisões e condenações a trabalhos forçados por atos do campesinato como, por exemplo, comer batatas ou colher o milho para o próprio consumo. As mortes foram aumentando devido à fome. Os cadáveres se espalhavam pelas ruas e pelo campo.  Segundo o historiador Thomas Woods:

Em 1933, Stalin estipulou uma nova meta de produção e coleta, a qual deveria ser executada por uma Ucrânia que estava agora à beira da mortandade em massa por causa da fome, que havia começado em março daquele ano. Vou poupar o leitor das descrições mais gráficas do que aconteceu a partir daqui. Mas os cadáveres estavam por todos os lados e o forte odor da morte pairava pesadamente sobre o ar. Casos de insanidade, e até mesmo de canibalismo, estão bem documentados.” (Woods, Thomas. A fome na Ucrânia – um dos maiores crimes do estado foi esquecido. Instituto Mises Brasil.)

Josef Stalin, que governava a União Soviética desde a morte de Lenin em 1924, implementou o Primeiro Plano Quinquenal visando implementar um grande processo de modernização nacional. Com a imposição em todo o território soviético da coletivização da agricultura privada, esperava-se aumentar a produção e assim poder vender os excedentes agrícolas para outros países. Essa venda ajudaria a conseguir recursos para um processo de industrialização. Os donos de terras que se recusassem a cooperar seriam acusados de serem inimigos do Estado. Os maiores proprietários rurais eram chamados de kulaks. Mas com o tempo, pequenos proprietários foram também incluídos nessa categoria. Os donos de terras tinham de deixar suas propriedades para o Estado. Se resistissem, as famílias desses proprietários seriam tiradas á força das terras que ocupavam e envidas para outros lugares, muitas vezes sem boas condições de sobrevivência.  Intelectuais e religiosos considerados contrários à politica de Stalin seriam também deportados como forma de punição.  Muitos camponeses empobrecidos foram para as cidades. Em 1930 a Ucrânia se destacava nas suas colheitas, tendo produzido 1/3 do trigo da União Soviética (URSS). Devido à insuficiência de recursos obtidos no campo em diversas áreas da URSS, o governo central mandou confiscar quase metade da produção agrícola ucraniana de 1930.

Além da questão econômica existia a questão política. Conforme historiadores ucranianos, o governo stalinista desconfiava dos ucranianos e em sua análise os mesmos desejavam sua independência desde os anos 20, indo eles contra a ideia da Ucrânia como parte da URSS. Dessa forma, o governo soviético esperava enfraquecer muito essas aspirações nacionalistas e fortalecer a integração da Ucrânia na URSS. Para esses estudiosos, a posição política do governo de Stalin teve grande influência no Holodomor como uma maneira de submeter a Ucrânia. A maioria dos camponeses ucranianos não concordou com a política de coletivização. O Estado soviético, cujo controle estava nas mãos de Stalin, forçou os camponeses ucranianos a entregarem suas terras, gado e ferramentas agrícolas e os mandou trabalhar em fazendas coletivas.

Os ucranianos, em 1932, que estavam sujeitos ao planejamento rígido central tiveram a situação agravada por condições duras do clima, a existência de pragas, a necessidade de mais equipamentos para a colheita e a desmotivação dos camponeses em participar das fazendas coletivas. Diante disso, não houve apoio do governo central soviético e sim um aumento das exigências de cumprimento de metas mensais. Se uma pessoa fosse pega tirando comida para fora das áreas produtivas, seria presa. Ninguém poderia ter seu estoque pessoal de comida. Conforme pesquisadores, aldeias inteiras foram dizimadas e, em algumas regiões, a taxa de mortalidade pode ter alcançado um percentual de 30%.

As dificuldades enfrentadas pelos ucranianos levaram, no início de 1933, a uma rebelião que se espalhou, havendo sabotagem da produção. A reação do governo stalinista foi uma brutal repressão, com a prisão de cem mil pessoas que foram enviadas para campos de trabalhos forçados, os gulags. Por volta da metade desse ano, cerca de 30 mil ucranianos morriam por dia. A fome era tanta que ocorreram casos de canibalismo. Diante de atos de resistência, milícias a serviço do governo soviético iam até as e levaram tudo o que era comestível. Quando a fome estava no auge, autoridades soviéticas fecharam as fronteiras para que camponeses não fugissem para outros países.

O fim do Holodomor, após milhões de mortos, se deu com ajustes no programa de coletivização da agricultura. Segundo Simon Starrow, um professor ucraniano que viveu nos Estados Unidos e que usou o pseudônimo de Miron Dolot: “No fim de maio de 1933, a fome amainou. Acabou a inanição em massa. Verduras e frutas estavam disponíveis em abundância para todos que fossem capazes de sair e procurar por eles. Além disso, as autoridades precisavam de trabalhadores para as fazendas e elas não tinham outra escolha senão a de fornecer aos membros que trabalhavam no kolhosp rações alimentares suficientes para sustentar sua existência”.

Foi aprovada na Ucrânia em 2006 uma lei reconhecendo o Holodomor como uma ação genocida. Vinte países acompanharam esse reconhecimento. Mas a ONU não se pronunciou oficialmente sobre a questão. O governo russo nunca reconheceu que tenha acontecido um genocídio. Uma versão do governo russo foi de que os ucranianos estariam tendo uma “interpretação nacionalista” da fome. Para este governo, houve uma tragédia, sem intenções de extermínio, e, portanto, não houve um genocídio. O Brasil não foi um dos países que reconheceram o Holodomor como genocídio. O Senado dos Estados Unidos definiu, em 2018,o Holodomor como genocídio. A questão, se foi ou não um genocídio, até hoje suscita debates.

Segundo a pesquisadora Alexandra Ilia:

"Os assassinatos na Ucrânia não foram numerosos apenas na fome de 1932-1933. O número de mortos na Ucrânia depois que os bolcheviques chegaram ao poder também foi bastante alto. Nos anos antes da fome, o regime bolchevique tentou acabar com os sentimentos nacionalistas do povo ucraniano passando por expurgos da elite intelectual, impondo língua russa e dissolução da igreja nacional".

E também disse a mesma autora:

"O fato de que os bolcheviques estavam tentando destruir a identidade nacional dos ucranianos também pode significar que a fome pode não ter sido uma tentativa fracassada de forçar a coletivização, mas uma tentativa bem-sucedida de esmagar a Ucrânia como um todo".

A seguir um trecho de “Memória da Fome” na revista Aventuras na História, Edição 228:

Holodomor se origina das palavras em ucraniano holod(fome) e mor (praga ou morte). Ele foi resultado da política de coletivização compulsória das propriedades rurais ucranianas-celeiro agrícola do leste europeu- e de outros países daquela região, introduzida no fim de 1929 pelo regime comunista soviético, então comandado por Joseph Stalin (1878-1953). Como era de se esperar, boa parte dos fazendeiros ofereceu resistência ao decreto que os obrigaria a trabalhar em fazendas coletivas, as kolhosps. Eles eram os chamados kulaks, médios e grandes proprietários de terras que empregavam trabalhadores e detinham meios de produção. Porém, muitos agricultores pobres também se opuseram ao novo sistema.

Na prática, o termo kulak ganhou conotação ideológica no sentido de denominar todos os homens e mulheres do campo contrários à coletivização das terras. “Nesse processo, perderam suas propriedades, suas ferramentas e a possibilidade de trabalho. Essa fragilização de suas condições acabou atingindo-os diretamente também pela fome. Além disso, a repressão veio na forma de prisões, de deportações e de confisco dos grãos e dos animais”, conta Vinicius Liebel, Professor de História Contemporânea da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A questão agrária na Ucrânia era vital, pois a União Soviética utilizava a produção agrícola (especialmente a ucraniana) como moeda no mercado mundial para financiar suas indústrias. Logo, a queda da produção em decorrência da perseguição aos kulaks ameaçava os planos de crescimento russos. “Quando ficou claro, no decorrer do ano de 1932, que era fisicamente impossível atingir a cota de requisição de grãos pelo Estado, Stalin tomado pela fúria, ordenou o confisco de todos os estoques disponíveis, em nada importando as consequências para a população local”, sustenta Adam Ulam, Diretor do Russian Research Center da Universidade de Harvard."

E ainda na mesma revista:

“Temos ainda que considerar os esforços empreendidos pela URSS para apagar os rastros da Grande Fome. Arquivos locais foram incinerados; registros de mortes, desvinculados da inanição; dados de recenseamento públicos, alterados. Os próprios ucranianos temiam abordar o ocorrido pelo risco de sofrerem represálias”.

Segundo a colunista Anne Applebaum do Washington Post e professora da London of Economics e colaboradora do New York Reviwof Books em sua obra: A Fome Vermelha:

“Nos anos que se seguiram à fome, os ucranianos foram proibidos de falar sobre o que ocorrera. Eles tinham medo de prantear em público. Mesmo que ousassem fazer isso, não existiam igrejas para orar e nem sepulturas para decorar com flores. Quando o Estado destruiu as instituições do interior ucraniano, desferiu também poderoso golpe contra a memória pública.

Na vida privada, entretanto, os sobreviventes se lembravam de tudo. Fizeram anotações reais e mentais sobre o que ocorrera. Alguns mantiveram diários, “trancados em baús de madeira”, como um deles recordou, e escondidos embaixo de assoalhos ou enterrados no chão. Nos vilarejos, no seio de suas famílias, as pessoas também contavam aos filhos o que havia acontecido(...)”.

A ilusão de muitos ucranianos de que a invasão alemã a partir de 1941 na Segunda Guerra Mundial os livraria dos sacrifícios impostos pelo governo de Stalin logo se esvaiu, como Anne explicou em sua obra: 

“Como cada potência que ocupava a Ucrânia, os nazistas, em síntese, tinham um só interesse: os grãos. Hitler já vinha alegando por algum tempo que “a ocupação da Ucrânia nos livrará de qualquer preocupação econômica” e que o território ucraniano nos livrará de qualquer preocupação econômica”, e que o território ucraniano a eles garantiria “eu ninguém mais passaria fome, como na última guerra”. Desde os últimos anos da década de 1930, seu governo vinha planejando transformar aquela aspiração em realidade. Herbert Backe, sinistro oficial nazista encarregado da alimentação e da agricultura, concebeu um “Plano da Fome”, cujos objetivos eram claros: “A guerra só pode ser vencida se toda a Wermacht for alimentada pela Rússia no terceiro ano do conflito armado”. Mas ele também concluiu que toda a Wermacht, assim como a própria Alemanha, só poderiam ser alimentadas se a população soviética fosse totalmente privada de alimentos. Como Backe explicou em suas “Diretrizes para a Política Econômica”, emitidas em maio, bem como no memorando que circulou entre mil funcionários germânicos, em junho de 1941, “fome inimaginável” em breve tomaria conta da Rússia, da Bielorrússia e das cidades industriais da URSS: Moscou e Leningrado, além de Kiev e Kharkov. Essa fome não seria acidental: o objetivo era que cerca de 30 milhões de pessoas “fossem extintas”(...)” E ainda a autora sobre as intenções dos invasores nazistas: “(...) Essa era a política de Stalin multiplicada por mil: a eliminação de nações inteiras pela fome por inanição (...). Os alemães jamais tiveram a oportunidade de implementar por completo o “Plano da Fome” na Ucrânia. Mas sua política pôde ser sentida na política de ocupação (...)”.

 

Sugestão de vídeo:  

HOLODOMOR | A HISTÓRIA DA FOME UCRANIANA

https://www.youtube.com/watch?v=aRPnem6Aon8

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História. 


Figura:

https://www.google.com/search?q=imagens+de+holodomor&sxsrf=ALiCzsbc0u5u6VQ8YkcZT_saZaZsmwh12g:


segunda-feira, 20 de junho de 2022

A triste história do Hospital Colônia de Barbacena

 








Este meu artigo é sobre uma questão que ainda é muito pouco conhecida pelos brasileiros, a existência do Hospital Colônia de Barbacena. Sobre este hospital a jornalista Daniela Arbex escreveu o livro Holocausto Brasileiro. Segundo a autora deste livro, o hospital era semelhante a um campo e concentração.

A fundação do Hospital Colônia de Barbacena foi em 12 de outubro de 1903. Era um hospital psiquiátrico localizado na cidade de Barbacena, em Minas Gerais e integrava um conjunto de sete instituições psiquiátricas construídas nessa cidade que chegou a ser chamada de "Cidade dos Loucos". Ainda existem três desses hospitais em funcionamento.

O Hospital Colônia ficava em terras pertencentes à Fazenda da Caveira, cujo proprietário tinha sido Joaquim Silvério dos Reis. De início era um hospital para tratamento de tuberculosos e posteriormente virou hospital psiquiátrico. O local, em área montanhosa, era considerado bom para se curar os doentes com tuberculose. Também houve médicos que acharam o local favorável para tratamento de doenças mentais. O médico Joaquim Antônio Dutra foi o primeiro diretor. De Hospital Colônia de Barbacena a instituição foi depois chamada de Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena. Durante a República Velha o local foi considerado uma referência nacional no tratamento a transtornos psiquiátricos e muito procurado por quem queria abandonar membros indesejáveis da família. Antes da inauguração do Hospital Colônia os pacientes eram atendidos nos porões da Santa Casa. Foi nos anos duros da ditadura militar que as condições do hospital pioraram.Na atualidade, funciona no lugar um hospital gerenciado pela Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG).

Em 1900 havia em Minas Gerais a Assistência aos Alienados e o hospital de Barbacena foi relacionado a essa instituição. Havia uma área de cerca de 8 mil metros quadrados onde foi criado o chamado “Cemitério da Paz”. No Brasil, em 1895 tinha sido construído em 1895 o Hospital Psiquiátrico do Juqueri e depois a Colônia Juliano Moreira.

O Hospital, que funcionava como manicômio,era formado por dezesseis pavilhões independentes, cada qual com uma função. Por exemplo, o pavilhão para as mulheres indigentes era o Pavilhão "Zoroastro Passos"; para os homens indigentes era o Pavilhão “Antônio Carlos”. Nos anos de 1980 o hospital começou a ser criticado pelo tipo de tratamento dado aos pacientes, um tratamento duro demais. Chegou a ser chamado de campo de concentração nazista pelo psiquiatra italiano Franco Basaglia. Durante muitos anos pacientes chegavam ao hospital em grandes vagões de carga chamados de “trem de doido”. Nesse tempo diversas linhas ferroviárias passavam pela cidade de Barbacena. De 200 leitos disponíveis no hospital em 1903 o número aumentou nas décadas seguintes e em 1961 o hospital tinha aproximadamente cinco mil pacientes, entre eles constavam opositores políticos, prostitutas, homossexuais, mendigos, alcoólatras, amantes de líderes políticos, crianças indesejadas, epiléticos, vítimas de estupros, homens excessivamente tímidos, mulheres que tinham características de liderança ou que se recusavam se casar e grupos marginalizados socialmente (grande parte dos internos era de pessoas negras), todos considerados nessa época como “pessoas não agradáveis”. A maioria desses pacientes entrava no hospital sem nenhum sintoma de transtorno mental.

Foi chamado de “Holocausto Brasileiro” o período das décadas de 1960 e 1970, quando aconteceu o maio número de mortes. Alguns estudiosos estimam que pode ter sido um número aproximado a 60 mil mortos.

No tempo de funcionamento do hospital, havia famílias que, desejando um “tratamento” para membros que elas consideravam “desajustados”, encaminhavam essas pessoas para lá. Por anos o hospital operou muito além de sua capacidade normal. Havia pacientes de vários estados do Brasil que chegavam por trem em condições degradantes. Segundo o relato do médico Jairo Toledo, em um certo dia, no hospital, durante a madrugada, dezessete pacientes morreram de frio. O hospital acabou se tornando um lugar para se livrar daqueles que não eram enquadrados nos padrões de moral e de normalidade da época e até msmo como meio de se afastar pessoas que incomodavam politicamente. 

O psiquiatra Franco Basaglia, que fez uma visita em 1979, exigiu que o hospital psiquiátrico de Barbacena fosse fechado. Mas só nos anos da década de 1980 é que isso aconteceu. Em 1996 o Hospital Colônia foi reaberto e transformado em “Museu da Loucura”. O Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (CHPB) hoje em dia atende um universo de 50 cidades.

Os pacientes sofriam demasiado, tinham de trabalhar manualmente, dormir sobre capim seco sobre um chão de cimento (em meio a ratos e baratas), faziam necessidades fisiológicas no chão e ainda ocorriam estupros, castigos físicos (como o instrumento de tortura cadeira do dragão), uso de camisas de força, existência de celas solitárias e pressão psicológica, acontecendo as chamadas terapias de choque e usos de ducha forte, tudo isso somado à fome, falta de água potável, imensa sujeira. Os motivos para tal tratamento desumano diversas vezes era para servir como punição ou porque existiam conflitos entre pacientes e funcionários. Não raramente pessoas morriam devido a essas condutas desumanas. Alguns internos, sedentos, bebiam sua própria urina.

Para piorar, existia a superlotação. Havia internos que andavam nus e outros com pouquíssima roupa e nas baixas temperaturas do inverno sofriam muito e parte deles morria de hipotermia. Para tomarem banho muitos tinham de se banhar ou beber em um esgoto a céu aberto. Mulheres grávidas se sujavam com fezes para evitar a aproximação de funcionários. Bebês recém-nascidos após algum tempo eram separados das mães.  Pessoas que adoeciam eram abandonadas e morriam. Não aprendiam a falar, a ler e a escrever as crianças que nasciam no Hospital Colônia.

O público só ficou sabendo da real situação que acontecia no hospital quando em 1961 o fotógrafo Luiz Alfredo de O Cruzeiro mostrou por meio de suas fotos o que acontecia. E o jornalista Hiram Firmino realizou reportagens com nome de "Nos porões da loucura" sobre a realidade do hospital. Também foi feito por Helvécio Ratton,um filme chamado Em Nome da Razão.

Com tanta gente que morria, o cemitério das proximidades não conseguia ter espaço suficiente. A alternativa encontrada por funcionários corruptos foi o tráfico de corpos para laboratórios de anatomia de universidades. O total de corpos vendidos foi de 1853. Houve também corpos que eram dissolvidos em ácido. Quando o hospital foi fechado, houve a transferência de bem poucos sobreviventes para lugares com estrutura melhor, com direito à indenização do Estado. Ninguém foi punido pelos maltratos e mortes nesse hospital. Nenhum governo foi responsabilizado.

Museu da Loucura, idealizado por Jairo Toledo e inaugurado em 1996, funciona no antigo torreão do Hospital Colônia. É o museu mais visitado por turistas dos cinco que existem em Barbacena. Jairo publicou em 2008 o livro “Colônia” sobre a tragédia que aconteceu naquele hospital.

Relatos:

A ex-paciente Sônia do hospital, que passou por eletrochoques e agressões relatou: “Lá no hospital judiavam muito da gente. Já apanhei muito, mas bati em muita gente também. Como era agressiva, me deram muito choque. Agora tenho comida gostosa, talheres e o principal: liberdade.”

Marlene Laureano, que foi funcionária do CHPB desde os 20 disse: “Todas as manhãs, eu tirava o capim e colocava para secar. Também dava banho nos pacientes, mas não havia roupas para vestirem. Tinha um pavilhão com 300 pessoas para alimentar, mas só tinha o suficiente para 30. Imagine! Só permaneci aqui, porque tinha a certeza de que um dia tudo isso ia melhorar, sei que Deus existe.

Segundo o relato de Wellerson Durães de Alkmim, que fazia parte da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise, após sua ida ao hospital em 1975:

Eu era estudante do Hospital de Neuropsiquiatria Infantil, em Belo Horizonte, quando fui fazer uma visita à Colônia ‘Zoológica’ de Barbacena. Tinha 23 anos e foi um grande choque encontrar, no meio daquelas pessoas, uma menina de 12 anos atendida no Hospital de Neuropsiquiatria Infantil. Ela estava lá numa cela, e o que me separava dela não eram somente grades. O frio daquele maio cortava sua pele sem agasalho. A metáfora que tenho sobre aquele dia é daqueles ônibus escolares que foram fazer uma visita ao zoológico, só que não era divertido, e nem a gente era tão criança assim. Fiquei muito impactado e, na volta, chorei diante do que vi.”

Outro relato foi do psiquiatra e escritor Ronaldo Simões Coelho, que trabalhou na Colônia no início da década de 60 como secretário geral da recém-criada Fundação Estadual de Assistência Psiquiátrica, substituída, em 1977, pela Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig):

“Muitas das doenças eram causadas por vermes das fezes que eles comiam. A coisa era muito pior do que parece. Cheguei a ver alimentos sendo jogados em cochos, e os doidos avançando para comer, como animais. Visitei o campo de Auschwitz e não vi diferença. O que acontece lá é a desumanidade, a crueldade planejada. No hospício, tira-se o caráter humano de uma pessoa, e ela deixa de ser gente. Havia um total desinteresse pela sorte. Basta dizer que os eletrochoques eram dados indiscriminadamente. Às vezes, a energia elétrica da cidade não era suficiente para aguentar a carga. Muitos morriam, outros sofriam fraturas graves”.

Citações de autoras:

“Existências infames: sem notoriedade, obscuras como milhões de outras que desapareceram e desaparecerão no tempo sem deixar rastro – nenhuma nota de fama, nenhum feito de glória, nenhuma marca de nascimento, apenas o infortúnio de vidas cinzentas para a história e que se desvanecem nos registros porque ninguém as considera relevantes para serem trazidas à luz. Nunca tiveram importância nos acontecimentos históricos, nunca nenhuma transformação perpetrou-se por sua colaboração direta. Apenas algumas vidas em meio a uma multidão de outras, igualmente infelizes, sem nenhum valor. Porém, sua desventura, sua vilania, suas paixões, alvos ou não da violência instituída, sua obstinação e sua resistência encontraram em algum momento quem as vigiasse, quem as punisse, quem lhes ouvisse os gritos de horror, as canções de lamento ou as manifestações de alegria.”( Os infames da história – pobres, escravos e deficientes no Brasil (Faperj/Lamparina)de autoria da psicóloga Lilia Ferreira Lobo)

“Milhares de mulheres e homens sujos, de cabelos desgrenhados e corpos esquálidos cercaram os jornalistas. (…) Os homens vestiam uniformes esfarrapados, tinham as cabeças raspadas e pés descalços. Muitos, porém, estavam nus. Luiz Alfredo viu um deles se agachar e beber água do esgoto que jorrava sobre o pátio. Nas banheiras coletivas havia fezes e urina no lugar de água. Ainda no pátio, ele presenciou o momento em que carnes eram cortadas no chão. O cheiro era detestável, assim como o ambiente, pois os urubus espreitavam a todo instante” (Holocausto Brasileiro/ Geração Editorial( de autoria da jornalista Daniela Arbex.)

“O repórter luta contra o esquecimento. Transforma palavra o que era silêncio. Faz memória. Neste livro, Daniela Arbex devolve nome, história e identidade àqueles que, até então eram registrados como “Ignorados de tal”. Eram um não ser. Pela narrativa, eles retornam, como Maria de Jesus, internada porque se sentia triste, Antônio da Silva, porque era epilético. Ou ainda Antônio Gomes da Silva, sem diagnóstico, que ficou vinte e um dos trinta e quatro anos de internação mudo porque ninguém se lembrou de perguntar se ele falava. São sobreviventes de um holocausto que atravessou a maior parte do século XX, vivido na Colônia, como é chamado o maior hospício do Brasil, na cidade brasileira de Barbacena. Como pessoas, não mais como corpos sem palavras, eles, que foram chamados de “doidos”, denunciam a loucura dos “normais”(...)”

Eliane Brum (jornalista) , Prefácio do livro Holocausto Brasileiro, de autoria de Daniela Arbex.

 

Sobre o seu livro, a autora de Holocausto Brasileiro, Daniela Arbex explicou:

“Dei esse nome primeiro porque foi um extermínio em massa. Depois porque os pacientes também eram enviados em vagões de carga (ao manicômio). Quando eles chegavam, os homens tinham a cabeça raspada, eram despidos e depois uniformizados”.

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O psiquiatra italiano Franco Basaglia disse em 1979 quando visitou o hospício: “Estive hoje num campo de concentração nazista. Em nenhum lugar do mundo presenciei uma tragédia como essa”.

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Sugestão de vídeo: Diário do Repórter - Hospital Colônia de Barbacena

https://www.youtube.com/watch?v=38qRtOVBCgk

 

Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História e Psicólogo


Figura: https://www.google.com/search?q=imagem+do+museu+da+loucura&sxsrf=ALiCzsbtdTf6vBnOWayUOsHL0Sqa0aCuNA%3A1655762598809&source=