sábado, 17 de junho de 2017

A Batalha de Waterloo




No domingo de 18 de junho de 1815 aconteceu a batalha de Waterloo. Foi a última batalha de Napoleão Bonaparte e que decidiu o fim de seu império. Era o fim de seu governo de 100 dias após a fuga de Elba, onde tinha sido encaminhado para reinar sobre uma pequena ilha.  Em 22 de junho ele abdicou do trono. Foi mandado pelos ingleses para Santa Helena, onde morreu em 1821.
Napoleão foi um general, corso de nascimento, que se destacou no governo do Diretório, na Revolução Francesa. No fim de 1799 após dar um golpe de Estado tornou-se primeiro consul e em dezembro de 1804 foi coroado imperador da França. Até 1812 já tinha conseguido  vencer batalhas importantes contra os países inimigos de seu império como a Áustria, Prússia e Rússia. Austerlitz foi uma batalha de grande glória para Napoleão, quando os exércitos russo e austríaco foram derrotados.  Mas sua marinha unida à da Espanha sofreu grande derrota em Trafalgar e em 1812 deu-se o início da derrocada napoleônica com a desastrosa campanha da Rússia, que praticamente acabou com o grande exército de aproximadamente 600.000 soldados, o chamado "Exército das 20 nações".
Em Leipzig, na Batalha das Nações, em 1813, seu exército que já estava muito enfraquecido, viu-se com os efetivos ainda mais reduzidos e com a moral mais abalada. Ainda assim Napoleão resistiu mais algum tempo em território francês, tentando impedir a tomada da França pelos aliados, no entanto suas tropas não tinham mais condições para se opor a forças mais poderosas, tendo ele de renunciar em 1814 e em maio do mesmo ano chegava a Elba.
Com a volta de Napoleão à França, o rei Bourbon Luís XVIII fugiu e o corso formou novo governo. Mas os aliados de novo formaram uma coligação (a sétima) contra ele, que para enfrentá-los montou novo exército, sendo que parte dele de veteranos de outras campanhas.
O escritor Bernard Cornwell em sua obra "Waterloo"  sobre a chegada de Napoleão em Paris em 1815 escreveu: " Sua majestade imperial, Napoleão Bonaparte, tinha 46 anos quando entrou no Palácio das Tulherias, em Paris, onde uma multidão entusiasmada aguardava sua chegada. Estava reunida havia horas. O rei, o gordo Luís XVIII, fugira de Paris, indo para Ghent, no Reino dos Países Baixos..."
Segundo o mesmo autor: "Em 1814, o jovem esguio, vistoso, desaparecera, substituído por uma figura barriguda, de cabelos curtos, pele amarelada e mãos e pés muito pequenos. Não era alto, pouco mais de 1,70 metro, no entanto ainda era hipnótico.Este era o homem que se erguera para dominar toda a Europa, um homem que conquistara e perdera um império, que redesenhara os mapas, refizera a Constituição e reescrevera as leis da França..."
E ainda:  "Era um administrador extraordinário, mas não queria ser lembrado assim. Sobretudo era um líder militar. Seu ídolo era Alexandre, o Grande. Em meados do século XIX, na Guerra Civil Americana, Robert Lee, o grande general confederado, viu seus soldados executando uma manobra brilhante e vitoriosa numa batalha e disse, de maneira memorável, "é bom que a guerra seja tão terrível, do contrário passaríamos a gostar muito dela". Napoleão passou a gostar muito, amava a guerra.Talvez fosse seu primeiro amor, porque combinava a excitação do risco com a alegria da vitória. Ele tinha a mente de um grande estrategista, mas quando a marcha terminava e o inimigo se encontrava flanqueado, ainda exigia enormes sacrifícios de seus homens..."
Reunidos em Viena, onde eram discutidas questões europeias desde a derrubada de Napoleão em 1814, o rei da Prússia, o imperador da Áustria e o tsar da Rússia, resolveram declarar guerra a Napoleão. Prússia, Rússia, Inglaterra e Áustria decidiram organizar cada país um exército de 150.000 soldados que deveriam convergir para a França. A Grã-Bretanha impossibilitada de formar um exército tão grande ofereceu ajuda financeira aos outros coligados. O escolhido para comandar um primeiro exército aliado contra Napoleão, na atual Bélgica (naquele tempo fazia parte dos Países Baixos), foi o  duque de Wellington, heroi da campanha inglesa na Espanha contra os franceses.
Napoleão conseguiu reunir na França um exército de 360.000 homens e decidiu partir para atacar os aliados na Bélgica com uma parte desse efetivo, 125.000 soldados experientes, o "Exército do Norte".
Napoleão calculava que demoraria para austríacos e russos chegarem logo até a França. Os primeiros estavam formando seu exército e os outros estavam longe. Mas o exército prussiano e mais um exército anglo-holandês estavam se preparando na  Bélgica. O imperador francês considerava que se conseguisse vencer esses dois exércitos os outros aliados perderiam o ânimo. Se derrotasse Wellington, ele achava que poderia haver uma mudança no governo inglês que poderia deixá-lo continuar governando e a aliança inimiga se desfaria. Era um palpite dele. Ele pensou que se pudesse dividir os dois exércitos ao norte, poderiam ser vencidos e assim a coligação perderia força.
Embora experiente, o exército napoleônico tinha uma fraqueza considerável que era o alto-comando. Dos vinte generais que estavam vivos, ele só poderia contar com dez. Dois dos melhores marechais não participariam do confronto na Bélgica, Davout e Suchet, o primeiro porque ficaria como ministro da guerra em Paris e o outro ficaria defendendo a fronteira leste da França contra um possível ataque austríaco. Um novo marechal foi nomeado, o marquês de Grouchy e havia Ney, o chamado "o mais bravo entre os bravos", que era entusiasmado e esquentado.
Em 15 de junho Napoleão atravessou a fronteira e alguns pequenos enfrentamentos começam entre franceses e prussianos. O líder do exército prussiano era Blucher. Segundo Cornweel: "A campanha de Waterloo é toda baseada em estradas. Estradas e encruzilhadas. Os exércitos precisavam de estradas. A cavalaria e a infantaria avançavam pelo campo sem estradas, embora seu progresso fosse dolorosamente lento, mas os canhões e as carroças precisavam delas..."
E ainda: "Nivelles é a última estrada de ligação que permitirá aos britânicos vir para ajudar os prussianos, então Blucher ordena uma parada ali. Há um problema, porém. O duque de Wellington esperou demais e o Exército britânico-holandês está se concentrando tardiamente. O imperador roubou uma marcha, e a encruzilhada vital de Quatre Bras_o lugar onde esse exército precisa se reunir para ajudar Blucher_está praticamente indefesa. Tome essa encruzilhada e o exército do duque de Wellington não poderá avançar para ajudar os prussianos. E ao amanhecer de 16 de junho o imperador envia o marechal Ney para conquistar Quatre Bras.
Havia uma importância estratégica no  cruzamento de Quatre Bras, pois o grupo que  o controlasse  poderia mover-se até o sudeste ao longo da estrada de Nivelles a Namur até os exércitos francês e prussiano comprometidos na Batalha de Ligny. Se o exército anglo-aliado de Wellington pudesse combinar com o prussiano, suas forças conjuntas seriam maiores que as de Napoleão. Se um ou mais dos corpos de exército de Ney pudessem golpear aos prussianos pelo flanco enquanto Napoleão atacava frontalmente,eles poderiam não só ser derrotados, mas também aniquilados..."

Ao nascer do sol em 16 de junho os aliados poderiam esperar duas batalhas, uma em Ligny e outra em Quatre Bras. Mas Ney não foi totalmente eficaz em Quatre Bras contra os holandeses que faziam a defesa, não conseguindo conquistar de imediato o cruzamento de estradas. Os holandeses então receberam reforços dos britânicos. Se Ney tivesse sido mais ágil ocupando o cruzamento, poderia ir sem muita demora ao encontro de Napoleão. Esse esperava que Ney, sendo bem sucedido, chegaria a tempo de se juntar a ele e esmagar os prussianos em Ligny.

Aliás a importância de Quatre Bras me lembra um pouco a batalha de Bastogne (também na Bélgica), onde um cruzamento de vias também foi importante e defendido com ardor pelos soldados dos Estados Unidos contra os alemães. A resistência em Bastogne foi essencial para uma derrota mais rápida dos nazistas nas Ardenas.

Outro fator que atrapalhou Napoleão foi o desfalque de quase 22.000 soldados do marechal D'Erlon que foram enviadas para reforçar Ney contra os ingleses em Quatre Bras. Mas D'Erlon  estava bloqueado nas estradas por tropas inimigas e teve de contornar para chegar até as tropas de Ney e no caminho foi avisado por mensageiros para voltar a ajudar Napoleão em Ligny. E assim, não pôde ajudar Ney a esmagar a resistência em Quatre Bras e nem a Napoleão para destruir completamente os prussianos em Ligny.

Os resultados dessas batalhas anteriores a Waterloo (o nome da batalha foi dado por Wellington, mas a batalha não foi travada nesta povoação) influenciaram no resultado final. Segundo Cornwell: " Wellington vencera sua batalha, pelo menos em termos de frustrar o objetivo francês. Mantivera a encruzilhada e negara a Ney a chance de virar para o leste e avançar contra os prussianos. Não era uma vitória pequena. Se Ney, ou mesmo D'Erlon, tivesse atacado a direita prussiana, a Batalha de Ligny poderia ter acabado em total debandada do exército de Blucher.  Isto não acontecera. O exército prussiano fora vencido, mas estava intacto e constituía valiosa força combatente..."

A batalha acabou às 21h30 quando já havia anoitecido. O combate custou a Ney 4.000 homens e a Wellington 4.800. Nenhum dos grupos chegou a controlar definitivamente o cruzamento de Quatre Bras e, portanto, não puderam enviar reforços aos exércitos que lutavam em Ligny.

O exército de Blucher seguiu para o norte e o de Wellington se deslocou para se estabelecer na cadeia de elevações de Mont-Saint-Jean.  O marechal Ney poderia ter atrapalhado bastante os anglo-ingleses e lhe infringido baixas, pois enquanto muitos se retiravam de Quatre Bras poderia ter desferido ataques, mas ficou inativo. Se Ney tivesse atacado tropas em retirada, poderia ter causado sérios danos. 

Napoleão para perseguir os prussianos que se retiraram após a batalha de Ligny enviou uma parte de seu exército, com 33.000 homens, sob o comando de Gruchy, para persegui-los e evitar assim uma união entre anglo-holandeses e prussianos. Mas Grouchy falhou e enfrentou uma parcela das tropas prussianas deixadas para enganá-lo, enquanto o grosso das tropas de Blucher puderam participar da batalha final. Também o general francês Lobau fracassou em atacar tropas prussianas em deslocamento. Napoleão durante a batalha ficou esperando em vão o retorno de Grouchy, pois suas tropas poderiam ajudar bastante o exército francês que atacava.

Durante a chamada batalha de Waterloo, Wellington contava com 23 mil ingleses e 44 mil soldados aliados, vindos da Bélgica, dos Países Baixos e de pequenos estados alemães, num total de 67 mil homens apoiados por 160 canhões. Os franceses contavam com 74 mil homens e 250 canhões. Eles efetuaram vários ataques com infantaria e cavalaria, com bravas defesas dos anglo-holandeses. Houve ataques destemidos de soldados franceses que gritavam: "Viva o Imperador". Os canhões de ambos os lados fizeram muitas vítimas.

Havia chovido muito à noite e o terreno estava molhado. Napoleão esperou até às 11:00 do dia 18 de junho para atacar para dar tempo ao terreno de secar. Mas mesmo assim, ainda havia lama e as balas de canhão que eram disparadas e que poderiam quicar produzindo estragos maiores, enterravam na lama. Também o terreno ainda enlameado deixou mais lentos os ataques da infantaria e da cavalaria dos franceses, dando vantagem aos defensores.

Napoleão também tentou inicialmente um ataque de distração a uma posição inglesa fortificada e deslocou milhares de soldados. Mas Wellington não caiu na armadilha e não deixou mais que 1.200 homens no local. Os soldados franceses enviados para lá atacaram enfrentaram fortíssima resistência e desfalcaram o exército que atacava os ingleses em outras partes da linha de frente.

Enfim, quando os prussianos finalmente conseguiram chegar para participar da batalha, os franceses tiveram de tirar uma parte considerável de suas forças para se defenderem deles, o que enfraqueceu seu ataque principal. Assim, Wellington pôde reunir suas tropas e fazer o ataque final após firme defesa pela sua infantaria contra os últimos ataques franceses. A batalha estava perdida para Napoleão, que voltou para a França e teve de renunciar. Seu destino seria a ilha de Santa Helena. A seguir um trecho de Cornwell sobre o fim da batalha:


 "O general Pierre Cambronne comandava uma brigada da Guarda e estava em um dos quadrados. Sua posição era desesperançada. As infantarias britânica e hanoveriana (havia batalhões alemães lutando com os ingleses) o haviam alcançado e oficiais pediam à Guarda para se render. E assim nasceu uma das lendas mais duradouras de Waterloo, a de que Cambronne respondeu "A Guarda morre, mas não se rende!" Foram boas palavras, e quase certamente inventadas por um jornalista francês alguns anos depois da batalha. Na outra versão, Cambronne grita uma única palavra: "Merde!" As duas respostas ficaram famosas, ambas excelentes reações diante da derrota inevitável. O próprio Cambronne alegou ter dito: "Camaradas como nós não se rendem", mas ele se rendeu. Foi derrubado do cavalo com uma bala de mosquete que esfolou sua cabeça e o deixou inconsciente..."

Dizem alguns estudiosos que a saúde de Napoleão estava tão afetada ( inclusive ele sofria de hemorroidas), que isso o perturbava em suas decisões. Não se pode dizer com certeza se isso realmente influenciou, mas de fato Napoleão já era um homem mais esgotado e não tinha mais a energia e a rapidez de raciocínio de antes. 
Dessa forma, enquanto Wellington se movia constantemente durante a batalha, incentivando seus soldados, Napoleão se movimentava bem menos, mais observando e despachando os batalhões para a frente, enquanto Ney é que liderava no campo de batalha. Também custou a enviar à batalha a sua Guarda Imperial, corpo de elite, que talvez pudesse ter influenciado mais se fosse enviada mais rapidamente. Outro fator importante foram os erros de seus altos oficiais comandantes desde o início da campanha.

No total de perdas, os franceses, entre mortos e feridos, perderam mais de 30.000 soldados, os prussianos 7.000 na frente de Plancenoit e os britânico-holandeses cerca de 14.000.
Se Napoleão tivesse ganho poderia ter ficado muito mais tempo no poder? Possivelmente não. As outras nações inimigas dificilmente se acomodariam. Os impérios austríaco e russo poderiam ter atacado uma França já enfraquecida após anos de guerras. Seria mais um banho de sangue e mais sacrifícios para a população francesa. A genialidade de Napoleão na guerra já não era mais a mesma e nem existiam mais tantos bons generais franceses.  Portanto, creio que pode-se se dizer que Waterloo precisava ser ganha pelos aliados para encerrar de vez a Era Napoleônica e as guerras que afligiam a Europa entre Napoleão e os seus inimigos. Napoleão era considerado um usurpador pelas potências europeias, um "fora da lei".


O Duque de Wellington disse em uma carta a uma amiga sobre Waterloo:

"Enquanto estou no meio  daquilo fico atarefado demais para sentir qualquer coisa; mas logo depois a sensação é deplorável. É praticamente impossível pensar em glória. A mente e os sentimentos ficam exauridos. Fico desconfortável até mesmo no momento da vitória, e sempre digo que, depois de uma batalha perdida, o maior sofrimento é uma batalha vencida. Não apenas você perde amigos queridos com os quais convivia como é obrigado a deixar para trás. É certo que que se tenta fazer o melhor por eles, mas como isso é pouco! Nesses momentos, qualquer sentimento em seu íntimo fica amortecido. Só agora estou começando a retomar meu estado de ânimo natural, mas não desejo mais combate algum".


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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História
Figura: Imagem do Google

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