sexta-feira, 14 de julho de 2017

Robespierre












Robespierre foi figura proeminente do grupo dos jacobinos durante a Revolução Francesa e com a ascensão desses ele passou por algum tempo a ser o líder principal do governo revolucionário. A participação de Robespierre na Revolução mostrou um cidadão preocupado com direitos básicos dos franceses. Por outro lado, foi mandante de muitos assassinatos em nome da Revolução, agindo como um déspota. Em nome de ideais contribuiu muito para a instalação de uma máquina estatal terrivelmente repressora e reprimiu rigorosamente a oposição aos jacobinos. 

A seguir um resumo da história deste personagem histórico e uma breve análise de sua personalidade. 

Maximilien François Maria Isidore de Robespierre nasceu em Arras, em 06 de maio de 1758. Foi advogado e chegou a ser chamado pelos amigos de "O Incorruptível". Os seus inimigos durante o Terror (fase de rígida repressão estatal) o chamavam de "Candeia de Arras", "Tirano" e "Ditador Sanguinário". 

Ele nasceu em uma família da pequena burguesia e perdeu sua mãe ainda criança e foi depois abandonado com seus  três irmãos pelo pai, advogado, que entrou em depressão após a morte de sua esposa e passou a beber. O avô materno, um rico negociante, ficou com Robespierre e os irmãos. 

A morte da mãe, o abandono pelo pai e a responsabilidade que Robespierre assumiu pelos irmãos podem ter deixado marcas em sua personalidade, pois tornou-se um jovem sério e solitário, características que conservou até o fim de sua vida. 

Em Paris, estudou com uma bolsa de estudos dada pelo bispo de Arras. Como melhor aluno, foi premiado e teve a honra de ser cumprimentado pelo rei e a rainha da França (que tempos depois seriam executados pelos revolucionários jacobinos). Em 1781, formou-se em Direito, tendo na ocasião de seus estudos na capital francesa entrado em contato com o pensamento iluminista. Um dos seus professores foi D' Alembert, um dos organizadores da Enciclopédia, uma obra importante no período. Mas foram as ideias de Rousseau que provavelmente mais influenciaram Robespierre, que convenceu-se que a sociedade tinha degradado e escravizado as pessoas e concordou com Rousseau de que o Estado e o povo são os verdadeiros senhores de todos os bens.

Começou como advogado em 1783. Foi, de início, bem sucedido na sua profissão em sua cidade natal. Porém, desiludiu-se, pensando em abandonar Arras, quando o rei Luís XVI anuncia a sua intenção de convocar os Estados Gerai Teve trabalhos premiados e, em um deles mostrava sua discordância  sobre a atitude da sociedade para com os criminosos e doentes mentais. Os novos conceitos do século XVIII - a democracia, a igualdade e a liberdade - eram partes importantes  do seu pensamento.

Destacou-se com mais de 260 discursos. O Clube dos Jacobinos já era uma das alas mais radicais dos revolucionários, tornando-se Robespierre num dos principais articuladores da Revolução Francesa. Passou a ser mais notado quando fez um discurso em 25 de Janeiro de 1790, no qual  defendia que todos os franceses deveriam poder ser admitidos nos empregos públicos, sem outra distinção que não fosse a dos seus talentos e virtudes Em maio de 1791 ele consegue o seu maior sucesso parlamentar, ao fazer decretar que nenhum membro daquela Assembleia poderia ser eleito na legislatura seguinte.

Ele exigiu a execução do rei Luís XVI, guilhotinado em janeiro de 1793 e criou o Comitê de Salvação Pública contra os inimigos da Revolução, sendo na época instalado o "Grande Terror". Com a traição de Dumouriez, Robespierre passa a crer que a conivência dos girondinos com o general rebelde não oferecia dúvida, abrindo-se o processo que vai culminar na proscrição dos seus líderes, em 2 de Junho de 1793.

Em 1794 outro líder revolucionário, Danton, foi executado na guilhotina a mando de Robespierre e no mesmo ano tornou-se Presidente da Convenção Nacional. Robespierre manda decretar que o povo francês reconhece a existência do Ser Supremo e a imortalidade da alma.

A Planície (grupo político da Convenção Nacional),  organizou um golpe contra Robespierre, que é preso em julho de 1794, tendo sido guilhotinado um dia depois, em Paris, em 28 de julho. Com ele foram guilhotinados outros jacobinos importantes, como o seu irmão Augustin de Robespierre (também membro da Junta de Salvação Pública) e outros de seus colaboradores, dentre eles, seus dois grandes amigos, companheiros desde o início de sua jornada, Saint-Just e Couthon.

Apesar de ter mandado tantos para a guilhotina, defendia princípios humanistas como o sufrágio universal, a igualdade de direitos e a abolição da escravidão. Combateu a Igreja, mas acreditava em um Ser Supremo, chegando a dizer: "Se a existência de Deus, se a imortalidade da alma não fossem senão sonhos, ainda assim seriam a mais bela de todas as concepções do espírito humano".

O historiador F. A. Mignet escreveu sobre sua percepção dos ideais de Robespierre e de Saint-Just:

"(...) Robespierre e Saint-Just haviam traçado o plano desta democracia, cujos princípios eles defendiam em todos os seus discursos. Eles queriam mudar os costumes, o espírito e os hábitos da França. Eles queriam transformá-la em uma república à moda dos antigos".

"O domínio exercido pelo povo, magistrados desprovidos de orgulho, cidadãos sem vícios, a fraternidade nos relacionamentos, o culto da virtude, a simplicidade dos modos, a austeridade do caráter, eis o que pretendiam estabelecer".

"Liberdade e igualdade para o governo da república; indivisibilidade em sua forma; virtude como seu princípio; Ser Supremo como o seu culto. Quanto aos cidadãos, fraternidade em seus relacionamentos, probidade em sua conduta, bom senso como espírito, modéstia em suas ações públicas, que eles deveriam nortear para o bem do estado, e não para eles mesmos. Tal era o símbolo de sua democracia."

Ele queria criar uma República da Virtude, sem reis ou nobres, sem extremos de riqueza ou pobreza. Para conseguir seus objetivos ele perseguiu severamente os inimigos da República: girondinos que criticavam o governo jacobino, federalistas contrários a um governo central forte; padres, nobres e camponeses contrarrevolucionários e especuladores que escondiam alimentos. Em um discurso dele que ficou famoso ele afirmou:   "As funções públicas não podem ser consideradas como sinais de superioridade nem como recompensa, mas como deveres públicos.  Ninguém possui o direito de ser mais "inviolável" do que outros cidadãos. O povo tem o direito de conhecer todos os atos dos seus mandatários".

Robespierre conseguiu algumas realizações significativas. Como exemplo, na área militar: o exército francês conseguiu impedir a invasão da França por forças estrangeiras. E durante o governo dele vigorou a nova Constituição da República (1793), que garantia ao povo:     Direito ao voto; Direito de rebelião; Direito ao trabalho e à subsistência. Nessa Constituição havia uma declaração de que o objetivo do governo era o bem comum e a felicidade de todos. Foi uma das figuras mais polêmicas da Revolução Francesa. No desejo de promover a democracia, pôs em prática o chamado Reinado do Terror, durante o qual foram guilhotinadas milhares de pessoas. 

Ele  tinha muito medo de ser assassinado e preocupava-se excessivamente com os trajes que usaria ao assinar atos capitais. Era vaidoso, usava paletós bem cortados e coletes ricamente bordados. Sempre que precisava falar em público, sofria com contorções compulsivas nas mãos e na face e exibia um manuseio descontrolado dos óculos.

A seguir alguns comentários do psicanalista Jean Bergeret sobre Robespierre em sua obra "A Personalidade Normal e Patológica" (destaquei algumas palavras):

"Seu narcisismo de esfolado vivo suporta mal o face a face individual acusador; ele pretendia terrivelmente ser amado mas, em público, a tensão torna-se forte demais, tudo parece acusá-lo de suas próprias origens infelizes, de sua própria ascensão compensatória, de sua própria angústia e de sua própria agressividade interna;tudo então torna-se persecutório e, em um movimento defensivo impulsional direto, terrivelmente custoso e que se esgotará rapidamente, apesar dos encorajamentos excitadores de um ideal de ego sem medidas, ele não conseguirá resistir ao ritmo esgotante de uma "corrida terrivelmente endiabrada."

"Quando só diante de seus próprios problemas, como no 8 ou 9 Termidor, vemo-lo oscilar, tergiversar, perder a altivez, angustiar-se, não escolher, em contrapartida, desde que se sinta em oposição diante de um grupo adverso, sua violência renasce prontamente: Hebert e seus partidários, Danton, Desmoulins e seus amigos tornam-se o centro dessa angústia, desde que ela ultrapasse o limiar do suportável pelo consciente, do organizável pelo ego,da manutenção em representações não demasiadamente clivadas da realidade."

"... Por outro lado, em um movimento complementar e simultâneo, cria em si um vínculo igualmente subdelirante com a representação interna positiva de um Ser Supremo dotado de todos os poderes, todas as bondades e virtudes, mas que permaneceria o Ser Supremo de Robespierre, o seu, não o dos irmãos padres (o Deus da igreja), nem o dos irmãos revolucionários (a deusa da razão)..."

"Se houvesse podido dispor de uma suficiente maturidade afetiva que lhe permitisse "amar", Robespierre teria conseguido utilizar sua excepcional inteligência e incontestável incorruptablidade não para atiçar, mediante excessos suplementares, processos primários já bastante liberados, mas para devolver alguma audiência ao princípio da realidade através de uma secundarização e elaboração, que talvez tivesse evitado a posterior e inelutável perversificação bonapartista da situação".

"Não pretendemos julgar Robespierre, mas tentar compreender o nível de funcionamento de tais processos mentais, ao mesmo tempo mórbidos e assintomáticos que entram incontestavelmente na patologia caracterial sob uma forma que parece ser nitidamente psicótica, dada a importância da clivagem dos imagos e consecutiva amputação da realidade, bem como o empobrecimento progressivo do ego (...)"

"...Robespierre via a si mesmo, nesses anos, como alguém que tinha uma missão em que um mundo convulsionado, onde arriscava jogar fora aos poucos conquistas alcançadas até então pela Revolução. Ele queria combater a corrupção sob todas as formas..."

"Ele via na virtude o eixo da vida política republicana e na corrupção, a força destrutiva que devia ser combatida a todo custo. A linguagem na qual ele se exprimia-assim como muitos homens políticos de seu tempo- devia muito a Rousseau. Mas seus discursos portavam a marca dramática de um ator que acreditava que a revolução corria perigo. Até o fim de sua vida, ele se guiará pela ideia de que a França e a Revolução corriam grande perigo e só o emprego de terror seria capaz de deter o processo de corrupção que se instalava na nação..."

Eis a análise de um psicanalista. É a forma como ele analisa esse personagem histórico. Se formos verificar a infância e a adolescência de Robespierre, provavelmente não foram felizes, principalmente pela ausência de seus pais ( a mãe morreu cedo e o pai entregou-se à bebida alcoólica, abandonando os filhos), o que pode ter realmente causado a ele problemas significativos na esfera afetiva, problemas esses que podem ter influenciado nas suas ações extremistas como líder revolucionário. O que, ao meu ver, não invalida certas ideias suas que eram realmente revolucionárias e em prol de melhorias sociais. Mas seus métodos foram diversas vezes cruéis. Ele com certeza devia achar que "os fins justificam os meios". Outros líderes políticos na História também pensaram assim e milhões pereceram e outros milhões sofreram na busca de realização de utopias. É possível que suas histórias de vida quando crianças e adolescentes expliquem também determinados atos seus. Porém isto seria motivo para outros artigos e não cabe neste momento em referência à temática. 

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Márcio José Matos Rodrigues-Psicólogo e Professor de História

Figura: Google

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