quarta-feira, 11 de agosto de 2021

O filósofo grego Epicuro

 


                                                   



                                       

                                           


Epicuro foi um filósofo grego do período helenístico, que nasceu na Ilha de Samos em 341 a. C e morreu por volta de 271 ou 270 a. C em Atenas. O pensamento desse filósofo foi disseminado por vários lugares do mundo antigo como a Jônia, o Egito e em Roma a partir do século I, sendo Lucrécio o principal divulgador. Foi chamado de "Profeta do Prazer" e o "Apóstolo da Amizade”, apresentou um esboço da evolução 2.300 anos antes da teoria darwiniana.

Estudou em sua infância com Pânfilo, um estudioso platonista. Quando jovem Epicuro foi para Teos, na costa da Ásia Menor. Nesse local ele possivelmente estudou com Nausífanes, um discípulo de Demócrito de Abdera. Nessa época Epicuro pode ter estudado a teoria atomista e fez mudanças nessa teoria.  Aos 18 anos Epicuro cumpriu dois anos de serviço militar em Atenas. Buscava ter ideias próprias e não se dedicava com exclusividade a algum filósofo e não pretendia encontrar a suprema verdade em nenhum escrito de qualquer filósofo.

Ensinou gramática e filosofia em Lâmpsaco, Mitilene e Cólofon.Voltou para Samos em 323 a. C. Em 306 a. C tinha fundado a escola filosófica O Jardim e passou a residir em Atenas com alguns amigos. Teve problemas de saúde por causa de um cálculo renal e isso lhe proporcionou momentos de dor durante sua vida. Lecionou até sua morte em 270 a. C e quando morreu estava rodeado de amigos e discípulos.

Contexto histórico do Epicurismo:

Na época que se desenvolveu o epicurismo, havia já acontecido as conquistas macedônicas sobre territórios gregos e sobre o império persa. Após a morte do imperador Alexandre, seus generais dividiram o seu império. Uma forma de dominação de Alexandre foi manter aspectos culturais dos povos vencidos e houve uma fusão cultural envolvendo os gregos e povos orientais. Surgiu assim o helenismo. Nesse contexto foram criadas correntes filosóficas como o epicurismo. As ideias de Epicuro permaneceram mesmo com a dominação romana que se iniciou em 146 a .C. 

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A filosofia de Epicuro fez oposição à metafísica de Aristóteles e às ideias de Platão. Dizia Epicuro que nada está além de nossos sentidos e que não há outra realidade que possa existir sem o auxílio dos cinco sentidos.  Ele dizia que devemos dar prazer para receber prazer, não se deve causar injúria, deve-se viver e deixar viver, ser para si o melhor amigo ao mesmo tempo que se é um bom amigo para os outros. Para Epicuro há três tomadas de consciência do indivíduo: compreensão dos deuses, compreensão da morte e compreensão dos desejos. A sua filosofia buscava atingir a felicidade, buscando a aponia (ausência de dor física) e ataraxia (imperturbabilidade da alma). Para ele o homem segue o exemplo dos animais, procurando evitar a dor e buscando o prazer.

Para explicar a existência das coisas Epicuro baseou-se na teoria atômica de Demócrito. Dizia ele que tudo é formado de átomos, mas com diferentes naturezas, sendo os átomos com qualidades finitas, quantidades infinitas e com infinitas combinações. O corpo para ele seria uma soma de carne e alma e a morte física seria o fim do corpo e do indivíduo. Mas os átomos passariam a constituir outros corpos, pois para ele os átomos seriam eternos e indestrutíveis. A filosofia de Epicuro pretendia explicar todos os fenômenos naturais e eliminando os maiores medos humanos: o medo da morte e o medo dos deuses.

Para Epicuro os deuses viviam em perfeita harmonia e em um estado de felicidade divina. Os deuses não teriam a intenção de causar sofrimento aos seres humanos. Os deuses teriam de ser considerados como exemplos de bem-aventurança, servindo de modelos para os homens, sem instabilidade e sem serem dotados de paixões humanas.  Não deveriam ser temidos durante a vida das pessoas e nem depois da morte delas. Epicuro defendia a ideia de que não se deve temer a morte. Para ele depois de mortas as pessoas não poderão sentir algo porque estarão desprovidas de seus sentidos.

Na filosofia epicurista as dores e os prazeres estarão nesse caminho que busca a felicidade e ainda que nem sempre se possa evitar as dores físicas, elas não são duradouras, podendo ser suportadas usando-se as lembranças de momentos prazerosos que se tenha tido. Mas piores são as dores que atormentam a alma, muitas vezes relacionadas às frustrações, por causa de desejos que não foram satisfeitos. Para combater este tipo de dor, Epicuro indicava a reflexão. Os seguidores e discípulos de Epicuro encaravam a sua doutrina como uma boa nova, um meio de equilibrar dores e prazeres.

Epicuro escreveu cerca de 300 obras, porém sobraram somente três cartas que tratam a respeito da natureza, meteoros e sobre a moral. Também restaram uma coleção de pensamentos e partes fragmentadas de obras da filosofia epicurista perdidas. As cartas e os fragmentos foram reunidos por Herman Useneer, que em 1887 deu a todo este conjunto o título de Epicurea. O autor Hermann Diels veio a descobrir mais tarde que os fragmentos não eram de Epicuro e sim de Leucipo.

Epicuro dizia que o medo em relação aos deuses fazia que se cometessem maus atos, sendo empecilho à serenidade. Defendia que teria de haver a liberdade humana e a tranquilidade do espírito. Para se conseguir a liberdade e a tranquilidade seria preciso o atomismo. Na teoria epicurista há um encontro fortuito dos átomos devido a uma pequena inclinação em sua trajetória e com o choque deles se constitui a matéria. O átomo, para Epicuro, se desvia, por causa da inclinação e essa poderia ser por um desejo, uma vontade ou afinidade com outro átomo. O encontro fortuito dos átomos para ele é que asseguraria a liberdade. O Homem teria que compreender como funciona a natureza e essa compreensão o levaria a libertar-se do medo e das superstições que fazem o espírito sofrer. Epicuro em uma de suas cartas teria dito que há um número infinito de mundos no cosmos, sendo alguns habitados e outros não.

É importante destacar que o epicurismo, embora diga que o bem está no prazer, não é a mesma coisa que o hedonismo, que considera os prazeres sexuais e incentiva que haja prazer de forma intensa. No epicurismo o prazer é passivo, com ausência de paixões e com o fim de fatores que possam causar o sofrimento ou o temor, por exemplo, a morte. Segundo João Quartim de Moraes, professor aposentado da Universidade Estadual de Campinas: “Para Epicuro, a vida prazerosa exige paz de espírito, não sendo somente a totalidade dos prazeres da vida. A principal diferença, portanto, do epicurismo e do hedonismo é que o primeiro considera o prazer do repouso, a experiência psíquica da lembrança também é um prazer; enquanto a segunda considera apenas a experiência prazerosa no momento de sua fruição.”

O prazer para Epicuro é o do sábio, é a quietude da mente, domínio das emoções e de si próprio. A justa medida e não os excessos. Um prazer que satisfaz uma necessidade e acalma a dor. Para ele deve-se ter uma vida simples conduzida pela Natureza. O prazer que existe, segundo essa teoria, é o prazer corpóreo, o prazer do espírito seria lembrança dos prazeres do corpo. A saúde seria o máximo prazer. A amizade seria um desses prazeres. Na academia de Epicuro, O Jardim, os amigos se dedicavam à filosofia e essa teria como característica maior a libertação do Homem e uma vida feliz.

A classificação dos desejos para Epicuro seriam: 1- Necessários: para a felicidade, para a tranquilidade do corpo, para a vida (nutrição, sono); 2-Simplesmente naturais: variação de prazeres, busca do que é agradável; 3-Artificiais (como a riqueza e a glória); 4-Irrealizáveis (como a imortalidade). Para Epicuro, os desejos não naturais e não necessários surgem de uma opinião falsa sobre o mundo, estimulados por sentimentos de vaidade, orgulho ou inveja. Epicuro considerava que os seres humanos tinham o dever de tornar a vida presente a melhor possível e a vida teria de ter prazer, um prazer refinado, não turbulento, com uma vida simples e evitando os excitamentos de querer sempre mais. Ele dizia que a filosofia é dividida em: Uma parte lógica para diferenciar as formas de conhecimento verdadeiro; uma parte física para mostrar a estrutura verdadeira da realidade; uma parte que se constituiria na chave para abrir as portas da felicidade.

Pode-se dizer que o epicurismo é um sistema filosófico que diz que deve-se buscar prazeres moderados de modo a se atingir uma condição de tranquilidade e de libertação do medo, evitando-se o sofrimento do corpo a partir do conhecimento de como o mundo funciona e da limitação dos desejos. Os desejos exagerados podem assim gerar perturbações frequentes e causando dificuldades para se obter a felicidade,  estando essa relacionada à saúde do corpo e à serenidade do espírito. Para essa teoria, é preciso controlar medos e desejos e assim ser feliz, o estado de prazer tem que ser estável e equilibrado, havendo a tranquilidade e evitando-se a existência de perturbações.

A filosofia epicurista teve muitos seguidores no mundo antigo mediterrânico. A sua influência ainda perdurou por cerca de sete séculos após a morte do seu criador. Três elementos eram fundamentais para Epicuro para se atingir a felicidade: liberdade, amizade e tempo para filosofar. Na teoria do conhecimento epicurista há a valorização da experiência imediata. Para Epicuro o conhecimento tem origem nas sensações e impressões dos sentidos e as sensações são sempre verdadeiras. Deve-se aproximar da realidade por meio de sensação, antecipação e afecção. As afecções ocorrem de dois modos:o prazer, que é segundo a natureza, e a dor que é oposta à natureza. Faz-se necessário, segundo Epicuro, deixar os prazeres que possam causar aflição e aceitar a dor quando ela traz em si um bem futuro. Ele valorizava a contemplação intelectual e a amizade como os mais elevados prazeres e ensinou que o ser humano se livra da dor por intermédio de suas recordações e esperanças.

Para Epicuro há uma forma de pensar, o logismós, envolvendo raciocínio, cálculo e pensamento discursivo. Assim, pelo logismós pode-se fazer a alma não cair no erro em seus julgamentos e em suas opiniões, fazendo-a ser capaz de perceber os limites do prazer e saber quais prazeres causam uma vida que seja agradável e sem perturbações, havendo uma capacidade de medir e ponderar.

Epicuro teve discípulos de vários tipos, alguns ricos e outros não, até mesmo mulheres e escravos. Ele não entendia o conhecimento como algo a ser direcionado a um só tipo de pessoa, acreditando que todos tinham direito a conhecer, defendendo que a sabedoria pode conduzir à felicidade.

Em pensadores estoicos, como Cícero, Sêneca e até mesmo Marco Aurélio pode-se perceber uma influência de Epicuro, embora existam diferenças entre estoicos e epicuristas. Para os estoicos a perfeição humana estava relacionada ao fundamento de que os seres humanos estão ligados à natureza e precisam negar seus desejos e voltarem-se à realização de uma vontade direcionada pela razão, que tem que estar em equilíbrio com a natureza. A felicidade para os estoicos baseia-se numa ética rigorosa e para eles o universo é governado por uma razão universal divina e que os homens devem dominar suas paixões. Para os estóicos deve haver também a indiferença em relação ao que é externo ao ser. O epicurismo está relacionado aos prazeres terrenos. Os epicuristas dizem que os homens são inclinados aos seus interesses individuais e cada um deve buscar nos prazeres a felicidade. Para os estoicos o que deve ser procurado não é o prazer e sim a virtude.

Epicuro era conhecido por estar sempre sereno, calmo e benevolente ele, antes de morrer disse: “lembrem de meus ensinamentos

Sobre Epicuro disse Diógenes Laércio em sua obra sobre o filósofo:

“Há testemunhas suficientes para provar a índole insuperavelmente nobre deste homem para com todos os homens: a sua cidade natal, que o honrou com estátuas de bronze; seus amigos, tão numerosos que nem podem ser contados; seus partidários que ficaram cativados pelos seus ensinamentos atraentes, com exceção de Metrodoro de Estratoniceia, que passou para Carnéades, ficando, porém, profundamente humilhado pela bondade sem limites de Epicuro; pela sequência da escola, que, enquanto todas as outras, praticamente, se perderam, continuou a florescer sob a direção de diversos discípulos epicureus; pela sua gratidão para com seus pais; pela caridade para com seus irmãos; pela sua brandura para com seus escravos e, em geral, pelo seu proceder cheio de afeto para com todos os homens. O seu respeito piedoso para com a divindade e o seu amor à pátria são indizíveis: pois num excesso de equidade, ele nem quis ocupar-se com política. E, apesar de, naquele tempo, a sua pátria natal helênica haver padecido nas piores circunstâncias, lá passou ele a sua vida, viajando apenas por duas ou três vezes na região jônica da Ásia Menor para visitar seus amigos, que acorriam de todos os pontos cardeais para com ele viverem no Jardim, da maneira mais moderada e simples... Assim era o homem que pregava o “gozo” como finalidade da vida”.

Segundo Johannes Mewaldt na introdução de Pensamentos. Epicuro. Textos Selecionados:

“De pura origem ática, como nos relatam com ênfase, de velha linhagem nobre, Epicuro nasceu em janeiro do ano 341 a. C, filho de Néocles e de Queréstrata, não em Atenas, mas na ilha jônica de Samos, onde seu pai, que emigrara dez anos antes para lá, tomava conta de uma propriedade rural. Era uma época difícil, também do ponto de vista econômico, na qual a luta entre Atenas, dirigida por Demóstenes, e o rei da Macedônia, Filipe, se tornava séria; três anos depois do nascimento de Epicuro, ano de 338 a. C, a coalizão dos helenos foi aniquilada em Queroneia. Epicuro cresceu num meio campestre simples, sob a guarda de seus pais, aos quais demonstrou, por toda a sua vida, um profundo reconhecimento, e juntamente com três irmãos que mais tarde se tornaram seus discípulos (...)”

 


Pensamentos de Epicuro:

 

“É impossível viver prazerosamente sem viver prudente, bela e justamente, nem viver prudente, bela e justamente sem viver prazerosamente. Aquele que está privado daquilo que permite viver prudente, bela e justamente, não pode viver feliz, mesmo se for correto e justo.“

 

“Nenhum prazer é em si mesmo um mal, mas aquilo que produz certos prazeres acarreta sofrimentos bem maiores do que os prazeres.”

“Aqueles desejos naturais que quando permanecem insatisfeitos não provocam padecimento, mas suscitam forte tensão, são produto de uma vã opinião, e quando não se dissipam não é por causa de sua natureza própria, mas da futilidade humana.”


“Aquele que melhor goza a riqueza é aquele que menos necessidade dela tem.”

“O prazer de fazer o bem, é maior do que recebê-lo.”

“Se queres a verdadeira liberdade, deves fazer-te servo da filosofia.”

    “Nada é bastante ao homem para quem tudo é demasiado pouco.”

O prazer não é um mal em si; mas certos prazeres trazem mais dor do que felicidade.

  “Só há um caminho para a felicidade. Não nos preocuparmos com coisas  que ultrapassam o poder da nossa vontade.”

     “O homem sereno procura serenidade para si e para os outros.”

      “Queres ser rico? Pois não te preocupes em aumentar os teus bens, mas   sim em diminuir a tua cobiça.”

      “As pessoas felizes lembram o passado com gratidão, alegram-se com o presente e encaram o futuro sem medo.”

       “O justo é tranquilíssimo, o injusto é sempre muito solícito.”

“A amizade e a lealdade residem numa identidade de almas raramente encontrada.”

“É estupidez pedir aos deuses aquilo que se pode conseguir sozinho.”

      “A liberdade é o maior fruto da autossuficiência.”

“Não se pode não ter medo quando se inspira o medo.”

“Os grandes navegadores devem sua reputação aos temporais e tempestades.”

       “Todo o desejo incômodo e inquieto se dissolve no amor da verdadeira filosofia.”

“Nunca se protele o filosofar quando se é jovem, nem canse o fazê-lo quando se é velho, pois que ninguém é jamais pouco maduro nem demasiado maduro para conquistar a saúde da alma.”

      “E quem diz que a hora de filosofar ainda não chegou ou já passou, assemelha-se ao que diz que ainda não chegou ou já passou a hora de ser feliz.”

“Se queres enriquecer Pítocles, não lhe acrescentes riquezas: diminui-lhe os desejos.”

"Qualquer argumentação filosófica que não tenha como preocupação principal abordar terapeuticamente o sofrimento humano é inútil"

“Somente o justo desfruta de paz de espírito.”

     “Faz tudo como se alguém te contemplasse.”

“Caráter é aquilo que você é quando ninguém está te olhando.”

“Na discussão, o vencido obtém maior proveito, pois aprende aquilo que ainda não sabia.”

“Lembre-se de que aquilo que você tem hoje, um dia esteve entre as coisas que desejava."

“Os alimentos mais simples proporcionam o mesmo prazer que as iguarias mais requintadas, desde que se remova a dor provocada pela falta.”

“Das coisas que a sabedoria proporciona para tornar a vida inteiramente feliz, a maior de todas é uma amizade”.


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Márcio José Matos Rodrigues-Professor de História


Figura: https://www.google.com/search?q=imagem+de+epicuro&sxsrf=ALeKk01nz9xTJwGUVywyfGKBN5FeJEolmw:1628728527602&tbm=isch&source

 

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