sábado, 27 de maio de 2023

A escritora brasileira e paraense Olga Savary

 







A escritora e poeta (ou poetisa) brasileira Olga Savary nasceu em 21 de maio de 1933, em Belém do Pará. Era a filha única de Bruno Savary, engenheiro russo que tinha antepassados alemães, suecos e franceses e da paraense Célia Nobre de Almeida. Olga tinha uma bisavó materna indígena. Na sua infância, Olga recebeu influências culturais do Pará por meio de parentes pelo lado de mãe. Seus avós maternos eram da cidade paraense de Monte Alegre.

Olga, devido ao trabalho de seu pai, vai morar em Fortaleza, capital do Ceará, em 1936. Em 1942, por causa da separação de seus pais, Olga passa a morar na cidade do Rio de Janeiro com um tio materno. É nessa cidade que ela, aos onze anos, passa a redigir um pequeno jornal, com incentivo de um vizinho, ganhando uma remuneração. A mãe não concordava com essa atividade, porque desejava que a filha se interessasse por música, porém Olga não queria tal caminho. Para evitar que a mãe destruísse seus escritos, Olga dava seu caderninho para um bibliotecário guardar. A convivência com a mãe era complicada e aos 18 anos ela voltou a Belém e foi estudar no Colégio Moderno. Mas sua carreira de escritora só vai em frente quando volta a morar no Rio de Janeiro.

Ela, além de escrever poesias, também foi contista, romancista, crítica, tradutora e ensaísta. Ela traduziu obras de escritores hispano-americanos como Borges, Cortázar, Carlos Fuentes, Lorca, Neruda, Octávio Paz, Mário Vargas Llosa e também traduziu obras dos escritores japoneses Buson e Issa.  

A escritora conheceu o poeta Carlos Drumond de Andrade, que teria se apaixonado por ela. Mas não foi correspondido. Segundo ela:

“Drummond era meu primo, ele que descobriu isso e me escreveu para contar. Ele era apaixonado por mim, eu não.  Se bem que uma vez encontrei com ele na rua, e tive que encostar na parede, para não cair. Fiquei com as pernas bambas, não de paixão, mas de ternura”.

Olga foi correspondente de periódicos no Brasil e em outros países, tendo organizado antologias de poesias. Em 1968 Olga participou do filme “Edu, Coração de Ouro”. A Antologia de Poesia da América Latina, editada em 1994, nos Países Baixos, com obras de 18 poetas, entre eles Pablo Neruda e Octávio Paz (dois ganhadores do Nobel de Literatura) conta também com poesias de Olga. Ela participou da associação mundial de escritores, com ligação à UNESCO, chamada PEN Club. Presidiu entre 1997 e 1998 o Sindicato de Escritores do Estado do Rio de Janeiro. Foi a primeira mulher brasileira que lançou um livro todo dedicado a poemas eróticos. Teve alguns poemas musicados pelo compositor Madan, Pedro Luiz das Neves (1961 - 2014). Foi colaboradora de jornais e revistas do Brasil e de fora do país.

Ganhou o Prêmio Jabuti, de Autor Revelação, pelo livro Espelho Provisório, o Prêmio de Poesia, pelo livro Sumidouro e o Prêmio Artur de Sales de Poesiapelo livro Berço Esplêndido, em 1987.

Olga teve dois filhos no seu casamento com o cartunista Jaguar:  Pedro e Flávia Savary. Pedro faleceu em 1999.

Ela disse certa vez:

“No Brasil, poeta morre de fome.
Mas sou apaixonada por este malandro chamado literatura
e não viveria sem ele.”
Olga Savary (1933 – 2020)

 

Olga publicou os seguintes livros:

Livros publicados: 1970 - Espelho Provisório (poemas); 1977 - Sumidouro (poemas); 1979 - Altaonda (poemas); 1982 - Magma (o 1º livro editado por uma mulher só com poemas eróticos; 1982 - Natureza Viva (poemas);1986 - Hai-Kais (poemas); 1987 - Linha d'água (poemas); 1987 - Berço Esplendido (poemas); 1989 - Retratos (poemas); 1996 - Morte de Moema (poemas); 1997 - O Olhar Dourado do    Abismo (contos). 1998 - Repertório Selvagem (poesia reunida).

Olga  morreu de parada cardíaca em 15 de maio de 2020, por causa da COVID- 19.

Segundo Antônio Houaiss: “Olga Savary é senhora de uma gleba fecunda no território da poesia brasileira viva que ninguém aí se nutre deve desconhecer.”

Segundo Felipe Fortuna:

 “Acostumada à concisão, sua poesia exercita, com formas breves, com metros curtos, a permanência — qualidade, aliás, que lhe permitiu dominar a estrutura do haicai, talvez avessa às peculiaridades do idioma. Ao estrear numa década violenta da história política do País, Olga Savary atravessou-a com a delicadeza da linha-d´água no papel, sem se permitir a poesia engajada: ela é, de fato, poeta dos elementos, das formas naturais, das pequenas elegias.” 

O poeta Antonio Carlos Secchin disse:

“— Além da poesia delicada, temos também a posição dela como incentivadora de novos poetas. Ela organizou a primeira antologia de poesia erótica do país, e se dedicou inteiramente à literatura em todas as manifestações, apesar de não ter tido o reconhecimento à altura. E ela se ressentia um pouco disso, com razão. Nos resta homenageá-la...”

O poeta Edimilson de Almeida Pereira destacou em sua página numa rede social : "No início do meu percurso como poeta, Olga (que conheci através de José Afrânio Moreira Duarte, outro amigo imensurável, flor da mais humana generosidade) foi uma incentivadora constante, uma voz reconhecida que se dedicou a ler e a comentar os textos de um iniciante" E ainda : “— Ela foi uma artista de muitas faces. Harmonizou densidade e coerência com a força criativa da poeta, o rigor crítico da pensadora, a competência da gestora pública de bens clulturais, tudo isso permeado por uma generosidade muito grande e um senso de humor refinado. A Olga Savary que conheci me legou a vontade de trabalhar apesar dos obstáculos, sem perder no trabalho o apreço pela beleza.”

 

Aguns poemas de Olga Savary:

Pássaro

 A noite não é tua

mas nos dias

— curtos demais para o voo —

amadureces como um fruto.

Tuas asas seguem as estações.

É tua a curvatura da terra.

Pássaro, metáfora de poeta.

 

Nua e crua

 Não tendo pra onde voltar é que me largo pra rua,

Eu que seria leito de rio, leito de mar, maré,

Sem porto ou barco, peixe fora d´água, pássaro no voo

Mas quede a asa?      

 

 

Signo

Há tanto tempo que me entendo tua,
exilada do meu elemento de origem: ar,
não mais terra, o meu de escolha,
mas água, teu elemento, aquele
que é do amor e do amar.

Se a outro pertencia, pertenço agora a este
signo: da liquidez, do aguaceiro. E a ele
me entrego, desaguada, sem medir margens,
unindo a toda esta água do teu signo
minha água primitiva e desatada


Luz, Câmara, Ação

O poeta cria o sonho
compensando o que lhe falta
com o muito que lhe sobra.

 

Acomodação do desejo III

Deito-me com quem é livre à beira dos abismos
e estou perto do meu desejo.

Depois do silêncio úmido dos lugares de pedra,
dos lugares de água, dos regatos perdidos,
lá onde morremos de um vago êxtase,
de uma requintada barbárie estávamos morrendo,
lá onde meus pés estavam na água
e meu coração sob meus pés,

se seguisses minhas pegadas e ao êxtase me seguisses
até morrermos, uma tal morte seria digna de ser morrida.

Então morramos dessa breve morte lenta,
cadenciada, rude, dessa morte lúdica.

 

 Mapa de Esperança

Vinha pisando sobre toda a praia,
o sangue quieto — ou quase quieto —,
os pensamentos leves como espumas
e os cabelos soltos como nuvens.

Trágica como princesa de elegia,
meu estandarte é o desespero,
minha bandeira, indecisão.

Ainda assim, alegria, te festejo.

  Água Água

 Menina sublunar, afogada,

que voz de prata te embala

toda desfolhada?

Tendo como um só adorno

o anel de seus vestidos

ela própria é quem se encanta

numa canção de acalanto

presa ainda na garganta.

 

 Auto despedida

Há algo nas manhãs que não entendo agora

e a um grito de minhas pernas não atendo.

Ainda depois da noite, noite me espia

e sonho dúvidas enormes e imóveis

como a imobilidade das aranhas.

Tão pouco tempo – e tenho de deixar-me

e queria nunca ter de repartir-me.

Começa a raiva da saudade

que inventei vou ter de mim

 

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Márcio José Matos Rodrigues

Figura: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=imagens+de+olga+savary&tbm=isch&source=univ&fi

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