sábado, 20 de agosto de 2022

Poesia Deixe a Lua abraçar seus sonhos

 





Deixe a Lua abraçar seus sonhos

Feche seus olhos,

Deixe a lua abraçar,

Seus sonhos

E entregá-los ,

Para o mar;

Os mais risonhos

Ele poderá gostar

E abençoá-los com sua grandeza;

Os mais tristonhos ele poderá levar,

Para lugares distantes,

Para você não se lembrar;

E aqueles pesadelos medonhos,

Ele jogará ,

Para os tubarões mais temidos,

Para serem comidos,

Sem pena.

Peço apenas,

Que espere que a Lua venha

E que ela toda cheia tenha,

Empatia com os que pedem,

Sintonia com os poetas que escrevem;

Ela nos torna leves,

Fazendo as noites,

Até nos momentos

Mais breves,

Serem plenas de esperança

E encantamento.

Márcio José Matos Rodrigues

Figura:

https://www.google.com/search?q=imagem+de+lua+sobre+o+mar&sxsrf=ALiCzsbA24_R9qdvybB2D5GbCp8rkSNKmA%3A1661043690124&source=


domingo, 14 de agosto de 2022

"Tears in Heaven" , a canção de Eric Clapton para seu filho Conor

 







Neste segundo domingo de agosto quando se comemora o Dia dos Pais no Brasil, vou abordar a história de uma canção feita por Eric Clapton, um compositor inglês famoso, que perdeu um filho de maneira trágica e que por isso fez a canção Tears in Heaven, dedicada a ele. A canção foi feita em pareceria com Will Jennings.

Tears in Heaven tornou-se uma das melodias mais populares da historia do rock. A conceituada revista Rolling Stone, em 2004 classificou a canção na colocação de número 362 entre as 500 melhores canções de rock.  Eric Clapton, autor e intérprete da canção, ganhou graças a ela, em 1993, três prêmios Grammy (melhor canção, melhor gravação e melhor interpretação vocal pop masculina), sendo que a mesma tem sido há vários anos uma das mais tocadas nas rádios. Lory del Santoa mãe de Conor, o filho de Clapton morto em 1991, evitava ouvir a canção pois lhe causava lembranças dolorosas. Ela disse em uma ocasião em uma entrevista: “Uma vez, quando estava em Amsterdã, colocaram a música no rádio. Ao soarem os primeiros acordes, saí correndo para não ouvi-la”. 

Em 27 de agosto de 1990 o empresário de Eric e um colega músico, Stevie Ray Vaughan, mais duas outras pessoas, tinham morrido em um acidente de helicóptero, o que abalou Eric. E numa manhã de março de 1991 veio outra perda: seu filho Conor. Lory (mãe de Conor) e o filho tinham ido visitar Eric em Nova York. O casal estava separado. Eric ainda era oficialmente casado com Pattie Boyd (a história de Eric e Pattie eu contei quando escrevi o artigo sobre a música que Eric fez para Pattie). Quando Eric e Pattie se separaram, Conor tinha três anos. Eric tinha sido muito ausente na vida do filho e estava querendo ser um pai mais presente. Na véspera da morte do filho, Eric foi com o filho a um circo em Long Island. Lory, na entrevista mencionou: “Eles realmente curtiram muito. Quando Eric voltou, me olhou e disse que finalmente entendia o que significava ter um filho e ser pai. Estava muito feliz. Era a primeira vez que Eric passava algumas horas sozinho com nosso filho. Conor, por sua vez, estava muito emocionado pelo dia tão maravilhoso que havia passado com o pai”. No dia 20 de março Eric se encontraria com Lory e Conor no apartamento onde mãe e filho estavam hospedados para que todos fossem ao zoológico.

Lory fez o seguinte relato sobre o fatídico dia 20 de março de 1991: “Conor brincava com a babá enquanto eu me preparava para ir ao zoo. Eram 11h da manhã. Gritei do banheiro para que Conor se apressasse, e ele me disse que estaria pronto em um minuto”. Lory tinha pedido para a babá ficar prestando atenção no garoto, que corria de um lado para o outro. Enquanto isso, o zelador do prédio estava limpando as janelas do apartamento. A babá perseguia de brincadeira o menino. Em dado momento o zelador avisou que a janela estava aberta e ela parou. Mas Conor não sabia que a janela estava aberta e foi correndo em direção a ela. Nesse momento Lory escutou a babá gritar, foi ver o que tinha acontecido e gritou: “Onde está Conor? Onde está Conor?” Ela então percebeu o que tinha havido e desmaiou. Conor tinha caído da janela do apartamento, localizado no 53º andar. Clapton disse em um documentário sobre sua vida a respeito do que aconteceu com seu filho:  “Às 11h57, Lory me ligou gritando e disse: ‘Está morto.” Ele ficou desnorteado, querendo entender e Lory explicou a ele: “Caiu da janela”. Eric disse nesse documentário que: “Senti como se saísse de mim mesmo, não podia entender, não podia assumir. Fui com ele ao hospital mais próximo e me despedi dele. Perdi a fé”. E destacou: “Conor foi a primeira coisa que aconteceu na minha vida que realmente tocou meu coração e me fez pensar: “É hora de amadurecer”. Eric tinha vivido até então uma vida agitada de artista, envolvendo-se muito com álcool e drogas. Em 1987 tinha deixado as bebidas alcoólicas. Ele tinha questões pessoais que o inquietaram por anos, como a descoberta de que a pessoa que ele pensava ser sua mãe era sua avó e a mãe era quem ele pensava ser sua irmã. Seus problemas existenciais o levavam a momentos autodestrutivos e atrapalhavam seus relacionamentos.  

Com a morte do filho Eric se dispôs a enfrentar suas questões pessoais de uma forma mais equilibrada. Ele ressaltou no documentário: "Comecei a abrir as cartas de condolências, que eram milhares, e entre elas havia uma de Conor. Ele a tinha enviado semanas antes. Dizia: ‘Te amo, quero te ver de novo. Um beijo’. Nesse momento, vi que eu podia passar por aquilo sem beber, poderia fazer qualquer coisa”. Lory, mãe de Conor, não se conformava por ter o zelador ter tirado o vidro da janela e destacou: “O zelador jamais nos pediu desculpa, e eu deixei de viver a partir daquele momento. Quando Conor caiu, o zelador chamou a ambulância, mas obviamente não havia nenhuma esperança. Eric foi vê-lo no IML, mas eu não pude”.

A canção Tears in Heaven foi composta nove meses depois da morte de Conor. Foi lançada no álbum Unplugged. Clapton, sensibilizado com o que houve com seu filho, fez anúncios alertando sobre a necessidade de se colocar proteção para crianças em janelas e escadas. A canção foi um meio que Eric encontrou para lidar com a dor de perder um filho. Eric disse: “Fui consciente de que podia fazer dessa tragédia algo positivo e dediquei minha vida a honrar meu filho. Peguei uma guitarra e a toquei sem parar durante meses para tentar enfrentar a situação. A música me salvou, levou a dor... Escrevi Tears in Heaven para mim porque me sentia terrivelmente mal”. Em 2005 ele a gravou de novo num disco e a renda se destinou às vítimas do tsunami de 2004 que causou uma tragédia no Sudeste Asiático nesse ano. Eric Clapton casou em 2002 com Melia McEnery . O casal teve três filhas.

Em 2004 ele falou sobre as canções My Father’s Eyes e Tears in Heaven"Eu não sentia mais a sensação de perda, que é uma parte integrante dessas composições. Eu preciso me conectar com os sentimentos que havia quando compus essas canções. Acho que esses sentimentos se foram, e eu não quero que eles voltem novamente. Minha vida mudou desde então. Canções assim só precisam de uma pausa e talvez eu volte a apresentá-las de uma maneira nova”.

O coautor de Tears in HeavenWill Jennings, disse em uma entrevista:

Eric e eu fomos contratados para escrever uma canção para um filme chamado Rush. Nós escrevemos uma música chamada 'Help Me Up' para o final do filme... Eric então viu um outro lugar no filme para incluir mais uma canção e ele me disse: 'Eu quero escrever uma canção sobre o meu menino.' Eric tinha a primeira estrofe da canção escrita, que, para mim, é toda a música, mas ele queria que eu escrevesse o resto das linhas do verso ("'Time can bring you down, time can bend your knees...'), e ser creditado no lançamento mesmo dizendo a ele que era tão pessoal que ele mesmo devia escrever tudo sozinho. Ele me disse que tinha admirado o trabalho que eu tinha feito com Steve Winwood e, finalmente, não havia mais nada a fazer, mas como ele pediu (...).  Esta é uma canção tão pessoal e tão triste que é única em minha experiência de escrever canções.”

 

"Tears In Heaven

Would you know my name

if I saw you in Heaven?

Would it be the same

if I saw you in Heaven?

 

I must be strong and carry on,

'Cause I know

I don't belong

here in Heaven.

 

Would you hold my hand

if I saw you in Heaven?

Would you help me stand

if I saw you in Heaven?

I'll find my way

through night and day,

'Cause I know

I just can't stay

here in Heaven.

 

Time can bring you down;

time can bend your knees.

Time can break your heart,

have you begging please,

begging please.

 

Beyond the door

there's peace I'm sure,

And I know

there'll be no more

tears in Heaven.

 

Would you know my name

if I saw you in Heaven?

Would it be the same

if I saw you in Heaven?

I must be strong and carry on,

'Cause I know I don't belong here in Heaven

'Cause I know I don't belong here in Heaven"

 

Tradução em português

"Lágrimas no Paraíso

 

Você saberia meu nome

Se eu o visse no paraíso?

Seria o mesmo

Se eu o visse no paraíso?

 

Eu devo ser forte e seguir em frente

Porque eu sei

Que não pertenço

Aqui ao paraíso.

 

Você seguraria minha mão

Se eu o visse no paraíso?

Você me ajudaria a ficar em pé

Se eu o visse no paraíso?

Encontrarei meu caminho

Pela noite e pelo dia,

Porque eu sei

Que não posso ficar

Aqui no paraíso.

 

O tempo pode te derrubar,

O tempo pode te fazer ajoelhar.

O tempo pode quebrar seu coração,

Você implora por favor

Implora por favor.

 

Além da porta

Existe paz, tenho certeza,

E eu sei

Que não haverá mais

Lágrimas no paraíso.

 

Você saberia meu nome

se eu o visse no paraíso?

Você seria o mesmo

se eu o visse no paraíso?

Eu devo ser forte e seguir em frente,

Porque eu sei que não pertenço aqui ao paraíso

Porque eu sei que não pertenço aqui ao paraíso"


Sugestão para escutar:

Eric Clapton: tears in heaven

https://www.youtube.com/watch?v=IvU_zJUFiLA

 

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Márcio José Matos Rodrigues.

 


Figura:

https://www.google.com/search?q=imagem+de+eric+clapton&sxsrf=ALiCzsZZFvjJ4_8Sz26Unfweuz3WSeTvNw%3A1660515975943&source=hp&e

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

O poeta árcade Tomás Antônio Gonzaga

 






  

Em 11 de agosto de 1744 nasceu Tomás Antonio Gonzaga, em Miragaia, freguesia da cidade do Porto em Portugal. Foi um poeta luso-brasileiro da escola do Arcadismo/Neoclassicismo, sendo o poeta de maior destaque dessa escola no Brasil. Além de poeta foi também jurista e ativista político durante a Inconfidência Mineira. Seu nome arcádico era Dirceu. Ficou famosa a sua obra “Marília de Dirceu”. As características árcades e neoclássicas da poesia de Tomás António Gonzaga são: o pastoril, o bucólico, a Natureza amena, o equilíbrio etc e também apresenta características pré-românticas como confissões de sentimento pessoal, ênfase emotiva estranha aos padrões do neoclassicismo e descrição de paisagens brasileiras.

A mãe de Tomás era Tomásia Isabel Clark, uma portuguesa com antepassados ingleses e João Bernardo Gonzaga, magistrado brasileiro. Ficou órfão de mãe com um ano de idade e foi com o pai primeiro para Pernambuco em 1751. Anos depois, Tomás foi para a Bahia estudar no Colégio dos Jesuítas. Foi em 1761 para Coimbra estudar Direito e na Universidade dessa cidade tornou-se bacharel em Leis em 1768. Escreveu a tese de Tratado de Direito Natural, com objetivo de ser professor nessa universidade. Depois preferiu a magistratura e exerceu o cargo de juiz de fora, em Beja, Portugal. Foi em 1782 para Vila Rica, em Minas Gerais, Brasil, nomeado como ouvidor dos Defuntos e Ausentes da  comarca de Vila Rica, onde é hoje Ouro Preto. Nessa ocasião, Tomás conheceu Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão, que tinha somente 16 anos, que segundo certos estudiosos pode ter sido a pastora Marília, em versos do poeta na obra Marília de Dirceu.

Tomás Antônio Gonzaga escreveu Cartas Chilenas, poema satírico que crticava o governo da colônia. Ele, em 1786, é promovido a desembargador da relação da Bahia e pede então Maria Doroteia em casamento, em 1788. Os pais dela não queriam o casamento dos dois porque Tomás era considerado de posição social inferior a da família de Doroteia. 

Foi preso em 1789 por ter participado junto com outros membros da revolta chamada de Inconfidência Mineira, emtre eles Claudio Manuel da Costa, Silva Alvarenga e Alvarenga Peixoto. Foi mandado para a prisão na Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, onde ficou por três anos,  e seus bens foram confiscados. Nesse período teria escrito a maior parte das liras que talvez tenha sido autor, não havendo assinatura em suas poesias. Sua pena passou para degredo por ordem da rainha Dona Maria I e em 1792 ele é enviado para Moçambique para lá ficar por dez anos, como punição. Nesse mesmo ano a primeira parte de Marília de Dirceu é lançada em Lisboa, possivelmente por amigos maçons, com 33 liras. No seu exílio trabalhou como advogado e passa a morar na casa de um comerciante de escravos, tendo se casado com a filha desse comerciante, Juliana de Sousa Mascarenhas, em 1793. Com ela teve dois filhos. Quando morreu, com 66 anos, por volta de 1810, era um homem rico. Tinha exercido na África os cargos de procurador da Coroa e Fazenda, e o de juiz de Alfândega de Moçambique. A segunda parte de Marília de Dirceu tinha sido publicada em 1799. Tomás é patrono da cadeira 37 da Academia Brasileira de Letras e influenciou poetas românticos brasileiros, como Casimiro de Abreu e Castro Alves.

Segundo a professora licenciada em LetrasDaniela Diana

“Tomás Antônio Gonzaga foi um dos importantes escritores do movimento árcade no Brasil. Ele é patrono da cadeira 37 da Academia Brasileira de Letras (ABL). Além de poeta, ele foi ativista político, advogado, juiz e participou da Inconfidência Mineira, em Minas Gerais (...)

(...) Estudou no Colégio de Jesuítas na Bahia. Voltou para Portugal a fim de estudar Direito na Universidade de Coimbra. Se formou em 1768, exercendo sua profissão como juiz na cidade de Beja, no Alentejo.

Por volta de 1782, retorna ao Brasil e trabalha como Ouvidor Geral em Minas Gerais, na cidade Vila Rica (atual Ouro Preto).

Foi ali que ele conheceu sua musa inspiradora. Apaixonou-se por Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão, a pastora Marília. Inspirado em sua própria história de amor, escreveu sua obra mais importante: Marília de Dirceu.

Resolve pedir a mão de sua amada em casamento. Mas estava envolvido na Inconfidência Mineira e foi acusado de conspiração, sendo preso no Rio de Janeiro.

Permaneceu recluso cerca de 3 anos e seu casamento foi anulado. Foi transferido para a África para cumprir sua sentença (pena de degredo). Ali exerceu a profissão de advogado e juiz da alfândega...”

Para Warley Souza, professor de Literatura:

Tomás Antônio Gonzaga nasceu em 11 de agosto de 1744, na cidade do Porto, em Portugal. O pai — João Bernardo Gonzaga — era brasileiro nascido no Rio de Janeiro. Já a mãe — Tomásia Isabel Clark— era portuguesa. No entanto, o poeta ficou órfão de mãe no ano seguinte e passou a ser educado pelos tios maternos.

Em 1752, o escritor se mudou para o Brasil com seu pai, nomeado ouvidor-geral de Pernambuco, e passou a estudar no colégio de jesuítas, na Bahia. Nove anos depois, em 1761, regressou a Portugal para estudar na Universidade de Coimbra, onde cursou Leis.

Ele recebeu o título de bacharel em 1768. A princípio, tinha a intenção de ser professor de Leis dessa universidade, mas desistiu e se tornou juiz de fora em 1779, na cidade de Beja, em Portugal. Três anos depois, mudou-se para Vila Rica (atual cidade de Ouro Preto), no Brasil, para atuar como ouvidor-geral.

Nessa cidade, ele se apaixonou pela jovem Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão (1767-1853), a sua Marília de Dirceu. Anos depois, em 1786, apesar de ser nomeado desembargador na Bahia, Tomás Antônio Gonzaga continuou a viver em Vila Rica, onde, no ano seguinte, ficou noivo de Maria Doroteia.

Porém, em 1789, ele foi acusado de conspiração e preso na ilha das Cobras, no Rio de Janeiro. O julgamento ocorreu três anos depois, em 1792. Condenado, o poeta foi degredado e passou o resto de sua vida em Moçambique, na África. Nesse país, ele foi obrigado a esquecer sua amada e reconstruiu sua vida (...)”

Para a professora e biblioteconomista Dilva Frazão:

“ (...) Com o nome poético de “Dirceu”, Tomás Antônio Gonzaga escreveu poemas para sua amada Maria Doroteia, a quem chamou de “Marília”. Na primeira parte de seus poemas, "Marília de Dirceu", publicados ainda em Vila Rica, o poeta fala do amor, canta as delícias de uma vida simples em contato com a natureza, ao lado de seus amigos pastores e de sua pastora "Marília".

Esse ideal, descrito no poema, estava bem de acordo com as convenções do Arcadismo e era, na verdade, o oposto da vida levada pelo poeta, sempre envolvido com livros e processos jurídicos:

Eu tenho um coração maior que o mundo!
Tu, formosa Marília, bem o sabes:
Um coração..., e basta,
Onde tu mesma cabes.

Na segunda parte, do livro "Marília de Dirceu", são encontradas as poesias que Gonzaga escreveu na cadeia, na Ilha das Cobras, quando estava preso por seu envolvimento na Inconfidência Mineira. Nesses textos, o tom é outro, com o poeta lamentando-se do destino, afirmando sua inocência e queixando-se da saudade de Marília e da liberdade:

Que diversas que são, Marília, as horas,
Que passo na masmorra imunda, e feia,
Dessas horas felizes, já passadas
Na tua pátria aldeia!

Prisão

Em 1786, Tomás Antônio Gonzaga foi nomeado Desembargador da relação da Bahia, mas adiou o quanto pode essa transferência, pois estava apaixonado e já havia marcado o casamento com Maria Doroteia, mas Gonzaga não chegou a casar, nem a assumir o cargo de desembargador, pois foi acusado de participar da Inconfidência Mineira. 

A conspiração contra a coroa portuguesa, tinha como objetivo libertar a colônia do domínio econômico português. A Inconfidência Mineira foi realizada por pessoas da elite econômica, onde se destacava a presença de padres e letrados.

Tomás Antônio Gonzaga foi preso e, levado para a Ilha das Cobras no Rio de Janeiro, onde ficou até 1792, quando foi extraditado para Moçambique, na África, onde pode refazer sua vida. 

Trabalhou como juiz de alfândega, casou-se com a viúva Juliana Mascarenhas, sem esquecer talvez da doce Marília, que ele eternizou em suas "liras" (...)”

 

Para a Doutora em estudos da cultura Rebeca Fuks:

“ (...) Mordaz, crítico e audacioso, sua lírica lhe rendeu a fama de um dos maiores poetas neoclássicos brasileiros.

Principais poemas

A primeira obra publicada por Gonzaga - um volume de poesias - surgiu em Lisboa no ano de 1792. Com 48 anos, o poeta estava aguardando para embarcar rumo à África quando publicou as suas Liras.

Sua obra literária pertence ao Arcadismo (ou Neoclassicismo), escola literária que sucedeu o Barroco, e contempla basicamente duas obras bastantes distintas.

Já bastante conhecidas pelo grande público, são de autoria de Tomás Antônio Gonzaga os versos de Marília de Dirceu e Cartas Chilenas.

Marília de Dirceu, 1792

O trabalho que hoje conhecemos como a coletânea protagonizada pelos pastores Marília e Dirceu tinha originalmente 118 páginas que continham 23 poesias.

Tomás Antônio Gonzaga teoricamente teria conhecido Maria Joaquina Dorotéia Seixas (no poema reproduzida como Marília), na época uma adolescente, no ano a seguir que teria chegado no Brasil.

Seguindo a convenção pastoril da época, Tomás Antônio Gonzaga transpôs para a literatura o seu amor pela jovem que havia conhecido em Vila Rica. Serviram de inspiração para a lírica poetas como Virgílio e Teócrito.

Para além de uma declaração de amor à sua amada Marília, os versos fazem um elogio a vida bucólica do campo ao mesmo tempo que criticam a rotina citadina.

A linguagem utilizada é simples e acessível, os versos são discretos e não carregam rimas elaboradas. Vale sublinhar que Marília, o objeto do amor de Dirceu, é altamente idealizada nos versos tanto em termos físicos quanto de personalidade:

Na sua face mimosa,
Marília, estão misturadas
Purpúreas folhas de rosa,
Brancas folhas de jasmim.
Dos rubins mais preciosos
Os seus beiços são formados;
Os seus dentes delicados
São pedaços de marfim.

Marília de Dirceu é, portanto, antes de mais nada, um elogio à amada feito em um contexto pastoril de cortejo.

A impressão da primeira edição dos poemas havia sido feita pela Tipografia Nunesiana em 1792. Sete anos mais tarde, a mesma tipografia imprimiu uma nova edição, dessa vez com um acréscimo de uma segunda parte. Em 1800, por sua vez, surgiu uma terceira edição contendo uma terceira parte.

As edições se sucederam em Portugal até 1833 enquanto no Brasil a primeira impressão de Marília de Dirceu surgiu somente em 1802, dez anos após a publicação da primeira edição portuguesa.

Cartas Chilenas, 1863

As Cartas Chilenas foram versos satíricos anônimos que denunciavam o sistema de corrupção e agrados durante a administração de Luís da Cunha de Menezes, governador da capitania de Vila Rica entre 1783 e 1788.

Os versos não tinham rima e eram assinados por Critilo, que claramente fazia um deboche com a situação da capitania nas treze cartas divulgadas anonimamente pela região.

Como havia forte repressão e um medo terrível da censura, as críticas precisavam ser camufladas. Critilo, que vivia no Chile, supostamente decidiu escrever treze cartas endereçadas ao amigo Doroteu, que vivia na Espanha, para narrar as decisões do cruel Fanfarrão Minésio, um corrupto governador da colônia espanhola.

Com o desejo de que Minésio servisse de exemplo para que tal situação não se repetisse no Brasil, um desconhecido que obtém as cartas resolve traduzi-las do espanhol para o português para as espalhar por Vila Real.

O alvo das maiores críticas que nas cartas aparecia com o nome Fanfarrão Minésio, era na verdade o governador de Vila Real, Luís da Cunha de Menezes.

O destinatário das cartas, Doroteu, supõe-se que seja Cláudio Manuel da Costa, um inconfidente mineiro próximo de Tomás Antônio Gonzaga. A cidade de Vila Rica surge nas cartas como se fosse Santiago e o Brasil, por correspondência, seria o Chile.

A crítica nas cartas se dá com uma ironia fina a partir de um olhar preciso que denuncia os absurdos cometidos pelo governador.

Em seus versos, Critilo muitas vezes chacota as supostas deficiências e limitações de Luís da Cunha de Menezes:

Do nosso Fanfarrão? Tu não o viste
Em trajes de casquilho, nessa corte?
E pode, meu amigo, de um peralta
Formar-se, de repente, um homem sério?
Carece, Doroteu, qualquer ministro
– Apertados estudos, mil exames,
E pode ser o chefe onipotente
Quem não sabe escrever uma só regra
Onde, ao menos, se encontre um nome certo?

As Cartas Chilenas têm enorme valor literário, mas também social porque retratam a vida em sociedade da época. Elas ilustram o modo como o povo era tratado e como os governantes faziam (ou não faziam) as leis serem cumpridas.

Os versos atribuídos à Tomás Antônio Gonzaga são um verdadeiro registro do modus operandi da capitania mais valiosa do Brasil do final do século XVIII.

Obra completa

Tomás Antônio Gonzaga não foi um autor muito prolixo e a sua bibliografia se resume a poucas publicações. São elas:Tratado de Direito Natural, 1768; Marília de Dirceu (parte 1). Lisboa: Tipografia Nunesiana, 1792;Marília de Dirceu (partes 1 e 2). Lisboa: Tipografia Nunesiana, 2 vols., 1799; Marília de Dirceu (partes 1, 2 e 3). Lisboa: Joaquim Tomás de Aquino Bulhões, 1800; Cartas chilenas. Rio de Janeiro: Laemmert, 1863; Obras Completas (organização de M. Rodrigues Lapa). São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942.”

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Abaixo 3 Liras  de Marília de Dirceu:

 

Lira I

Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Eu vi o meu semblante numa fonte,
Dos anos inda não está cortado:
Os pastores, que habitam este monte,
Com tal destreza toco a sanfoninha,
Que inveja até me tem o próprio Alceste:
Ao som dela concerto a voz celeste;
Nem canto letra, que não seja minha,
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Mas tendo tantos dotes da ventura,
Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
Depois que teu afeto me segura,
Que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
De um rebanho, que cubra monte, e prado;
Porém, gentil Pastora, o teu agrado
Vale mais q’um rebanho, e mais q’um trono.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!

Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do Sol em vão se atreve:
Papoula, ou rosa delicada, e fina,
Te cobre as faces, que são cor de neve.
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamos vapora.
Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
Para glória de Amor igual tesouro.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!”

Lira XIX

Enquanto pasta alegre o manso gado,
Minha bela Marília, nos sentemos
À sombra deste cedro levantado.

Um pouco meditemos
Na regular beleza,
Que em tudo quanto vive, nos descobre
A sábia natureza.

Atende, como aquela vaca preta
O novilhinho seu dos mais separa,
E o lambe, enquanto chupa a lisa teta.
Atende mais, ó cara,
Como a ruiva cadela
Suporta que lhe morda o filho o corpo,
E salte em cima dela.

Repara, como cheia de ternura
Entre as asas ao filho essa ave aquenta,
Como aquela esgravata a terra dura,
E os seus assim sustenta;
Como se encoleriza,
E salta sem receio a todo o vulto,
Que junto deles pisa.

Que gosto não terá a esposa amante,
Quando der ao filhinho o peito brando,
E refletir então no seu semblante!
Quando, Marília, quando
Disser consigo: “É esta
“De teu querido pai a mesma barba,
“A mesma boca, e testa.”

Lira XXI – Tomás Antônio Gonzaga

Não sei, Marília, que tenho,
Depois que vi o teu rosto;
Pois quanto não é Marília,
Já não posso ver com gosto.
Noutra idade me alegrava,
Até quando conversava
Com o mais rude vaqueiro:
Hoje, ó Bela, me aborrece
Inda o trato lisonjeiro
Do mais discreto pastor
Que efeitos são os que sinto?
Serão efeitos de Amor?

Saio da minha cabana
Sem reparar no que faço:
Busco o sítio aonde moras,
Suspendo defronte o passo.
Fito os olhos na janela,
Aonde, Marília bela,
Tu chegas ao fim do dia;
Se alguém passa, e te saúda,
Bem que seja cortesia,
Se acende na face a cor.
Que efeitos são os que sinto?
Serão os efeitos de Amor?

Se estou, Marília, contigo,
Não tenho um leve cuidado;
Nem me lembra se são horas
De levar à fonte o gado.
Se vivo de ti distante,
Ao minuto, ao breve instante
Finge um dia o meu desgosto:
Jamais, Pastora, te vejo
Que em seu semblante composto
Não veja graça maior.
Que efeitos são os que sinto?
Serão os efeitos de Amor?

Ando já com o juízo,
Marília, tão perturbado,
Que no mesmo aberto sulco
Meto de novo o arado.
Aqui no centeio pego,
Noutra parte em vão o sego:
Se alguém comigo conversa,
Ou não respondo, ou respondo
Noutra coisa tão diversa,
Que nexo não tem menor.
Que efeitos são os que sinto?
Serão os efeitos de Amor?

Se geme o bufo agoureiro,
Só Marília me desvela,
Enche-se o peito de mágoa,
E não sei a causa dela.
Mal durmo, Marília, sonho
Que fero leão medonho
Te devora nos meus braços:
Gela-se o sangue nas veias,
E solto do sono os laços
À força da imensa dor.
Ah! que os efeitos, que sinto,
Só são efeitos de Amor.

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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História

Figura: https://www.bing.com/search?q=imagem+de+tomas+antonio+gonzaga&form=ANSPH1&refig=26df50c5f36c4de48725b17521e0379d&pc=

domingo, 7 de agosto de 2022

Poesia "Sextas-feiras"

 



Sextas-feiras

Ora veja!

Já é sexta-feira!

No Brasil,

Dia de cerveja.

Vem e me beija

Sexta-feira!

Sexta que uma vez ao ano

É santa.

Para muitos em tantas

Tantas sextas-feiras,

São dias de pecado.

Dia desejado

Pelos adoradores de Baco.

Posterior à quinta,

Antecede o sábado.

Quantos amam

Quando sexta é feriado?

Quantos estudantes sabadeiam

Nas noites de sexta,

Deixando vagas as carteiras?

E suas futuras carreiras?

Ó tu ser noturno,

Que vagueias,

Pelas noites de sexta nos bares,

De gente encharcados,

Prepara tua carteira,

Não é só porque é sexta-feira,

Que te venderão fiado!

E tu que bebes um bocado

Não mintas a ti mesmo,

Quando gritas entusiasmado:

“É a última,

A derradeira,

A que finda,

A saideira!”

Márcio José Matos Rodrigues


Figura: 

https://www.google.com/search?q=imagens+de+bares+lotados&sxsrf=ALiCzsYCK13gJ3wNh4l0k0-LYiT-znRazg%3A1659876847455&source=hp&ei=


sábado, 6 de agosto de 2022

Poesia Quintas feiras

 




Quintas feiras

Quinta é tão perto

De sexta

Que quando quinta vem,

É certo,

Que alguém já está sextando.

Quantos torcem ao raiar o ano

Que se não feriar as sextas ou segundas,

Que seja quinta por favor!

Esperando a benevolência de um governador de estado,

Que decrete o próximo dia

Como facultado.

Moça que gosta das quintas

Que o anjo deste dia lhe proteja,

Que seja um anjo que trabalhe 

Nos pontos facultativos

E também nos feriados!

Márcio José Matos Rodrigues

Figura: https://www.google.com/search?sxsrf=ALiCzsavRyjK68bJdwGkrhOBsSLjNmO2VQ:1659843259708&source=univ&tbm=isch&q=imagem+de+anjo&fir=


quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Poesia Quartas-feiras


 


Quartas-feiras

Quarta feira,

Dia do meio.

Quantos reclamam da segunda?

Quantos amam a sexta?

A segunda deixa um pouco de si na terça,

A quinta já começa a dar um gostinho de sexta

E todas são feiras.

A quarta é bonita?

É feia?

Dama de olhar afável,

Só quero te desejar,

Que tua quarta seja agradável

Como uma primavera;

Calma,

Como as águas tranquilas de uma lagoa.

Quartas-feiras tem alma?

Se tem,

Espero que as tuas

Tenham alma boa.

Quartas à noite podem ser de qualquer fase de lua,

Muitos preferem a cheia;

Mas ainda que seja nova ou minguante

Que seja uma noite bela,

Com um céu repleto de pontos brilhantes,

Transbordante de estrelas!

Márcio José Matos Rodrigues