quinta-feira, 8 de maio de 2025

Conclave: O que é e história

 



A pedido de um leitor de meus artigos neste blog decidi escrever sobre a reunião realizada por representantes da Igreja Católica chamada de “conclave”.

Mas o que é o conclave? A palavra “conclave” vem sendo usada desde 1274. Foi o papa Gregório X que a usou pela primeira vez nesse ano, criando-se assim as bases para os conclaves que foram realizados até a atualidade. Trata-se de um processo desenvolvido pela Igreja Católica de escolha de um novo papa (o chefe da Igreja Católica), por meio de uma reunião do Colégio de Cardeais. No decorrer de todo esse tempo desde a sua criação, esse processo passou por mudanças conforme os contextos em que ocorreram.

Foi durante o Segundo Concílio de Lyon, em 1274, que o papa Gregório X , preocupado com a possibilidade de demora na escolha e com possíveis interferências políticas externas, assinou um decreto que determinava que os cardeais eleitores deveriam ficar trancados em seclusão (isolamento) cum clave ( “com chave”). Eles não poderiam sair até que o processo da eleição tivesse terminado, com um novo papa eleito.

No início da história da Igreja Católica o bispo de Roma (que posteriormente passou a ser considerado o papa) era escolhido pelo consenso do clero e dos leigos da diocese. Mas a regra mudou em 1059 quando o Colégio de Cardeais foi designado como o único corpo de eleitores. O Papa Paulo VI em 1970 fez outra mudança: os eleitores seriam cardeais com menos de 80 anos. Houve outras alterações feitas depois pelos papas João Paulo II e Bento XVI.  Atualmente é preciso um voto de maioria qualificada de dois terços para eleger o novo papa.

O mais longo tempo para escolha de um papa aconteceu com a morte do Papa Clemente IV. Em Viterbo, na Itália, no dia 29 de novembro de 1268, teve início a mais longa eleição papal da História da Igreja que só teve fim em 1º de setembro de 1271. Dos 19 cardeais eleitores que iniciaram a reunião, dois morreram nesse período. A população da cidade perdeu a paciência e trancou os cardeais eleitores no Palácio Papal de Viterbo. A entrega de alimentos era controlada rigorosamente e a cobertura do local onde os cardeais estavam foi removida em parte deixando-os expostos à temperatura ambiente. Finalmente foi escolhido Teobaldo Visconti, que nem cardeal era e não estava na reunião. Ele encontrava-se na Terra Santa e demorou 4 meses para ele chegar em Viterbo e em 27 de março, em Roma, tornou-se o papa Gregório X.

A expressão “conclave” aparece pela primeira vez na Constituição Apostólica Ubi Periculum , em relação ao local em que se reúnem os cardeais para a eleição do novo Papa, e à assembleia constituída com esta finalidade.

Na atualidade, quando há a morte de um papa, durante nove dias os cardeais celebram exéquias de sufrágio por sua alma , conforme o que está escrito no documento Ordo Exsequiaram Romani Pontifici

Quando um papa morre ou renuncia a Sé Apostólica é considerada vacante até a data de eleição de um novo pontífice. Durante este tempo o Cardeal Decano ou Camerlengo fica responsável pelos assuntos da Igreja. Ele é que tem que comprovar oficialmente a morte do Papa, fazendo-o na presença do Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, dos Prelados Clérigos e dos Secretário e Chanceler da Câmara Apostólica. Também é o Decano que redige a ata em relação ao falecimento do Papa. É convocado o Sagrado Colégio dos Cardeais para que seja reunido o Conclave. O Camerlengo também tem a função de recolher o selo e o anel pontifícios, fechando os aposentos e dependências onde o papa que morreu viveu e trabalhou.

A eleição é feita no Vaticano pelos cardeais reunidos que não tenham completado 80 anos até o anúncio da Sé Apostólica vacante. O último papa que não era cardeal foi Urbano VI, em 1378. A eleição é realizada no Estado do Vaticano ( na Capela Sistina), com os cardeais isolados do mundo exterior, sem poderem se comunicar para fora de onde estão.

O Papa Paulo VI por meio do documento do Motu Proprio Ingravescentem Aetatem, de 21 de novembro de 1970, refez regras de eleição e foi publicada a Constituição Apostólica Romano Pontífice Eligendo em 1975 que reafirma o documento de 1970. Foram decretadas por esse papa três modalidades para a eleição: 'por aclamação' (um cardeal propõe um nome e os outros cardeais aceitam-no imediatamente); 'por compromisso', isto é, por aceitação do nome decidido por um grupo de Cardeais, e 'por votação'. Neste último caso, o nome do Cardeal mais votado tinha que somar dois terços dos votos. Mas João Paulo II na Constituição Apostólica Universi Dominci Gregis, de Constituição Apostólica modificou as regras de escolha: a eleição de um papa seria só por votação, com três passos.  O primeiro é a contagem dos votos, o segundo a sua verificação e o terceiro a sua destruição pelo fogo.

O sigilo durante o processo eleitoral no Conclave é para os cardeais e todas as pessoas chamadas a prestar apoio técnico ou logístico às sessões do Conclave. Geralmente os conclaves duram de 2 a 5 dias. O processo mais rápido na atualidade foi em 1939 quando foi escolhido Pio XII em dois dias, em três votações e o mais longo foi em 1922 na escolha Pio XI. Em outras épocas da História houve o processo de escolha do Papa Celestino V que começou em 1292 e terminou em 1294 (no total 27 meses) e como destaque de rapidez o de escolha do Papa Júlio II em 1503 que levou algumas horas.

 Ao começa o Conclave o Camerlengo lê o juramento solene que obriga todos os cardeais eleitores a aceitar as condições do processo , a rejeitar todas as influências externas e a manter secretas as suas deliberações. Após isso, ele procede à chamada dos eleitores. Ao ouvir o seu nome, cada cardeal levanta-se e dirige-se para a mesa onde estão os três vasos de vidro e a bandeja de prata, perante a qual, em voz alta, declara o juramento com a mão direita sobre a Bíblia. O Camerlengo destaca a importância das decisões dos eleitores e diz: "Que o Senhor vos abençoe a todos!" Começa então um sorteio para escolha de três cardeais escrutinadores que tem a responsabilidade de verificar e contar os votos. Esses cardeais recebem a designação de 1.º, 2.º e 3.º escrutinador. São sorteados também os três cardeais infirmarii que devem recolher os votos dos cardeais que adoeceram, eventualmente, durante o Conclave. São sorteados, por fim,  os três Cardeais revisores, encarregados de fiscalizar os trabalhos dos cardeais escrutinadores.

As votações para escolha do novo papa são realizadas em sessões de manhã e à tarde, duas em cada sessão, com exceção do primeiro dia onde se realiza apenas uma votação. Na hora da votação cada Cardeal pega num boletim, de papel branco e forma retangular, que tem escrito na parte superior ''Eligo in summum pontificem" (Elejo como Sumo Pontífice), ali há o espaço que o cardeal eleitor deve escrever em letras maiúscula o nome do escolhido por ele. O voto precisa ser dobrado ao meio. Primeiro votam os cardeais mais idosos. Os eleitores colocam o voto na bandeja de prata e vão até a boca do primeiro vaso de vidro, inclinam a bandeja e o voto cai no vaso. Quando a votação termina, o primeiro Cardeal escrutinador pega o vaso de vidro e leva-o para a mesa de escrutínio e aí agita-o para misturar bem os votos e depois coloca os votos no segundo vaso de vidro, conta-os um por um e diz em voz alta para que todos ouçam claramente. Se os votos contados não estiverem correspondendo ao total de cardeais eleitores, serão queimados e será feita a segunda votação.

Quando cada voto é tirado pelo primeiro escrutinador, ele é desdobrado e é anotado numa folha de papel o nome votado. O voto depois de ter passado pelo primeiro escrutinador é entregue ao segundo escrutinador, que procede de igual modo, entregando o voto ao terceiro escrutinador. Este lê cada nome votado em voz alta e de modo que todos entendam. E assim se procede até que todos os votos sejam contados e anunciados.  No fim deste processo, o terceiro escrutinador fura e cose cada boletim de voto com agulha e linha. Depois os votos são colocados no terceiro vaso de vidro. Cada um dos três escrutinadores deve somar os votos constantes do papel em que os foi anotando. Após esse trabalho, os cardeais revisores vão até a mesa de escrutínio e, cada um por seu lado, contam os votos e conferem o número total de votos com o registro feito por cada escrutinador.

Se houver três dias sem resultados suspendem-se os escrutínios durante o máximo de um dia, com o fim de criar uma pausa para oração e livre diálogo entre os cardeais eleitores.

O anúncio dizendo que o processo eleitoral terminou ou não é por meio de "fumatas". A fumaça que sai de uma chaminé instalada numa estufa do tipo salamandra na Capela Sistina, é, pela sua cor, o sinal dado ao exterior. Se não houver ainda conclusão, isto é, se o nome de um candidato não somar dois terços dos votos, volta tudo à primeira forma. Os eleitores devem dar ao Camerlengo as notas pessoais que porventura tomaram durante a eleição. As notas, juntamente com todos os votos, são metidas numa caixa onde já se encontram as tiras de papel relativas ao sorteio dos cardeais escrutinadores, infirmarii e revisores. A caixa é conduzida para o fogão contíguo à Capela Sistina, onde tudo é queimado.

A partir do conclave de 2005 há um novo sistema para a fumata que permite distinguir bem a fumaça branca, que indica a eleição do pontífice, da fumaça preta, que indica que o processo ainda não convergiu num nome. Para obter cor preta usa-se uma mistura de perclorato de potássio, antraceno e enxofre e para fumaça branca é usada uma mistura de clorato de potássio, lactose e colofónia.

Escolhido o novo papa são chamados pelo último dos Cardeais Diáconos dois cardeais: o cardeal que é Secretário do Colégio dos Cardeais e o cardeal que é Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias. O Cardeal Diácono pede então o consentimento do cardeal que foi eleito Papa dizendo:

Pergunta 1-Acceptasne electionem de te canonice factam in Suumum Pontificem? Aceitas a tua eleição canónica como Sumo Pontífice?

Resposta- Aceito em nome do Senhor (o Cardeal pode rejeitar e volta-se a fazer uma nova votação).

Pergunta 2- Quo nomine vis vocare? Com qual nome queres ser chamado?

O novo Papa releva o nome que deseja ter. A seguir, recebe o 'ato de obediência' por parte de todos os Cardeais. Um a um, vão até ele de pé. Então, a caixa que contém os votos, os apontamentos dos Cardeais e as tiras do sorteio dos escrutinadores é levada a queimar dentro do fogão da Capela Sistina. Sai neste caso a fumaça branca, anunciando a escolha do novo Papa. O Cardeal Protodiácono vai até a varanda da basílica anunciar o resultado.

 

Annuntio vobis gaudium magnum:
Habemus Papam!
Eminentissimum ac Reverendissimum Dominum,
Dominum [primeiro nome],
Sanctæ Romanæ Ecclesiæ Cardinalem [sobrenome],
qui sibi nomen imposuit [nome papal].

"Anuncio-vos com grande alegria:
Temos Papa!
Eminentíssimo e Reverendíssimo Senhor,
Senhor [primeiro nome],
Cardeal da Igreja Católica Romana [sobrenome],
que escolheu para si o nome de [nome papal]."

Em um momento posterior o Papa aparece na varanda central da Basílica de São Pedro e deve então dar a a bênção Urbi et Orbi .Desde a eleição do Papa João Paulo II o papa que foi eleito fala ao povo com um discurso precedente à benção.

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

Figura: https://www.gettyimages.com.br/search/2/image?phrase=conclave 

 


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