quarta-feira, 8 de novembro de 2023

O filme Assassinos da Lua das Flores

 




Vi recentemente o filme Assassinos da Lua das Flores, dirigido por Martin Scorsese, com os atores de renome Leonardo Di Caprio e Robert De Niro. O filme é baseado na obra do autor David Grann, que fez um trabalho de investigação para escrever o livro que serviu posteriormente de base para o filme.

Os roteiristas Martin Scorsese e Eric Roth procuraram agir com respeito ao povo Osage. Scorsese se consultou com lideranças desse povo para evitar estereótipos negativos contra nativos americanos. A atriz indígena Lily Gladstone teve destaque no filme. Ela disse em uma entrevista para a Variety"conforme a comunidade [indígena] se aqueceu com nossa presença, mais eles ficaram envolvidos com o filme. É uma obra diferente daquela que [Scorsese] chegou para fazer, por conta do que a comunidade [Osage] tinha a dizer sobre como o filme estava sendo feito e o que ele estava retratando".

Por que “Assassinos da Lua das Flores”? Na verdade o autor do livro usou uma metáfora para se referir aos homens que seguem uma ganância e se apoiam no preconceito para tocar em frente as ações de sua vida. O livro foi lançado em 2017. No livro o autor explica que é comum uma grande lua aparecer no mês de maio e aí plantas maiores engolem as menores.

Como se vê no filme, os Osage foram expulsos de suas terras originais pelo governo dos Estados Unidos, que se valia de seu forte exército para intervir junto às nações nativas e para garantir a superioridade dos descendentes de europeus, que tomavam as terras para plantar, criar gado e morar, além de caçar os animais que davam sustento aos indígenas. O povo Osage, embora forçado a migrar, teve a “sorte” de encontrar petróleo em suas novas terras no final do século XIX, no Oklahoma, o que os deixou ricos, mas ainda explorados, discriminados e o que é pior, sujeitos a assassinatos. A situação do Oklahoma (declarado Estado em 1907) era, no início do século XX , assim como outros Estados dos Estados Unidos, de considerável preconceito dos brancos em relação aos indígenas e negros.

Os Osage aparentemente pareciam gozar de certa liberdade e aceitação, mas essa situação era ilusória, pois a riqueza do petróleo os colocou como alvos da cobiça do homem branco. Além da questão dos Osage, havia outras questões sociais graves em diversos Estados, que revelavam muitas injustiças . Um caso que ficou famoso, que até é rapidamente mencionado no filme, é o massacre de Tulsa (31 de maio a 1 de junho de 2021), com um número de mortos entre 100 a 300, sendo a maioria de negros. Nesse massacre participaram multidões de brancos que atacaram pessoas negras e suas residências e comércios. Houve centenas de feridos e mais de 6000 negros foram presos e detidos por dias.

Voltando ao povo nativo (relatado no filme), vou contar um pouco da história dele. Os Osage são também conhecidos como NiuKonska ou Ni-U-Kon-Ska, (“filhos das águas médias). O nome no idioma osage é Wazházhe, que os franceses chamaram de Ouazhigi e na língua inglesa ficou Osage.

Os Osage habitaram regiões centrais e do nordeste da América do Norteantes da chegada dos colonizadores e fizeram parte da cultura do Mississipi. Sua alimentação era baseada no milho, na abóbora e em carne de cervo e búfalo.  Foram um povo guerreiro e chegaram a ter armas de fogo no tempo que a colonização branca estava em andamento, tendo controlado a região entre o Oeste estadunidense, com muitos povos indígenas, e o crescente Leste colonizado e até o século XIX controlaram o comércio entre colonizadores e indígenas.  O governo dos Estados Unidos assinou acordos com os Osage no período de 1809 a 1870 fazendo o esse povo perder mais de 40 mil quilômetros de território, tendo a nação Osage a migrado em 1872 para as áreas de Pawhuska, Hominy e Gray Horse. Tornaram-se a única nação indígena a comprar sua própria reserva (um lugar seco e cheio de pedras no Oklahoma) e foi nessa reserva que, em 1894 foi descoberto petróleo.

Segundo a Sociedade Histórica de Oklahoma: “Os royalties eram pagos à Tribo como um todo e distribuídos igualmemte entre os mebros, com cada beneficiário recebendo uma fatia igual”.  E também disse a mesma sociedade: 

“Esse direito era hereditário e repassado aos herdeiros legais imediatos de um beneficiário falecido. E não era preciso pertencer à tribo Osage para herdar esse direito”.

O FBI, que investigou o caso dos assassinatos disse: “À medida que a notícia (da fortuna) se espalhou, oportunistas chegaram às terras dos Osage, procurando separá-los da sua riqueza por qualquer meio necessário – até mesmo assassinato”.

Baseando-se na história dos Osage em relação ao petróleo e as tentativas de acabar com este povo para roubar sua riqueza nesse recurso , o autor David Grann escreveu sua obra. Os Osage passaram a ser o povo nativo norte-americano o mais rico per capita do mundo no começo dos anos 20 do século passado. Em locais como Gray Horse surgiram várias casas luxuosas e carros grandes, assim como indígenas com empregados. Porém, uma camada de homens brancos se organizou para enganar , roubar e matar indígenas, com a conivência de autoridades e forças de segurança.  Foi uma época que os Osage definiram como uma “orgia de golpes e exploração”.

Essa história triste tem sido ignorada e não é estudada nas escolas nos Estados Unidos. O cabeça do bando de ladrões e assassinos de indígenas era William King Hale, proprietário de bancos e lojas e detentor de grande influência política,que elaborou o plano que envolvia roubo e destruição do povo Osage. Pelo lado indígena, a osage Mollie Burkhart perdeu sua família devido aos assassinatos, intoxicações, desaparecimentos e mortes por doenças estranhas.

O sistema de leis que começava as injustiças contra os indígenas dizia que os direitos de exploração os recursos da reserva só podiam chegar a mãos alheias à sua linhagem por herança. O Estado declarou os Osage menores de idade e nomeou um tutor branco para cada fortuna do petróleo . Aproveitando o contexto, homens brancos casavam com mulheres osage para depois as matarem e o bando herdar os bens dos indígenas. Segundo Grann, o livro vai além de uma pesquisa clássica em busca de saber quem havia cometido o crime, passando a descrever “uma cultura do assassinato”.

Para procurar saber o que estava acontecendo, para saber a razão da morte de tantos indígenas de formas trágicas os Osage contrataram detetives particulares como o famoso William J. Burns e profissionais da agência Pinkerton. Porém, a conivência das autoridades, da polícia e dos juízes com os assassinos causou muitas dificuldades e não houve sucesso no trabalho desses investigadores. O advogado W.W. Vaughan, que se interessou pela causa dos indígenas foi assassinado. Ele possuía provas concretas sobre os planos sujos contra os Osage. A imprensa mencionava uma trama contra os “índios ricos”, porém não eram tomadas providências legais para se acabar com as injustiças e mortes. Houve na época a participação nas investigações da agência federal dos Estados Unidos que deu origem depois ao FBI.

O FBI originou-se do órgão criado em 1908 e sua figura central era J. Edgar Hoover. Na década de 20 do século passado a agência ainda era frágil e com pouca jurisdição em casos de assassinatos, porém com autonomia para agir em terras indígenas.

Foi em março de 1923 que o conselho tribal pediu ao governo federal que enviasse detetives para ajudar a investigar os casos. Entra em cena o Bureau of Investigation (BOI, precursor do FBI), que mandou um grupo de agentes para o território Osage. Era uma agência ainda pequena, com menos de 20 anos de existência. As mortes dos indígenas Osage passaram a ser seu primeiro grande caso de homicídio, sendo consideradas um marco crucial na criação do FBI.

No caso o chefe da investigação foi o agente White, um texano que não usava armas e que era respeitado. Segundo Grann sobre o caso investigado pelo FBI: “Hoover o usou para avançar em todos os sentidos. Foi assim que acumulou todo o poder e começou a abusar dele. Tinha apenas 28 anos, mas já se via seu gênio organizativo, sua megalomania e sua obsessão pela boa imprensa”.

Devido às investigações da agência federal o líder criminoso William  Hale foi condenado em relação a alguns assassinatos. O autor do livro descobriu que a situação era mais complexa do que tinha sido revelado pela agência. Disse Grann:

 “Sou um grande leitor de romances policiais e isso me ajudou muito. Além disso, as pessoas viveram aquilo como um mistério. Mollie não sabia quem seria o próximo a morrer, quem os estava matando. Com essa forma de narrar tento capturar o leitor e transmitir a realidade da melhor forma possível”. Uma neta de uma das vítimas indígenas disse: “Estas terras estão encharcadas de sangue”.

No total, cerca de 60 pessoas, entre indígenas, testemunhas e investigadores não indígenas, morreram no caso dos Osage no período entre 1921 e 1925. Essa série de crimes ficou conhecida como “Reinado do Terror”.

Segundo os arquivos do FBI, a respeito dos primeiros casos que chamaram a atenção em maio de 1921: “O corpo decomposto de Anna Brown, uma indígena Osage, foi encontrado em um barranco em uma área remota. O agente funerário descobriu um ferimento a bala em sua nuca”. Também nessa época houve os casos de Charles Whitehorn, encontrado morto com marcas de tiros e Minnie, irmã de Anna, morreu por causa de uma doença misteriosa. Em 1923 foi morto a tiros Henry Roan, primo de Anna e Rita Smith, casada com William E. Smith e irmã de Anna foi morta junto com o marido e uma empregada devido uma explosão que destruiu a casa onde estavam. Em seguida, outras 20 mortes ocorreram sem explicação. Quem suspeitasse ou apontasse evidências sobre os crimes era ameaçado ou assassinado.  Segundo a Sociedade Histórica de Oklahoma:

 

“As mortes de algumas supostas vítimas que não apresentavam ferimentos visíveis foram simplesmente atribuídas a "indigestão", "doenças peculiares" ou "causas desconhecidas”. Um fator comum a todos os Osage mortos é que tinham direitos à renda de petróleo, que poderiam repassar a seus herdeiros. Mollie, por exemplo, casada com Ernest Burkhardt, um homem branco herdou uma fortuna devido à morte de Anna, Lizzie e Rita. Segundo a agência de investigação federal: “Mollie Burkhart estava arrasada e também afligida por uma doença misteriosa.” Investigações descobriram que ela estava sendo envenenada. O tio de Ernest era Hale, o chefe do esquema criminoso. Relato da agência federal disse: “Se Anna (a primeira vítima), sua mãe e duas irmãs morressem, todos os direitos (relativos à renda com o petróleo) passariam para Ernest, e Hale poderia assumir o controle”.

 

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A ação do enviado especial para comandar as investigações pela agência federal BOI ( que veio a originar o FBI), Tom White, junto com outros agentes disfarçados de vendedores de seguros ou compradores de gado, entre outras profissões, foi crucial para desvendar o caso. Conseguiu-se provar que Hale tinha sido o mandante do assassinato dos membros da família de Mollie  para herdar os direitos ao petróleo.  Assim, Hale, Burkhart e Ramsey foram as pessoas detidas em janeiro de 1926 e depois de três meses foram presos também Kelsie Morrison e Byron Burkhart, irmão de Ernest Burkhardt

Por três anos houve julgamentos em tribunais estaduais e federais, com bastante acompanhamento da mídia. Apesar de Ernest Burkhart, Hale, Ramsey e Morrison terem sido sentenciados à prisão perpétua, alguns anos depois ganharam a liberdade

Finalmente, em 1925 foi aprovada uma lei pelo Congresso dos Estados Unidos proibindo pessoas que não sejam Osage de herdar os direitos (ao petróleo) de membros desse grupo. Porém segundo os Osage há ainda 26% desses direitos nas mãos de pessoas e instituições que não tem relação com esta nação indígena

A atriz descendente de indígenas DeveryJacobs fez algumas críticas ao filme. Segundo ela a visão de Scorsese sobre os Osage no filme foi "dolorosa, cansativa e desnecessariamente gráfica".  Disse ainda:

"Para mim, como nativa, assistir a esse filme foi como ir ao inferno. Imagine as piores atrocidades cometidas contra seus antepassados, então assista a um filme explicitamente preenchido com elas, com o único descanso sendo cenas de 8 minutos, com homens brancos assassinos falando sobre como pretendem fazer seus assassinatos.

Deve-se notar que Lily Gladstone é uma lenda absoluta e carrega Mollie com tremenda graça. Todos os incríveis atores indígenas foram os únicos fatores redentores deste filme. Deem a Lily seu maldito Oscar!

Mas embora todas as performances tenham sido fortes, se você olhar proporcionalmente, cada um dos personagens Osage parece dolorosamente subscrito, enquanto os homens brancos receberam muito mais cortesia e profundidade.

No entanto, entendo que a direção técnica de Martin Scorsese é convincente, e ver os US$ 200 milhões em tela é um espetáculo. Eu entendo que o objetivo dessa violência é adicionar um valor de choque brutal, que força o entendimento dos verdadeiros horrores que aconteceram com essa comunidade, mas... Não sinto que essas pessoas muito reais tenham recebido honra ou dignidade no retrato horrível de suas mortes.

Ao contrário, acredito que, ao mostrar mais mulheres indígenas assassinadas na tela, isso normaliza a violência cometida contra nós e desumaniza ainda mais nosso povo.

E ainda por cima, ver como os nerds do cinema estão comemorando isso? Faz meu estômago doer!

Não acredito que isso precise ser dito, mas povos indígenas existem além de nossa dor, trauma e atrocidades. Nosso orgulho de ser nativo, nossas línguas, culturas, alegria e amor são muito mais interessantes e humanizadores do que mostrar os horrores que os homens brancos nos infligiram.

Este é o problema de quando os diretores não-nativos têm a liberdade de contar nossas histórias, eles centram a perspectiva branca e se concentram na dor dos povos nativos.

Para as comunidades Osage envolvidas na criação deste filme, imagino o quão catártico é ter essas histórias finalmente reconhecidas, especialmente em uma plataforma tão prestigiada como este filme. Houve um belo trabalho feito por muitos Wazhazhe neste filme.

Mas, admito, eu preferiria ver um cineasta Osage contando essa história em um filme de US$ 200 milhões.

E me desculpe, mas Scorsese optar por terminar com uma cena de danças e batuques de Ilonshka? Isso não absolve o filme de fazer dos nativos vítimas indefesas sem assistência.

R.I.P. para Mollie, Anna, Minnie, Rita, e todas as outras pessoas Osage muito reais que foram assassinadas por ganância. Sinto muito pelo povo Osage de hoje, cujas histórias familiares foram marcadas por essas atrocidades. A dor é real e não se limita às 3h e 26 minutos do filme.

E um enorme dane-se para a vida real, pros brancos de Oklahoma, que ainda carregam e se beneficiam dessas cabeças manchadas de sangue.

Em suma, o que foi retratado no cinema, essa é realmente a representação que precisávamos?"

Sobre o filme disse o crítico de cinema Marco Antônio Moreira:

“Assassinos da Lua das Flores comprova Martin Scorsese como um cineasta que atingiu a plenitude de sua expressão artística, ao criar um filme que desvela os trágicos assassinatos de indígenas Osage nos Estados Unidos na década de 1920. Inspirado no livro  de David Grann, o filme tece uma narrativa envolvente que revela  as complexas dinâmicas  de poder dos homens brancos que exploraram oportunidades de enriquecimento por meio das terras pertencentes à tribo Osage.

Com uma abordagem cuidadosa, o filme ilustra de maneira paciente e perspicaz as múltiplas formas de manipulação, seja no âmbito financeiro, emocional ou político, em relação aos indígenas. Essa abordagem revela imagens  e palavras  com um profundo respeito pelo espectador por meio  de uma linguagem que permite a progressão gradual da trama. Ao contrário das produções contemporâneas que muitas vezes cedem à pressa Scorsese entrega um filme de longa duração no qual cada minuto é precioso, proporcionando ao espectador uma compreensão profunda e necessária dos horrores desse triste capítulo da historia dos Estados Unidos...”

Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=580743629&q=imagem+de+assassino+da+lua+das+flores&tbm=


quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Novembro

 


 

Outubro já parte sim,

Novembro enfim,

Começa com fim,

Dia que tantos são lembrados.

Depois no meio,

Outro feriado,

Mas veja,

Para tristeza de muitos,

Que gostam demais da cerveja

Não será emendado.

E aí o mês segue,

Seco,

Talvez às vezes um pouco molhado.

E aí o afobado,

Já arma sua árvore de Natal,

Fazendo plano,

Para a virada do ano,

Afinal,

É preciso garantir ,

Que tudo saia como planejado.

Mês de guerras ainda,

Ucrânia, Síria, Palestina...




Mas a moça linda,

Mulher com sorriso de menina,

Que encanta quando ri,

É capaz de fazer florir ,

O ano que se inicia.





Ria moça!

Ria!

Que você possa,

Encantar a tantos,

Mesmo que haja uma longa noite escura e fria


Nos lugares onde o som dos canhões ,

Abafam cantos ,

De esperança.




Ria moça,

Como uma criança,

Que ainda sonha.


Que aqueles que choram rios

E que encharcam a fronha,

Ou colchões precários,

Possam algum dia

Sorrir de alegria.

Até parece que foi ontem,

Que partia,

Setembro,

Levado pelo vento

Do tempo.

Adeus Outubro!

Bem vindo Novembro!

Márcio José Matos Rodrigues

 * Poesia escrita em 31 de outubro de 2023

 

 Figuras:

https://www.google.com/search?q=imagem+de+folhinha+com+m%C3%AAs+de+novembro+de+2023&tbm=isch&ved

https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=578690205&q=imagem+de+guerra&tbm=isch&source=univ&fir=eUuJzVaePeea_

https://br.freepik.com/fotos/mulher-sorrindo

https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+campo+florido#vhid=ev

https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=578690205&q=imagem+de+noite+escura+e+fria&

https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=578690205&q=imagem+de+canh%25C3%25B5es+disparando&

https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=578690205&q=imagem+de+menina+sonhando&tbm=isch

 


segunda-feira, 16 de outubro de 2023

A educadora, diplomata e poetisa chilena Gabriela Mistral

 



Neste mês de outubro de 2023, quando o mundo está passando por guerras e outros conflitos terríveis que afetam tanta gente e considerando também o “Dia do Professor” comemorado no Brasil em 15 de outubro, resolvi escrever sobre Gabriela Mistral, uma poetisa (ou poeta), educadora, diplomata e feminista chilena, que em 1945 (ano do fim da Segunda Guerra Mundial) recebeu o Prêmio Nobel de Literatura.

O nome original de Gabriela Mistral era Lucila de Maria del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga. Ela nasceu em Vicuna, Chile, em 7 de abril de 1889. O amor, o amor de mãe, memórias pessoais dolorosas, mágoa e recuperação foram temas centrais em poemas escritos pela autora.

Seu pai era o professor e poeta Juan Jerónimo Godoy Villanueva, e sua mãe era Petronila Alcayaga Rojas, descendentes de espanhóis. Gabriela passou anos de sua infância em localidades do vale de Elqui, na atual Região de Coquimbo. Aos dez anos foi com seus pais para La Union(hoje em dia é Pisco Elqui). Mas o local que Gabriela considerava como sua cidade natal foi Montegrande, onde ela viveu entre três e nove anos. Ela chamava este lugar de “amado povoado”.

 Aos três anos o pai de Gabriela deixou a família, mas ela o defendeu e  mencionou que foram poemas de seu pai que incentivaram nela o gosto pela poesia. A sua mãe morreu em 1929. Para ela foi dedicado a primeira parte do livro TalaMuerte de mi Madre

Gabriela passou a trabalhar como professora primária em 1903, tendo feito a prova nacional para professores na Escola Normal N º 1 de meninas de Santiago e obteve o título de “Maestra”. Trabalhou como professora em cidades chilenas, conheceu o poeta Pablo Neruda e em 1918 se tornou diretora do "Liceo de niñas de PuntaArenas". Foi convidada em 1922 pelo Ministério da Educação do México para trabalhar nos planos da reforma educacional que estava sendo conduzida pelo filósofo e ministro de educação José Vasconcelos.

Em 1914, ao vencer os JuegosFlorales de Santiago, com seus Sonetos de La Muerte, a então Lucila Godoy passou a utilizar o pseudônimo de Gabriela Mistral, em referência a seus poetas preferidos: o italiano Gabriele D’Annunzio e o provençal Fréderic Mistral.

Em 1945, quando fazia parte do corpo diplomático chileno, Gabriela residiu na cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro e nessa época recebeu a notícia de que tinha sido escolhida para receber o Prêmio Nobel de Literatura, passando a ser a a primeira escritora latino-americana a receber tal prêmio. Ela passou a ter um destaque internacional e começou a viajar para diversos lugares do mundo e também passou a representar o Chile em comissões culturais das Nações Unidas. Ela deixou as atividades de ensino para se dedicar a cargos diplomáticos na Europa. Era muito respeitada por sua honestidade moral e intelectual, imbuída de um profundo sentimento religioso. Teve sua poesia influenciada pelo trágico suicídio de seu noivo em 1907. Essa marca levou a sua poesia a ter características de um forte carinho maternal, como em seus poemas relacionados às crianças. Na sua poesia encontram-se elementos como o amor pelos humildes e um interesse pela Humanidade.

Gabriela veio a falecer em 10 de janeiro de 1957 em Hempstead, Estado de Nova Iorque, nos Estados Unidos.

 

Entre as obras mais significativas de Gabriela Mistral podem ser citadas:

Sonetos de laMuerte, 1914; Desolación, 1922; Lecturas para Mujeres, 1923; Ternura, 1924; Nubes Blancas y Breve Descripción de Chile, 1934; Tala, 1938; Antología, 1941; Lagar, 1954; Recados Contando a Chile, 1957

 

Segundo a professora Dilva Frazão:

 

“(...) Gabriela Mistral, pseudônimo literário de Lucila de Maria del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga, nasceu em Vicuña, no Norte do Chile, no dia 7 de abril de 1889. Era filha de um professor, descendente de espanhóis e índios. Desde cedo, demonstrou um interesse duplo: tanto pela escrita como pela docência.

Com 16 anos decidiu se dedicar à carreira de professora. Quando estava com 18 anos, seu namorado se suicidou, fato que marcou sua obra e sua vida.

Em 1914, quando tinha 25 anos, ganhou um concurso de poesia nos Juegos Florais de Santiago, com “Sonetos de La Muerte” – começava a nascer “Gabriela Mistral”, nome criado em homenagem aos poetas que admirava o italiano Gabriele D’Annunzio e o francês Frédéric Mistral.

Em 1922, publicou seu primeiro livro de poesias, “Desolación”, onde incluiu o poema “Dolor”, no qual fala do suicídio de seu namorado.

Gabriela Mistral trabalhou como professora de escola secundária e como diretora. Ainda em 1922, foi convidada para trabalhar no Ministério da Educação do México.

Logo, Gabriela se tornaria uma referência na pedagogia – elaborou as bases do sistema educacional do México, fundou escolas e organizou várias bibliotecas públicas.

A notoriedade a obrigou a abandonar o ensino e a desempenhar diversos cargos diplomáticos na Europa, Estados Unidos e América Latina. Em 1926 foi nomeada secretária do Instituto de Coperación Intelectual de la Sociedade de Naciones.

Paralelamente foi redatora da revista de Bogotá “El Tiempo”. Representou o Chile em um Congresso universitário em Madri e pronunciou uma série de conferências sobre o desenvolvimento cultural norte-americano, nos Estados Unidos.

Gabriela Mistral foi nomeada Consulesa do Chile e representou seu país em Nápoles, Madri, Lisboa e no Rio de Janeiro.  Nos anos 30 e 40, ela era considerada um ícone da literatura latino-americana (...)”

Também a mesma autora sobre Gabriela:

 

“(...) Logo que chegou ao Brasil, fez amizade com Cecília Meireles – lançaram um livro de poemas juntas. Fez amizades literárias com Manuel Bandeira, Jorge de Lima, Assis Chateaubriand e seu predileto, Vinícius de Moraes. Conheceu Mário de Andrade através de Cecília. Nessa época, escreveu para o Jornal do Brasil.

A poesia de Gabriela Mistral é única, mística e repleta de imagens singulares e de lirismo. Seus temas centrais são o amor pelos humildes, memórias pessoais dolorosas, as mágoas e um interesse mais amplo por toda a humanidade (...)”

Alguns poemas de Gabriela Mistral:


Eu Não Sinto a Solidão.

É noite desampara
Das montanhas ao oceano
Porém eu, a que te embala,
Eu não sinto a solidão.

É todo o céu desamparo,
mergulha a lua nas ondas,
Porém eu, a que te embala,
eu não sinto a solidão

É o mundo desamparo,
Triste a carne em abandono,
Porém eu, a que te embala,
Eu não sinto a solidão.

A oração da mestra

Senhor! Tu que ensinaste, perdoa que eu ensine; que leve o
nome de mestra, que Tu levaste pela Terra.

Dá-me o amor único de minha escola; que nem a queimadura da
beleza seja capaz de roubar-lhe minha ternura de todos os instantes.

Mestre, faz-me perdurável o fervor e passageiro o desencanto.
Arranca de mim este impuro desejo de justiça que ainda me perturba, a
mesquinha insinuação de protesto que sobe de mim quando me ferem.
Não me doa a incompreensão nem me entristeça o esquecimento das que ensine.

Dá-me o ser mais mãe que as mães, para poder amar e defender
como elas o que não é carne de minha carne. Dá-me que alcance
a fazer de uma de minhas crianças meu verso perfeito e a deixar-lhe
cravada minha mais penetrante melodia, para quando meus lábios não cantem mais.

Mostra-me possível teu Evangelho em meu tempo, para que não
renuncie à batalha de cada dia e de cada hora por ele.

Põe em minha escola democrática o resplendor que se discernia sobre
tua roda de meninos descalços.

Faz-me forte, ainda em meu desvalimento de mulher, e de mulher pobre;
faz-me desprezadora de todo poder que não seja puro, de toda pressão
que não seja a de tua vontade ardente sobre minha vida.


 

Ausência

Se vai de ti meu corpo gota a gota.
Se vai minha cara no óleo surdo;
Se vão minhas mãos em mercúrio solto;
Se vão meus pés em dois tempos de pó.

Se vai minha voz, que te fazia sino
fechada a quanto não somos nós.
Se vão meus gestos, que se enovelam,
em lanças, diante de teus olhos.
E se te vai o olhar que entrega,
quando te olha, o zimbro e o olmo.

Vou-me de ti com teus mesmos alentos:
como umidade de teu corpo evaporo.
Vou-me de ti com vigília e com sono,
e em tua recordação mais fiel já me borro.
e em tua memória volto como esses
que não nasceram nem em planos nem em bosques

Sangue seria e me fosse nas palmas
de teu trabalho e em tua boca de sumo.
Tua entranha fosse e seria queimada
em marchas tuas que nunca mais ouço,
e em tua paixão que retumba na noite,
como demência de mares sós.

Se nos vai tudo, se nos vai tudo!


Desolação

A bruma espessa, eterna, para que esqueça de onde
Há-me jogado ao mar em sua onda de salmoura.
A terra a que vim não tem primavera:
tem sua noite longa a qual mãe me esconde.

O vento faz à minha casa sua ronda de soluços
e de alarido, e quebra, como um cristal, meu grito.
E na planície branca, de horizonte infinito,
vejo morrer intensos poentes dolorosos.

A quem poderá chamar a que até aqui há vindo
se mais longe que ela só foram os mortos?
Tão sós eles contemplam um mar calado e rígido
crescer entre seus braços e os braços queridos!

Os barcos cujas velas branqueiam no porto
vem de terras onde não estão os que são meus;
e trazem frutos pálidos, sem à luz de meus hortos,
seus homens de olhos claros não conhecem meus rios.

E a interrogação que sobe a minha garganta
ao olhar-los passar, me descendem, vencida:
falam estranhas línguas e não a comovida
língua que em terras de ouro minha velha mãe canta.

Vejo cair a neve como o pó na sepultura,
Vejo crescer a névoa como o agonizante,
e por não enlouquecer não encontro os instantes,
porque a "noite longa" agora tão só começa.

Vejo o plano extasiado e recolho seu luto,
que vim para ver as paisagens mortais.
A neve é o semblante que aparece a meus cristais;
sempre será sua altura abaixando dos céus!

Sempre ela, silenciosa, como a grande olhada
de Deus sobre mim; sempre sua flor de laranjeira sobre minha casa;
sempre, como o destino que nem mingua nem passa,
descenderá a cubrir-me, terrível e extasiada.



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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura :https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=573686166&q=fotos+de+gabriela+mistral&tbm=isch&source=univ&fir=Q3i4bAfDINDdBM%25252Cyk_c5on7Q1fdBM%25252C_%25253BhrMuijjSI4eybM%25252CVclJmpSvDN-FIM%25252C_%25253B5nPA7YROiwwo3M%25252CVclJmpSvDN-FIM%25252C_%25253BZCVHRINGeq3biM%25




domingo, 15 de outubro de 2023

É preciso chover na minha horta!

 




Se o amor me move,

A dor me comove.

O grande calor ,

Mata a couve,

Na horta,

E não chove!

Couve peço por ti,

E por todas as hortaliças.

Será que o deus da chuva,

Não se importa?

Está com preguiça?

Preciso de couve, cenoura e repolho,

Não aguento mais comer

Ovo com linguiça!

Ó corvo,

Tu que te dás bem com a brisa,

Vê se tu me avisas,

Quando é que vem,

O fim da estiagem.

Se é preciso coragem

E fé,

Para a vida,

Também é preciso água para a vagem,

Da terra seca não vem comida,

E saco vazio não se põe em pé!

Márcio José Matos Rodrigues

Figura: https://www.google.com/search?q=imagens+de+planta%C3%A7%C3%A3o+murcha+por+falta+de+chuva&tbm=isch&ved=2ahUKEw


sábado, 14 de outubro de 2023

Metade de outubro

 





Outubro chega

Na metade.

Oba!

Já deu vontade,

De comer uma maniçoba!

Bora lá!

Calor?

Ainda temos de sobra,

Em Belém do Pará,

Mas falta mais amor

Para a Humanidade.

Mais um Círio se passou,

Para deixar saudade,

Para nós paraenses dizermos:

“Eu me lembro...”

Moça,

Vá vendo,

Na folhinha.

Daqui a pouco novembro,

Talvez uma chuvinha...

Seria melhor você preparar sua sombrinha?

Recordo das mangas

Caindo...

Já sinto Dezembro rindo,

Esperando sua hora.

Mais um ano indo,

Outro ano vindo.

É a realidade!

Tudo que passou é só um pingo,

Na grande obra,

Da eternidade!

Márcio José Matos Rodrigues

 

Figura: https://www.google.com/search?q=figura+de+uma+folhinha+no+m%C3%AAs+de+outubro+de+2023&tbm


quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Assa aí

 








Assa aí

A carne,

E a sardinha.

Deixa que eu levo o açaí.



Ri!

Com açúcar?

Se não tem pede para a vizinha!

Farinha ?

Tapioca?

Muita?

Pouca?

Minha bela,

Sei que ficas louca,

Por uma tigela,

Do grosso.



Aproveita também

Que a carne não tem osso.

Aproveita bem!

O açaí descendo gostoso,

Goela abaixo,

O lábio roxo.



Que maravilha!

Se tem ervilha

E repolho?

Mania tua...

Mas pede!

Se açaí faz bem para o olho?

Não sei,

Mas repete!

Assa bem que a carne ainda está crua!

No meu sonho,

Estamos em uma titânica ilha,

A comida no fogo,

Eu escutando o jogo,

Em um radinho de pilha,

Deitado na rede,

E tu escutando no teu IPAD

Uma canção da Ivete.









Márcio José Matos Rodrigues

 

Figuras:

Figura 1:  https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+carne+assando+na+brasa#vhid=

Figura 2: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=569281890&q=imagem+de+a%25C3%25A7a%25C3%25AD&tbm=isch&source=univ&fir=shg25bNLIv

Figura 3:  https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+sardinhas+na+brasa#vhid=hpus

Figura 4: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=569281890&q=mulher+bebendo+a%25C3%25A7ai&tbm

Figura 5: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=569281890&q=imagem+de+a%25C3%25A7ai+do+grosso&tbm=isc

Figura 6: https://www.google.com/search?q=homem+deitado+na+rede+desenho&tbm=isch&client=firefox-b

Figura 7: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=569281890&q=imagem+de+um+radinho+de+pilha&tbm

Figura 8: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&sca_esv=569281890&q=mulher+na+praia+com+um+ipad+escutando+musica&tbm=isc

 

 

 

 

 


Brisa e Tempestade

 




Tempo,

Pedi para ti,

Para vires bem lento,

Nas costas de um jabuti.



Mas tu vens serelepe,

Nas costas da lebre.





Diante da eternidade,

É tudo tão breve...

O tempo não para,

Não paralisa,

Não faz greve.

Melhor mesmo é curtir a brisa,

Suave, leve...

Aprecia o luar,

Minha querida.

Porque tempestade na vida,

Nem sempre avisa,

Quando vai chegar.


Cada um de nós tem um mar,

E precisa

Navegar.




Márcio José Matos Rodrigues


Figuras:

Figura 1: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=figura+de+ampulheta

Figura 2: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+um+jabuti

Figura 3: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+uma+lebre#vhid=2nuFlYD5bxqx

Figura 4: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+tempestade

Figura 5: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagem+de+mar#vhid=7oFmrG9Jb2WJAM&vssid=l